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Teste de dissolução para avaliação de liberação de glibenclamida em comprimidos

Glibenclamide dissolution test for drug release evaluation in tablets

Resumos

A glibenclamida (GLIB) ou gliburida, é um hipoglicemiante oral de segunda geração, da classe das sulfoniluréias, usado sob a forma de comprimidos para tratamento do diabetes mellitus. Variações no tratamento podem ocorrer, devido à baixa solubilidade do fármaco em comprimidos. A comparação de várias formulações de comprimidos piloto com comprimidos do medicamento referência (Daonil®, glibenclamida 5 mg comprimidos, Aventis Pharma Ltda.) foi avaliada por meio do desenvolvimento de um teste de dissolução sem adição de solventes orgânicos ou tensoativos no meio, que mostrou ser discriminativo para as diferentes formulações farmacêuticas propostas. A quantificação de GLIB foi realizada por meio de cromatografia líquida de alta eficiência em fase reversa (CLAE-FR), método previamente validado. A partir de vários ensaios de perfil de dissolução testados comparativamente àquele de comprimidos do medicamento referência, verificou-se o potencial de determinada formulação proposta (f1 4,04 and f2 69,35) como candidata a medicamento genérico no mercado brasileiro.

Glibenclamida; Hipoglicemiante; Comprimidos; Formulações farmacêuticas; Medicamento genérico


Glibenclamide (GLIB) or glyburide, a second-generation hypoglycemic agent is used per oral as tablets for the treatment of diabetes mellitus. Much variabilility in the treatment may occur because of the low drug aqueous solubility in tablets dosage forms. This work reports the comparison of several pilot formulation batches with the commercial reference drug dosage form (Daonil®, glibenclamide 5 mg per tablet, Aventis Pharma Ltda.). A feasible dissolution test, developed with no use of organic solvents or surfactants in the medium, showed to be discriminative regarding to different formulations tested. GLIB quantitation was performed by a previously validated reverse-phase high performance liquid chromatography (RP-HPLC). Among several dissolution profiles compared with that of a commercial reference, a potential for a generic candidate was evident (f1 4.04 and f2 69.35) for a proposed solid dosage formulation in the Brazilian market.

Glibenclamide; Hypoglycemic agent; Tablets; Pharmaceutical formulations; Generic candidate


TRABALHOS ORIGINAIS

Teste de dissolução para avaliação de liberação de glibenclamida em comprimidos

Glibenclamide dissolution test for drug release evaluation in tablets

Christiane Gino Colu NeryI; Gerson Antônio PianettiII; Maria Arlete Silva PiresI; Ligia Maria Moreira-CamposII; Cristina Duarte Vianna-SoaresII,** Correspondência: C. D. Vianna-Soares Faculdade de Farmácia Universidade Federal de Minas Gerais Av. Antônio Carlos, 6627 31270-901 - Belo Horizonte - MG, Brasil E-mail: cviannas@yahoo.com

IFundação Ezequiel Dias/FUNED

IIDepartamento de Produtos Farmacêuticos, Universidade Federal de Minas Gerais

RESUMO

A glibenclamida (GLIB) ou gliburida, é um hipoglicemiante oral de segunda geração, da classe das sulfoniluréias, usado sob a forma de comprimidos para tratamento do diabetes mellitus. Variações no tratamento podem ocorrer, devido à baixa solubilidade do fármaco em comprimidos. A comparação de várias formulações de comprimidos piloto com comprimidos do medicamento referência (Daonil®, glibenclamida 5 mg comprimidos, Aventis Pharma Ltda.) foi avaliada por meio do desenvolvimento de um teste de dissolução sem adição de solventes orgânicos ou tensoativos no meio, que mostrou ser discriminativo para as diferentes formulações farmacêuticas propostas. A quantificação de GLIB foi realizada por meio de cromatografia líquida de alta eficiência em fase reversa (CLAE-FR), método previamente validado. A partir de vários ensaios de perfil de dissolução testados comparativamente àquele de comprimidos do medicamento referência, verificou-se o potencial de determinada formulação proposta (f1 4,04 and f2 69,35) como candidata a medicamento genérico no mercado brasileiro.

