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Associação da catastrofização da dor com a incidência e a intensidade da dor perineal aguda e persistente após parto normal: estudo longitudinal tipo coorte

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O parto vaginal pode resultar em dor perineal aguda e persistente pósparto. Este estudo avaliou a associação da catastrofização, fenômeno de má adaptação psicológica à dor que leva o indivíduo a magnificar a experiência dolorosa, tornando-a mais intensa, com a incidência e a intensidade da dor perineal e sua relação com o trauma perineal. MÉTODO: Estudo coorte. Realizado com gestantes em trabalho de parto. Foi aplicada a escala de pensamentos catastróficos sobre a dor durante o internamento e foram avaliados o grau da lesão perineal e a intensidade da dor perineal nas primeiras 24 horas e após oito semanas do parto por meio da escala numérica de dor. RESULTADOS: Avaliadas 55 mulheres. Sentiram dor aguda 69,1% das pacientes. Dessas, 36,3% queixaram-se de dor de moderada/forte intensidade e 14,5% de dor persistente. O escore médio de catastrofização foi de 2,15 ± 1,24. As pacientes catastrofizadoras apresentaram um risco 2,90 vezes maior (95% IC: 1,08-7,75) de apresentar dor perineal aguda e 1,31 vezes maior (95% IC: 1,05-1,64) de desenvolver dor perineal persistente. Também apresentaram um risco 2,2 vezes maior de desenvolver dor perineal aguda de maior intensidade (95% IC: 1,11-4,33). CONCLUSÕES: A incidência de dor perineal aguda e persistente após parto vaginal é alta. Gestantes catastrofizadoras apresentam maior risco de desenvolver dor perineal aguda e persistente, como também dor de maior intensidade. O trauma perineal aumentou o risco de ocorrência de dor perineal persistente.

CIRURGIA, Obstétrica; Parto Normal; Catastrofização; Períneo; DOR, Aguda; TÉCNICAS DE MEDIÇÃO, Dor


JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: El parto vaginal puede traer dolor perineal agudo y persistente postparto. Este estudio evaluó la asociación de la catastrofización, fenómeno de mala adaptación psicológica al dolor, que hace con que el individuo exagere la experiencia dolorosa, convirtiéndola en algo más intenso, con la incidencia y la intensidad del dolor perineal y su relación con el trauma perineal. MÉTODO: Estudio de cohorte realizado con gestantes en trabajo de parto. Se aplicó la escala de pensamientos catastróficos sobre el dolor durante el ingreso, y se evaluaron el grado de la lesión perineal y la intensidad del dolor perineal en las primeras 24 horas y después de ocho semanas del parto, por medio de la escala numérica del dolor. RESULTADOS: Fueron evaluadas 55 mujeres. Sintieron dolor agudo 69,1% de las pacientes. De ellas, un 36,3% se quejaron de dolor de moderado/fuerte intensidad y 14,5% de dolor persistente. La puntuación promedio de catastrofización fue de 2,15 ± 1,24. Las pacientes catastrofizadoras tuvieron un riesgo 2,90 veces mayor (95% IC: 1,08-7,75) de presentar dolor perineal agudo y 1,31 veces mayor (95% IC: 1,05-1,64) de desarrollar dolor perineal persistente. También tuvieron un riesgo 2,2 veces mayor de desarrollar dolor perineal agudo de mayor intensidad (95% IC: 1,11-4,33). CONCLUSIONES: La incidencia de dolor perineal agudo y persistente posteriormente al parto vaginal es elevada. Las gestantes catastrofizadoras tienen un mayor riesgo de desarrollar dolor perineal agudo y persistente, como también dolor de mayor intensidad. El trauma perineal aumentó el riesgo de prevalencia de dolor perineal persistente.

