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Uma nova geração de stents farmacológicos

A new generation of drug-eluting stents

EDITORIAL

Uma nova geração de stents farmacológicos

A new generation of drug-eluting stents

Rogério Sarmento-Leite

Instituto de Cardiologia/Fundação Universitária de Cardiologia - Porto Alegre - RS

Correspondência Correspondência: Rogério Sarmento-Leite Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul/Fundação Universitária de Cardiologia Av. Princesa Isabel, 395 - Setor de Hemodinâmica Porto Alegre - RS Fone (51) 3230-3626 E-mail: sarmentoleite@terra.com.br

Os stents farmacológicos mudaram radicalmente o tratamento da doença arterial coronariana e seus paradigmas. Os menores índices de reestenose com os dispositivos com eluição de Sirolimus ou Paclitaxel, quando comparado aos stents convencionais de metal1,2, permitem o tratamento de lesões e pacientes mais complexos, com maior sucesso clínico a médio e longo prazos3. Entretanto, ainda existem limitações. Por melhores que sejam os dispositivos farmacoativos atualmente disponíveis, a reestenose ainda não foi eliminada, a preocupação com uma maior possibilidade de trombose tardia emergiu, se faz mandatória uma terapia antiagregante plaquetária dupla por tempo prolongado e o custo ainda é muito elevado. Além disso, seus efeitos, sejam eles nocivos ou não, ainda não foram avaliados por longos períodos. Os futuros stents farmacológicos devem, necessariamente, atenuar tais limitações e responder às questões em aberto.

Assim, torna-se obrigatório o desenvolvimento de uma nova geração de stents farmacológicos com ainda maior eficácia clínica, melhor perfil de segurança, facilidade de uso e que sejam, sobretudo, custo-efetivos.

Esta próxima geração envolverá novas plataformas, drogas e polímeros. Os dispositivos com componentes bioabsorvíveis surgem como uma alternativa bastante atrativa.

Os stents com Biolimus A9 são uma destas "novas possibilidades". O Biolimus A9 é um análogo do Sirolimus, com potente inibição da proliferação celular, especialmente aquelas mediadas pelas células T e células musculares lisas. Incorporado a um stent com um polímero biodegradável, o ácido polilático, a droga fica predominantemente na superfície externa das hastes do dispositivo. Imediatamente após o implante do stent, em função de sua alta concentração, a droga penetra na parede do vaso. O ácido polilático é reabsorvido pelo tecido, metabolizado e, posteriormente, excretado. Em tese, elimina-se, assim, uma das potenciais causas para a trombose tardia, a hipersensibilidade ou alergia ao polímero, sem comprometimento da capacidade antiproliferativa do dispositivo4.

O estudo STEALTH I5 demonstrou a eficácia e a segurança dos stents com eluição de biolimus A9 em reduzir a perda angiográfica e a reestenose binária tardia, com baixa incidência de complicações ou eventos clínicos. Trata-se, todavia, de um estudo com amostra pequena, com apenas 120 pacientes com lesões consideradas simples ou do tipo não complexas em população de baixo risco. Em publicação neste fascículo da revista, Missel et al.6 apresentam uma subanálise do estudo STEALTH I5, com ênfase nos achados da ultra-sonografia intracoronária, realizada em aproximadamente 37% dos pacientes do estudo original. Os achados de redução de volume de placa em relação ao grupo controle são concordantes com as expectativas para um dispositivo de alto poder citostático, como o Biolimus A9. Surpreendente é o bom desempenho dos stents implantados no grupo controle, cujos resultados, mesmo inferiores aos dos stents com eluição de drogas, apresentam baixa reestenose binária (7,7% vs. 3,9%; p=0,40), reduzida perda tardia (0,74±0,45 mm vs. 0,26±0,43 mm; p=0,004) e pequeno volume de obstrução de placa (19,9±4,67% vs. 2,2±0,8%; p<0,0001)5,6. Isto talvez possa ser explicado pelo desenho mais moderno da plataforma do stent em teste, ou ainda pela baixa complexidade clínica e angiográfica dos indivíduos estudados.

Paradoxalmente, entretanto, verificou-se na análise do subestudo com ultra-sonografia6 uma maior freqüência de eventos cardiovasculares no grupo tratado com stents com eluição de Biolimus A9 (um caso de IAM não-fatal e uma reestenose clínica). Embora o estudo não tenha poder para conclusões sobre desfechos duros, o seguimento ser restrito aos primeiros 6 meses após os implantes e estes achados facilmente creditados ao acaso, os mesmos são intrigantes e nos remetem a questões ainda não resolvidas no que se refere ao perfil de segurança e efetividade clínica dos stents farmacológicos em geral.