Unitermos: Glibenclamida. Hipoglicemiante. Comprimidos/perfil de dissolução. Formulações farmacêuticas. Medicamento genérico

ABSTRACT

Glibenclamide (GLIB) or glyburide, a second-generation hypoglycemic agent is used per oral as tablets for the treatment of diabetes mellitus. Much variabilility in the treatment may occur because of the low drug aqueous solubility in tablets dosage forms. This work reports the comparison of several pilot formulation batches with the commercial reference drug dosage form (Daonil®, glibenclamide 5 mg per tablet, Aventis Pharma Ltda.). A feasible dissolution test, developed with no use of organic solvents or surfactants in the medium, showed to be discriminative regarding to different formulations tested. GLIB quantitation was performed by a previously validated reverse-phase high performance liquid chromatography (RP-HPLC). Among several dissolution profiles compared with that of a commercial reference, a potential for a generic candidate was evident (f1 4.04 and f2 69.35) for a proposed solid dosage formulation in the Brazilian market.

Uniterms: Glibenclamide. Hypoglycemic agent. Tablets/dissolution profile. Pharmaceutical formulations. Generic candidate.

INTRODUÇÃO

O diabetes mellitus (DM) é uma doença crônica, herdada ou adquirida, que atinge todas as faixas etárias. É causada pela deficiência ou ineficiência na produção de insulina pelo pâncreas e pode ser classificada, clinicamente, como tipo I ou tipo II, sendo que o último prevalece em 90% dos casos (WHO, 2002).

O DM é um sério problema de saúde pública em praticamente todos os países e implica em elevado impacto sócioeconômico. Além dos elevados custos envolvidos no controle da doença e tratamento das complicações agudas e crônicas associadas, leva à incapacidade física permanente por cegueira e/ou amputação de membros e modifica a qualidade e a expectativa de vida do indivíduo. Até 2025, estima-se que 300 milhões de pessoas possuam a doença em todo o mundo (AHFS, 2000; WHO, 2002).

Em 1998, o DM foi a sétima causa de morte no Brasil. Em 2001, a Campanha Nacional de Detecção de Diabetes rastreou, pela primeira vez no país, os suspeitos do diabetes. De 20,23 milhões de pessoas examinadas, 14,67% apresentaram suspeita da doença. Esta campanha fez parte do Plano de Reorganização de Atenção aos Portadores de Hipertensão Arterial e Diabetes. Dentre outras medidas prevista no plano, o Ministério da Saúde (MS) disponibilizou os antidiabéticos na lista de assistência farmacêutica básica e os incluiu na lista de medicamentos genéricos prioritários da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Os primeiros registros de genéricos hipoglicemiantes concedidos pela Anvisa datam de 2001 (metformina, produzida por Biosintética e Merck). Com a entrada de registro de GLIB no mesmo ano, mais uma opção para médicos e pacientes no tratamento do diabetes, uma economia de 35% foi obtida nas despesas do consumidor em relação ao valor do medicamento referência (Daonil®, Aventis Pharma Ltda.) (Brasil, 2001a, b, c).

A GLIB é um hipoglicemiante oral de segunda geração da classe das sulfoniluréias (Takla, 1981). Apresenta baixa biodisponibilidade relacionada ao fato de ser insolúvel em água e, conseqüentemente, taxas reduzidas de liberação do fármaco em testes in vitro (dissolução). Destaca-se, pelos estudos de Babu e Pandit (1995), a acentuada variação da velocidade de liberação da GLIB nos testes de dissolução e biodisponibilidade entre diferentes fabricantes de comprimidos de GLIB (Ghosh et al., 1998; Hassan et al., 1991; Panagopoulou-Kaplani, Malamataris, 2000; Suleiman, Najib, 1989). Estas variações são indesejáveis para um fármaco e sua formulação, principalmente, em se tratando de medicação de uso contínuo, como é o caso dos hipoglicemiantes.

Inúmeros esforços em todo o mundo têm sido conduzidos na tentativa de aumentar a solubilidade e melhorar a biodisponibilidade de fármacos com características semelhantes à GLIB. Recursos técnicos como a micronização, a dispersão molecular, a incorporação de tensoativos, a complexação de inclusão em ciclodextrina e a transformação da fase sólida em formas polimorfas ou amorfas têm sido empregadas no caso da GLIB (Ghosh et al., 1998; Hassan et al., 1991). Especificamente no que se refere ao tamanho de partícula, observa-se que, em sistemas dispersos sólido-líquido com partículas de baixa solubilidade como a GLIB, a diminuição no tamanho das mesmas gera aumento da velocidade de dissolução não só pelo aumento da área superficial mas, também, pela redução da espessura da camada de difusão ao redor de cada partícula. Este fenômeno é especialmente pronunciado em materiais com tamanho de partícula inferior a 5 µm. (Mosharraf, Nystrom, 1995). Além disso, é necessário delinear ensaios de dissolução que possam predizer, de forma mais eficaz, o comportamento in vivo das formas farmacêuticas. Pretende-se, desta forma, buscar um controle de qualidade mais confiável, diminuir os trabalhos de desenvolvimento e estudos clínicos requeridos e, conseqüentemente, reduzir os custos envolvidos nestas etapas.