Catastrofización; CIRUGÍA, Obstétrica; DOLOR, Aguda; Parto Normal; Perineo; TÉCNICAS DE MEDICIÓN, Dolor


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Vaginal birth delivery may result in acute and persistent perineal pain postpartum. This study evaluated the association between catastrophizing, a phenomenon of poor psychological adjustment to pain leading the individual to magnify the painful experience making it more intense, and the incidence and severity of perineal pain and its relationship to perineal trauma. METHOD: Cohort study conducted with pregnant women in labor. We used the pain catastrophizing scale during hospitalization and assessed the degree of perineal lesion and pain severity in the first 24 hours and after 8 weeks of delivery using a numerical pain scale. RESULTS: We evaluated 55 women, with acute pain reported by 69.1%, moderate/severe pain by 36.3%, and persistent pain by 14.5%. Catastrophizing mean score was 2.15 ± 1.24. Catastrophizing patients showed a 2.90 relative risk (RR) for perineal pain (95% CI: 1.08-7.75) and RR: 1.31 for developing persistent perineal pain (95% CI: 1.05-1.64). They also showed a RR: 2.2 for developing acute and severe perineal pain (95% CI: 1.11-4.33). CONCLUSIONS: The incidence of acute and persistent perineal pain after vaginal delivery is high. Catastrophizing pregnant women are at increased risk for developing acute and persistent perineal pain, as well as severe pain. Perineal trauma increased the risk of persistent perineal pain.

Acute Pain; Catastrophization; Natural Childbirth; Obstetric Surgical; Procedures; Pain Measurement; Perineum


ARTIGO CIENTÍFICO

Associação da catastrofização da dor com a incidência e a intensidade da dor perineal aguda e persistente após parto normal: estudo longitudinal tipo coorte

Anne Danielle Santos SoaresI; Tânia Cursino de Menezes CouceiroII; Luciana Cavalcanti LimaIII; Fernanda Lobo Lago FloresIV; Eusa Maria Belarmino AlcoforadoV; Roberto de Oliveira Couceiro FilhoVI

IAnestesiologista, Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), Recife, PE, Brasil

IITSA; Mestrado em Neurociências, Universidade Federal de Pernambuco, Recife; Coordenadora, IMIP, Recife, PE, Brasil

IIIPhD em Anestesiologia, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, São Paulo; Professora & Coordenadora da Faculdade Pernambucana de Saúde, Recife, PE, Brasil

IVMédico Residente, IMIP, Recife, PE, Brasil

VTSA; Médica do Ministério da Saúde, Brasil

VITSA; Anestesiologista

Correspondência para Correspondência para: Tânia Cursino de Menezes Couceiro Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira. Departamento de Anestesiologia Rua dos Coelhos 300 Recife, PE, Brasil. CEP: 50070-550 E-mail: taniacouceiro@yahoo.com

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O parto vaginal pode resultar em dor perineal aguda e persistente pósparto. Este estudo avaliou a associação da catastrofização, fenômeno de má adaptação psicológica à dor que leva o indivíduo a magnificar a experiência dolorosa, tornando-a mais intensa, com a incidência e a intensidade da dor perineal e sua relação com o trauma perineal.

MÉTODO: Estudo coorte. Realizado com gestantes em trabalho de parto. Foi aplicada a escala de pensamentos catastróficos sobre a dor durante o internamento e foram avaliados o grau da lesão perineal e a intensidade da dor perineal nas primeiras 24 horas e após oito semanas do parto por meio da escala numérica de dor.

RESULTADOS: Avaliadas 55 mulheres. Sentiram dor aguda 69,1% das pacientes. Dessas, 36,3% queixaram-se de dor de moderada/forte intensidade e 14,5% de dor persistente. O escore médio de catastrofização foi de 2,15 ± 1,24. As pacientes catastrofizadoras apresentaram um risco 2,90 vezes maior (95% IC: 1,08-7,75) de apresentar dor perineal aguda e 1,31 vezes maior (95% IC: 1,05-1,64) de desenvolver dor perineal persistente. Também apresentaram um risco 2,2 vezes maior de desenvolver dor perineal aguda de maior intensidade (95% IC: 1,11-4,33).

CONCLUSÕES: A incidência de dor perineal aguda e persistente após parto vaginal é alta. Gestantes catastrofizadoras apresentam maior risco de desenvolver dor perineal aguda e persistente, como também dor de maior intensidade. O trauma perineal aumentou o risco de ocorrência de dor perineal persistente.

Unitermos: CIRURGIA, Obstétrica; Parto Normal; Catastrofização; Períneo; DOR, Aguda; TÉCNICAS DE MEDIÇÃO, Dor.

