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Os empresários industriais no primeiro mandato Dilma Rousseff (2011-2014): uma análise a partir do jornal Valor Econômico

Industrial entrepreneurs in Dilma Rousseff’s first term (2011-2014): an analysis from the newspaper Valor Econômico

Empresarios industriales en el primer mandato de Dilma Rousseff (2011-2016): un análisis del diario Valor Econômico

Resumo:

Este trabalho se insere no debate sobre as interpretações dos governos Dilma Rousseff e da crise que levou ao impeachment em 2016. O artigo toma como base a hipótese de André Singer sobre a coalizão produtivista e o deslocamento político do empresariado industrial para, a partir da análise de declarações de empresários no jornal Valor Econômico entre 2011 e 2014, verificar se a mudança de posicionamento da burguesia industrial de fato se concretizou. As declarações foram classificadas como favoráveis, contrárias ou neutras em relação ao governo e à política econômica. A presidenta contava com amplo apoio do empresariado até o primeiro semestre de 2013, contudo, do segundo semestre até o final de 2014, predominam as manifestações contrárias. Os resultados sugerem que o comportamento político dos industriais não pode ser explicado apenas como reação pragmática às condições econômicas adversas.

Palavras-chave:
Dilma Rousseff; coalizão de classe; burguesia industrial; lulismo; nova matriz econômica; Impeachment de 2016

Abstract:

This article contributes to the debate about how to interpret Dilma Rousseff’s governments and the crisis that led to her impeachment in 2016. The starting point is André Singer’s hypothesis about the “productivist coalition” and the political shift of industrial entrepreneurs. Based on the analysis of statements by business leaders in the newspaper, Valor Econômico, between 2011 and 2014, we aimed to verify whether a change in the industrial bourgeoisie’s political position in fact occurred. The statements were classified as favorable, contrary or neutral to Rousseff’s government and its economic policy. The data reveal that the president had broad support from industrialists until the first half of 2013. However, from the second half until the end of 2014, contrary manifestations predominated. The results suggest that the political behavior of industrialists cannot be explained merely as a response to adverse economic conditions.

Keywords:
Dilma Rousseff; class coalition; industrial bourgeoisie; lulism; new economic matrix; 2016 impeachment

Resumen:

Este artículo es parte del debate sobre las interpretaciones de los gobiernos de Dilma Rousseff y la crisis que llevó a su destitución en 2016. El artículo se basa en la hipótesis de André Singer sobre la “coalición productivista” y el desplazamiento político de los empresarios industriales. A partir del análisis de las declaraciones de empresarios en el diario Valor Econômico nos propusimos verificar si efectivamente se ha materializado el cambio de posicionamiento de la burguesía industrial. Las declaraciones fueron clasificadas como favorables, contrarias o neutrales en relación con el gobierno de Rousseff y su política económica. Los datos revelan que la mandataria contó con un amplio apoyo de la comunidad empresarial hasta el primer semestre de 2013, sin embargo, desde el segundo semestre hasta finales de 2014, predominan las manifestaciones contrarias. Los resultados sugieren que el comportamiento político de los industriales no puede explicarse simplemente como una respuesta a condiciones económicas adversas.

Palabras-clave:
Dilma Rousseff, coalición de clase, burguesía industrial, lulismo, nueva matriz económica; impeachment de 2016

Introdução6 6 Agradecemos às(aos) pareceristas anônimas(os) da Revista Brasileira de Ciência Política pelos comentários e sugestões e aos pesquisadores do grupo de pesquisa Pensamento e Política no Brasil, nos nomes de André Singer, Hugo Fanton e Daniela Costanzo, pelas valiosas discussões que aprimoraram essa pesquisa. Devemos relembrar também os pesquisadores André Dallacorte, David Molinari, Flávia Couto e Silva, Isabella Esteves, Lucas Fonseca, Rafael Costa, Tales Mançano e Yasmin Ribeiro, cujas contribuições foram fundamentais para nosso trabalho. Agradecemos ainda a Alvaro Comin e Wagner Mancuso que, enquanto debatedores em seminários e simpósios, também contribuíram para o aperfeiçoamento deste artigo. Os erros e omissões restantes são, evidentemente, de nossa total responsabilidade.

Este artigo se insere no debate mais amplo das interpretações do período Dilma Rousseff na presidência da República (2011-2016) e do impeachment de 2016. Devido a sua complexidade, a crise que terminou por derrubar a presidenta envolve diferentes dimensões: institucional, política, econômica, social e jurídica (LIMONGI, 2015LIMONGI, Fernando. O passaporte de Cunha e o impeachment: a crônica de uma tragédia anunciada. Novos Estudos - CEBRAP. São Paulo, v. 34, n. 3, p. 99-112, nov. 2015.; LIMONGI, 2017LIMONGI, Fernando. Impedindo Dilma. Novos Estudos - CEBRAP. edição especial, p. 5-13, jul. 2017.; RUGITSKY, 2015RUGITSKY, Fernando. Do ensaio desenvolvimentista à austeridade: uma leitura kaleckiana. In: BELLUZZO, Luiz Gonzaga de Mello; BASTOS, Paulo Zahluth (orgs.). Austeridade para quem? Balanço e perspectivas do governo Dilma Rousseff. São Paulo: Carta Maior/ Friedrich Ebert Stiftung, 2015. p. 131-137.; RUGITSKY, 2017RUGITSKY, Fernando. The rise and fall of the Brazilian economy (2004-2015): the economic antimiracle. Departamento de Economia (FEA-USP): Working Paper Series no 2017-29, 2017. Disponível em: Disponível em: http://www.repec.fea.usp.br/documentos/FernandoRugitsky_29WP.pdf . Acesso em 27 jun. 2019.
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; BOITO JR, 2018BOITO JR., Armando. Reforma e crise política no Brasil: os conflitos de classe nos governos do PT. Campinas, SP: Editora da Unicamp / São Paulo: Editora Unesp, 2018.; CARVALHO, 2018CARVALHO, Laura. Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018.; SERRANO; SUMMA, 2018SERRANO, Franklin; SUMMA, Ricardo. Conflito distributivo e o fim da “breve era de ouro” da economia brasileira. Novos Estudos - CEBRAP. São Paulo, v. 37, n. 2, p. 175-189, maio-ago. 2018.; SINGER, 2018SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018.). Neste trabalho dedicamo-nos à análise de uma das peças desse quebra-cabeça: o comportamento político do empresariado industrial. Tomando como ponto de partida a hipótese de Singer (2018)SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018. acerca da coalizão produtivista e do deslocamento político do empresariado industrial, pretendemos identificar, através da análise das manifestações de empresários no jornal Valor Econômico, o posicionamento político da burguesia industrial ao longo do primeiro mandato de Rousseff (2011-2014). Nesse sentido, queremos verificar, em primeiro lugar, se havia de fato o alinhamento do empresariado ao governo e à Nova Matriz Econômica e, em seguida, se o movimento em direção à oposição se concretizou. Com isso, esperamos aprofundar a discussão sobre os acontecimentos que conduziram ao processo de impeachment de 2016 e colaborar com outros estudos em andamento no interior do grupo de pesquisa Pensamento e Política no Brasil7 7 O espelho do grupo de pesquisa pode ser acessado aqui: http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/24741 ligado ao Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo.

Dilma Rousseff assume a presidência da República no ano de 2011 em cenário muito favorável. Após dois mandatos, Lula deixara a cadeira com índices de aprovação e de popularidade em patamares históricos. Era o auge do lulismo: o Brasil vivera um período amplo de crescimento econômico, com redução da pobreza e da miséria, valorização do salário mínimo, queda no desemprego e expansão da formalização e do consumo. Como ilustrava a capa da consagrada publicação liberal The Economist, em 14 de novembro de 2009, o Brasil parecia decolar.

Escolhida por Lula como sucessora e herdeira de seu capital político, Rousseff inicia seu primeiro mandato bastante fortalecida, de tal maneira que, em lugar de apenas seguir com o projeto de conciliação, reformismo fraco e lenta integração que caracteriza o lulismo e seu “pacto conservador” (SINGER, 2012SINGER, André. Os sentidos do lulismo: reforma gradual e pacto conservador. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.), a presidenta decide por acelerá-lo, “deslocando o lulismo para um pouco mais perto do reformismo forte, embora dentro dos limites da transformação pelo alto” (SINGER, 2018SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018., p. 26). Para isso, Dilma e sua equipe econômica, conduzida pelo então ministro da Fazenda Guido Mantega, colocam em prática uma política econômica que visa retomar a industrialização, com crescimento econômico, emprego e renda, a partir de estímulos ao investimento produtivo privado e à exportação. Batizado de Nova Matriz Econômica,8 8 O nome foi utilizado pelo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, em entrevista ao jornal Valor Econômico publicada em 17 de dezembro de 2012. Segundo Holland, a nova matriz “combina juros baixos, taxa de câmbio competitiva e uma consolidação fiscal ‘amigável ao investimento’” (ROMERO, 2012). Dois dias depois, em 19 de dezembro, Guido Mantega (2012) emprega o mesmo termo em artigo publicado também no Valor Econômico. Ainda que a expressão tenha se difundido somente após essas duas manifestações, Mantega já a utilizara para se referir à mudança de política econômica do governo Dilma em 05 de julho de 2012, no jornal O Estado de S. Paulo (ABREU, 2012). o conjunto de medidas contemplava demandas históricas do empresariado industrial brasileiro, dentre as quais se destacam a redução da taxa básica de juros (SELIC) e dos spreads bancários; ampliação das linhas de crédito subsidiado do BNDES para investimentos; desoneração da folha de pagamentos e do imposto sobre produtos industrializados (IPI) para diversos setores produtivos; desvalorização cambial, elevação de alíquotas sobre importados e políticas de conteúdo local; e redução das tarifas de energia elétrica. Ressalta-se ainda a criação do Plano Brasil Maior, nova política industrial com parâmetros e incentivos para diferentes setores produtivos.

