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Distúrbios cognitivos adversos no pós-operatório: uma pesquisa nacional de anestesiologistas portugueses

Resumo

Justificativa e objetivos

O delírio pós-operatório e a disfunção cognitiva pós-operatória são algumas das complicações mais comuns em pacientes cirúrgicos mais idosos e estão associados a desfechos adversos. O objetivo deste estudo foi avaliar as perspectivas e conhecimentos de anestesiologistas portugueses sobre distúrbios cognitivos pós-operatórios e a prática clínica de rotina ao cuidar de pacientes cirúrgicos idosos.

Métodos

Pesquisa prospectiva on-line com perguntas usando uma escala Likert de 1–5 (discordo completamente–concordo completamente), ou respostas como sim/não/não sei. Os potenciais participantes eram anestesiologistas portugueses que trabalhavam em hospitais afiliados ao sistema nacional de saúde português e hospitais privados.

Resultados

Analisamos 234 resultados (17,7% do total dos potenciais respondentes). A maioria acreditava que o risco de efeitos colaterais cognitivos deveria ser considerado ao escolher o tipo de anestesia (87,6%) e que a função cognitiva pré-operatória deveria ser rotineiramente avaliada (78,6%). Ao cuidar de um paciente agitado e confuso no pós-operatório, 62,4% administraram primeiro um analgésico e 11,1% um ansiolítico. Protocolos para detectar e tratar distúrbios cognitivos pós-operatórios são raramente usados. Quase todos os entrevistados acreditam que o delírio pós-operatório e a disfunção cognitiva pós-operatória são áreas negligenciadas na anestesiologia.

Conclusões

Em geral, os participantes percebem os distúrbios cognitivos pós-operatórios como importantes resultados adversos após a cirurgia e anestesia, estão cientes dos principais fatores de risco para seu desenvolvimento, mas podem não ter informações sobre como prevenir e tratar o delírio pós-operatório. A maioria dos hospitais não possui protocolos de avaliação cognitiva pré-operatória, diagnóstico, tratamento ou acompanhamento de pacientes com delírio e disfunção cognitiva no pós-operatório.

PALAVRAS-CHAVE
Período pós-operatório; Distúrbios neurocognitivos; Disfunção cognitiva; Pesquisas e questionários

Abstract

Background and objectives

Postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction are some of the most common complications in older surgical patients and are associated with adverse outcomes. The aim of this study was to evaluate portuguese anesthesiologists’ perspectives and knowledge about adverse postoperative cognitive disorders, and routine clinical practice when caring for older surgical patients.

Methods

We used a prospective online survey with questions using a Likert scale from 1 to 5 (completely disagree to completely agree), or yes/no/don’t know answer types. Potential participants were portuguese anesthesiologists working in hospitals affiliated with the portuguese national health system and private hospitals.

Results

We analyzed 234 surveys (17.7% of total potential respondents). The majority believed that the risk of cognitive side effects should be considered when choosing the type of anesthesia (87.6%) and that preoperative cognitive function should be routinely assessed (78.6%). When caring for an agitated and confused patient postoperatively, 62.4% would first administer an analgesic and 11.1% an anxiolytic. Protocols to screen and manage postoperative cognitive disorders are rarely used. Nearly all respondents believe that postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction are neglected areas in anesthesiology.

Conclusions

Overall, participants perceive postoperative cognitive disorders as important adverse outcomes following surgery and anesthesia are aware of the main risk factors for their development but may lack information on prevention and management of postoperative delirium. The majority of hospitals do not have protocols regarding preoperative cognitive assessment, diagnosis, management or follow-up of patients with delirium and postoperative cognitive dysfunction.

KEYWORDS
Postoperative period; Neurocognitive disorders; Delirium; Cognitive dysfunction; Surveys and questionnaires

Introdução

A população mundial está envelhecendo e o número de adultos idosos submetidos à cirurgia e anestesia está aumentando constantemente.11 Etzioni DA, Liu JH, Maggard MA, et al. The aging population and its impact on the surgery workforce. Ann Surg. 2003;238:170-7. Comorbidades e mau estado funcional basal aumentam o risco de complicações pós-operatórias e mortalidade em pacientes mais velhos.22 Hamel MB, Henderson WG, Khuri SF, et al. Surgical outcomes for patients aged 80 and older: morbidity and mortality from major noncardiac surgery. J Am Geriatr Soc. 2005;53:424-9. Distúrbios cognitivos no pós-operatório como o delírio pós-operatório e a disfunção cognitiva pós-operatória são algumas das complicações mais comuns em pacientes cirúrgicos idosos.33 Monk TG, Weldon BC, Garvan CW, et al. Predictors of cognitive dysfunction after major noncardiac surgery. Anesthesiology. 2008;108:18-30.,44 Marcantonio ER. Postoperative delirium: a 76-year-old woman with delirium following surgery. JAMA. 2012;308:73-81.

