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Comparação da resposta vascular entre stents liberadores de sirolimus com diferentes doses e formas de eluição: análise com ultrassom intracoronário

Comparison of vascular response to different doses and patterns of elution of sirolimus-eluting stents using coronary intravascular ultrasound

Resumos

INTRODUÇÃO: O remodelamento vascular positivo após intervenção coronária percutânea com stents farmacológicos pode estar associado a dose excessiva do fármaco antiproliferativo e/ou toxicidade local do polímero sintético. Tal fenômeno pode levar à aposição incompleta tardia das hastes do stent, atuando como fator de risco para trombose tardia/muito tardia. Objetivamos avaliar a resposta vascular secundária ao implante de stents liberadores de sirolimus com diferentes doses e formas de eluição por meio de análise seriada com ultrassom intracoronário. MÉTODO: Avaliamos 50 pacientes de baixo a moderado risco cardiovascular divididos em três grupos, de acordo com a dose de sirolimus e a forma de eluição: grupo 1, Cypher® (7,7 µg de sirolimus/mm de stent, polímero durável); grupo 2, Cypher Redox® (3,1 µg de sirolimus/mm de stent, polímero durável); e grupo 3, VESTAsyncTM (2,9 µg de sirolimus/mm de stent, sem polímero). RESULTADOS: No seguimento de 10 ± 1 meses, os stents Cypher®, Redox® e VESTAsyncTM apresentaram perda luminal tardia, respectivamente, de 0,16 ± 0,36 mm, 0,24 ± 0,33 mm e 0,37 ± 0,24 mm (P = 0,19). Na análise com ultrassom intracoronário, os stents Cypher® e Redox® apresentaram discreto remodelamento vascular positivo, traduzido pelo aumento não-significativo do volume do vaso de 0,1 ± 1,6 mm³/mm e 0,5 ± 0,6 mm³/mm, respectivamente. Por outro lado, o grupo VESTAsyncTM apresentou ausência de remodelamento vascular positivo (-0,3 ± 1,9 mm³/mm). CONCLUSÕES: Na população avaliada, não foi observada relação linear entre doses crescentes de sirolimus e remodelamento vascular positivo, sugerindo que esse fenômeno vascular pode estar relacionado à presença de um polímero sintético.

Stents farmacológicos; Sirolimo; Ultrasonografia de intervenção


BACKGROUND: Positive vascular remodeling after percutaneous coronary intervention (PCI) using drug-eluting stents may be associated to a high dose of an anti-proliferative agent and/or local toxicity of the synthetic polymer. This may lead to late incomplete aposition of the struts, acting as a late/very late thrombosis risk factor. Our objective was to assess the vascular response secondary to sirolimus drug-eluting stent implantation using different doses and patterns of elution by means of serial intravascular ultrasound (IVUS) analysis. METHOD: We assessed 50 patients with low to moderate cardiovascular risk divided into 3 groups according to the sirolimus dose and pattern of elution: group 1, Cypher® (7.7 µg sirolimus/mm, durable polymer sirolimus-eluting stent); group 2, Cypher Redox® (3.1 µg sirolimus/mm, durable polymer sirolimus-eluting stent); and group 3, VESTAsyncTM (2.9 µg sirolimus/mm, polymer-free sirolimus-eluting stent). RESULTS: In the 10 ± 1 month followup, Cypher®, Redox® and VESTAsyncTM stents showed a late luminal loss of 0.16 ± 0.36 mm, 0.24 ± 0.33 mm, 0.37 ± 0.24 mm, respectively (P = 0.19). Serial IVUS analysis showed Cypher® and Redox® stents with mild positive vascular remodeling translated by non-significant vessel volume increase of 0.1 ± 1.6 mm³/mm and 0.5 ± 0.6 mm³/mm, respectively. On the other hand, there was no positive vascular remodeling in the VESTAsyncTM group (-0.3 ± 1.9 mm³/mm). CONCLUSIONS: There was no linear relationship between increasing sirolimus doses and positive vascular remodeling, suggesting this vascular event may be related to the presence of a synthetic polymer.