A pergunta que fica é sobre qual a relevância clínica dos achados de Missel et al.6 e no que eles implicam na tomada de decisão na nossa atuação rotineira. Sob o ponto de vista científico e prático, esta nova tecnologia ainda necessita de testes adicionais, com análises de desfechos de maior relevância com seguimento tardio em cenários de maior complexidade clínica e angiográfica, e de estudos de superioridade e/ou equivalência com os dispositivos com eluição de fármacos já incorporados à prática médica. Sob a ótica teórica e especulativa, desponta como uma atrativa alternativa no aprimoramento de uma tecnologia que vem sendo tão questionada atualmente, especialmente no que se refere ao quesito segurança, face ao fenômeno da trombose tardia.

A trombose tardia dos stents farmacológicos, embora seja um evento raro e apenas discretamente superior ao verificado nos stents convencionais7, constituiu-se em um acontecimento potencialmente grave e indesejável. Seja como pesquisadores, formadores de opinião ou médicos, nossos objetivos sempre serão a transparência nas ações, com os melhores resultados clínicos e o mínimo de complicações possíveis.

O pentagrama dos possíveis mecanismos fisiopatológicos da trombose tardia dos stents farmacológicos8 envolve o retardo na endotelização do segmento tratado, alteração de fenótipos endoteliais, mal aposição de suas hastes, penetração com ruptura da núcleo necrótico da placa e hipersensibilidade ao polímero e/ou à droga. Esta linha de pesquisa com novas plataformas de stents farmacológicos com drogas alternativas e polímeros biodegradáveis surge como muito promissora e com grande potencial para melhor compreensão e atuação sobre os fatores envolvidos nas limitações hoje existentes.

Não há dúvida que a ciência da alta tecnologia e a medicina baseada em evidências nos trará respostas, novos conhecimentos e, certamente, outros questionamentos.

Recebido em: 8/8/2007

Aceito em: 14/8/2007

  • 1. Moses JW, Leon MB, Popma JJ, Fitzgerald PJ, Holmes DR, O'Shaughnessy C, et al. Sirolimus-eluting stents versus standard stents in patients with stenosis in a native coronary artery. N Engl J Med. 2003;349(14):1315-23.
  • 2. Stone GW, Ellis SG, Cox DA, Hermiller J, O'Shaughnessy C, Mann JT, et al. One-year clinical results with slow-release, polymer-based, paclitaxel-eluting TAXUS stent: The TAXUSIV trial. Circulation. 2004;109(16):1942-7.
  • 3. Jonas M, Resnic FS, Levin AD, Arora N, Rogers CD. Transition from bare metal to drug eluting stenting in contemporary US practice: effect on incidence and predictors of clinically driven target revascularization. Catheter Cardiovasc Interv. 2007;70(2):175-83.
  • 4. Grube E, Buellesfeld L. BioMatrix Biolimus A9-eluting coronary stent: a next-generation drug-eluting stent for coronary artery disease. Expert Rev Med Devices. 2006;3(6):731-41.
  • 5. Costa RA, Lansky AJ, Abizaid A, Mueller R, Tsuchiya Y, Mori K, et al. Angiographic results of the first human experience with Biolimus A9 drug-eluting stent for de novo coronary lesions. Am J Cardiol. 2006;98(4):443-6.
  • 6. Missel E, Beraldo P, Abizaid A, Mattos LAP, Feres F, Staico R, et al. Inibição da proliferação neointimal após o implante de stents eluidores de Biolimus A9: análise volumétrica tardia com ultra-sonografia intracoronária. Rev Bras Cardiol Invas. 2007;15(3):234-239.
  • 7. Mauri L, Hsieh WH, Massaro JM, Ho KK, D'Agostino R, Cutlip DE. Stent thrombosis in randomized clinical trials of drug-eluting stents. N Engl J Med. 2007;356(10):1020-9.
  • 8. Lang NN, Newby DE. Emerging thrombotic effects of drug eluting stents. Arterioscler Thromb Vasc Biol. 2007;27(2):261-2.
  • Correspondência:

    Rogério Sarmento-Leite
    Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul/Fundação Universitária de Cardiologia
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      2007
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