Há diversas maneiras de verificar o poder desafiador do teste de dissolução: variações nas características do fármaco (tamanho de partícula, cristalinidade, solvatação, rota de síntese), na formulação (variações qualitativas e quantitativas) e nos processos e parâmetros produtivos (via úmida ou compressão direta; força de compressão, método de secagem, revestimento, ordem de adição dos componentes da formulação, capacidade e tamanho dos equipamentos envolvidos) gerando, conseqüentemente, liberações distintas do fármaco (Pharmacopeial, 2004).

Vários são os métodos para se comparar os perfis de dissolução, tais como, métodos de análise de variância (ANOVA), modelo-dependente (modelo de primeira ordem, modelo de Weibull, entre outros) e modelo-independente simples (área sob a curva/AUC, fatores de diferença, f1 e de semelhança, f2) (Manadas, Pina, Veiga, 2002). Este último é um dos métodos sugeridos pela resolução (RE) 310 (Brasil, 2004), que trata do guia para realização do estudo e elaboração do relatório de equivalência farmacêutica e perfil de dissolução. Segundo a RE 310, empregam-se os fatores de diferença, f1, e de semelhança, f2, (compreendidos de 0 a 15 e de 20 a 100, respectivamente) como indicativo do comportamento dos produtos antes de submetê-los aos ensaios de bioequivalência.

Na tentativa de averiguar a liberação de GLIB a partir de comprimidos, El-Massik e colaboradores (1996) utilizaram como meio de dissolução, solução tampão borato pH 9,5. Entretanto, pelo alto valor de pH do meio e sua pouca relevância para o fármaco no sítio de ação nas condições fisiológicas do organismo. Assim, propuseram outras condições analíticas para avaliação de comprimidos de GLIB (Euglucon®): agitação por pás; velocidade de rotação 50 rpm; meio de dissolução tampão fosfato pH 7,4 (contendo 8,5% de álcool e 0,24% de Tween 80), volume de 900 mL e temperatura 37 ± 1 ºC. A determinação quantitativa foi por cromatografia líquida de alta eficiência em fase reversa (CLAE-FR), coluna C18 300 x 3,9 mm, volume de injeção 10 µL, fase móvel acetonitrila e solução de ácido acético 1% na proporção 1:1, fluxo de corrida 2,5 mL/min e detecção em 227 nm.

Shaheen e colaboradores (1987) avaliaram os perfis de dissolução de comprimidos de GLIB (Oramide® e Daonil® 5 mg) e utilizaram as seguintes condições: agitação por pás; velocidade de rotação 100 rpm; meio de dissolução tampão fosfato pH 7,5, volume de 500 mL e temperatura 37 ± 1 ºC. A quantificação por CLAE-FR com coluna C18 150 x 4,6 mm, fase móvel mistura de solução sulfato de amônio (0,023 mol/L) e acetonitrila (55:45) foi utilizada. Hassan e colaboradores (1991) utilizaram as mesmas condições para avaliação da matéria-prima GLIB nas formas cristalina e amorfa e do Daonil® 5 mg com exceção para a detecção espectrofluorimétrica.

Lobenberg e colegas (2000) avaliaram os perfis de dissolução da matéria-prima GLIB comum e microfina e sua correlação in vitro/in vivo dos comprimidos nos produtos comerciais Euglucon® 3,5 mg e Glukovital® 3,5 mg a partir da utilização das condições agitação por pás; 75 rpm; 500 e 900 mL de meio de dissolução e 37 ± 1 ºC. Na composição dos meios de dissolução foram testadas as soluções suco gástrico simulado sem pepsina, fluido intestinal simulado, fluido intestinal simulado sem pancreatina (pH final igual a 7,5), fluido intestinal simulado contendo 3 mmol/L de taurocolato de sódio e 0,75 mmol/L (pH final igual a 6,5), fluido intestinal simulado contendo 15 mmol/L de taurocolato de sódio e 3,75 mmol/L (pH final igual a 5,0) e solução tampão fosfato de potássio pH 6,0 (20 mmol/L). A determinação quantitativa foi por CLAE-FR, coluna Lichrospher 60 RP Select B (5 µm, Merck) 125 x 4 mm, volume de injeção 30 µL, fase móvel acetonitrila e tampão fosfato (25 mmol/L, pH 4,5) na proporção 45:55, fluxo de corrida 1,0 mL/min e detecção em 230 nm.