O delírio pós-operatório é o que ocorre no pós-operatório em pacientes mais idosos, o risco é mais elevado.44 Marcantonio ER. Postoperative delirium: a 76-year-old woman with delirium following surgery. JAMA. 2012;308:73-81. A incidência pós-operatória pode ser tão alta quanto 53,3%.55 Bruce AJ, Ritchie CW, Blizard R, et al. The incidence of delirium associated with orthopedic surgery: a meta-analytic review. Int Psychogeriatr. 2007;19:197-214. A característica do delírio é a desatenção, mas só é reconhecida em uma fração dos pacientes sem testes formais.66 Whitlock EL, Vannucci A, Avidan MS. Postoperative delirium. Minerva Anestesiol. 2011;77:448-56. Em contraste com o delírio, a disfunção cognitiva pós-operatória é uma classificação de pesquisa que requer avaliação cognitiva pré e pós-operatória com uma incidência de 20–26%.77 Moller JT, Cluitmans P, Rasmussen LS, et al. Long-term postoperative cognitive dysfunction in the elderly ISPOCD1 study, ISPOCD investigators. International Study of Post-Operative Cognitive Dysfunction. Lancet. 1998;351:857-61.99 Silverstein JH, Deiner SG. Perioperative delirium and its relationship to dementia. Prog Neuropsychopharmacol Biol Psychiatry. 2013;43:108-115. A anestesia e a cirurgia podem aumentar o risco de delírio e disfunção cognitiva pós-operatória, especialmente em pacientes cirúrgicos idosos.77 Moller JT, Cluitmans P, Rasmussen LS, et al. Long-term postoperative cognitive dysfunction in the elderly ISPOCD1 study, ISPOCD investigators. International Study of Post-Operative Cognitive Dysfunction. Lancet. 1998;351:857-61. O delírio pós-operatório está associado a desfechos piores, como maior tempo de permanência hospitalar, institucionalização e declínio funcional.44 Marcantonio ER. Postoperative delirium: a 76-year-old woman with delirium following surgery. JAMA. 2012;308:73-81.,1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,1111 Rudolph JL, Inouye SK, Jones RN, et al. Delirium: an independent predictor of functional decline after cardiac surgery. J Am Geriatr Soc. 2010;58:643-9. Além disso, os pacientes com tal disfunção parecem ter um risco aumentado de morte em longo prazo, readmissões hospitalares, comprometimento cognitivo até cinco anos após a cirurgia e pioria da qualidade de vida.1212 Martin BJ, Buth KJ, Arora RC, et al. Delirium: a cause for concern beyond the immediate postoperative period. Ann Thorac Surg. 2012;93:1114-20.,1313 Abelha FJ, Luis C, Veiga D, et al. Outcome and quality of life in patients with postoperative delirium during an ICU stay following major surgery. Crit Care. 2013;17:R257. A disfunção cognitiva pós-operatória também está associada ao aumento da mortalidade, perda prematura de trabalhadores e dependência financeira de auxílio-doença.88 Steinmetz J, Christensen KB, Lund T, et al. Long-term consequences of postoperative cognitive dysfunction. Anesthesiology. 2009;110:548-55.

Diretrizes para a prevenção e tratamento do delírio pós-operatório foram sugeridas,1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. mas não há conhecimento de que os médicos usem essas diretrizes em sua prática. Fizemos uma pesquisa com médicos assistentes e residentes para avaliar as perspectivas dos anestesiologistas portugueses sobre os distúrbios cognitivos adversos no pós-operatório, identificar lacunas de conhecimento e definir a prática clínica de rotina entre os anestesiologistas de Portugal para ajudar na identificação, prevenção e tratamento do delírio pós-operatório e da disfunção cognitiva pós-operatória.

Métodos

A aprovação deste estudo (número de protocolo 2016.118 [102-DEFI/098-CES]) foi fornecida pelo Comitê de Ética para a Saúde (CES) do Centro Hospitalar do Porto, em Portugal (Presidente Dra. Luisa Bernardo), em 20 de junho de 2016. O Comitê de Ética dispensou a exigência de consentimento informado para participação na pesquisa através da Internet. Com a permissão dos autores, criamos um questionário em uma plataforma da web com base em um questionário previamente validado por Jildenstal et al.1515 Jildenstal PK, Rawal N, Hallen JL, et al. Perioperative management in order to minimise postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction: Results from a Swedish web-based survey. Ann Med Surg (Lond). 2014;3:100-7.