Atender à agenda econômica da burguesia industrial implicava confrontar interesses da fração financeira do capital, interferindo diretamente em seu lucro. Para além da redução da taxa básica de juros ao menor patamar até então, o episódio conhecido como “batalha dos spreads” (SINGER, 2015SINGER, André. Cutucando onças com varas curtas. Novos Estudos - CEBRAP. São Paulo, v. 34, n. 2, p. 39-67, jul. 2015.) é bastante elucidativo: a presidenta não apenas forçou os bancos privados a reduzirem os juros cobrados nos empréstimos, como tornou o conflito público, a partir de diversas falas e manifestações. Em tônica bastante distinta do acento conciliador que orientou os governos Lula, Rousseff, argumenta Bastos (2017)BASTOS, Pedro Paulo Zahluth. Ascensão e crise do governo Dilma: poder estrutural, contradição e ideologia. Revista de Economia Contemporânea, Rio de Janeiro, número especial, p. 1-63, 2017., decidiu enfrentar o poder estrutural do capital financeiro, de modo a minimizar o rentismo com a dívida pública e beneficiar os investimentos produtivos.

Cumpre assinalar que tal programa econômico não partiu de simples voluntarismo da presidenta. Pelo contrário, segundo a hipótese de Singer (2018, p. 39)SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018., Dilma teria apostado em uma coalizão produtivista, formada pela aliança entre empresariado industrial e trabalhadores, para “sustentar uma virada desenvolvimentista”9 9 A qualificação “desenvolvimentista” suscita polêmica, sobretudo entre economistas, acerca de sua validade para compreender a política econômica de Dilma Rousseff em seu primeiro mandato. No entanto, o fundamental aqui é ressaltar o caráter antiliberal da experiência, isto é, a intervenção do Estado na economia. Sobre isso, ver: Bastos (2012) e Cepêda (2012). na economia brasileira e, assim, recolocar o país nos trilhos do crescimento econômico, cujos primeiros sinais de arrefecimento já apareciam em 2011. Isto é, em meio à crise mundial - naquele momento centralizada na Europa - e às queixas dos produtivistas10 10 O documento Brasil do diálogo, da produção e do emprego, lançado em maio de 2011 pela FIESP, pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), pela Força Sindical e pelos Sindicatos de Metalúrgicos do ABC e de São Paulo e Mogi das Cruzes, talvez seja uma das maiores evidências da coligação entre empresários industriais e trabalhadores e de seu suporte às ações de Dilma e Mantega. contra o aumento crescente de importações - o que acelerava o processo de desindustrialização -, Dilma enxergou nova janela de oportunidade para um projeto de desenvolvimento com sustentação local, implementando medidas que favorecessem o investimento privado no setor industrial. Aliás, foi justamente contando com o suporte político da aliança produtivista que a presidenta foi capaz de enfrentar interesses da coalizão rentista, constituída pelo capital financeiro e pela classe média tradicional (SINGER, 2016SINGER, André. A (falta de) base política para o ensaio desenvolvimentista. In: SINGER, André; LOUREIRO, Isabel (orgs.). As contradições do lulismo: a que ponto chegamos? São Paulo: Boitempo, 2016. p. 21-54.).

Contudo, à medida que o programa da Nova Matriz era implementado, os empresários industriais, “em lugar de darem apoio, foram progressivamente se afastando do governo, alinhando-se lenta e continuamente ao bloco rentista - como se cada gesto para efetivar o rol de medidas por eles mesmos proposto fizesse crescer o temor do ‘estatismo’, criando desconfiança” (SINGER, 2018SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018., p. 59). Atacada pelo setor financeiro e pelos meios de comunicação em massa, e desprovida do apoio dos empresários industriais, cada vez mais alinhados ao discurso rentista do excesso de intervencionismo e da necessidade de aperto fiscal, Dilma se vê isolada e passa a recuar ponto a ponto, em uma tentativa, sem sucesso, de retomar o diálogo com o empresariado. O abandono definitivo da Nova Matriz veio ainda em 2014, com a saída de Mantega e a escolha do ortodoxo Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, cedendo às pressões pelo ajuste fiscal - em clara contradição com o discurso proferido durante a campanha eleitoral daquele ano. A reorientação do governo, no entanto, não abrandou o cenário político e econômico, e Dilma Rousseff é deposta em agosto de 2016, com amplo apoio de empresários industriais, notadamente da outrora aliada Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP).

A oposição dos setores rentistas ao programa da Nova Matriz já era aguardada, haja vista o avanço sobre seus interesses. A presidenta não contava, entretanto, com a oposição do próprio empresariado industrial, cuja agenda econômica vinha sendo implementada. Para Singer (2018)SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018., o que explica a falência do experimento dilmista seria justamente esse deslocamento político da burguesia industrial, desfazendo a aliança com os trabalhadores que sustentava o governo. Uma vez rompida a coalizão produtivista, os empresários industriais passam a compor uma frente única burguesa antidesenvolvimentista (SINGER, 2018SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018.) em defesa de uma plataforma de ortodoxia neoliberal e, no limite, da deposição de Rousseff.

Desde uma mirada semelhante, isto é, a análise das classes e suas frações na política, cabe destacar a hipótese do também cientista político Armando Boito Jr. (2018)BOITO JR., Armando. Reforma e crise política no Brasil: os conflitos de classe nos governos do PT. Campinas, SP: Editora da Unicamp / São Paulo: Editora Unesp, 2018., segundo o qual os governos do Partido dos Trabalhadores (PT) significaram a conquista de hegemonia no bloco do poder por parte da grande burguesia interna,11 11 Influenciado por Poulantzas (1975), Boito Jr. (2018) compreende a burguesia interna como uma fração de classe burguesa situada em posição intermediária entre a velha burguesia nacional e a burguesia associada ao capital estrangeiro. Ainda que não completamente hostil ao capital internacional, a burguesia interna possui uma base de acumulação própria, competindo, na economia nacional, com a burguesia associada. rebaixando a burguesia associada e o capital internacional a uma posição secundária. Para isso, foi necessário que a grande burguesia interna, em aliança com o movimento sindical e popular, constituísse uma frente política neodesenvolvimentista que sustentasse os governos do PT e lhes oferecesse as diretrizes de política econômica. A derrubada de Dilma em 2016, assim, é resultado do esgarçamento dessa aliança política. Para Boito Jr. (2018)BOITO JR., Armando. Reforma e crise política no Brasil: os conflitos de classe nos governos do PT. Campinas, SP: Editora da Unicamp / São Paulo: Editora Unesp, 2018., o acirramento das contradições no interior da frente neodesenvolvimentista, sobretudo aquelas ligadas ao conflito entre capital e trabalho, levou a burguesia interna a engrossar a ofensiva restauradora do capital estrangeiro e do campo neoliberal. Uma vez rompida a aliança de sustentação, Dilma é incapaz de resistir ao impeachment.

As interpretações de Singer e Boito Jr., ainda que divirjam na definição daquela que seria a contradição de classe fundamental - o conflito entre capital produtivo e capital financeiro, ou a disputa entre capital nacional e capital estrangeiro -, conferem centralidade à ação política da burguesia no ocaso do governo Dilma. Isto não significa, é claro, que a crise política se encerre em apenas uma dimensão, mas somente que, no caso de Singer e Boito Jr., bem como na perspectiva aqui assumida, a atuação política do empresariado, sobretudo daquele ligado à indústria, assume papel determinante.

Há, evidentemente, trabalhos que se concentram em outras esferas. Na seara da Economia, Carvalho (2018)CARVALHO, Laura. Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018. vê a derrocada de Dilma como resposta aos efeitos negativos da política econômica adotada. Para a economista, a “Agenda FIESP” implementada pelo governo reduziu os investimentos públicos e atribuiu ao investimento privado produtivo, através de desonerações tributárias, de controle de custos e de redução dos juros, a responsabilidade de recolocar o país na trilha do crescimento. Isto é, na visão de Carvalho (2018)CARVALHO, Laura. Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., no lugar de solucionar os problemas do modelo de crescimento do segundo governo Lula, a presidenta optou por um certo tipo de “desenvolvimentismo” equivocado. O resultado foi desastroso. Segundo Carvalho (2018)CARVALHO, Laura. Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia, 2018., a política econômica de Dilma, além de transferir renda para o empresariado, produziu graves desequilíbrios, conduzindo o país a uma de suas mais graves crises, e terminou com o impeachment e o retorno da austeridade. Em outra chave, Rugitsky (2015RUGITSKY, Fernando. Do ensaio desenvolvimentista à austeridade: uma leitura kaleckiana. In: BELLUZZO, Luiz Gonzaga de Mello; BASTOS, Paulo Zahluth (orgs.). Austeridade para quem? Balanço e perspectivas do governo Dilma Rousseff. São Paulo: Carta Maior/ Friedrich Ebert Stiftung, 2015. p. 131-137.; 2017)RUGITSKY, Fernando. The rise and fall of the Brazilian economy (2004-2015): the economic antimiracle. Departamento de Economia (FEA-USP): Working Paper Series no 2017-29, 2017. Disponível em: Disponível em: http://www.repec.fea.usp.br/documentos/FernandoRugitsky_29WP.pdf . Acesso em 27 jun. 2019.
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e Serrano e Summa (2018)SERRANO, Franklin; SUMMA, Ricardo. Conflito distributivo e o fim da “breve era de ouro” da economia brasileira. Novos Estudos - CEBRAP. São Paulo, v. 37, n. 2, p. 175-189, maio-ago. 2018. se concentram no conflito distributivo entre capital e trabalho. Para os autores, os sucessivos aumentos salariais ocorridos no governo Dilma teriam impactado negativamente os lucros do empresariado - como Rugitsky (2017)RUGITSKY, Fernando. The rise and fall of the Brazilian economy (2004-2015): the economic antimiracle. Departamento de Economia (FEA-USP): Working Paper Series no 2017-29, 2017. Disponível em: Disponível em: http://www.repec.fea.usp.br/documentos/FernandoRugitsky_29WP.pdf . Acesso em 27 jun. 2019.
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denomina, um ciclo de profit squeeze. Nessa linha, o impeachment seria resultado da reação dos empresários à redução das taxas de lucro imposta pela política econômica e pelos ganhos reais dos trabalhadores.