Drug-eluting stents; Sirolimus; Ultrasonography, interventional


ARTIGO ORIGINAL

Comparação da resposta vascular entre stents liberadores de sirolimus com diferentes doses e formas de eluição: análise com ultrassom intracoronário

Comparison of vascular response to different doses and patterns of elution of sirolimus-eluting stents using coronary intravascular ultrasound

Felipe Maia; Daniel Chamié; J. Ribamar Costa Jr.; Fausto Feres; Alexandre Abizaid; Andrea S. Abizaid; Ricardo Costa; Dimytri Siqueira; Rodolfo Staico; Luiz Alberto Mattos; Luiz Fernando Tanajura; Marinella Centemero; Áurea J. Chaves; Amanda G. M. R. Sousa; J. Eduardo Sousa

Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia - São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: J. Ribamar Costa Jr Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 - Ibirapuera São Paulo, SP, Brasil - CEP 04012-180 E-mail: rmvcosta@uol.com.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: O remodelamento vascular positivo após intervenção coronária percutânea com stents farmacológicos pode estar associado a dose excessiva do fármaco antiproliferativo e/ou toxicidade local do polímero sintético. Tal fenômeno pode levar à aposição incompleta tardia das hastes do stent, atuando como fator de risco para trombose tardia/muito tardia. Objetivamos avaliar a resposta vascular secundária ao implante de stents liberadores de sirolimus com diferentes doses e formas de eluição por meio de análise seriada com ultrassom intracoronário.

MÉTODO: Avaliamos 50 pacientes de baixo a moderado risco cardiovascular divididos em três grupos, de acordo com a dose de sirolimus e a forma de eluição: grupo 1, Cypher® (7,7 µg de sirolimus/mm de stent, polímero durável); grupo 2, Cypher Redox® (3,1 µg de sirolimus/mm de stent, polímero durável); e grupo 3, VESTAsyncTM (2,9 µg de sirolimus/mm de stent, sem polímero).

RESULTADOS: No seguimento de 10 ± 1 meses, os stents Cypher®, Redox® e VESTAsyncTM apresentaram perda luminal tardia, respectivamente, de 0,16 ± 0,36 mm, 0,24 ± 0,33 mm e 0,37 ± 0,24 mm (P = 0,19). Na análise com ultrassom intracoronário, os stents Cypher® e Redox® apresentaram discreto remodelamento vascular positivo, traduzido pelo aumento não-significativo do volume do vaso de 0,1 ± 1,6 mm3/mm e 0,5 ± 0,6 mm3/mm, respectivamente. Por outro lado, o grupo VESTAsyncTM apresentou ausência de remodelamento vascular positivo (-0,3 ± 1,9 mm3/mm).

CONCLUSÕES: Na população avaliada, não foi observada relação linear entre doses crescentes de sirolimus e remodelamento vascular positivo, sugerindo que esse fenômeno vascular pode estar relacionado à presença de um polímero sintético.

Descritores: Stents farmacológicos. Sirolimo. Ultrasonografia de intervenção.

ABSTRACT

BACKGROUND: Positive vascular remodeling after percutaneous coronary intervention (PCI) using drug-eluting stents may be associated to a high dose of an anti-proliferative agent and/or local toxicity of the synthetic polymer. This may lead to late incomplete aposition of the struts, acting as a late/very late thrombosis risk factor. Our objective was to assess the vascular response secondary to sirolimus drug-eluting stent implantation using different doses and patterns of elution by means of serial intravascular ultrasound (IVUS) analysis.

METHOD: We assessed 50 patients with low to moderate cardiovascular risk divided into 3 groups according to the sirolimus dose and pattern of elution: group 1, Cypher® (7.7 µg sirolimus/mm, durable polymer sirolimus-eluting stent); group 2, Cypher Redox® (3.1 µg sirolimus/mm, durable polymer sirolimus-eluting stent); and group 3, VESTAsyncTM (2.9 µg sirolimus/mm, polymer-free sirolimus-eluting stent).

RESULTS: In the 10 ± 1 month followup, Cypher®, Redox® and VESTAsyncTM stents showed a late luminal loss of 0.16 ± 0.36 mm, 0.24 ± 0.33 mm, 0.37 ± 0.24 mm, respectively (P = 0.19). Serial IVUS analysis showed Cypher® and Redox® stents with mild positive vascular remodeling translated by non-significant vessel volume increase of 0.1 ± 1.6 mm3/mm and 0.5 ± 0.6 mm3/mm, respectively. On the other hand, there was no positive vascular remodeling in the VESTAsyncTM group (-0.3 ± 1.9 mm3/mm).

CONCLUSIONS: There was no linear relationship between increasing sirolimus doses and positive vascular remodeling, suggesting this vascular event may be related to the presence of a synthetic polymer.

Descriptors: Drug-eluting stents. Sirolimus. Ultrasonography, interventional.