Introdução

O parto é um processo natural que pode resultar em morbidade materna por longo período1. Segundo a literatura, nos três primeiros meses após o parto 87% a 94% das mulheres queixam-se de algum problema de saúde2. Um problema de importante prevalência é a dor perineal aguda, que atinge 57-92% das puérperas3-6. Sua incidência parece relacionar-se com diversos fatores, entre os quais a paridade, a duração do período expulsivo ativo, o grau do trauma perineal, o tipo de fio usado para sutura e a realização de episiotomia6,7,8. A intensidade da dor aguda está relacionada a um risco 2,5 vezes maior de desenvolver dor crônica e três vezes maior para depressão pós-parto, independentemente do tipo de parto, vaginal ou cesário1,9. Recentes estudos têm verificado a relação entre a catastrofização da dor durante o trabalho de parto com a intensidade da dor perineal aguda, com a incidência de depressão pós-parto e com a capacidade de reabilitação funcional após o nascimento4,10. Originalmente a catastrofização foi estudada em pacientes portadores de dor crônica e sua influência no contexto do parto permanece aberta a novas pesquisas4. Neste estudo, foi analisada a associação da catastrofização da dor durante o trabalho de parto e do trauma perineal com a ocorrência e a intensidade da dor perineal aguda e persistente.

Método

Após aprovação pelo comitê de ética em pesquisa da instituição, foi realizado um estudo longitudinal tipo coorte, no Centro Obstétrico do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), Recife (PE), entre junho de 2010 e outubro de 2011. A coleta dos dados ocorreu em dois momentos: durante o internamento para o parto e oito semanas após, por contato telefônico. Participaram deste estudo gestantes de baixo risco, maiores de 16 anos, internadas em trabalho de parto e cujos fetos nasceram via parto vaginal espontâneo, após assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido pela paciente ou por seu responsável. Foram excluídas da pesquisa as mulheres com doença perineal prévia e foram retiradas após inclusão as que não compreenderam a explicação das escalas aplicadas e as que não responderam ao contato telefônico para avaliação da dor persistente. O total de mulheres que aceitaram participar do estudo foi 127. Dessas, 97 preencheram os critérios de inclusão e participaram da primeira fase de coleta dos dados. Entretanto, apenas 55 responderam ao segundo contato, via telefone.

Para a mensuração da catastrofização usamos a Escala de Catastrofização da Escala de Autoafirmações Relacionadas à Dor (PRSS)11 por causa de sua simplicidade, visto que é composta por apenas nove itens relacionados em uma escala Likert que varia de zero (quase nunca) a cinco (quase sempre) pontos (Quadro 1). O questionário é autoaplicável e o escore total é a soma dos itens dividida pelo número de itens respondidos, com escore variando de zero a cinco. Quanto maior o escore, mais indicativo de pensamentos catastróficos. Essa escala, validada em Português12, foi aplicada às participantes do estudo durante seu internamento. Usamos como referência de experiência dolorosa a dor do trabalho de parto (Quadro 1).


A intensidade da dor foi avaliada em dois momentos por meio da aplicação da Escala Numérica de Dor. Foi solicitado que a participante quantificasse um valor de zero a 10 para a sua dor em que zero correspondia à ausência de dor e 10 à intensidade máxima15,16. O primeiro momento ocorreu em até 24 horas após o parto e a dor foi classificada como aguda; o segundo ocorreu após oito semanas do parto, via telefone, e a dor, quando presente, foi classificada como persistente. Para fins de análise estatística, a dor foi categorizada como leve (< 3), moderada (4-7) e forte (>7). O protocolo de analgesia do serviço para o pós-parto normal foi mantido para as participantes deste estudo e consistiu em analgésicos (dipirona ou paracetamol) ou anti-inflamatórios não esteroidais (AINE) via oral, se necessários.

A avaliação do grau do trauma perineal foi realizada pelo obstetra ou enfermeiro obstetra que conduziu o parto, com base em um anexo específico previamente apresentado à parturiente. A classificação adotada considerou os seguintes graus de trauma: períneo íntegro, que corresponde a ausência de lesão; lesão de primeiro grau ou lesão de continuidade da pele em volta da abertura vaginal; lesão de segundo grau, que compromete a mucosa vaginal e os músculos perineais; lesão de terceiro grau, que compromete, além da mucosa vaginal e dos músculos perineais, o esfíncter anal; lesão de quarto grau, que compreende os tecidos comprometidos na lesão de terceiro grau mais lesão da parede do reto.

Para análise dos dados foi usado o programa Epi Info versão 3.5.3. Os resultados foram considerados estatisticamente significativos quando p < 0,05.