O questionário foi primeiramente traduzido do inglês para o português por três residentes e três assistentes e depois modificado para melhor refletir a prática clínica e nomenclatura em Portugal (tabela 1). O questionário foi dividido em três seções: (1) dados demográficos; (2) questões relativas ao conhecimento, preferências subjetivas e práticas clínicas de rotina; (3) tratamento de casos clínicos. Os três principais tópicos de interesse foram: (1) avaliação pré-operatória, avaliação do risco e fatores de risco para transtornos cognitivos pós-operatórios; (2) manejo intraoperatório e monitoração da profundidade da anestesia; (3) prevenção e tratamento do delírio pós-operatório e acompanhamento de pacientes com disfunção cognitiva pós-operatória. O questionário incluiu 21 perguntas e as respostas foram apresentadas em uma escala Likert de 1 a 5 (discordo completamente, discordo, não tenho opinião, concordo em parte, concordo totalmente) ou como opções fechadas de múltipla escolha: sim/não/não sei. Os participantes precisavam responder todas as perguntas para que a pesquisa fosse validada.

O questionário ficou disponível on-line de setembro de 2016 a janeiro de 2017 e três lembretes foram enviados. Os potenciais participantes eram anestesiologistas que trabalhavam em hospitais afiliados ao sistema nacional de saúde português (1.121 anestesiologistas, incluindo 291 residentes) e anestesiologistas que trabalhavam exclusivamente no setor privado (200 anestesiologistas).1616 Lemos LJP, Viana J, Assunção JP, et al. Censos anestesiologia – 2014 | Relatório final Census anesthesiology – 2014 | Final report board of the Portuguese Anesthesiology of the Portuguese Medical Association. Rev Soc Port Anestesiol. 2015;24:41-52. Em Portugal, é possível trabalhar apenas em hospitais afiliados ao sistema nacional de saúde, apenas em hospitais privados ou em ambos. Potenciais participantes foram contatados através de um e-mail que incluiu uma breve nota introdutória, instruções, um link para a pesquisa e as informações de contato dos autores. A participação foi voluntária e anônima. A Sociedade Nacional de Anestesiologistas enviou o link com a pesquisa através de seu banco de dados de correspondência para membros ativos e o manteve ativo em seu site oficial durante o período de cinco meses. Para aumentar a taxa de respostas, enviamos e-mails aos chefes de todos os departamentos de anestesiologia dos hospitais afiliados ao sistema nacional de saúde para que pudessem incentivar a participação e encaminhar a pesquisa para os anestesiologistas de seus departamentos.

Usamos o programa estatístico IBM SPSS para Mac OS, versão 24.0 (IBM Corp., Armonk, N.Y., EUA) para fazer a análise dos dados estatísticos. Os dados demográficos e os resultados das questões de múltipla escolha foram expressos em frequência e porcentagem. As respostas para as perguntas da escala Likert foram expressas em frequência e porcentagem calculadas como o número de uma constatação positiva (4 – Concordo parcialmente; 5 – Concordo completamente) ou negativa (1 – Discordo completamente; 2 – Discordo). Uma análise secundária foi feita para comparar os resultados das perguntas da escala Likert entre os residentes e assistentes usando o teste de Mann-Whitney para variáveis ordinais. Os resultados foram expressos em média ± desvio padrão (DP) e a significância estatística bicaudal foi estabelecida em 0,05.

Resultados

Analisamos 234 questionários (17,7% de potenciais entrevistados). A maioria dos anestesiologistas era do sexo feminino (158 [67,5%]), trabalhava em hospital de ensino (207 [88,5%]) e era assistente (172 [73,5%]). Os resultados abrangentes da pesquisa são mostrados na tabela 1 e os dados demográficos detalhados estão na tabela 2.

Tabela 1
Resultados detalhados da pesquisa
Tabela 2
Características demográficas

Quando os anestesiologistas foram questionados sobre a feitura de cirurgia sob anestesia geral, 58,9% (n = 138) ficariam preocupados com a possibilidade de comprometimento cognitivo pós-operatório e 94% (n = 220) gostariam que a profundidade da anestesia fosse monitorada, o que foi mais prevalente entre os residentes (4,83 ± 0,54 vs. 4,63 ± 0,74; p = 0,01). A maioria prefere técnicas anestésicas regionais para correção de hérnia inguinal (60,3% [n = 141]).