Os stents farmacológicos liberadores de sirolimus já demonstraram sua eficácia na redução marcante das taxas de reestenose intrastent1,2. Recentemente, várias publicações trataram do tema da trombose tardia/muito tardia em stents farmacológicos, ficando evidenciada incidência ligeiramente maior nos stents farmacológicos quando comparados aos nãofarmacológicos3. Resposta de hipersensibilidade/reação inflamatória induzida pelas altas concentrações do fármaco nas hastes do stent ou pela presença do polímero sintético pode levar a remodelamento vascular positivo, crescimento desproporcional da área da membrana elástica externa do vaso em relação à área da placa aterosclerótica/camada média4-6. Tal fenômeno pode levar à aposição incompleta tardia das hastes do stent, atuando como fator de risco para trombose tardia desses dispositivos7,8.

Testamos a hipótese de que stents farmacológicos com doses progressivamente menores de sirolimus e com diferentes formas de eluição (polímero durável vs. sem polímero) poderiam ocasionar diferentes taxas de remodelamento vascular positivo.

MÉTODO

Desenho do estudo

Análise retrospectiva de 50 pacientes provenientes de três séries distintas de estudos tipo First-In-Man com stents farmacológicos liberadores de diferentes doses de sirolimus, realizada em único centro. Os pacientes foram divididos em três grupos: grupo 1 (Cypher®, 7,7 µg de sirolimus/mm de stent com polímero durável); grupo 2 (Cypher Redox®, 3,1 µg de sirolimus/mm de stent, com polímero durável); e grupo 3 (VESTAsyncTM, 2,9 µg de sirolimus/mm de stent, sem polímero). As características desses dispositivos estão apresentadas na Tabela 1.

Objetivamos avaliar por meio de ultrassom intracoronário, no seguimento tardio, o grau de remodelamento vascular do vaso ao implante do stent farmacológico.

População incluída

Os pacientes do grupo 1 foram tratados em abril de 2000; os do grupo 2, em março de 2005; e os do grupo 3, em maio de 2007. Todos os pacientes foram submetidos aos mesmos critérios de inclusão e exclusão.

Os pacientes eram considerados elegíveis se apresentassem lesão de novo com porcentual de estenose entre 50% e 99% e extensão < 14 mm, em artérias coronárias nativas, com vasos de diâmetro de referência entre 2,5 mm e 3,5 mm. Foram excluídos os pacientes com disfunção grave do ventrículo esquerdo (fração de ejeção < 30%), creatinina > 2 mg/dl, infarto agudo do miocárdio < 72 horas, lesões no tronco da artéria coronária esquerda não protegido, lesões ostiais, bifurcações e reestenose intrastent.

O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa de nossa Instituição. Todos os pacientes foram incluídos após obtenção de termo de consentimento informado.

Características dos stents

O fármaco liberado por todos os stents avaliados foi o sirolimus, um antibiótico macrolídeo com propriedades imunossupressoras, aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA), em 1999, para profilaxia de rejeição ao transplante renal. O sirolimus liga-se à proteína citosólica FK-binding protein 12 (FKBP12), e esse complexo inibe a mammalian target of rapamycin (mTOR), bloqueando a progressão do ciclo celular da fase G1 para S9. A dose do sirolimus aplicada é de 140 µg por 18 mm de stent no grupo 1 (stent Cypher®), de 65 µg por 18 mm de stent no grupo 2 (stent Cypher Redox®) e de 55 µg por 19 mm de stent no grupo 3 (stent VESTAsyncTM). O stent VESTAsyncTM apresenta uma modificação em suas hastes, que são recobertas por fina camada nanoporosa (500 nm a 700 nm) de hidroxiapatita, responsável pelo carreamento e pela liberação do fármaco, dispensando a necessidade de polímeros sintéticos. Nesse stent, o sirolimus é carreado em uma formulação lipofílica, que preenche as porosidades da cobertura de hidroxiapatita, sem aumentar a espessura de suas hastes. Esse dispositivo já teve sua eficácia comprovada em análises anteriores10. Já nos stents Cypher® e Redox® o fármaco é carreado por um polímero sintético durável.

Procedimento

Apesar das diferenças temporais, todos os pacientes receberam terapia periprocedimento semelhante. Foram pré-tratados com aspirina (300 mg nos pacientes que não faziam uso crônico) e um tienopiridínico. A ticlopidina era administrada na dose de 500 mg por dia e iniciada pelo menos 48 horas antes do procedimento. Caso o tienopiridínico escolhido fosse o clopidogrel, este era administrado na dose de 300 mg, 24 horas antes do procedimento, e mantido na dose de 75 mg por dia. Terapêutica antiagregante plaquetária dupla foi mantida por pelo menos três meses. Após esse período, aspirina foi mantida indefinidamente.