A análise das declarações empresariais publicadas no Valor Econômico permitiu iluminar pontos importantes da posição política da burguesia industrial no decurso do primeiro mandato de Rousseff. Diferentemente do que algumas interpretações sugerem, a oposição ao governo e à Nova Matriz, por parte do empresariado da indústria, não se materializou em 2014, quando o país estagnava e marchava rumo à recessão de 2015 e 2016, mas em 2013, momento em que a economia se expandia e parecia se recuperar do baixo crescimento de 2012. Isto é, os dados indicam que o componente econômico em si pode não ser suficiente à compreensão do movimento da burguesia industrial em direção à frente que derrubou Rousseff em 2016. Escapa ao escopo deste artigo a formulação de hipóteses que elucidem as motivações para o movimento do empresariado industrial, no entanto, as evidências encontradas podem auxiliar na formulação de novas agendas de pesquisa.

Este artigo se divide em três seções. Na primeira delas, a seguir, procuramos discutir a metodologia utilizada na produção dos dados aqui expostos. Na segunda, apresentamos os resultados obtidos com a leitura e análise das edições do periódico Valor Econômico e detalhamos o posicionamento dos empresários industriais em cada ano do primeiro mandato. Finalmente, na última seção, confrontamos os resultados obtidos com a hipótese geral que orientou este trabalho.

Metodologia

As manifestações do empresariado industrial em relação ao governo Dilma Rousseff foram coletadas a partir da leitura integral - isto é, de todos os cadernos - das edições impressas12 12 O acesso às edições se deu através do sistema disponível no site do próprio jornal. do jornal Valor Econômico publicadas no decurso do primeiro mandato (2011-2014), em um total de 1016 exemplares. O recurso à análise de periódicos, sobretudo daqueles especializados, como aqui é o caso, é frequente em estudos da Ciência Política sobre o empresariado brasileiro. Os trabalhos de Bianchi (2004)BIANCHI, Álvaro. Um ministério dos industriais: a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo na crise das décadas de 1980 e 1990. Campinas: Unicamp, 2004., Cruz (1995)CRUZ, Sebastião Velasco e. Empresariado e Estado na transição brasileira: um estudo sobre a economia política do autoritarismo (1974-1977). Campinas: Unicamp /Fapesp, 1995. e Diniz (1978)DINIZ, Eli. Empresário, estado e capitalismo no Brasil: 1930-1945. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978. são exemplos importantes de pesquisas que se utilizam desse tipo de fonte empírica. Mais do que um meio de informação, os jornais especializados funcionam por vezes como instrumento de manifestação pública.

O periódico Valor Econômico13 13 Lançado em maio de 2000 pelos grupos Folha e Globo, com 50% de participação de cada sócio, desde 2016 o jornal é controlado unicamente pelo Grupo Globo (ROSA, 2020). foi escolhido por conta de seu prestígio e importância no setor empresarial, contando com presença constante de membros do empresariado brasileiro em reportagens e entrevistas. O jornal funciona, assim, como canal de diálogo dos empresários entre si e como importante instrumento de reivindicação e de crítica ao governo e sua política econômica. Ademais, o fato de o jornal ser diário permitiu verificar a reação imediata a determinadas medidas e ofereceu uma amostra significativa de notícias. A ampla circulação e abrangência nacional do diário também é de fundamental importância, tendo em vista que permite acessar opiniões de empresários de diferentes regiões do país, possibilitando, assim, uma maior robustez dos dados no que diz respeito ao panorama nacional.

Compreendem-se como empresários industriais todos aqueles ligados à indústria extrativa, à indústria de transformação, ao setor de eletricidade e gás e ao setor de construção, seguindo a classificação14 14 CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) 2.0, publicada pelo IBGE em 2006. Os setores mencionados correspondem, respectivamente, às seções B, C, D e F. do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Durante a leitura dos cadernos, foram identificados os posicionamentos de empresários industriais com relação ao governo e suas determinações econômicas. Foram selecionadas as matérias que continham citações diretas de empresários industriais. As citações indiretas foram incluídas somente quando acompanhadas da identificação do empresário, da empresa ou entidade que representa. Cada um dos posicionamentos foi avaliado e registraram-se, além do nome do empresário ou entidade, o setor industrial correspondente (de acordo com a CNAE 2.0) e o objeto da declaração.

A classificação dos posicionamentos foi realizada com a metodologia de atribuição de valência,15 15 Metodologia semelhante àquela adotada pelo Manchetômetro, site de acompanhamento da cobertura da grande mídia sobre temas de economia e política produzido pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP) sediado no IESP-UERJ. Ver: Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP), Manchetômetro, [s.d]. Disponível em: http://manchetometro.com.br. Acesso em: 23 ago. 2021. em uma escala linear, tendo como unidade de análise as declarações feitas por empresários industriais em relação ao governo federal ou às políticas econômicas, sendo essas divididas entre políticas setoriais e macroeconômicas. Essa classificação possibilitou uma análise das frequências simples das valências, isto é, das porcentagens dos posicionamentos empresariais que eram favoráveis, contrários ou neutros ao governo Dilma. Os posicionamentos foram classificados a partir da seguinte questão: essa declaração empresarial é negativa, positiva ou ambivalente/inconclusiva em relação à atuação do governo federal ou às diretrizes econômicas?

Consideraram-se favoráveis os elogios a determinadas medidas, ao cenário econômico e ao governo. Também foram entendidas como favoráveis as manifestações que relacionam o bom desempenho econômico, seja da empresa, do setor industrial ou da economia em geral, a determinadas políticas econômicas. Um exemplo de manifestação classificada como favorável é a do presidente da Eletros, Lourival Kiçula, que, em 2012, atribuiu à política de desoneração do IPI a razão de crescimento nas vendas do setor: “se não fosse a desoneração do IPI, fecharíamos o ano passado no negativo, mas as vendas acabaram crescendo 1,4% [na comparação com 2010] devido ao efeito do IPI já em dezembro” (GIFFONI, 2012bGIFFONI, Carlos. Indústria espera alta de vendas, mas queda de preço é incógnita. Valor Econômico, 28 mar. 2012b. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2012/03/28/industria-espera-alta-de-vendas-mas-queda-de-preco-e-incognita.ghtml . Acesso em: 05 jul. 2021.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2...
).

As declarações que criticavam o governo ou suas políticas, bem como aquelas que expressavam prejuízos decorrentes de medidas governamentais, foram classificadas como contrárias. Exemplo de manifestação desfavorável é a de Ágide Meneguete, diretor-superintendente do grupo Santa Terezinha, que criticou a política intervencionista do governo: “É preciso que a intervenção [do Estado] seja a mínima possível. A presença do governo na definição dos preços dos combustíveis vem prejudicando duramente o setor produtor de etanol” (EMPRESÁRIOS..., 2013EMPRESÁRIOS pedem regras mais claras. Valor Econômico, 20 out. 2013. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2013/08/20/empresarios-pedem-regras-mais-claras.ghtml . Acesso em: 05 jul. 2021.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2...
). Outro tipo de declaração categorizada como desfavorável é a de Luiz Aubert Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), que desaprovou a política cambial e a relação com o governo: “parece um diálogo de surdo-mudo. Esse câmbio está matando e ninguém faz nada” (GIFFONI, 2011GIFFONI, Carlos. Planos do governo não estão funcionando, diz indústria. Valor Econômico, 25 out. 2011. Disponível em: Disponível em: https://sindivestuario.org.br/planos-do-governo-nao-estao-funcionando-diz-industria/ . Acesso em: 22 out. 2021.
https://sindivestuario.org.br/planos-do-...
).

Foram julgadas como neutras aquelas que se mostraram inconclusivas, como o caso de um executivo que aguardava pela definição do cenário para se posicionar ou na ocasião em que o empresário faz ponderações positivas e negativas, sem predominância de nenhuma delas. Em geral, manifestações desse segundo tipo são aquelas nas quais os empresários elogiam a postura do governo, mas com a mesma ênfase censuram outra medida, ou, ao contrário, elogiam a medida, mas insinuam que os efeitos podem ser restritos. Um exemplo do segundo tipo de posicionamento neutro é a de Carlos Pastoriza, também presidente da Abimaq, que “afirma que a atitude do governo [de volta do Reintegra] é importante, mas que o reflexo para o setor é pequeno” (MARTINS; PUPO; ALONSO, 2014MARTINS, Diogo; PUPO, Fábio; ALONSO, Olivia. Incentivos dados pelo governo ajudam, mas não viram o jogo. Valor Econômico, 07 set. 2014. Disponível em: Disponível em: https://www.valor.com.br/virador/#/edition/43763?page=3§ion=1 . Acesso em: 07 jul. 2021.
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). Outro caso de declaração classificada como neutra, do primeiro tipo, é a de Maurílio Schmitt, coordenador do departamento econômico da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), na qual ele afirma que “ainda é cedo para medir a real eficácia das medidas de estímulo à indústria anunciadas pelo governo em abril e também o impacto da redução da taxa de juros” (LIMA, 2012LIMA, Marli. Vendas da indústria do Paraná caem 0,65% no primeiro trimestre. Valor Econômico, 07 mai. 2012. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2012/05/07/vendas-da-industria-do-parana-caem-065-no-primeiro-trimestre.ghtml . Acesso em: 07 jul. 2021.
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).