A maioria dos participantes concordou que o risco de distúrbios cognitivos pós-operatórios deve ser considerado na escolha do tipo de anestesia (105 [87,6%]) e que a avaliação cognitiva pré-operatória deve ser feita rotineiramente (184 [78,6%]). No entanto, o risco de distúrbios cognitivos pós-operatórios adversos foi percebido como menos importante quando comparado às complicações cardíacas adversas (224 [95,8%]) e pulmonares 228 (97,4%). O controle da dor pós-operatória (4,79 ± 0,52 vs. 4,54 ± 0,72; p = 0,01) e a escolha do paciente para o plano anestésico (4,19 ± 0,76 vs. 3,94 ± 0,93; p = 0,043) foram mais importantes para os residentes em comparação com os assistentes (fig. 1). Na avaliação pré-operatória, o risco de consciência foi mais valorizado por quase todos os 228 (97,4%) respondentes, seguido de disfunção cognitiva pós-operatória por 196 (83,8%), delírio pós-operatório por 188 (80,3%) e agitação de emergência por 161 (68,8%). A preocupação com a consciência foi maior entre os residentes que entre os assistentes (4,86 ± 0,35 vs. 4,61 ± 0,64; p = 0,005) (fig. 2). Os fatores de risco considerados mais preditivos de distúrbios cognitivos pós-operatórios foram: idade (229 [97,9%]), cirurgia de grande porte (222 [94,9%]), alcoolismo (220 [94%]) e acidente vascular cerebral prévio (207 [88,4%]). Gênero masculino (78 [33,3%]) e baixa escolaridade (107 [45,8%]) foram considerados fatores de risco menos importantes (fig. 3). A maioria dos hospitais não tinha protocolos escritos sobre medicação ansiolítica (196 [83,8%]) ou analgésica (203 [86,8%]) para distúrbios cognitivos pós-operatórios adversos em pacientes de alto risco.

Figura 1
No momento da avaliação pré-operatória, quais fatores você acha que devem influenciar na escolha do anestésico?
Figura 2
Durante a avaliação pré-operatória, qual dos seguintes estados cognitivos você leva em consideração?
Figura 3
Quão importante você considera os seguintes fatores de risco na ocorrência de distúrbios cognitivos no pós-operatório?

Quando solicitados a propor um plano de anestesia para um paciente com risco aumentado de delírio no pós-operatório, 46,2% (n = 108) dos entrevistados preferiram um bloqueio espinhal, 19,2% (n = 45) um bloqueio combinado geral/regional e 14,1% (n = 33) um bloqueio sequencial peridural-espinhal combinado. Em caso de uma anestesia geral, 92,7% (n = 217) usariam a monitoração da profundidade da anestesia em um paciente de alto risco para prevenir o delírio pós-operatório. O monitor mais usado foi o Índice Bispectral (BIS) por 198 (93%). Quase todos os 226 (97%) participantes têm monitores de EEG processados em seus hospitais e 56% (n = 126) sempre ou quase sempre os usam. Aproximadamente 75% (n = 161) dos anestesiologistas acreditam que a profundidade da anestesia deve ser monitorada em todos os pacientes. Quando perguntados se usariam um monitor de profundidade da anestesia para reduzir o risco de consciência, 94% (n = 220) concordaram; 86,8% (n = 161) acreditam que o monitor de EEG processado é um método confiável para controlar a profundidade da anestesia e apenas 8% (n = 18) o consideram muito caro para ser usado. Os residentes, quando comparados aos assistentes, acreditam mais fortemente na utilidade dos monitores de profundidade da anestesia para reduzir o risco de consciência (4,83 ± 0,46 vs. 4,34 ± 0,70; p = 0,007) e para controlar a profundidade da anestesia (4,34 ± 0,66 vs. 4,11 ± 0,73; p = 0,012) (fig. 4).

Figura 4
O que você acha dos monitores de profundidade da anestesia?

Quase 60% dos entrevistados (n = 140) recordaram pelo menos um episódio de delírio pós-operatório no último ano (79,3% de 1 a 5 episódios e 6,4% mais de 10 episódios), mas apenas 15,2% (n = 35) usaram ferramentas de triagem regularmente para avaliá-lo após a cirurgia. Quando questionados sobre como tratariam um paciente mais velho delirante em sala de recuperação, 62,4% (n = 146) primeiro administrariam um analgésico e 11,1% (n = 26) um ansiolítico. Caso tivessem que administrar um ansiolítico, a maioria (85 [36,5%]) escolheria um benzodiazepínico como o midazolam e 33,9% (n = 79) um neuroléptico como o haloperidol. A maioria dos hospitais não tem protocolos para tratar pacientes que desenvolvem delírio em Sala de Recuperação Pós-Anestesia (129 [55,1%]) ou enfermarias cirúrgicas (138 [59%]). Para o manejo de paciente com disfunção cognitiva pós-operatória, apenas quatro (1,7%) tinham protocolos institucionais escritos. Em sua prática clínica, 37,2% (n = 87) dos participantes recordaram um caso de disfunção cognitiva pós-operatória; 37,2% (n = 87) responderam que os pacientes com perda recente de memória seriam submetidos a uma avaliação neuropsicológica e 44% (n = 103) encaminhariam esses pacientes a um neurologista ou neuropsicólogo para avaliação e tratamento adicionais.

Aproximadamente 98% (n = 229) e 97% (n = 227) dos entrevistados acreditam que o delírio pós-operatório e a disfunção cognitiva pós-operatória, respectivamente, são campos negligenciados na anestesiologia.