Heparina não-fracionada foi utilizada durante a intervenção na dose de 100 UI/kg, a fim de se obter tempo de coagulação ativada de pelo menos 250 segundos. O uso de inibidores da glicoproteína IIb/IIIa ficou a critério do operador.

A angiografia inicial era realizada em pelo menos duas projeções ortogonais, após administração de 100 µg a 200 µg de nitroglicerina intracoronária. Os stents dos grupos 1 e 2 estavam disponíveis nos diâmetros de 3 mm e 3,5 mm, com extensão de 18 mm, enquanto os stents do grupo 3 apresentavam os mesmos diâmetros, com extensão de 19 mm. Todas as lesões foram obrigatoriamente pré-dilatadas, sendo a pós-dilatação recomendada nos casos de lesão residual > 20%. Era recomendado o uso de apenas um stent por lesão, ficando o uso de dois stents reservado para os casos de dissecção de bordas ou cobertura incompleta da lesão-alvo. A via de acesso utilizada foi a femoral em todos os casos, com uso de introdutor 6 F, que deveria ser retirado por compressão manual de vinte minutos, duas horas após o término da intervenção. O sucesso do procedimento foi definido como lesão residual < 30% com evidência de fluxo TIMI 3.

Angiografia coronária quantitativa

Angiografia do vaso-alvo foi realizada pré e pósprocedimento depois da administração de 100 µg a 200 µg de nitroglicerina intracoronária, em duas projeções ortogonais. As mesmas angulações foram repetidas nos reestudos angiográficos. As imagens foram armazenadas em formato digital e analisadas utilizandose sistema de detecção automática de bordas (QCA-CMS, Medis Medical Imaging System, Nuenem, Holanda).

Análise morfológica da lesão foi feita de acordo com os critérios padrão e a definição de sua complexidade, de acordo com o sistema de classificação modificado do American College of Cardiology/American Heart Association11.

A ponta do cateter-guia preenchida por contraste foi utilizada para calibração. A análise quantitativa incluía mensuração dos seguintes parâmetros: 1) diâmetro de referência do vaso; 2) diâmetro luminal mínimo; 3) extensão da lesão; 4) porcentual do diâmetro de estenose (diâmetro de referência - diâmetro luminal mínimo/diâmetro de referência x 100); 5) ganho agudo (diâmetro luminal mínimo pós-procedimento - diâmetro luminal mínimo pré-procedimento); e 6) perda tardia (diâmetro luminal mínimo pós-procedimento - diâmetro luminal mínimo no seguimento). Reestenose binária foi definida como diâmetro de estenose > 50%.

Ultrassom intracoronário

As imagens do ultrassom intracoronário, pós-implante do stent e tardias, foram adquiridas utilizando-se transdutor de elemento único rotacional, com frequência de 40 MHz, envolto em uma bainha com perfil 2,6 F, com recuo motorizado à velocidade de 0,5 mm/segundo e conectado a um escâner comercial (CVISTM, Galaxy 2TM ou iLabTM, Boston Scientific Corp., Nattick, Estados Unidos).

As imagens foram digitalizadas para análise quantitativa off-line de acordo com os critérios do American College of Cardiology Clinical Expert Consensus Document on Standards for Acquisition, Measurement and Reporting of Intravascular Ultrasound Studies12.

Para realização da análise volumétrica, foi feita reconstrução tridimensional das imagens do ultrassom intracoronário com a utilização de um programa de planimetria computadorizada comercialmente disponível (EchoPlaque 3.0, INDEC Systems Inc., Mountain View, Estados Unidos). As áreas do lúmen, do stent e do vaso foram determinadas a cada milímetro por planimetria computadorizada. A partir de então, os volumes (lúmen, stent e vaso) foram calculados utilizando-se a regra de Simpson. Avaliamos a variação no volume da membrana elástica externa do vaso indexada pelo tamanho do stent (Δ Vol Vaso Index mm3/mm), assim como a aposição das hastes do stent à parede do vaso. Aposição incompleta foi definida como a separação de pelo menos uma haste da parede do vaso, com fluxo sanguíneo por trás das mesmas, sem envolver área de bifurcação com ramo lateral. A aposição incompleta foi definida como: 1) persistente (presente após o procedimento e no seguimento); 2) resolvida (presente após o procedimento e ausente no seguimento); e 3) adquirida (ausente após o procedimento e presente no seguimento).