Resultados

A amostra foi composta por 55 mulheres, com média de idade de 25 ± 5,6 anos. A média de tempo de escolaridade da amostra foi de 10 ± 2 anos. As pacientes com escolaridade acima de 11 anos estavam cursando o ensino superior e constituíram 18% da amostra. A média de gestações foi igual a duas por participante.

Quanto à ocorrência de dor, 69,1% das participantes referiram dor nas primeiras 24 horas após o parto e 14,5% queixaram-se de dor persistente após oito semanas do parto. Entre as pacientes que referiram dor, 52,6% classificaram-na como sendo de moderada a forte intensidade nas primeiras 24 horas (Tabela 1).

Em relação à ocorrência de lesão perineal, 80% das pacientes apresentaram algum grau de lesão. Apenas duas pacientes foram submetidas à episiotomia (Tabela 2).

Em relação à escala de pensamentos catastróficos sobre a dor, o escore médio da amostra foi 2,15 ± 1,24 e a mediana 2,11, que foi usada como ponto de corte para inclusão das pacientes no grupo de catastrofizadoras ou não. Observamos que as catastrofizadoras têm um risco relativo (RR) igual a 2,90 (95% IC: 1,08-7,75) de apresentar dor perineal aguda e um RR de 1,31 (95% IC: 1,05-1,64) de desenvolver dor persistente. Também observamos entre as pacientes catastrofizadoras um risco 2,2 vezes maior de apresentar dor de maior intensidade nas primeiras 24 horas (95% IC: 1,11-4,33) (Tabela 3).

Quanto ao trauma perineal, observamos que a presença de trauma não esteve relacionada, de forma significativa, ao aumento do risco de dor perineal aguda. No entanto, nas pacientes que apresentaram trauma perineal o risco de dor persistente é 1,15 vezes maior. A relação entre trauma perineal e intensidade da dor não foi estatisticamente significativa (Tabela 4).

Discussão

Em nossa amostra, 69% das gestantes apresentaram dor aguda após o parto, sendo essa incidência semelhante à descrita na literatura (57-92%)1,6,9. No referente à dor perineal persistente, nossa incidência (14,5%) foi maior do que a descrita na literatura (9,7-10%)6,9,15. Entretanto, quando excluímos as pacientes submetidas à episiotomia, esse dado assemelha-se aos já publicados (10,8%). As pacientes submetidas à episiotomia foram excluídas da análise, que avaliou a relação entre catastrofização e dor perineal, visto que já existem fortes evidências de que a episiotomia é fator de risco para o desenvolvimento de dor perineal6,7 e assim poderia atuar como viés de confusão neste estudo.

Observamos que cerca de 70% das pacientes apresentaram dor aguda e dessas 52,6% referiram dor de moderada a forte intensidade. Esse dado indica que a dor pós-parto não está sendo adequadamente controlada e isso se deve ao fato de que o protocolo da Instituição só contempla o tratamento da dor de leve intensidade. Esse achado indica a necessidade de reavaliação dessa conduta.

Nosso estudo não observou relação significativa entre o trauma perineal e a ocorrência de dor perineal aguda e sua intensidade da dor e divergiu de estudo anterior que refere uma associação positiva entre o grau do trauma com a incidência e a intensidade da dor perineal após o parto vaginal7. Isso pode ser explicado pela seguinte razão: apesar de termos observado uma alta incidência de lesão perineal (80%), todas as lesões foram de baixo grau (1º e 2º), o que provavelmente contribuiu para a ausência de relação entre o grau do trauma perineal e a incidência e a intensidade da dor perineal observada em nossos resultados. Essa prevalência de lesões de baixo grau pode refletir simplesmente a realidade do local onde os dados foram coletados. Um serviço voltado para o parto humanizado, espontâneo, com baixa incidência de episiotomia, prestado por enfermeiras obstetras para gestantes de baixo risco, de forma que as pacientes que evoluíram para parto vaginal assistido (com uso de fórceps) ou apresentaram alguma distocia de progressão foram enviadas à ala de alto risco e não fizeram parte da análise dos dados.