Recentemente, publicaram-se as seguintes condições para o teste de dissolução de comprimidos contendo GLIB não micronizada: pás; 75 rpm; meio de dissolução solução tampão borato (25 mmol/L) contendo 0,5% de brometo de hexadeciltrimetilamônio, pH 8,0, volume 900 mL, 37 ± 0,5 ºC e determinação quantitativa por CLAE-FR, conforme previsto para o doseamento de GLIB comprimidos na Farmacopéia Americana 29a. edição (2005), a saber: coluna C8 250 x 4,6 mm, volume de injeção 10 µL, fase móvel acetonitrila:tampão fosfato monobásico de amônio (45:55), pH 5,25 ± 0,30; fluxo 2,0 mL/min e detecção em 254 nm. A tolerância (T) para avaliação da liberação de GLIB em 60 min é 80% (Pharmacopeial, 2004).

A partir dos dados das referências citadas, observam-se relatos de vários métodos para o teste de dissolução da GLIB comprimidos. Entretanto, até o momento, não há uma publicação oficial em farmacopéias (European Pharmacopeia, 1997; Japanese Pharmacopeia, 2001; United States Pharmacopeia, 2005; Farmacopéia Brasileira, 2001).

Pretende-se, com este trabalho, propor condições de um teste de dissolução discriminativo para GLIB comprimidos, como ferramenta de avaliação da qualidade entre diversos fabricantes e com vistas à adaptação pela Farmacopéia Brasileira.

MATERIAL E MÉTODOS

Matérias-primas GLIB identificadas como MP1, MP2, MP3 e MP4 de acordo com as suas origens e características granulométricas (percentil 90 cerca de 117, 25, 36 e 8 µm, respectivamente) foram obtidas de fornecedores locais, com procedência sintética da Índia.

Formulações piloto diversas (PA1, PA2, PA3, PA4, PB1, PC1 e PD1, PD2, PD3, PD4) e únicas de comprimidos de GLIB 5 mg foram fabricadas por compressão direta pelo laboratório farmacotécnico da Fundação Ezequiel Dias (FUNED, Belo Horizonte, MG). Pilotos PA1, PA2, PA3 e PA4 elaborados com diferentes GLIB matérias-primas (MP1, MP2, MP3 e MP4, respectivamente), manitol oral, celulose microcristalina MC 102, laurilssulfato de sódio (LSS), croscarmelose sódica, estearato de magnésio e dióxido de silício coloidal. Piloto PB1: GLIB matéria-prima (MP4), lactose spray dried, celulose microcristalina MC 102, polivinipirrolidona K-30 (PVP K-30), estearato de magnésio e dióxido de silício coloidal. Piloto PC1: glibenclamida (MP4), lactose spray dried, celulose microcristalina MC 102, estearato de magnésio e dióxido de silício coloidal. Pilotos PD1, PD2, PD3, PD4: GLIB matérias-primas (MP4, MP1, MP3 e MP2, respectivamente), lactose spray dried, amido de milho, estearato de magnésio, dióxido de silício coloidal. As proporções dos excipientes foram aquelas normalmente utilizadas pelas indústrias farmacêuticas, de acordo com a função de cada constituinte.