Houve ainda declarações nas quais o empresário tecia elogios a determinada diretiva econômica e, simultaneamente, considerava-a insuficiente. Esse tipo de posicionamento foi julgado em debate entre pares, tomando como referência o contexto em que se inseria a reportagem e a fala do empresário. Classificaram-se como favoráveis as declarações em que, ainda que houvesse crítica a determinada limitação ou insuficiência, a cobrança ao governo fosse no sentido de se aprofundar, ampliar ou tornar permanente a resolução econômica em questão. Vejamos um caso concreto. Heitor Klein, então presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) afirmou que “a desoneração [da folha de pagamentos] foi um bom caminho, mas ainda insuficiente: é necessário aprofundar esse tipo de medida e que o governo seja mais ousado” (PEDROSO, 2013PEDROSO, Rodrigo. Setor desonerado não supera média da indústria. Valor Econômico, 24 jan. 2013. Disponível em: Disponível em: https://www.valor.com.br/virador/#/edition/44125?page=2§ion=1&word=setor%20desonerado%20n%C3%A3o%20supera . Acesso em: 07 jul. 2021.
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). Isto é, Klein demonstra concordância com as diretrizes econômicas do governo e deseja que se continue avançando.

Por outro lado, entendeu-se como desfavorável a declaração que, muito embora valorizasse certa medida pontual, clamasse por mudanças na condução da economia. É ilustrativo o caso em que o então gerente de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, ainda que avaliasse positivamente as medidas anunciadas para a indústria, reivindica uma política industrial de características distintas (RESENDE; MARCHESINI, 2012RESENDE, Thiago; MARCHESINI, Lucas. Após medidas, CNI reduz projeção para o setor. Valor Econômico, 13 abr. 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/2614284/apos-medidas-cni-reduz-projecao-para-o-setor . Acesso em: 19 maio 2019.
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).

Os dados coletados e sistematizados seguindo a metodologia apresentada ainda foram objeto de verificação entre pares. A base de dados resultante é consistente: o quantitativo de posicionamentos e setores industriais de cada ano é semelhante, registraram-se poucas manifestações neutras ou inconclusivas e, sobretudo, não houve variações erráticas no período tratado.

Por fim, cumpre apontar alguns dos limites dessa metodologia. Conforme argumenta Miguel (2015)MIGUEL, Luis Felipe. Quanto vale uma valência? Revista Brasileira de Ciência Política, n. 17, p. 165-178, 2015. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbcpol/a/fpBKv3bYGqhQRgs5HRJkJyR/?format=pdf⟨=pt . Acesso em: 22 jul. 2021.
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, ao se estabelecer somente três valências, torna-se impossível a mensuração de graus mais ou menos significativos de crítica ou apoio ao governo. Assim, uma crítica às diretrizes de uma política setorial específica tem o mesmo peso que uma crítica mais dura à condução do governo, ou ainda, um elogio à política macroeconômica equipara-se a um elogio explícito ao governo. Ademais, os significados dos posicionamentos neutros ficam pouco esclarecidos: em momento de acirramento dos conflitos entre empresariado e governo, uma declaração neutra pode ter um peso político diferente do que em um momento de maior harmonia. No entanto, deve-se ressaltar, a categoria neutra não pressupõe imparcialidade do empresário, indica tão somente que não foi possível extrair de determinada declaração um posicionamento predominantemente favorável ou contrário. Uma estratégia aqui adotada que se mostrou eficaz em amenizar algumas dessas limitações consiste em associar o exame do banco de dados à avaliação das declarações e do contexto em que se inserem, ou seja, não se restringir somente às estatísticas descritivas dos dados.

Em geral, os empresários costumam elogiar ou criticar diretamente as regulamentações econômicas e, em menor escala, o governo, precisamente porque as medidas podem ser julgadas positivas ou negativas a depender do efeito previsto sob o desempenho econômico da empresa ou setor industrial que se manifesta (FERES JÚNIOR, 2016FERES JÚNIOR, João. Em defesa das valências: uma réplica. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 19, p. 277-298, 2016. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbcpol/a/Gg58w6gDjwLbhqqnMnr4qtR/?format=pdf⟨=pt . Acesso em: 06 jul. 2021.
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). Assim, por mais que existam declarações técnicas em torno dos critérios regulatórios de determinadas diretrizes econômicas, elas indicam maior ou menor acirramento do conflito entre governo e empresariado, o que torna a metodologia adequada ao objetivo desta pesquisa, mesmo que com os limites apontados.

Resultados

Analisaram-se, ao todo, 854 declarações empresariais sobre o governo ou suas políticas econômicas entre 2011 e 2014, em uma média de 213 manifestações por ano. Raramente as declarações fazem avaliações explícitas sobre o governo. Em geral, os empresários comentam sobre políticas econômicas setoriais ou macroeconômicas e como elas se refletem no desempenho de seu setor industrial ou de sua empresa. Como demonstra a tabela 1, de maneira geral, a divisão entre posicionamentos sobre política macroeconômica e sobre política setorial foi equilibrada durante os primeiros quatro anos de governo Rousseff:

Tabela 1.
Objeto das declarações no primeiro mandato Dilma Rousseff (2011-2014)

No decorrer de todo o primeiro mandato, e em cada um dos quatro anos, as entidades multissetoriais, isto é, associações transversais aos setores da indústria, foram as que mais se manifestaram, totalizando 156 posicionamentos no período. A CNI16 16 A presença expressiva da CNI, em comparação não apenas com as empresas individuais, mas também com federações, corrobora com a literatura sobre a atuação política empresarial. Conforme Mancuso (2007a) demonstra, a CNI, por ser a maior instância de representação dos interesses empresariais e por ter amplos recursos, é a entidade que costuma atuar como empreendedor político e arcar com a mobilização em torno de temas que unificam a indústria. e a FIESP contaram com maior presença no jornal, concentrando 89,7% dos posicionamentos emitidos por multissetoriais.17 17 Somando todas as federações industriais de outros estados que se manifestaram durante o período analisado (FIEA, FIEAM, FIEB, FIEC, Firjan, FIEP e FIESC), têm-se apenas 16 declarações.

Conforme ilustrado na tabela 2, as entidades multissetoriais tendem a se manifestar mais frequentemente sobre políticas macroeconômicas (68,6%) do que setoriais (31,4%), o que é compatível com sua função de ser porta-voz da indústria como um todo.

Tabela 2.
Caracterização das declarações de entidades multissetoriais no primeiro mandato Dilma Rousseff (2011-2014)

Via de regra, as manifestações sobre as políticas setoriais são elogios a medidas já implementadas. Por seu turno, as políticas macroeconômicas mostraram-se fonte de maior oposição (Tabela 2).

Além das entidades multissetoriais, em média, cerca de 20 setores industriais se manifestaram por ano no jornal, todavia, a composição mostrou-se volátil ao longo dos anos. Isto pode ser explicado, principalmente, pelo anúncio de novas medidas setoriais pelo governo. À medida que essas foram anunciadas, novos temas, envolvendo diferentes setores, foram trazidos à baila. Na tabela 3, constam os cinco setores que mais se posicionaram em cada ano analisado:

Tabela 3.
Cinco setores com maior número de posicionamentos por ano

A partir da leitura das matérias e sistematização dos dados coletados, constatou-se que, ao longo de 2011-2014, o posicionamento dos industriais em relação ao governo variou de apoio à oposição. Isto é, ao menos até o segundo ano de mandato, as medidas anunciadas por Dilma Rousseff e sua equipe estavam em consonância com as demandas e interesses dos empresários industriais. No entanto, a partir do terceiro ano (2013), a posição dos mesmos empresários se altera, e as críticas à Nova Matriz se intensificam, consolidando, em 2014, um posicionamento majoritariamente contrário ao governo, como demonstrado na tabela 4 e no gráfico 1.

Tabela 4.
Posicionamentos de industriais no primeiro mandato Dilma Rousseff (2011-2014) por ano

Gráfico 1.
Posicionamentos de industriais no primeiro mandato Dilma Rousseff (2011-2014) por ano

O mandato se inicia, em 2011, com um empresariado industrial dividido, mas que se torna mais favorável ao governo em 2012, com um aumento de cerca de 32 pontos percentuais de apoio, chegando a 72,9%. No meio do mandato, em 2013, apesar de ainda haver uma maioria de apoio (59,3%) entre os empresários, as manifestações favoráveis já indicam significativamente uma tendência de perda de apoio de Dilma, a qual se consolida no ano de 2014, quando cai para 17%. Os dados indicam que a inflexão do posicionamento do empresariado frente ao governo se deu ao longo do ano de 2013, mais especificamente, do primeiro para o segundo semestre (ver gráfico 2). No último ano do primeiro mandato, observa-se, assim, a inversão do posicionamento dos empresários: de uma postura abertamente favorável ao governo, deslocam-se para ampla rejeição.