Sobre os pensamentos catastróficos, diante da sua importância quanto à incapacidade e estresse decorrentes do estímulo doloroso, diversas medidas têm sido desenvolvidas para avaliar esse construto. As medidas mais frequentemente usadas são a Escala de Catastrofização do Questionário de Estratégias de Enfrentamento (CSQ)16, a Escala de Catastrofização sobre Dor (PCS)17 e a Escala de Catastrofização da Escala de Autoafirmações Relacionadas à Dor (PRSS)18 nas quais não há pontos de corte12,18. Essa última foi a escala usada nesta pesquisa. Em seu estudo de validade inicial19, o escore médio foi 2,03 ± 1,22. O escore médio de nossa amostra foi 2,15 ± 1,24 e a mediana 2,11, que foi usada como ponto de corte para inclusão das pacientes no grupo de catastrofizadoras ou não. Embora não existam pontos de corte para essa escala, optamos por usar a mediana do escore para classificação de catastrofizadoras e não catastrofizadoras na tentativa de uma melhor e mais fácil compreensão para análise dos dados. Essa estratégia foi adotada em estudos prévios com o uso da PCS4 que também não tem pontos de corte, embora o autor, no trabalho original de validação, tenha usado como pontos de corte os escores que limitavam o terço superior e inferior na distribuição dos escores da PCS de sua amostra17. Em nosso estudo, observamos que as catastrofizadoras têm um risco 2,90 vezes maior de apresentar dor perineal aguda e 1,31 vezes maior de desenvolver dor crônica. Embora a catastrofização não tenha sido originalmente descrita como preditor de ocorrência de dor, parece ter importância como tal, principalmente no que se refere à previsão de ocorrência de dor aguda. Em consonância com os achados de Flink - que, comparando as pacientes catastrofizadoras com as não catastrofizadoras, observou que as primeiras experimentavam dor mais intensa até um mês depois de realizado o parto (p < 0,0125)4, em nosso estudo observamos que as pacientes catastrofizadoras têm um risco 2,2 vezes maior de apresentar dor mais intensa nas primeiras 24 horas. Também observamos relação estatisticamente significativa entre catastrofização e intensidade da dor persistente (p < 0,023), o que corrobora os achados de estudos anteriores, realizados com pacientes portadoras de dor crônica, os quais observaram que pacientes catastrofizadoras apresentavam tendência a experimentar dor de maior intensidade17,18,19. Diante desses achados, sugerimos a possibilidade de identificar as gestantes catastrofizadoras durante o pré-natal e desenvolver intervenções a fim de proporcionar melhor adaptação dessas pacientes à dor do pós-parto. Uma opção já usada com sucesso em outras populações é a terapia cognitivo-comportamental, porém são necessários novos estudos que avaliem a efetividade desse tratamento de forma preventiva nessas mulheres4,18.

Este estudo tem algumas limitações que merecem discussão. Alguns fatores que poderiam influenciar a ocorrência da dor perineal após o parto, tais como o peso do feto ao nascer e a duração do período expulsivo, não foram avaliados. Porém, esses fatores estão indiretamente relacionados ao trauma perineal que foi analisado.

Ainda, a escala de pensamentos catastróficos usada neste estudo é originalmente autoaplicável, o que poderia levar à dificuldade de compreensão e de cooperação por parte das participantes. Para minimizar esse fato, a escala foi aplicada e posteriormente confirmada verbalmente pelo pesquisador.

Com este estudo concluímos que é alta a incidência de dor perineal aguda e persistente após o parto vaginal espontâneo. Mulheres que catastrofizam a dor do trabalho de parto parecem apresentar maior risco de ocorrência de dor perineal aguda e persistente, como também dor perineal de maior intensidade. Os traumas perineais de baixo grau aumentaram discretamente o risco de ocorrência de dor perineal persistente. Futuras pesquisas são necessárias tanto para identificação da melhor estratégia de suporte às puérperas catastrofizadoras quanto para melhor compreensão do papel da catastrofização sobre a ocorrência e intensidade dor aguda.

Recebido em 11 de abril de 2012.

Aprovado para publicação em 5 de dezembro de 2012.

Recebido do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira, Recife, PE, Brasil.

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  • Correspondência para:

    Tânia Cursino de Menezes Couceiro
    Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira. Departamento de Anestesiologia
    Rua dos Coelhos 300
    Recife, PE, Brasil. CEP: 50070-550
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 2013

    Histórico

    • Recebido
      11 Abr 2012
    • Aceito
      05 Dez 2012
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