Acessibilidade / Reportar erro

Angiografia coronária: técnica transbraquial revisitada

Coronary angiography: transbrachial technique revisited

Resumos

OBJETIVO: Demonstrar a experiência na execução da técnica de punção braquial para a realização de coronariografia. MÉTODO: Foram avaliados 106 pacientes ambulatoriais com suspeita de doença coronária submetidos a coronariografia pela técnica transbraquial. Foi pré-selecionado cateter MP2 introduzido através de bainha 5F, e o cateterismo esquerdo e angiografia realizados da maneira usual. Ao término do exame, foi retirada a bainha e a hemostasia realizada por compressão manual. RESULTADOS: A maioria dos exames (76,4%) foi completada com a utilização de um único cateter (MP2). A mediana do tempo de fluoroscopia foi 4,5 min. Em apenas 4 casos a técnica teve que ser substituída, todas ocorreram com um mesmo operador durante a curva de aprendizagem. Observamos a presença de hematoma de pequeno volume em 3 pacientes, logo após o procedimento, áreas discretas de equimose em 4 e equimoses mais extensas em 6 doentes, não tendo ocorrido complicações graves. CONCLUSÕES: A técnica transbraquial mostrouse efetiva e segura, facilitando a realização de cateterismo ambulatorial com baixa freqüência de complicações.

Cateterismo cardíaco, métodos; Angiografia coronária; Artéria braquial


OBJECTIVES: To report the experience using the transbrachial approach for coronary angiography. METHODS: 106 patients were studied with possible diagnosis of coronary artery disease using transbrachial catheterization. A preselected catheter (MP2) was introduced through a 5 F sheath and left heart catheterization and angiography performed in the usual manner. At the end of the procedure, the sheath was removed and hemostasis accomplished by manual compression. RESULTS: Most procedures (76.4%) were performed with a single catheter (MP2). The median fluoroscopy time was 4.5 min. In only 4 cases, during the learning curve of one operator, a different technique had to be performed. Three patients suffered small hematomas, 4 patients presented with small and 6 with moderate ecchymosis; there were no severe complications. CONCLUSIONS: The transbrachial technique is effective and safe; it has facilitated outpatient catheterization with a low rate of complications.

Heart catheterization, methods; Coronary angiography; Brachial artery


ARTIGO ORIGINAL

Angiografia coronária: técnica transbraquial revisitada

Coronary angiography: transbrachial technique revisited

Sidney Munhoz Junior; Jocelino Peregrino Soares; Fábio Ridolfi Figueiredo; José Alfredo Sejópoles; Alberto Najjar

Laboratório de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista de Cuiabá - LACIC, Hospital Jardim Cuiabá, MT

Correspondência Correspondência: Sidney Munhoz Junior Av. das Flores, 843 - Bairro Jd. Cuiabá Cuiabá - MT - Brasil - CEP 78043-172 Fone/ Fax (65) 36247971 E-mail: jrmunhoz@uol.com.br.

RESUMO

OBJETIVO: Demonstrar a experiência na execução da técnica de punção braquial para a realização de coronariografia.

MÉTODO: Foram avaliados 106 pacientes ambulatoriais com suspeita de doença coronária submetidos a coronariografia pela técnica transbraquial. Foi pré-selecionado cateter MP2 introduzido através de bainha 5F, e o cateterismo esquerdo e angiografia realizados da maneira usual. Ao término do exame, foi retirada a bainha e a hemostasia realizada por compressão manual.

RESULTADOS: A maioria dos exames (76,4%) foi completada com a utilização de um único cateter (MP2). A mediana do tempo de fluoroscopia foi 4,5 min. Em apenas 4 casos a técnica teve que ser substituída, todas ocorreram com um mesmo operador durante a curva de aprendizagem. Observamos a presença de hematoma de pequeno volume em 3 pacientes, logo após o procedimento, áreas discretas de equimose em 4 e equimoses mais extensas em 6 doentes, não tendo ocorrido complicações graves.

CONCLUSÕES: A técnica transbraquial mostrouse efetiva e segura, facilitando a realização de cateterismo ambulatorial com baixa freqüência de complicações.

Descritores: Cateterismo cardíaco, métodos. Angiografia coronária. Artéria braquial.

SUMMARY

OBJECTIVES: To report the experience using the transbrachial approach for coronary angiography.