Gráfico 2.
Posicionamentos de industriais no primeiro mandato Dilma Rousseff (2011-2014) por semestre

Em 2011, o empresariado pressiona o governo, ao criticar principalmente sua política macroeconômica. A mais frequente fonte de descontentamento é o avanço dos produtos importados, em especial chineses, no país. A avaliação de que o câmbio valorizado é um dos principais fatores que contribuem para esse cenário mostrou-se consensual entre os empresários. São apontados também como fatores importantes nesse processo a crise internacional, a chamada “guerra dos portos”,18 18 A “guerra dos portos” é como ficou conhecida a prática de alguns estados, em especial Santa Catarina, Espírito Santo e Goiás, de oferecer incentivos fiscais aos produtos importados. Esse foi o tema do Projeto de Resolução do Senado 72/10, de autoria do então Líder do Governo no Senado, Romero Jucá, que propôs a equalização da alíquota do ICMS interestadual para produtos importados não industrializados. O PRS 72 foi apoiado por empresários e pelo governo federal. Em votação conflituosa, o projeto foi aprovado em abril de 2012, e elogiado por entidades empresariais. e os encargos trabalhistas. Diante disso, os empresários reivindicavam a desvalorização do Real, a diminuição da carga tributária e medidas de defesa comercial. Outra pauta frequente no ano foi a elevada carga tributária, em especial os encargos relativos à energia elétrica - a questão da energia foi tratada com a MP579. Contudo, no segundo semestre, há retomada da confiança, tendo em vista o anúncio do Plano Brasil Maior - amplo pacote de medidas de incentivo à indústria, desoneração da folha de pagamentos e políticas de conteúdo local e proteção contra importados.

No ano seguinte, por sua vez, observa-se a reação dos empresários industriais à implementação do Plano Brasil Maior, com expectativas positivas. Esperava-se a retomada da produção industrial nos meses seguintes, o que fortaleceria a indústria nacional em meio à crise financeira internacional - fator intensificador da concorrência pelos mercados interno e externo. O empresário André Gerdau, presidente do conselho diretor do Instituto Aço Brasil, fez uma avaliação do governo em entrevista ao Valor: “No geral, tenho uma avaliação positiva. Seu governo [de Dilma Rousseff] vem tomando as medidas necessárias para retomada do crescimento da economia, com ações de estímulo ao consumo, ao se reduzir juros e facilitar o crédito” (RIBEIRO, 2012RIBEIRO, Ivo. Maior risco é o contágio da crise do euro, diz Gerdau. Valor Econômico, 14 jun. 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/empresas/2713978/maior-risco-e-o-contagio-da-crise-do-euro-diz-gerdau . Acesso em: 10 jun. 2019.
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). As críticas iniciais surtiram efeito: pressionada pelo empresariado industrial, Dilma responde com a implementação da agenda econômica proposta. Quanto à política setorial, as principais medidas elogiadas foram a desoneração da folha de pagamentos e a isenção do IPI. Ambas foram compreendidas como esforços do governo para fortalecer a competitividade da indústria nacional. Diferentemente de 2011, o câmbio foi objeto de diversas declarações favoráveis, o que era de se esperar, já que a equipe econômica criou diferentes instrumentos para reverter a valorização da moeda. A queda da taxa de juros mostrou-se ainda mais consensual: das 22 declarações sobre esse tema, 18 foram favoráveis.

Apesar de avaliarem que o governo tinha boas intenções e buscava aumentar a competitividade da indústria brasileira, alguns empresários se preocupavam com a falta de medidas estruturais: Marcello Stewers, da Teka, assinala que as intenções do governo são boas, mas que o plano não será eficaz para solucionar os obstáculos enfrentados pela indústria naquele ano (WATANABE, 2012WATANABE, Marta. Brasil maior não amplia planos de exportação. Valor Econômico, 20 jan. 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/2492946/brasil-maior-nao-amplia-planos-de-exportacao . Acesso em: 19 mai. 2019.
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); no mesmo sentido, Flávio Castelo Branco, da CNI, declara que o pacote de medidas de incentivo à indústria é positivo, porém seus resultados são insuficientes por se manifestarem com “defasagem” (RESENDE; MARCHESINI, 2012RESENDE, Thiago; MARCHESINI, Lucas. Após medidas, CNI reduz projeção para o setor. Valor Econômico, 13 abr. 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/2614284/apos-medidas-cni-reduz-projecao-para-o-setor . Acesso em: 19 maio 2019.
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). Malgrado as críticas, feitas em abril de 2012, a posição de Castelo Branco se altera significativamente cinco meses mais tarde. Em setembro do mesmo ano, o então gerente de política econômica da CNI afirma: “Existe uma mudança relevante na política econômica. As medidas de estímulo mais recentes buscam reduzir o custo da produção e destravar gargalos. [...] [a preocupação do governo] está em atacar questões estruturais pela oferta, e não simplesmente enfrentar as dificuldades apenas com medidas de estímulo à demanda” (DESONERAÇÃO..., 2012DESONERAÇÃO já atinge 25% da indústria. Valor Econômico, 14 set. 2012. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2012/09/14/desoneracao-ja-atinge-25-da-industria-1.ghtml . Acesso em: 20 jul. 2021.
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). Ante a pressão inicial de Castelo Branco, novamente, o governo parece ter alinhado a agenda econômica aos interesses empresariais.

O ano de 2013, como visto nos gráficos 1 e 2, é momento chave na compreensão da mudança de posição do empresariado industrial. A observação mais detida, com o detalhamento por semestres oferecido pelo gráfico 2, revela que o apoio à Dilma e à Nova Matriz Econômica tem seu auge no segundo semestre de 2012, com 79,4% de posicionamentos favoráveis, tendência que se altera no primeiro semestre de 2013. A virada se concretizou, efetivamente, no segundo semestre de 2013, com uma maioria de posicionamentos contrários (57,1%) que cresceu ainda mais nos últimos dois semestres do primeiro mandato (2014). É fundamental notar que 2013 foi um ano em que a economia brasileira ainda apresentava crescimento econômico19 19 Segundo dados do IBGE, o crescimento econômico em 2012 foi de 1,9% e, em 2013, 3,0%. - inclusive, expansão superior àquela de 2012 -, e, tratando-se especificamente da indústria e do setor de construção, os dados do Sistema de Contas Nacionais do IBGE assinalam que o valor adicionado bruto desses setores, somados, teve crescimento de 8,2% em 2013, estagnando a partir do ano seguinte (ver gráfico 3). Nesse sentido, a dimensão econômica parece não ser suficiente para elucidar as motivações por detrás dessa movimentação.

Gráfico 3.
Valor adicionado bruto indústria e setor de construção (CNAE 2.0 B, C, D e F) em R$ mi constante (base 2010)

O governo saiu de um 2012 altamente positivo e conseguiu manter esse apoio no primeiro semestre de 2013, no entanto, daquele momento até o fim de 2014, os empresários manifestaram-se, em sua maioria, contrários a Rousseff e suas diretrizes econômicas. A desoneração da folha de pagamentos continuou sendo um tema que concentrou as declarações favoráveis do empresariado. Em 2013 também foram alvos relevantes de elogios as medidas provisórias da Luz (MP 579)20 20 A avaliação empresarial sobre a MP 579, apesar de majoritariamente favorável, não foi consensual. A Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (ABRACE), por meio de seu presidente-executivo, Paulo Pedrosa, recorrentemente criticou a medida, argumentando que ela agrava as distorções do mercado, que tornam as grandes indústrias consumidoras de energia elétrica subsidiadoras do sistema (PEDROSA, 2013). e dos Portos (MP 595), os programas sociais Minha Casa Melhor e Minha Casa Minha Vida e a ampliação da oferta de crédito, em especial da linha do Programa de Sustentação do Investimento (PSI).

O segundo semestre de 2013, contudo, inicia-se com desconfiança em relação ao governo. É a primeira vez, desde 2011, que a inflação e o “intervencionismo estatal” surgem como preocupações dos empresários - muito embora tal “intervencionismo” tenha ocorrido para promover a agenda econômica por eles mesmos proposta. As críticas em relação à insuficiência da política setorial tornam-se mais recorrentes. Além de críticas mais diretas aos aumentos salariais em comparação à produtividade, duas manifestações de empresários são bastante elucidativas. Em entrevista concedida ao Valor em dezembro de 2013, Décio da Silva, presidente do conselho de administração da WEG, uma das maiores fabricantes de motores elétricos do Brasil, criticou o “excesso de poder” conquistado pela força de trabalho nos últimos anos e ressaltou a necessidade de uma reforma trabalhista (JURGENFELD, 2013JURGENFELD, Vanessa. “País não pode só viver na maré do consumo”, diz Décio da Silva. Valor Econômico, 10 dez. 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/3367244/pais-nao-pode-so-viver-na-mare-do-consumo-diz-decio-da-silva . Acesso em 20 maio 2019.
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). No mesmo sentido, Luiz Tarquínio, presidente da Fundição Tupy, criticou de maneira bastante dura o crescimento dos salários, afirmando que a ascensão da classe C “criou um problema” para as empresas (RITTNER et al., 2013RITTNER, Daniel et al. Dilma defende indústria, mas setor pede mais atenção. Valor Econômico, 12 dez. 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/3369682/dilma-defende-industria-mas-setor-pede-mais-atencao . Acesso em: 20 maio 2019.
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). Tais declarações oferecem evidências de um possível acirramento do conflito de classes, o que pode ter conduzido ao esgotamento da coalizão entre trabalhadores e empresários (SINGER, 2018SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018.). Ainda que Dilma e sua equipe tenham realizado medidas visando atender aos interesses do setor financeiro e do setor produtivo, como aperto fiscal (CALGARO, 2013CALGARO, Fernanda. Governo anuncia corte de R$ 10 bilhões no orçamento. UOL, 22 jul. 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.uol.com.br/noticias/redacao/2013/07/22/governo-anuncia-corte-de-r-10-bilhoes-no-orcamento.htm . Acesso em: 20 jul. 2021.
http://www.uol.com.br/noticias/redacao/2...
) e ampliação das taxas de retorno dos leilões de infraestrutura (AMATO, 2013AMATO, Fabio. Governo retoma nesta quarta programa de privatização de rodovias. G1, 18 set. 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.g1.globo.com/economia/negocios/2013/09/governo-retoma-nesta-quartafeira-programa-de-privatizacao-de-rodovias.html . Acesso em: 20 jul. 2021.
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) e, assim, retomar o diálogo com o empresariado, o ano de 2013 se encerra com o governo sob forte desconfiança.