Discussão

Nossos resultados enfatizam que os anestesiologistas portugueses reconheceram os distúrbios cognitivos pós-operatórios como resultados importantes, mas quase sempre ignorados na anestesiologia. Os entrevistados estavam cientes dos principais fatores de risco e a maioria acredita que seriam úteis para a triagem pré-operatória da função cognitiva. Monitores de profundidade da anestesia estão disponíveis na maioria dos hospitais e são amplamente usados. A maioria dos participantes, especialmente os residentes, acredita que são úteis para reduzir o risco de consciência e um método confiável para controlar a profundidade da anestesia. Muito poucos hospitais têm protocolos para identificação, prevenção e tratamento de distúrbios cognitivos pós-operatórios.

A pesquisa original feita com anestesiologistas e enfermeiros anestesistas suecos indica que os profissionais de saúde estão preocupados com o risco de distúrbios cognitivos adversos no pós-operatório e que a maioria não estava convencida sobre o uso de monitores para controlar a profundidade da anestesia. Além disso, concluíram que é necessário implantar estratégias para melhorar o conhecimento sobre fatores de risco, prevenção e tratamento de distúrbios cognitivos adversos no pós-operatório.1515 Jildenstal PK, Rawal N, Hallen JL, et al. Perioperative management in order to minimise postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction: Results from a Swedish web-based survey. Ann Med Surg (Lond). 2014;3:100-7.

O aumento do risco de distúrbios cognitivos pós-operatórios foi percebido como um fator importante para ser considerado na avaliação de pacientes submetidos à anestesia e cirurgia, embora não tão importante quanto os eventos cardíacos ou pulmonares. Esses resultados estão de acordo com os resultados originais da pesquisa conduzida por Jildenstal et al.,1515 Jildenstal PK, Rawal N, Hallen JL, et al. Perioperative management in order to minimise postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction: Results from a Swedish web-based survey. Ann Med Surg (Lond). 2014;3:100-7. na qual 69% dos entrevistados consideraram o “risco de efeitos colaterais neurocognitivos” importante durante a avaliação pré-operatória, enquanto 97% e 98% consideraram importante o risco de eventos cardíacos e pulmonares, respectivamente. Ao contrário da pesquisa original,1515 Jildenstal PK, Rawal N, Hallen JL, et al. Perioperative management in order to minimise postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction: Results from a Swedish web-based survey. Ann Med Surg (Lond). 2014;3:100-7. a maioria dos anestesiologistas portugueses estaria preocupada com a possível perda cognitiva pós-operatória caso eles próprios fossem submetidos à anestesia. Os distúrbios cognitivos adversos no pós-operatório têm um impacto reconhecível na recuperação, reabilitação e mortalidade após cirurgia.44 Marcantonio ER. Postoperative delirium: a 76-year-old woman with delirium following surgery. JAMA. 2012;308:73-81.,88 Steinmetz J, Christensen KB, Lund T, et al. Long-term consequences of postoperative cognitive dysfunction. Anesthesiology. 2009;110:548-55.,1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.1313 Abelha FJ, Luis C, Veiga D, et al. Outcome and quality of life in patients with postoperative delirium during an ICU stay following major surgery. Crit Care. 2013;17:R257. Curiosamente, o desejo do paciente foi considerado um fator importante para o plano de anestesia apenas por 75,6% dos participantes e foi significativamente diferente entre residentes e assistentes.

Descobrimos que a maioria dos anestesiologistas portugueses estava preocupada com a consciência durante o procedimento como um resultado adverso ao propor um plano de anestesia, especialmente os residentes. Isso também foi observado no estudo de Jildenstal et al.1515 Jildenstal PK, Rawal N, Hallen JL, et al. Perioperative management in order to minimise postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction: Results from a Swedish web-based survey. Ann Med Surg (Lond). 2014;3:100-7. Os autores explicaram que essa preocupação pode estar relacionada à percepção geral de uma falha total no fornecimento de anestesia adequada e à má publicidade associada à lembrança de dor e/ou paralisia intraoperatória. A incidência de consciência é de 1:15.414 anestésicos,1717 Pandit JJ, Cook TM, Jonker WR, et al. A national survey of anaesthetists (NAP5 baseline) to estimate an annual incidence of accidental awareness during general anaesthesia in the UK. Br J Anaesth. 2013;110:501-9. bem menor do que a de outros distúrbios cognitivos pós-operatórios.55 Bruce AJ, Ritchie CW, Blizard R, et al. The incidence of delirium associated with orthopedic surgery: a meta-analytic review. Int Psychogeriatr. 2007;19:197-214.,77 Moller JT, Cluitmans P, Rasmussen LS, et al. Long-term postoperative cognitive dysfunction in the elderly ISPOCD1 study, ISPOCD investigators. International Study of Post-Operative Cognitive Dysfunction. Lancet. 1998;351:857-61.,88 Steinmetz J, Christensen KB, Lund T, et al. Long-term consequences of postoperative cognitive dysfunction. Anesthesiology. 2009;110:548-55.,1818 Radtke FM, Franck M, Hagemann L, et al. Risk factors for inadequate emergence after anesthesia: emergence delirium and hypoactive emergence. Minerva Anestesiol. 2010;76:394-403. A consciência pode ser percebida pelo anestesiologista como uma consequência direta de seu manejo anestésico (p. ex.: o paciente não estava recebendo hipnóticos suficientes), enquanto o delírio pós-operatório e a disfunção cognitiva pós-operatória seguem um modelo patogênico muito mais complexo e abrangente.44 Marcantonio ER. Postoperative delirium: a 76-year-old woman with delirium following surgery. JAMA. 2012;308:73-81.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214.,1919 Evered L, Scott DA, Silbert B, et al. Postoperative cognitive dysfunction is independent of type of surgery and anesthetic. Anesth Analg. 2011;112:1179-85.