METHODS: 106 patients were studied with possible diagnosis of coronary artery disease using transbrachial catheterization. A preselected catheter (MP2) was introduced through a 5 F sheath and left heart catheterization and angiography performed in the usual manner. At the end of the procedure, the sheath was removed and hemostasis accomplished by manual compression.

RESULTS: Most procedures (76.4%) were performed with a single catheter (MP2). The median fluoroscopy time was 4.5 min. In only 4 cases, during the learning curve of one operator, a different technique had to be performed. Three patients suffered small hematomas, 4 patients presented with small and 6 with moderate ecchymosis; there were no severe complications.

CONCLUSIONS: The transbrachial technique is effective and safe; it has facilitated outpatient catheterization with a low rate of complications.

Descriptors: Heart catheterization, methods. Coronary angiography. Brachial artery.

A técnica de punção de artéria braquial para cateterismo cardíaco e angiografia foi descrita, pela primeira vez, por Fergusson e Kamada, em 19811. Vários artigos foram publicados na literatura, descrevendo-a como alternativa segura em substituição à arteriotomia braquial e à punção femoral2-6. A técnica transbraquial pode ser utilizada com sucesso na maioria dos pacientes, sem necessidade de dissecção e com baixos índices de complicações3.

Neste artigo, os autores descrevem sua experiência na realização de estudo hemodinâmico, ventriculografia e angiografia coronária em pacientes ambulatoriais encaminhados para este laboratório.

MÉTODO

Durante um período de três meses (de junho a setembro de 2006), foram realizadas 329 coronariografias no Laboratório de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista de Cuiabá (LACIC). Destas, foram avaliadas 106 (32,2%), realizadas por punção braquial, com bainha hemostática 5F, sendo 65% (69) em pacientes do sexo masculino e 35% (37) do sexo feminino, com a mediana da idade 58 anos (29 a 88 anos). Foram excluídas as poucas coronariografias transbraquiais realizadas com bainhas de outros diâmetros, as por via femoral, e coronariografias associadas a estudo de pacientes valvares.

Os pacientes foram colocados em decúbito dorsal e o braço direito abduzido a 60º. Após anestesia local com lidocaína a 2%, próxima à prega antecubital, a artéria braquial foi cuidadosamente puncionada com o conjunto agulha/cateter 16G em um ângulo de 45º, evitando-se a transfixação da parede posterior do vaso. No momento em que fosse obtido um fluxo pulsátil de sangue, retirava-se a agulha e canulava-se a artéria. Na ausência de resistência, avançava-se o fio-guia 0,035" com ponta em J e retirava-se o cateter. A bainha hemostática 5F foi, então, introduzida e 5000 UI de heparina administradas. O cateter MP2 foi avançado até a raiz da aorta e ventrículo esquerdo, da forma usual. Em alguns casos, o cateter MP2 foi substituído por cateteres de Judkins ou Amplatz, para cateterização seletiva das artérias coronárias. O fio-guia 0,035" com ponta em J foi utilizado sempre que empregados os cateteres de Judkins, Amplatz ou Pigtail.

A introdução do cateter MP2 em ventrículo esquerdo foi realizada diretamente ou com auxílio do fioguia 0,035" com ponta em J. A coronariografia seletiva foi obtida pelas técnicas usuais, com excelente estabilidade do cateter, e a opacificação com o uso de 4-6ml de contraste iodado (Figuras 1 a 3).


Após a retirada da bainha, foi realizada hemostasia por compressão manual por cerca de 20 minutos e, em seguida, aplicado curativo compressivo da forma usual.

Os pacientes permaneceram em observação por cerca de 2 horas após o término do procedimento, sendo depois avaliados e liberados. Na avaliação póscateterismo, levou-se em consideração a presença de hematoma e a amplitude do pulso radial, sendo que se considerou até 2 cm como hematoma pequeno, 2 a 4 cm, médio e mais de 4 cm, grande, e o pulso radial ausente ou de amplitude 1 a 4+/4. Na avaliação por contato telefônico, os pacientes foram argüidos sobre a presença de dor local excessiva, presença de massa pulsátil e de equimose, considerando-se aproximada-mente 5 cm como o limite entre a equimose discreta e a mais extensa.