Essa tendência de maior insatisfação por parte do empresariado industrial continua em 2014. Enquanto as declarações favoráveis se concentram em poucos temas, há grande variedade nos objetos de críticas. Mais uma vez a desoneração da folha de pagamentos é elogiada pelos empresários, assim como as linhas de crédito. Ao final do ano, a mudança na equipe econômica também é alvo de elogios, o que indica uma insatisfação com a condução econômica precedente - ainda que diversas demandas tenham sido contempladas. A inflação novamente se mostra um fator de preocupação para os industriais, e a alta carga tributária volta a concentrar declarações desfavoráveis. O tema do intervencionismo estatal manteve-se relevante em 2014 e é referenciado na discussão de regulamentações governamentais nos setores, principalmente em relação ao reajuste de preços - como foi o caso do setor sucroalcooleiro (MOREIRA, 2014MOREIRA, Assis. Unica destaca, na Suíça, a crise do etanol no Brasil. Valor Econômico, 08 out. 2014. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/agronegocios/noticia/2014/10/08/unica-destaca-na-suica-a-crise-do-etanol-no-brasil.ghtml . Acesso em: 20 ago. 2021
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).

Em relação ao câmbio, apesar de em geral mostrarem-se favoráveis à desvalorização, a imprevisibilidade e volatilidade cambial foram bastante criticadas pelo empresariado. Além disso, há o entendimento de que a desvalorização do real não seria mais capaz de compensar as demais assimetrias de competitividade. Em 2014, as medidas a curto prazo já não tinham o mesmo efeito e a indústria se encontrava novamente com dificuldades de competição com a concorrência internacional, tanto no mercado doméstico quanto no exterior. O gerente-executivo de Pesquisa e Competitividade da CNI, Renato da Fonseca, argumenta que “o problema principal não é conjuntural, mas estrutural. Ou seja, juros altos e inflação no teto atrapalham, mas a principal questão é a falta de competitividade da indústria brasileira, causada principalmente pela estagnação da produtividade nos últimos anos” (MARCHESINI; RODRIGUES, 2014MARCHESINI, Lucas; RODRIGUES, Lorenna. Crise da indústria começa a afetar o emprego, diz CNI. Valor Econômico, 04 jul. 2014. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/3604172/crise-da-industria-comeca-a-afetar-o-emprego-diz-cni . Acesso em: 22 mai. 2019.
http://www.valor.com.br/brasil/3604172/c...
). Carlos Pastoriza, diretor secretário da Abimaq, alega que “a maior preocupação do nosso setor, que é a mesma da indústria da transformação, é a de que o Brasil continue com um modelo baseado no foco à exportação de commodities e na destruição da indústria” (ALONSO, 2014aALONSO, Olivia. Setor de máquinas não vê reversão do déficit. Valor Econômico, 22 jan. 2014a. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/empresas/3402606/setor-de-maquinas-nao-ve-reversao-do-deficit . Acesso em: 23 mai. 2019.
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). Em documento da mesma associação, empresários demandavam do governo investimentos em infraestrutura e educação, além de esforços para aprovar as reformas política e tributária. Tais divergências entre empresariado e governo, em sua maioria, parecem não ter sido solucionadas ao longo do ano, ocorrendo poucos casos em que os empresários julgassem contempladas suas demandas:

a situação atual é resultado da valorização do real, da falta de investimentos produtivos no Brasil, de aumentos expressivos de salários - superiores ao aumento da produtividade das empresas, na avaliação da entidade - e dos altos juros do país. A solução proposta pela Abimaq são reformas políticas para a redução de gastos do governo, a desoneração da indústria e o aumento dos recursos disponíveis para investimentos no país. A queda dos gastos públicos, da inflação, dos juros e do real melhoraria a competitividade do setor”, argumenta a Abimaq em documento de reivindicações ao governo (ALONSO, 2014aALONSO, Olivia. Setor de máquinas não vê reversão do déficit. Valor Econômico, 22 jan. 2014a. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/empresas/3402606/setor-de-maquinas-nao-ve-reversao-do-deficit . Acesso em: 23 mai. 2019.
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).

Ao longo dos anos analisados foi possível constatar movimentações dos empresários no sentido de pressionar o governo a implementar medidas mais favoráveis a seus respectivos setores e empresas. Frequentemente, os empresários criticam as medidas - principalmente àquelas ligadas à política setorial -, cobram ajustes, alegam que são insuficientes. Não raro os empresários afetados por determinada medida se reúnem e lançam documentos apresentando suas demandas. Esse movimento se dá ao longo de meses, havendo diálogo entre governo e empresários, que se reúnem e ajustam as medidas criticadas inicialmente. A partir do momento em que o governo atende suas demandas e ajusta as medidas, o empresariado passa a elogiá-las. Nesse sentido, o governo procurava o diálogo com o empresariado industrial, atento a suas observações sobre as medidas apresentadas, e disposto a negociar. Alguns dos casos mais emblemáticos foram o da redução da alíquota da desoneração da folha de pagamentos em 2012 - demanda sobretudo do setor têxtil -, o do retorno da redução de alíquota do IPI a partir do segundo semestre de 2014 - pauta reivindicada especialmente pelo setor automobilístico - e o da desistência do governo em aumentar a tributação do setor de fabricação de cosméticos, também em 2014 (WATANABE, 2012WATANABE, Marta. Brasil maior não amplia planos de exportação. Valor Econômico, 20 jan. 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/2492946/brasil-maior-nao-amplia-planos-de-exportacao . Acesso em: 19 mai. 2019.
http://www.valor.com.br/brasil/2492946/b...
; GIFFONI, 2012aGIFFONI, Carlos. Alíquota de 1% beneficiaria 90% da indústria têxtil. Valor Econômico, 16 mar. 2012a. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2012/03/16/aliquota-de-1-beneficiaria-90-da-industria-textil.ghtml . Acesso em: 14 jun. 2021.
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; LAGUNA, 2014LAGUNA, Eduardo. Anfavea diz que governo errou ao subir IPI. Valor Econômico, 07 abr. 2014. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2014/04/07/anfavea-diz-que-governo-errou-ao-subir-ipi.ghtml . Acesso em: 22 jul. 2021.
https://valor.globo.com/empresas/noticia...
; MARTINS; PUPO; ALONSO, 2014MARTINS, Diogo; PUPO, Fábio; ALONSO, Olivia. Incentivos dados pelo governo ajudam, mas não viram o jogo. Valor Econômico, 07 set. 2014. Disponível em: Disponível em: https://www.valor.com.br/virador/#/edition/43763?page=3§ion=1 . Acesso em: 07 jul. 2021.
https://www.valor.com.br/virador/#/editi...
; MEYGE, 2014MEYGE, Adriana. Indústria tenta barrar mudança tributária. Valor Econômico, 28 mar. 2014. Disponível em: Disponível em: https://www.valor.com.br/virador/#/edition/43830?page=10&searching=true§ion=2&word=ind%C3%BAstria%20tenta%20barrar%20mudan%C3%A7a%20tribut%C3%A1ria . Acesso em: 22 jul. 2021.
https://www.valor.com.br/virador/#/editi...
; MALTA; ROMERO, 2014MALTA, Cynthia; ROMERO, Cristiano. Fazenda suspende plano para aumentar imposto. Valor Econômico, 08 abr. 2014. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2014/04/08/fazenda-suspende-plano-para-aumentar-imposto.ghtml . Acesso em: 22 jul. 2021.
https://valor.globo.com/empresas/noticia...
).

Vale notar que as medidas implementadas - tanto setoriais quanto macroeconômicas - não tiveram efeito homogêneo na indústria brasileira. Determinadas políticas setoriais não eram consensuais nem entre companhias do mesmo setor. A política de desoneração da folha de pagamentos é exemplo emblemático: algumas empresas do setor têxtil aprovaram a medida original, enquanto outras criticaram, já que a proposta inicial de substituir a alíquota de 20% sobre a folha de pagamento por uma de 1,5% sobre o faturamento bruto favorecia sobretudo as empresas dependentes de mão de obra, e não aquelas intensivas em tecnologia. Divergências similares, inter e intrasetorial, foram observadas na proposta de isenção de IPI e na implementação do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra). É interessante notarmos, contudo, que as divergências em relação às políticas setoriais costumam se concentrar em torno de seus critérios e regras, isto é, existe certo grau de consenso em relação à necessidade da medida, disputando-se apenas sua amplitude e implementação. No caso mencionado da desoneração da folha de pagamentos do setor têxtil, a posterior redução da alíquota para 1% sobre o faturamento foi bem recebida por todo o setor.

Já as políticas macroeconômicas, como é o caso do câmbio, geram divergências em relação à natureza mesma da diretriz econômica. Em geral, isso ocorre devido à heterogeneidade da indústria nacional em termos de competitividade, mercado e características da produção. Por exemplo, os setores ou empresas mais dependentes das importações de insumos e bens de capital são beneficiadas pela valorização da moeda nacional. A situação é inversa no caso das empresas menos dependentes de importados, das que necessitam de maior proteção no mercado doméstico e das exportadoras.