O teste e o perfil de dissolução seguiram as diretrizes básicas descritas no método geral V.1.5, Farmacopéia Brasileira quarta edição (1988). As condições definidas para o teste de dissolução, e para os perfis de dissolução dos comprimidos dos lotes do medicamento referência e dos pilotos foram: 6 comprimidos (1 comprimido por cuba); 900 mL de solução tampão fosfato pH 7,3 a 37 ± 0,5 ºC por cuba (capacidade 1000 mL), previamente desaerado (United States Pharmacopeia, 2005); sistema de agitação: pás; velocidade de agitação de 75 rpm (entre 0 e 120 min de teste) e 150 rpm (entre 120 e 150 min). Os testes foram realizados colocando-se 1 comprimido em cada cuba de dissolução em intervalo de 1 minuto entre eles. Alíquotas de 10 mL foram retiradas (com o sistema de agitação ainda em movimento e com reposição do meio) com auxílio de pipeta volumétrica, filtradas por meio de papel de filtro qualitativo, velocidade média (Quant) e unidades filtrantes em membrana de difluoreto de polivinilideno (PVDF) com 13 mm de diâmetro e 0,45 µm de tamanho de poro (Millipore). GLIB foi quantificada por CLAE-FR nas alíquotas retiradas e os valores de área obtidos foram comparados com os de uma solução padrão, para cálculo da porcentagem de GLIB liberada.

Os reagentes grau cromatográfico foram acetonitrila, metanol (Mallinckrodt) e, de grau analítico, foram ácido clorídrico concentrado (Quimex), fosfato monobásico de amônio, fosfato de monobásico de sódio monoidratado, fosfato de dibásico de sódio heptaidratado e hidróxido de sódio (Vetec). Todas as soluções foram filtradas por membranas em PVDF (47 mm diâmetro, 0,45 mm tamanho de poro, Millipore) antes da injeção.

As curvas dos perfis de dissolução foram construídas plotando-se a porcentagem de fármaco dissolvido em função do tempo, com auxílio do programa computacional Microsoft Excel. Os valores de AUC e eficiência de dissolução (ED) foram calculados a partir das curvas de dissolução, considerando a área total de um retângulo (12000 %min), se ocorresse 100% de dissolução num intervalo de 120 min de teste (eixo X, de 0 a 120 min versus eixo Y, de 0 a 100%), utilizando o programa Origin versão 6.1. Os valores de f1 e f2 foram calculados de acordo com a resolução RE 310 (Brasil, 2004).

Para a análise estatística dos resultados obtidos nos perfis de dissolução utilizou-se um delineamento inteiramente casualizado com 6 repetições para análise de variância. A comparação de médias foi avaliada pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade (Gomes, 2000).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na tentativa de ajustar as condições dos testes in vitro às condições fisiológicas, o delineamento do teste de dissolução tem sido objeto de intensa e constante discussão nos últimos anos (Manadas et al., 2002). O ideal é se trabalhar com um procedimento com poder discriminativo capaz de gerar dados que apontem diferenças nos componentes, na formulação e/ou nos processos produtivos das formas farmacêuticas podendo até, indicar possíveis mudanças na qualidade do produto antes que sua performance in vivo seja afetada.

Pela opção de se trabalhar com um meio de dissolução sem o acréscimo de tensoativos ou solvente orgânico, testes preliminares do presente estudo apontaram para a utilização das seguintes condições para a realização dos perfis de dissolução: pás, 75 rpm, 900 mL de solução tampão fosfato pH 7,3, considerando os resultados satisfatórios de liberação de GLIB, principalmente, para os comprimidos referência.

Os resultados dos perfis de dissolução de GLIB (AUC e ED) de todos os lotes dos comprimidos referência e pilotos testados estão apresentados na Tabela I. Os perfis de dissolução, para os comprimidos referência (R1), considerando os valores médios de liberação de GLIB (%) das 6 cubas, podem ser visualizados na Figura 1a. Condições para esgotamento da dissolução do fármaco foram realizadas sob agitação a 150 rpm. Segundo análise estatística dos dados de AUC, os lotes R1 e R3 foram considerados estatisticamente equivalentes (p<0,05, teste de Tukey) diferindo do lote R2. Constatou-se, portanto, que há diferenças na liberação de GLIB entre os lotes referência. O lote R1 foi selecionado para as comparações subseqüentes com os pilotos formulados por ter apresentado menores valores de DPR nos intervalos de tempo avaliados em relação a R3.






Os perfis de dissolução, considerando os valores médios de liberação (%) de GLIB dos lotes pilotos podem ser visualizados na Figura 1b. As formulações piloto PA1, PA2, PA3 e PA4 possuem os mesmos excipientes e diferem apenas quanto à granulometria de GLIB matéria-prima. Observou-se que quanto menor o tamanho de partícula do fármaco (MP3 e MP4) e a conseqüente maior área superficial, melhor é a porcentagem de liberação do fármaco. Visualmente, as curvas dos pilotos PA3 e PA4 tiveram perfis muito parecidos, porém, estatisticamente todas as curvas são diferentes a 5% de probabilidade e nenhuma se equivale ao comportamento do medicamento referência.