Em 48-72 horas, todos os pacientes foram contatados por telefone e, se necessário, reavaliados por um dos membros da equipe.

RESULTADOS

Dos 106 pacientes submetidos a coronariografia por punção braquial direita com bainha hemostática 5F, em apenas 4 (3,7%) a técnica foi substituída: pela via femoral em 1 paciente e procedeu-se à dissecção da artéria braquial em 3 doentes.

Em 81 (76,4%) pacientes, o exame foi completado com o uso de um único cateter (MP2), em 18 (17%) foram utilizados 2 cateteres e, em apenas 7 (6,6%) doentes foram necessários mais de 2 cateteres.

Durante a introdução do cateter MP2, não ocorreu espasmo ou queixa de dor, foi necessária, por vezes, a passagem de um fio-guia 0,035" com ponta em J, devido ao excesso de tortuosidade na artéria subclávia. Apesar do calibre 5F e de possuir orifício terminal, foram obtidas angiografias coronárias de excelente padrão e não houve dificuldade no posicionamento do cateter para a realização da ventriculografia, não tendo sido observada infiltração intramiocárdica de contraste.

A mediana do tempo de fluoroscopia foi de 4,5 minutos (0,9 a 29 min). Não ocorreu perda de pulso, observamos a presença de hematoma de pequeno volume em 3 (2,5%) pacientes, logo após o procedimento. Áreas discretas de equimose ocorreram em 4 pacientes e, em 6, as equimoses foram um pouco mais extensas, incluindo o paciente que se submeteu a dissecção de artéria braquial. Nenhum paciente necessitou tratamento cirúrgico e não ocorreram pseudoaneurismas, perda de pulso ou alteração neurológica (Tabela 1). Não ocorreu infarto do miocárdio ou mortes.

As complicações não parecem ter relação com sexo ou idade, entretanto, mostram tendência de maior incidência nos hipertensos e obesos.

DISCUSSÃO

A técnica transbraquial pode ser considerada uma alternativa vantajosa para a realização de cateterismo cardíaco esquerdo. Tendo em vista o alto índice de complicações com a técnica de dissecção braquial e a necessidade de permanência em repouso no leito dos pacientes submetidos à técnica femoral, a via transbraquial permite a realização do cateterismo esquerdo com segurança e a deambulação precoce4-6.

Neste grupo de pacientes, a troca para via femoral, as dissecções da artéria braquial e a maioria dos tempos de fluoroscopia acima de 10 minutos deveram-se à curva de aprendizado de um dos operadores, não sendo possível evidenciar qualquer razão clínica ou anatômica para estas falhas. Entretanto, deve-se assinalar que os demais operadores que participam do trabalho possuem larga experiência com esta técnica.

Campeau7, em 1989, descreveu a técnica transradial em 100 pacientes. Foram observados dissecção da artéria braquial em um paciente e oclusão da artéria radial em outro. Na seleção dos pacientes, 20% tiveram que ser dispensados por apresentarem testes de Allen insatisfatórios. A longa curva de aprendizagem, a necessidade de demonstrar fluxo arterial duplo pelo teste de Allen e o índice de insucesso na cateterização da artéria radial limitam o uso desta técnica. Tem sido demonstrado que ocorre importante injúria da artéria radial, com espessamento da íntima-média, bem como alterações funcionais persistentes, nos pacientes submetidos a procedimentos por via transradial. Estas alterações podem ter profundo impacto na indicação do enxerto de artéria radial para a cirurgia de revascularização miocárdica8,9.

A técnica de Sones requer grande experiência na manipulação do cateter, e necessita habilidade cirúrgica para a arteriotomia e a conseqüente sutura do vaso ao final do procedimento. Estes fatores acrescentam uma maior permanência do paciente na sala de exame e induzem ao aumento de complicações locais, como trombose com perda de pulso e necessidade de reparo cirúrgico10.

As complicações da punção braquial, tais como oclusão arterial ou lesão do nervo mediano, são raras7, sendo que esta última pode ocorrer por compressão extrínseca (grandes hematomas) e não pelo contato inadvertido da agulha de punção. A técnica transbraquial tem se mostrado segura em comparação às vias femoral e radial, com alto nível de conforto e curto tempo de permanência em repouso. Estima-se que a troca de acesso na técnica radial pode chegar a 20%, enquanto que na femoral seria 5% e na braquial 9,3%; na nossa casuística, apenas 3,7% necessitaram a mudança de técnica11.