Não obstante, algumas medidas mostraram-se mais consensuais, muito embora temporariamente, entre os industriais. A redução das taxas de juros constitui pauta amplamente reivindicada pelo empresariado. Em 2012, quando houve o esforço governamental de diminuir os juros, os empresários manifestaram-se a favor. Já em 2014, quando avaliavam que a taxa de juros estava alta demais, as declarações referentes a esse tema eram todas críticas. Algo similar ocorreu com relação à política de reajuste do salário mínimo. Em 2012, os empresários manifestaram-se favoráveis a essa medida, prevendo aumento de demanda e, por conseguinte, de suas receitas. Já em 2014, o empresariado opôs-se em uníssono ao reajuste do salário mínimo, manifestando-se contra o aumento real do custo da mão de obra em contexto de queda da produção industrial. Além disso, os industriais frequentemente traçam comentários mais gerais sobre a falta de competitividade da indústria nacional frente aos produtos importados ou no mercado externo. Consequentemente, a necessidade de medidas que resultem em maior isonomia competitiva é uma avaliação consensual entre os empresários, e serve como justificativa tanto para críticas quanto para elogios às mais variadas políticas econômicas.

Apesar das especificidades de cada setor e ano analisados, é possível apontar que o empresariado industrial, de 2011 a 2014, avaliava que a economia brasileira sofria com um problema grave de desindustrialização, em decorrência, principalmente, da falta de competitividade do produto brasileiro ante o produto estrangeiro. Essa discussão já aparecia nos primeiros anos do mandato, com os empresários alertando o governo da necessidade de se discutir e trabalhar no sentido de diminuir os custos de produção, apesar de, no geral, avaliarem bem a economia e as medidas governamentais. Em 2014, essa questão ficou ainda mais em evidência, e as medidas governamentais, em sua maioria, já não eram consideradas suficientes para retomar o crescimento econômico e a expansão da indústria.

Em resumo, os posicionamentos coletados no jornal Valor Econômico ao longo do primeiro mandato de Dilma Rousseff oferecem evidências do deslocamento político do empresariado industrial em relação ao governo e suas medidas econômicas, no sentido da hipótese desenvolvida por Singer (2018)SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018.. Apesar de apoio moderado em 2011, no início do mandato, as políticas desenvolvidas por Rousseff e sua equipe econômica contaram com amplo apoio dos empresários industriais, chegando ao ápice de 79,4% de posicionamentos favoráveis no segundo semestre de 2012. Mais do que isso, o governo se mostrou bastante aberto ao diálogo e aos questionamentos do empresariado, como visto no caso da desoneração da folha de pagamentos. Assim, os empresários industriais, ao menos até o primeiro semestre de 2013, mostravam-se alinhados à Nova Matriz Econômica, oferecendo apoio às medidas anunciadas, inclusive com elogios às boas intenções do governo e à “coragem” da presidenta em enfrentar questões importantes, como o custo da energia elétrica (FERNANDES, 2013FERNANDES, Ana. Otimistas, fabricantes projetam recuperação das vendas em 2013. Valor Econômico, 8 jan. 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/empresas/2960972/otimistas-fabricantes-projetam-recuperacao-das-vendas-em-2013 . Acesso em: 19 mai. 2019.
http://www.valor.com.br/empresas/2960972...
). No entanto, o que se verifica a partir do segundo semestre de 2013 é um progressivo afastamento dos industriais em relação ao governo, tendência que se consolida no ano de 2014. As críticas tornam-se cada vez mais frequentes nas páginas do Valor e, muito embora Dilma tentasse retomar o diálogo, o empresariado industrial se mostra refratário, exigindo mudanças na condução da política econômica. As diretrizes outrora valorizadas e defendidas tornam-se, na visão dos mesmos empresários, ineficazes e equivocadas.

Considerações finais

O artigo procurou examinar o posicionamento político dos empresários industriais em relação ao governo Dilma Rousseff e sua Nova Matriz Econômica no decurso do primeiro mandato (2011-2014). Seguindo a metodologia de atribuição de valências, as declarações de industriais colhidas no jornal Valor Econômico foram classificadas como contrárias, favoráveis ou neutras. Restou demonstrado que, até o primeiro semestre de 2013, a presidenta contava com amplo apoio entre a burguesia industrial: as diretrizes da política econômica eram elogiadas e encontravam guarida nas falas de empresários de diversos setores. Nota-se, aliás, que Rousseff foi pressionada em diferentes ocasiões a assumir uma determinada orientação econômica, o que resultou na implementação das diferentes medidas da Nova Matriz, como a desoneração da folha de pagamentos, a desvalorização cambial e a redução da taxa básica de juros - o caso de duas declarações de Flávio Castelo Branco em abril e setembro de 2012, mencionado na seção anterior, é bastante ilustrativo. Nesse sentido, reforçamos o argumento de que a adoção da política econômica do primeiro mandato da presidenta não se explica por simples voluntarismo da mandatária e de sua equipe, pelo contrário, houve ação da burguesia industrial na definição dos rumos a serem seguidos.

A situação se altera, contudo, no segundo semestre de 2013 e assim permanece até o final do primeiro mandato. A vasta adesão dos empresários ao governo se reverte em uma maioria crescente de posicionamentos desfavoráveis, o que nem mesmo a troca da equipe econômica no final de 2014 foi capaz de reverter. A diretriz geral da política econômica e suas medidas, outrora elogiadas, passaram a ser consideradas ineficazes e insuficientes pelo mesmo empresariado industrial. Os resultados, portanto, fornecem evidências que corroboram com a hipótese de Singer (2018)SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018., tomada como ponto de partida, acerca do deslocamento político da burguesia industrial: de uma posição inicialmente alinhada ao governo e à Nova Matriz Econômica, o setor industrial, empresários e associações moveram-se progressivamente em direção à oposição.

Como compreender esse movimento por parte dos empresários industriais, isto é, por que mudaram de posição a respeito da agenda econômica por eles mesmos sugerida, escapa de nossos objetivos. Todavia, um ponto importante iluminado por este artigo, qual seja, o momento em que se deu a “virada” do empresariado industrial, pode auxiliar pesquisas futuras. O ano de 2013 parecia indicar uma retomada do crescimento, sobretudo na comparação com o ano anterior: dados do IBGE apontam um aumento de 3% do PIB e de 8,2% no valor adicionado bruto da indústria. Assim, o argumento que mobiliza o pragmatismo empresarial e a ideia de reação a condições econômicas adversas não parece suficiente para explicar o que ocorreu no primeiro mandato de Dilma Rousseff, ou seja, haveria outras dimensões que merecem investigação, dentre elas, possivelmente, a político-ideológica. Singer (2018)SINGER, André. O lulismo em crise: um quebra-cabeça do período Dilma (2011-2016). São Paulo: Companhia das Letras, 2018. sugere um caminho: inspirado na tese de livre-docência de Fernando Henrique Cardoso (1972)CARDOSO, Fernando Henrique. Empresário industrial e desenvolvimento econômico no Brasil. 2 ed. São Paulo: Difel, 1972., argumenta que o mecanismo burguês pendular responsável pelo golpe de 1964, ainda que em condições bastante diversas, esteve novamente em ação. Boito Jr (2018)BOITO JR., Armando. Reforma e crise política no Brasil: os conflitos de classe nos governos do PT. Campinas, SP: Editora da Unicamp / São Paulo: Editora Unesp, 2018., também preocupado com as classes, frações e coalizões de classe, aposta na ofensiva restauradora do campo neoliberal e em fraturas internas à frente neodesenvolvimentista. De todo modo, um amplo campo de estudos é desvelado.

Finalmente, o exame das declarações também permitiu identificar alguns dos objetos de conflito entre o empresariado e o governo. Além da questão dos reajustes salariais - o que é compatível com as análises que sinalizam a intensificação do conflito distributivo no período, como aquelas feitas por Rugitsky (2015RUGITSKY, Fernando. Do ensaio desenvolvimentista à austeridade: uma leitura kaleckiana. In: BELLUZZO, Luiz Gonzaga de Mello; BASTOS, Paulo Zahluth (orgs.). Austeridade para quem? Balanço e perspectivas do governo Dilma Rousseff. São Paulo: Carta Maior/ Friedrich Ebert Stiftung, 2015. p. 131-137.; 2017)RUGITSKY, Fernando. The rise and fall of the Brazilian economy (2004-2015): the economic antimiracle. Departamento de Economia (FEA-USP): Working Paper Series no 2017-29, 2017. Disponível em: Disponível em: http://www.repec.fea.usp.br/documentos/FernandoRugitsky_29WP.pdf . Acesso em 27 jun. 2019.
http://www.repec.fea.usp.br/documentos/F...
e Serrano e Summa (2018)SERRANO, Franklin; SUMMA, Ricardo. Conflito distributivo e o fim da “breve era de ouro” da economia brasileira. Novos Estudos - CEBRAP. São Paulo, v. 37, n. 2, p. 175-189, maio-ago. 2018. -, o problema dos custos de produção e da baixa competitividade estrutural da indústria brasileira é frequentemente trazido à baila, sobretudo no ano de 2014. A pauta, contudo, não é restrita a esse momento, muito embora tenha reconquistado as falas de empresários por conta da crise internacional e da maior disputa pelos mercados doméstico e externo. Como demonstra Mancuso (2007a)MANCUSO, Wagner. O lobby da indústria no Congresso Nacional: empresariado e política no Brasil contemporâneo. São Paulo: Humanitas, Edusp, 2007a., desde a década de 1990, por conta da abertura econômica, o empresariado industrial brasileiro se organiza em torno da redução do “Custo Brasil”, com o objetivo de resistir ao avanço estrangeiro. O que chama a atenção no governo Rousseff é o fato de que, quando a agenda econômica do setor produtivo parecia contemplada, ainda que com limitações, o empresariado se mobilizou em sentido contrário - com relativo protagonismo paulista, como a frequência da FIESP nas declarações demonstra.