Nova angiografia e ultrassom intracoronário foram realizados em todos os pacientes 10 ± 1 meses após o procedimento índex.

Análise estatística

As análises foram realizadas com o programa SPSS 13.0 para Windows. Na análise descritiva, as variáveis categóricas foram expressas como frequências absolutas e porcentuais. As variáveis contínuas foram expressas como média ± desvio padrão. O teste de quiquadrado e o teste exato de Fisher foram usados para comparação das variáveis categóricas. O teste t de Student, pareado e não-pareado, foi usado para comparação das variáveis contínuas entre os grupos. Valores de P < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos.

RESULTADOS

Foram tratados 15 pacientes nos grupos Cypher® e VESTAsyncTM e 20 pacientes no grupo Redox®. A população total foi constituída predominantemente de pacientes de baixo a moderado risco cardiovascular, com média de idade de 59,3 anos, 29% de diabéticos e 49% de portadores de infarto agudo do miocárdio prévio. Houve maior prevalência de pacientes do sexo masculino em todas as coortes (cerca de 73%), sendo em sua maioria portadores de síndromes estáveis. A artéria descendente anterior foi o vaso mais tratado nos três grupos e a maioria das lesões apresentava perfil angiográfico de moderada complexidade (B1/B2), conforme os critérios do American College of Cardiology/American Heart Association11. Os perfis clínico e angiográfico dos três grupos de pacientes estão expostos na Tabela 2.

A Tabela 3 apresenta os dados de angiografia coronária quantitativa. O grupo 3 apresentou diâmetro de referência do vaso ligeiramente menor (2,76 ± 0,32 mm) em relação aos grupos 1 (2,98 ± 0,4 mm) e 2 (2,99 ± 0,2 mm), com P = 0,07 para tendência. O grupo 3 apresentou lesões significativamente mais curtas (9,98 ± 1,98 mm) que os pacientes dos grupos 1 (12,9 ± 1,9 mm) e 2 (11,4 ± 1,7), com P = 0,0004 para tendência.

Conforme determinação protocolar, todas as lesões foram pré-dilatadas, sendo a pós-dilatação realizada em 73% (grupo 1), 100% (grupo 2) e 47% (grupo 3). Todos os stents foram implantados com sucesso.

Imediatamente após o procedimento, o diâmetro luminal mínimo intrastent foi significativamente menor no grupo 3 (2,64 ± 0,31 mm) na comparação com os grupos 1 (2,94 ± 0,44 mm) e 2 (2,78 ± 0,2 mm), com P = 0,04 para tendência. No entanto, o ganho agudo foi semelhante nos três grupos (Tabela 3).

No seguimento médio de 10 ± 1 meses, os stents Redox® e VESTAsyncTM, apesar de apresentarem dose menor do fármaco, mantiveram boa potência antiproliferativa (perda luminal tardia de 0,24 ± 0,33 mm para Redox® e de 0,37 ± 0,24 mm para VESTAsyncTM), sem diferença significativa em relação à perda tardia observada no stent Cypher® (0,16 ± 0,36 mm), com P = 0,19 para tendência.

Na análise com ultrassom intracoronário, os stents com presença de polímero sintético durável e doses maiores de sirolimus (Cypher® e Redox®) apresentaram discreto remodelamento vascular positivo no seguimento tardio, traduzido pelo aumento não-significativo do volume do vaso entre o estudo realizado aos 10 ± 1 meses e pós-procedimento. Notou-se variação positiva do volume do vaso indexado de 0,1 ± 1,6 mm3/mm para o stent Cypher® e de 0,5 ± 0,6 mm3/mm para o stent Redox®. Por outro lado, no grupo VESTAsyncTM (sem polímero sintético), a variação do volume do vaso indexado foi negativa (-0,3 ± 1,9 mm3/mm), denotando ausência de remodelamento vascular positivo ao ultrassom intracoronário nesse grupo de pacientes (Tabela 4 e Figura 1).


Além disso, observou-se um caso de aposição incompleta adquirida das hastes do stent nos grupos 1 e 2. No grupo 3, foram observados dois casos de má aposição aguda após o implante, que se resolveram no seguimento, sem a ocorrência de casos de má aposição adquirida.