A punção da artéria braquial pode ser realizada com os mesmos materiais da técnica femoral, constituindo, assim, uma grande vantagem no momento da aquisição e uso de agulhas de punção, introdutores e cateteres.

Na nossa casuística, a maioria dos pacientes estava em uso de aspirina, e a administração rotineira de heparina não predispôs a complicações.

Os procedimentos diagnósticos foram realizados com amplo porcentual de sucesso, utilizando-se um único cateter pré-selecionado. Acreditamos que estes resultados possam encorajar outros operadores a utilizar preferencialmente esta via para a realização de cateterismo esquerdo, em pacientes ambulatoriais e naqueles onde houver contra-indicação para o uso da via femoral.

Este serviço, nos últimos 4 anos, vem utilizando a técnica transbraquial nos exames diagnósticos, em substituição à técnica de dissecção braquial com plena satisfação por parte dos pacientes e alto índice de sucesso. Foram realizadas, até o momento, mais de 2000 coronariografias por via transbraquial. Iniciada em 2003, esta técnica atualmente é amplamente utilizada em nosso serviço, preferencialmente nos pacientes ambulatoriais (Figura 4).


Recebido em: 21/5/2007

Aceito em: 3/7/2007

  • 1. Fergusson DJ, Kamada RO. Percutaneous entry of the brachial artery for left heart catheterization using a sheath. Cathet Cardiovasc Diagn. 1981;7(1):111-4.
  • 2. Folland ED, Kemper A, Bloomfield P, Parisi AF. Brachial artery catheterization employing a side arm sheath. Cathet Cardiovasc Diagn. 1984;10(1):55-61.
  • 3. Pepine CJ, Von Gunten C, Hill JA, Culp JR, Feldman RL, Rubin M, et al. Percutaneous brachial catheterization using a modified sheath and new catheter system. Cathet Cardiovasc Diagn. 1984;10(6):637-42.
  • 4. Campeau L. Percutaneous brachial catheterization. Cathet Cardiovasc Diagn. 1985;11(4):443-4.
  • 5. Campeau L, Deguise P, Gosselin G. Percutaneous brachial artery approach to coronary angiography, a safe alternative to femoral artery catheterization. J Am Coll Cardiol. 1987;9:178A.
  • 6. Esteves Fş A, Mariani Jr J, Kajita LJ, Horta PE, Garcia DP, Martinez Fş EE. Cateterismo esquerdo por punção da artéria braquial direita: experiência inicial. Rev Bras Cardiol Invas. 2000;8(1):22-6.
  • 7. Campeau L. Percutaneous radial artery approach for coronary angiography. Cathet Cardiovasc Diagn. 1989;16(1):3-7.
  • 8. Wakeyama T, Ogawa H, Iida H, Takaki A, Iwami T, Mochizuki M, et al. Intima- media thickening of radial artery after transradial intervention. An intravascular ultrasound study. J Am Coll Cardiol. 2003;41(7):1109-14.
  • 9. Burstein JM, Gidrewicz D, Hutchison SJ, Holmes K, Jolly S, Cantor WJ. Impact of radial artery cannulation for coronary angiography and angioplasty on radial artery function. Am J Cardiol. 2007;99(4):457-9.
  • 10. Sheldon WC. Technics for coronary arteriography. Cathet Cardiovasc Diagn. 1979;5(2):191-3.
  • 11. Grinfeld L, Berrocal D, Matas CR, Magni J, Belardi J. What is the most effective approach for diagnostic cardiac catheterization? J Am Coll Cardiol. 1996;27:A901.
  • Correspondência:

    Sidney Munhoz Junior
    Av. das Flores, 843 - Bairro Jd. Cuiabá
    Cuiabá - MT - Brasil - CEP 78043-172
    Fone/ Fax (65) 36247971
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      2007

    Histórico

    • Aceito
      03 Jul 2007
    • Recebido
      21 Maio 2007
    Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista - SBHCI R. Beira Rio, 45, 7o andar - Cj 71, 04548-050 São Paulo – SP, Tel. (55 11) 3849-5034, Fax (55 11) 4081-8727 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: sbhci@sbhci.org.br