Identificar uma inflexão no posicionamento empresarial entre o primeiro e o segundo semestre de 2013, em momento anterior à estagnação de 2014 e à recessão de 2015-2016, reforça a importância de uma agenda de pesquisa sobre o período Dilma Rousseff. Além de inaugurar uma nova oportunidade de exame do comportamento político do empresariado brasileiro,21 21 O tema é clássico na Ciência Política brasileira. Para uma revisão bibliográfica, ver Mancuso (2007b). haja vista a participação do setor na conformação da Nova Matriz Econômica, o governo Dilma pode oferecer elementos importantes para a compreensão da crise política que assola o país desde ao menos o final de 2014.

Referências

  • 6
    Agradecemos às(aos) pareceristas anônimas(os) da Revista Brasileira de Ciência Política pelos comentários e sugestões e aos pesquisadores do grupo de pesquisa Pensamento e Política no Brasil, nos nomes de André Singer, Hugo Fanton e Daniela Costanzo, pelas valiosas discussões que aprimoraram essa pesquisa. Devemos relembrar também os pesquisadores André Dallacorte, David Molinari, Flávia Couto e Silva, Isabella Esteves, Lucas Fonseca, Rafael Costa, Tales Mançano e Yasmin Ribeiro, cujas contribuições foram fundamentais para nosso trabalho. Agradecemos ainda a Alvaro Comin e Wagner Mancuso que, enquanto debatedores em seminários e simpósios, também contribuíram para o aperfeiçoamento deste artigo. Os erros e omissões restantes são, evidentemente, de nossa total responsabilidade.
  • 7
    O espelho do grupo de pesquisa pode ser acessado aqui: http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/24741
  • 8
    O nome foi utilizado pelo secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, em entrevista ao jornal Valor Econômico publicada em 17 de dezembro de 2012. Segundo Holland, a nova matriz “combina juros baixos, taxa de câmbio competitiva e uma consolidação fiscal ‘amigável ao investimento’” (ROMERO, 2012ROMERO, Cristiano. Transição para nova política econômica afetou PIB, diz Holland. Valor Econômico, 17 dez. 2012. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/brasil/coluna/transicao-para-nova-politica-economica-afetou-pib-diz-holland.ghtml . Acesso em: 20 ago. 2021.
    https://valor.globo.com/brasil/coluna/tr...
    ). Dois dias depois, em 19 de dezembro, Guido Mantega (2012)MANTEGA, Guido. O primeiro ano da nova matriz econômica. Valor Econômico, 19 dez. 2012. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/brasil/2945092/o-primeiro-ano-da-nova-matriz-economica . Acesso em: 28 ago. 2018
    http://www.valor.com.br/brasil/2945092/o...
    emprega o mesmo termo em artigo publicado também no Valor Econômico. Ainda que a expressão tenha se difundido somente após essas duas manifestações, Mantega já a utilizara para se referir à mudança de política econômica do governo Dilma em 05 de julho de 2012, no jornal O Estado de S. Paulo (ABREU, 2012ABREU, Beatriz. Mantega indica novo modelo econômico. O Estado de S. Paulo, 05 jul. 2012. Disponível em: Disponível em: https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,mantega-indica-novo-modelo-economico-imp-,896017 . Acesso em: 15 jul. 2021.
    https://economia.estadao.com.br/noticias...
    ).
  • 9
    A qualificação “desenvolvimentista” suscita polêmica, sobretudo entre economistas, acerca de sua validade para compreender a política econômica de Dilma Rousseff em seu primeiro mandato. No entanto, o fundamental aqui é ressaltar o caráter antiliberal da experiência, isto é, a intervenção do Estado na economia. Sobre isso, ver: Bastos (2012)BASTOS, Pedro Paulo Zahluth. A economia política do novo-desenvolvimentismo e do social desenvolvimentismo. Economia e Sociedade, Campinas, v. 21, n 3, p. 779-810, dez. 2012. e Cepêda (2012)CEPÊDA, V. Inclusão, democracia e novo-desenvolvimentismo: um balanço histórico. Estudos Avançados, v. 26, n. 75, p. 77-90, 1 ago. 2012..
  • 10
    O documento Brasil do diálogo, da produção e do emprego, lançado em maio de 2011 pela FIESP, pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), pela Força Sindical e pelos Sindicatos de Metalúrgicos do ABC e de São Paulo e Mogi das Cruzes, talvez seja uma das maiores evidências da coligação entre empresários industriais e trabalhadores e de seu suporte às ações de Dilma e Mantega.
  • 11
    Influenciado por Poulantzas (1975)POULANTZAS, Nicos. As classes sociais no capitalismo de hoje. Tradução de Antonio Roberto Neiva Blundi. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975., Boito Jr. (2018)BOITO JR., Armando. Reforma e crise política no Brasil: os conflitos de classe nos governos do PT. Campinas, SP: Editora da Unicamp / São Paulo: Editora Unesp, 2018. compreende a burguesia interna como uma fração de classe burguesa situada em posição intermediária entre a velha burguesia nacional e a burguesia associada ao capital estrangeiro. Ainda que não completamente hostil ao capital internacional, a burguesia interna possui uma base de acumulação própria, competindo, na economia nacional, com a burguesia associada.
  • 12
    O acesso às edições se deu através do sistema disponível no site do próprio jornal.
  • 13
    Lançado em maio de 2000 pelos grupos Folha e Globo, com 50% de participação de cada sócio, desde 2016 o jornal é controlado unicamente pelo Grupo Globo (ROSA, 2020ROSA, João Luiz. ‘Valor’ cresce 22% e alcança 107 mil assinaturas. Valor Econômico, 30 jan. 2020. Disponível em: Disponível em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/01/30/valor-cresce-22-e-alcanca-107-mil-assinaturas.ghtml . Acesso em: 05 jul. 2021.
    https://valor.globo.com/empresas/noticia...
    ).
  • 14
    CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) 2.0, publicada pelo IBGE em 2006. Os setores mencionados correspondem, respectivamente, às seções B, C, D e F.
  • 15
    Metodologia semelhante àquela adotada pelo Manchetômetro, site de acompanhamento da cobertura da grande mídia sobre temas de economia e política produzido pelo Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP) sediado no IESP-UERJ. Ver: Laboratório de Estudos de Mídia e Esfera Pública (LEMEP), Manchetômetro, [s.d]. Disponível em: http://manchetometro.com.br. Acesso em: 23 ago. 2021.
  • 16
    A presença expressiva da CNI, em comparação não apenas com as empresas individuais, mas também com federações, corrobora com a literatura sobre a atuação política empresarial. Conforme Mancuso (2007a)MANCUSO, Wagner. O lobby da indústria no Congresso Nacional: empresariado e política no Brasil contemporâneo. São Paulo: Humanitas, Edusp, 2007a. demonstra, a CNI, por ser a maior instância de representação dos interesses empresariais e por ter amplos recursos, é a entidade que costuma atuar como empreendedor político e arcar com a mobilização em torno de temas que unificam a indústria.
  • 17
    Somando todas as federações industriais de outros estados que se manifestaram durante o período analisado (FIEA, FIEAM, FIEB, FIEC, Firjan, FIEP e FIESC), têm-se apenas 16 declarações.
  • 18
    A “guerra dos portos” é como ficou conhecida a prática de alguns estados, em especial Santa Catarina, Espírito Santo e Goiás, de oferecer incentivos fiscais aos produtos importados. Esse foi o tema do Projeto de Resolução do Senado 72/10, de autoria do então Líder do Governo no Senado, Romero Jucá, que propôs a equalização da alíquota do ICMS interestadual para produtos importados não industrializados. O PRS 72 foi apoiado por empresários e pelo governo federal. Em votação conflituosa, o projeto foi aprovado em abril de 2012, e elogiado por entidades empresariais.
  • 19
    Segundo dados do IBGE, o crescimento econômico em 2012 foi de 1,9% e, em 2013, 3,0%.
  • 20
    A avaliação empresarial sobre a MP 579, apesar de majoritariamente favorável, não foi consensual. A Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (ABRACE), por meio de seu presidente-executivo, Paulo Pedrosa, recorrentemente criticou a medida, argumentando que ela agrava as distorções do mercado, que tornam as grandes indústrias consumidoras de energia elétrica subsidiadoras do sistema (PEDROSA, 2013PEDROSA, Paulo. Grandes indústrias, pequenos efeitos. Valor Econômico, 13 set. 2013. Disponível em: Disponível em: http://www.valor.com.br/opiniao/3268920/grandes-industrias-pequenos-efeitos . Acesso em: 10 out. 2018.
    http://www.valor.com.br/opiniao/3268920/...
    ).
  • 21
    O tema é clássico na Ciência Política brasileira. Para uma revisão bibliográfica, ver Mancuso (2007b)MANCUSO, Wagner. O empresariado como ator político no Brasil: balanço da literatura e agenda de pesquisa. Revista Sociologia e Política. Curitiba, n. 28, p. 131-146, jun. 2007b..
  • 1
    Para replicação dos dados: https://doi.org/10.7910/DVN/HQVT9O
  • 3
    Bolsista CNPq. Membro do grupo de pesquisa Pensamento e Política no Brasil, associado ao Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania (CENEDIC).
  • 5
    Bolsista CAPES. Membra do grupo de pesquisa Pensamento e Política no Brasil, associado ao Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania (CENEDIC).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Dez 2021
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    10 Mar 2021
  • Aceito
    16 Ago 2021
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