Os perfis de dissolução de R1 e dos pilotos PA4, PB1, PC1 e PD1 (Figura 1c), lotes que contêm GLIB matéria-prima de menor tamanho de partícula, MP4, e excipientes quali e quantitativamente diferentes, podem ser visualizados na Figura 1c. Observaram-se perfis equivalentes entre os comprimidos referência R1 e piloto PD1 e entre os pilotos PA4 e PC1. Estes pares diferem-se estatisticamente do comportamento do piloto PB1. A partir destas formulações diferentes contendo a mesma matéria-prima MP4, constatou-se que a formulação dos comprimidos piloto PD1 favoreceu melhor liberação do fármaco, provavelmente, pela influência da ação desintegrante do amido de milho.

Os pilotos PD1, PD2, PD3 e PD4 (Figura 1d) possuem a mesma formulação diferindo apenas quanto a matéria-prima GLIB utilizada. Pode-se observar o mesmo comportamento já apresentado para os pilotos de formulação PA (1 a 4) devido ao tamanho de partícula. Os perfis de dissolução dos pilotos PD1-4 são considerados estatisticamente diferentes.

Embora 12 comprimidos do lote referência R1 ou dos pilotos não tenham sido avaliados, os valores de f1 e f2 mostrados na Tabela II, foram calculados de modo a obter uma avaliação preliminar dos resultados (Brasil, 2004). Os valores satisfatórios de f1 e f2, somente para o piloto PD1, reforçam os dados de equivalência desta formulação com os comprimidos referência R1. Ambos os resultados dos lotes de comprimidos referência e pilotos, individualmente considerados, tiveram boa precisão na liberação de GLIB, como pode ser observado pelos baixos valores de DPR avaliados (Tabela I).

CONCLUSÕES

O método de dissolução desenvolvido é simples, de fácil execução, não utiliza solventes orgânicos ou tensoativos e apresenta-se discriminativo quanto à formulação e à característica do fármaco (tamanho de partícula).

A proposta de condições para o teste de dissolução utilizando pás como sistema de agitação; 900 mL de solução tampão fosfato pH 7,3 ± a 37 ± 0,5 ºC como meio de dissolução; 75 rpm e T (tolerância) 70% em 60 min de teste é sugerida para GLIB comprimidos. Os resultados da quantificação de GLIB, obtidos pelo método farmacopéico descrito (CLAE-FR, com exceção do volume de injeção, 95 mL) foram satisfatórios.

Pela importância do tamanho de partícula do fármaco muito pouco solúvel, sugere-se a inclusão dos testes de distribuição granulométrica e de área superficial específica na monografia de GLIB matéria-prima para a próxima edição da Farmacopéia Brasileira. A reavaliação e proposta de novos critérios de especificação, anteriormente presentes na edição anterior (Farmacopéia Brasileira, 1977), devem ser consideradas devido à importância destes testes na caracterização da GLIB e, conseqüente, influência na dissolução dos comprimidos.

O piloto PD1, dentre as várias formulações propostas, foi o que apresentou melhores resultados de liberação da GLIB gerando perfil de dissolução preliminar equivalente quando comparado com o referência R1.

Pode-se deduzir que tanto a composição da formulação quanto o tamanho de partícula da matéria-prima GLIB influenciaram decisivamente a liberação do fármaco, modulando o comportamento do seu perfil de forma a ser semelhante ao perfil do medicamento referência. Estas características levaram a um perfil de dissolução dos comprimidos piloto bem semelhante ao perfil dos comprimidos referência, com grande possibilidade de atender aos requisitos da primeira etapa (equivalência farmacêutica) para o registro de medicamentos genéricos.

Recebido para publicação em 11 de maio de 2006.

Aceito para publicação em 21 de junho de 2007.

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  • *
    Correspondência:
    C. D. Vianna-Soares
    Faculdade de Farmácia
    Universidade Federal de Minas Gerais
    Av. Antônio Carlos, 6627
    31270-901 - Belo Horizonte - MG, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Nov 2007
    • Data do Fascículo
      Set 2007

    Histórico

    • Aceito
      21 Jun 2007
    • Recebido
      11 Maio 2006
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