Não foram registrados casos de trombose (definitiva/provável) precoce ou tardia, bem como necessidade de nova revascularização da lesão-alvo em nenhum dos grupos, até o seguimento clínico de um ano.

DISCUSSÃO

O principal achado da presente análise refere-se ao fato de que o stent VESTAsyncTM com sirolimus e sem polímero mostrou-se capaz de suprimir a hiperpasia neointimal em seu interior de forma eficaz e não diferente dos stents Cypher® e Redox®, porém sem induzir o remodelamento vascular positivo, que pode denotar resposta inflamatória local, levando ao surgimento de má aposição adquirida, um possível mecanismo envolvido na gênese das tromboses tardias e muito tardias.

Publicações recentes, como a de Cook et al.13, demonstraram que a maior parte dos pacientes (73% de uma amostra de 11 pacientes: Cypher®, 5; Taxus®, 5; e Endeavor®, 1) que evoluíram com trombose muito tardia (1.020 ± 283 dias em média após intervenção coronária percutânea) apresentava áreas significativas de má aposição adquirida (> 5,0 mm2 em 63% dos casos), diretamente relacionadas ao grau de infiltrado inflamatório na aspiração de material aterotrombótico.

Por sua vez, análises ultrassonográficas de stents farmacológicos de segunda geração, portadores de polímeros mais biocompatíveis, demonstram menor grau de remodelamento vascular positivo, quando comparados a stents farmacológicos de primeira geração com polímeros duráveis (Δ Vol Vaso Index no seguimento tardio de 0,3 ± 1,0 mm3 com o Endeavor® e de 0,8 ± 1,0 mm3 com o Taxus; P < 0,05), sem diferença estatística quanto à incidência de má aposição adquirida (1 Endeavor® vs. 4 Taxus®)14, ainda que numericamente maior.

Na gênese da inflamação vascular local, além do polímero durável, a quantidade de fármaco antiproliferativo utilizada no sistema também pode exercer algum papel na indução dessa resposta indesejada. Estudo experimental demonstrou, por meio de análise histopatológica de stents farmacológicos implantados em artérias de suínos, menor grau de deposição de necrose vascular fibrinoide quando utilizadas doses menores desse fármaco (25 µg, 40 µg e 100 µg de sirolimus) liberado de superfície de hidroxiapatita, em comparação com stent Cypher® (0,05 ± 0,05 mm2 vs. 0,07 ± 0,04 mm2 vs. 0,07 ± 0,03 mm2 vs. 0,10 ± 0,06 mm2; P < 0,001)15. Nesta análise, a quantidade de sirolimus foi o único preditor independente para depósito de material fibrinoide (P = 0,028).

Apesar de metodologias distintas e, portanto, nãocomparáveis, os resultados de nossa análise parecem corroborar os achados dos estudos anteriormente mencionados, ao demonstrar ausência de remodelamento vascular positivo no grupo de stent VESTAsyncTM (baixa dose de sirolimus/ausência de polímero sintético), assim como nenhum caso de má aposição adquirida. Considerando que esse é um fenômeno não totalmente compreendido, mas com nítida relação com resposta inflamatória, parece natural o desenvolvimento de dispositivos com doses menores de fármaco antiproliferativo e polímeros mais biocompatíveis causadores de menor resposta inflamatória endotelial, tendência já observada nos dispositivos mais atuais, como os stents farmacológicos de segunda geração.

Limitações

Por tratar-se de análise não-randomizada, os resultados podem ter sido influenciados por viéses de seleção. Tentamos minimizar essa possibilidade selecionando uma população com as mesmas características clínicas, cujos indivíduos foram submetidos aos mesmos critérios de inclusão e exclusão.

CONCLUSÕES

Apesar de doses menores de sirolimus, os stents Redox® e VESTAsyncTM mantiveram boa potência antiproliferativa neointimal. Não observamos relação linear entre a dose de sirolimus e o grau de remodelamento vascular positivo. Este parece estar mais relacionado à presença de um polímero durável, haja vista a ausência de remodelamento vascular positivo no grupo VESTAsyncTM.

CONFLITO DE INTERESSES

Os autores declararam inexistência de conflito de interesses.

Recebido em: 12/7/2009

18/9/2009

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  • Correspondência:

    J. Ribamar Costa Jr
    Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia
    Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 - Ibirapuera
    São Paulo, SP, Brasil - CEP 04012-180
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2009

    Histórico

    • Recebido
      12 Jul 2009
    • Aceito
      18 Set 2009
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