Acredita-se que o desenvolvimento de delírio segue um modelo patogênico no qual condições predisponentes (fatores de risco) e fatores precipitantes (eventos estressores) podem ser identificados.44 Marcantonio ER. Postoperative delirium: a 76-year-old woman with delirium following surgery. JAMA. 2012;308:73-81. Nem todos os fatores de risco foram considerados na pesquisa original;1515 Jildenstal PK, Rawal N, Hallen JL, et al. Perioperative management in order to minimise postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction: Results from a Swedish web-based survey. Ann Med Surg (Lond). 2014;3:100-7. portanto, acrescentamos outros fatores considerados pertinentes com base em literatura anterior.1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. Os participantes desta pesquisa consideraram idade, cirurgia de grande porte, alcoolismo e AVC prévio como os mais importantes preditivos de distúrbios cognitivos pós-operatórios e esses resultados estão de acordo com a literatura atual.77 Moller JT, Cluitmans P, Rasmussen LS, et al. Long-term postoperative cognitive dysfunction in the elderly ISPOCD1 study, ISPOCD investigators. International Study of Post-Operative Cognitive Dysfunction. Lancet. 1998;351:857-61.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214.,2020 Girard TD, Jackson JC, Pandharipande PP, et al. Delirium as a predictor of long-term cognitive impairment in survivors of critical illness. Crit Care Med. 2010;38:1513-20.,2121 Pandharipande PP, Girard TD, Jackson JC, et al. Long-term cognitive impairment after critical illness. N Engl J Med. 2013;369:1306-16. A maioria dos entrevistados acredita que a avaliação cognitiva pré-operatória seria útil, embora protocolos para pacientes com alto risco de distúrbios cognitivos pós-operatórios raramente existam. Demência e comprometimento cognitivo leve são comuns em adultos mais velhos e são fatores de risco independentes comprovados para delírio pós-operatório.1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. Além disso, o comprometimento da função executiva sem comprometimento das atividades cotidianas é um preditivo do delírio pós-operatório.2222 Greene NH, Attix DK, Weldon BC, et al. Measures of executive function and depression identify patients at risk for postoperative delirium. Anesthesiology. 2009;110:788-95. O comprometimento cognitivo também está associado a piores desfechos, incluindo aumento de complicações pós-operatórias, maior tempo de internação, transferência para um nível mais elevado de cuidados, persistente disfunção cognitiva pós-operatória e mortalidade após cirurgia.2323 Heng M, Eagen CE, Javedan H, et al. Abnormal mini-cog is associated with higher risk of complications and delirium in geriatric patients with fracture. J Bone Joint Surg Am. 2016;98:742-50.2727 Silbert B, Evered L, Scott DA, et al. Preexisting cognitive impairment is associated with postoperative cognitive dysfunction after hip joint replacement surgery. Anesthesiology. 2015;122:1224-34. O comprometimento cognitivo com frequência não é reconhecido, exceto quando formalmente avaliado, e várias diretrizes recomendam a triagem de pacientes mais idosos antes da cirurgia.1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214.,2828 Ganguli M, Rodriguez E, Mulsant B, et al. Detection and management of cognitive impairment in primary care: the steel valley seniors survey. J Am Geriatr Soc. 2004;52:1668-75.3131 Partridge JS, Dhesi JK, Cross JD, et al. The prevalence and impact of undiagnosed cognitive impairment in older vascular surgical patients. J Vasc Surg. 2014;60, 1002-11.e1003. Há várias ferramentas de triagem cognitiva pré-operatória que são de aplicação rápida e fácil e podem ser usadas para destacar os pacientes com risco de resultados pós-operatórios adversos, incluindo delírio pós-operatório.3232 Axley MS, Schenning KJ. Preoperative Cognitive and frailty screening in the geriatric surgical patient: a narrative review. Clin Ther. 2015;37:2666-75.,3333 Long LS, Shapiro WA, Leung JM. A brief review of practical preoperative cognitive screening tools. Can J Anaesth. 2012;59:798-804.

Os fatores precipitantes são aqueles potencialmente modificáveis associados à hospitalização e aos períodos intraoperatório e pós-operatório. Diretrizes recomendavam o uso de monitores eletroencefalográficos de controle da profundidade da anestesia para evitar a supressão de explosão e anestesia profunda desnecessária para evitar o delírio pós-operatório.1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. Em contraste com Jildenstal et al.,1515 Jildenstal PK, Rawal N, Hallen JL, et al. Perioperative management in order to minimise postoperative delirium and postoperative cognitive dysfunction: Results from a Swedish web-based survey. Ann Med Surg (Lond). 2014;3:100-7. esses resultados mostram que há um monitor disponível em quase todos os hospitais; a maioria dos participantes sempre ou quase sempre os usa e não acredita que sejam muito caros para o uso. Os residentes concordam que os monitores de profundidade da anestesia podem reduzir o risco de consciência e que são um método confiável para controlar a profundidade da anestesia. Curiosamente, 94% dos anestesiologistas gostariam de usar um monitor de profundidade da anestesia se estivessem passando por anestesia geral, mas apenas 75% concordaram que deveriam ser usados em todos os pacientes submetidos à anestesia. Não sabemos se os participantes estavam preocupados com a consciência ou o desenvolvimento de distúrbios cognitivos pós-operatórios. Evidências sugerem que um estado de anestesia mais profundo ou um tempo maior de supressão de explosão pode estar associado ao risco aumentado de delírio pós-operatório e disfunção cognitiva pós-operatória.3434 Moyce Z, Rodseth RN, Biccard BM. The efficacy of peri-operative interventions to decrease postoperative delirium in non-cardiac surgery: a systematic review and meta-analysis. Anaesthesia. 2014;69:259-69.3939 Deiner S, Luo X, Silverstein JH, et al. Can intraoperative processed EEG predict postoperative cognitive dysfunction in the elderly?. Clin Ther. 2015;37:2700-5. A monitoração intraoperatória pode reduzir esse risco e da disfunção cognitiva pós-operatória,4040 Radtke FM, Franck M, Lendner J, et al. Monitoring depth of anaesthesia in a randomized trial decreases the rate of postoperative delirium but not postoperative cognitive dysfunction. Br J Anaesth. 2013;110:i98-105.,4141 Chan MT, Cheng BC, Lee TM, et al. BIS-guided anesthesia decreases postoperative delirium and cognitive decline. J Neurosurg Anesthesiol. 2013;25:33-42. mas sua utilidade para prevenir a consciência ainda é controversa.4242 Shepherd J, Jones J, Frampton G, et al. Clinical effectiveness and cost-effectiveness of depth of anaesthesia monitoring (E-Entropy, Bispectral Index and Narcotrend): a systematic review and economic evaluation. Health Technol Assess. 2013;17:1-264.,4343 Avidan MS, Jacobsohn E, Glick D, et al. Prevention of intraoperative awareness in a high-risk surgical population. N Engl J Med. 2011;365:591-600.

Nossos resultados também mostraram que os protocolos para o manejo de pacientes com risco de distúrbios cognitivos pós-operatórios são raramente usados, embora vias dedicadas melhorem a qualidade dos cuidados e desfechos na população cirúrgica geriátrica.1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,3030 Chow WB, Rosenthal RA, Merkow RP, et al. Optimal preoperative assessment of the geriatric surgical patient: a best practices guideline from the American College of Surgeons National Surgical Quality Improvement Program and the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2012;215:453-66. O delírio pode não ser reconhecido em até 50% das vezes; portanto, os médicos devem ter um alto grau de suspeita, especialmente no caso de pacientes vulneráveis.44 Marcantonio ER. Postoperative delirium: a 76-year-old woman with delirium following surgery. JAMA. 2012;308:73-81. De acordo com as recentes diretrizes da Sociedade Europeia de Anestesiologistas, os pacientes não devem sair da sala de recuperação sem serem triados para delírio pós-operatório.1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. Embora o padrão-ouro para diagnosticá-lo seja uma avaliação psiquiátrica de acordo com os critérios do DMS, o Método de Avaliação da Confusão (Confusion Assessment Method) ou a Escala de Triagem de Delírio para Enfermagem (Nursing Delirium Screening Scale) pode ser usado efetivamente.66 Whitlock EL, Vannucci A, Avidan MS. Postoperative delirium. Minerva Anestesiol. 2011;77:448-56.,4444 De J, Wand AP. Delirium screening: a systematic review of delirium screening tools in hospitalized patients. Gerontologist. 2015;55:1079-99. Mais da metade dos participantes relembrou de pelo menos um episódio de delírio pós-operatório no último ano, mas apenas 6% dos entrevistados lembraram mais de dez. Isso pode indicar que os anestesiologistas portugueses estão cientes da importância e das implicações dos distúrbios cognitivos pós-operatórios adversos nos desfechos de pacientes mais velhos, mas são incapazes de reconhecer todos os casos na prática clínica.

Ao tratar um paciente com delírio pós-operatório na sala de recuperação, a maioria disse que daria primeiro um analgésico ou um analgésico em combinação com um ansiolítico. Tanto a dor quanto os opioides são fatores de risco conhecidos para o delírio e uma avaliação e tratamento adequados da dor são altamente recomendados.1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. Se fossem administrar um ansiolítico, a maioria afirmou que um benzodiazepínico seria sua primeira escolha. Os benzodiazepínicos são fatores precipitantes bem conhecidos para o delírio e devem ser evitados, particularmente em pacientes idosos.1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. Evidências atuais apoiam o uso de antipsicóticos para o tratamento de pacientes que estão gravemente agitados ou angustiados e ameaçam causar danos substanciais a si próprios e aos outros.1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214. Em primeiro lugar, as recomendações destacam a importância de fazer uma avaliação médica, fazer ajustes ambientais e medicamentosos e solicitar testes diagnósticos apropriados para identificar e controlar os contribuintes subjacentes ao delírio.1010. Postoperative delirium in older adults: best practice statement from the American Geriatrics Society. J Am Coll Surg. 2015;220:136-48.,1414 Aldecoa C, Bettelli G, Bilotta F, et al. European Society of Anaesthesiology evidence-based and consensus-based guideline on postoperative delirium. Eur J Anaesthesiol. 2017;34:192-214.

As limitações deste estudo são inerentes à sua metodologia. A pesquisa foi enviada por e-mail a uma lista de organizações e instituições profissionais. Como a lista dos membros é dinâmica e muitas vezes incompleta, a amostra dos respondentes em potencial certamente não foi alcançada e não tínhamos mecanismo para garantir que os participantes completassem a pesquisa pelo menos uma vez. A taxa de não respondentes pode ter levado a um viés de não resposta e aqueles com mais interesse sobre o tema participariam mais prontamente (autoescolha e viés de participação). Embora as características demográficas dos participantes fossem semelhantes aos potenciais respondentes da pesquisa, a participação foi geograficamente desigual.1616 Lemos LJP, Viana J, Assunção JP, et al. Censos anestesiologia – 2014 | Relatório final Census anesthesiology – 2014 | Final report board of the Portuguese Anesthesiology of the Portuguese Medical Association. Rev Soc Port Anestesiol. 2015;24:41-52. Além disso, esta pesquisa teve como objetivo obter informações sobre como os anestesiologistas manejam os casos e suas respostas podem diferir da prática real. No entanto, esta pesquisa foi baseada em um questionário previamente validado e feito para os profissionais de saúde suecos, no qual os resultados foram globalmente semelhantes. Este estudo foi feito para compreender as perspectivas dos anestesiologistas portugueses sobre o delírio pós-operatório e a disfunção cognitiva pós-operatória e, como tal, contribui para uma melhor compreensão da prática clínica atual em Portugal. Esses resultados servirão de base para futuras intervenções para prevenir e tratar os distúrbios cognitivos pós-operatórios.

Em conclusão, os anestesiologistas portugueses percebem os distúrbios cognitivos no pós-operatório como desfechos adversos importantes após cirurgia e anestesia e estão cientes dos principais fatores de risco, mas podem carecer de algumas informações sobre prevenção e tratamento do delírio pós-operatório. A maioria dos hospitais dispõe de monitores de profundidade da anestesia que são usados pela maioria dos participantes, mas esforços devem ser feitos para aumentar seu uso, especialmente em pacientes de alto risco para distúrbios cognitivos no pós-operatório. A maioria dos hospitais não tem protocolos referentes à avaliação cognitiva pré-operatória, diagnóstico, manejo e acompanhamento dos pacientes com delírio e disfunção cognitiva no pós-operatório. Vias dedicadas para pacientes cirúrgicos idosos podem melhorar os resultados e, como tal, é importante identificar os pacientes de alto risco e estabelecer intervenções preventivas.

Agradecimentos

Este estudo foi cientificamente apoiado pelo Portuguese Society of Anesthesiologists (SPA). Os autores gostariam de agradecer a Sociedade Portuguesa de Anestesiologistas (SPA) pelo envio dos questionários através da sua base de dados de e-mails.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2018

Histórico

  • Recebido
    9 Out 2017
  • Aceito
    27 Fev 2018
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