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Crianças com Deficiência Física, Síndrome de Down e Autismo: Comparação de Características Familiares na Perspectiva Materna na Realidade Brasileira2 2 Apoio financeiro: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

RESUMO:

O presente estudo teve por objetivo identificar e comparar as necessidades familiares e o suporte social das famílias de crianças com deficiência física, síndrome de Down e autismo, na perspectiva das mães. Participaram da pesquisa 60 mães de crianças com deficiência na faixa etária de 7 meses a 6 anos de idade, que foram divididas em três grupos: G1(DF) formado por 20 mães de crianças com deficiência física, G2(SD) formado por 20 mães de crianças com síndrome de Down e G3(A), com 20 mães de crianças com autismo. A coleta de dados ocorreu nas residências das mães e/ou nas dependências de uma universidade. Os instrumentos utilizados como medidas avaliativas foram: o Questionário de necessidades familiares (QNF) e o Questionário de suporte social (QSS). A análise dos dados foi por meio de média e de desvio padrão. Para comparação dos grupos, foi realizado teste-t. Como resultados, relacionado às necessidades, identificaram-se diferenças estatisticamente significativas, como, por exemplo, o G1 apresentou diferenças significativas em relação ao G2 e G3 nas necessidades financeiras. O G2 frente às necessidades de apoio e de funcionamento da vida familiar, e G3 no que diz respeito a explicar a situação do filho e do desenvolvimento do filho. Com relação ao suporte social, o G2 apresentou maior número de pessoas suportivas, seguido do G3 e G1, porém o G1 mostrou-se mais satisfeito com o tipo de suporte recebido. Conclui-se que o estudo pode contribuir para conhecimento das principais necessidades e do suporte que as famílias de crianças com diferentes deficiências possuem.

Palavras-chave:
Educação especial; Deficiência; Família; Mães

ABSTRACT:

This study aimed to identify and compare the family needs and social support of families of children with physical disability, Down Syndrome and Autism from the perspective of the mothers. A total of 60 mothers of children with disability ranging from 7 months to 6 years of age participated and were divided into three groups: G1 (PD) consisting of 20 mothers of children with physical disability, G2 (DS) consisting of 20 mothers of children with Down Syndrome and G3 (A) made up of 20 mothers of children with Autism. Data collection took place in the mothers’ homes and/or on the premises of a university. The instruments used for evaluative measures were: the Family Needs Questionnaire (FNQ) and the Social Support Questionnaire (SSQ). Data analysis was performed by the mean and standard deviation. A t-test was performed to compare the groups. As for results, related to the needs, significant statistical differences were identified, as follows: G1 presented significant differences in relation to G2 and G3 with regard to financial needs. G2 in relation to the needs of support and functioning of family life and G3 with regard to explaining the situation of the child and child development. Regarding social support, G2 presented a greater number of supportive people, followed by G3 and G1, but G1 was more satisfied with the type of support received. It was concluded that the study may contribute to the knowledge of the main needs and support that families of children with different disabilities have.

KEYWORDS:
Special education; Disability; Family; Mothers

1 Introdução

A família, independentemente de cultura, de composição, de classe social ou de período histórico, consiste no primeiro grupo social do qual os seres humanos fazem parte e estabelecem seus contatos (Szymanski, 2011Szymanski, H. (2011). A relação família/escola: Desafios e perspectivas (2a ed.). Brasília: Liber Livro.; Glat, 2012Glat, R. (2012). Orientação familiar como estratégia facilitadora do desenvolvimento e inclusão de pessoas com necessidades especiais. In E. G. Mendes, & M. A. Almeida (Orgs.), A pesquisa sobre inclusão escolar em suas múltiplas dimensões teoria, políticas e formação (1a ed., Vol. 1, pp. 315-326). Marília: Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial.). É por meio das relações familiares que as crianças começam a compreender o mundo que as cercam, aspecto que favorece o seu desenvolvimento e a construção de sua identidade (Glat, 2012Glat, R. (2012). Orientação familiar como estratégia facilitadora do desenvolvimento e inclusão de pessoas com necessidades especiais. In E. G. Mendes, & M. A. Almeida (Orgs.), A pesquisa sobre inclusão escolar em suas múltiplas dimensões teoria, políticas e formação (1a ed., Vol. 1, pp. 315-326). Marília: Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial.). Assim sendo, as famílias tornam-se o principal modelo para os filhos, pois, ao nascer, a criança encontra um ambiente familiar instituído pelos seus membros (Szymanski, 2011Szymanski, H. (2011). A relação família/escola: Desafios e perspectivas (2a ed.). Brasília: Liber Livro.).

Quando os adultos se tornam pais, esse papel oportuniza a transformação de identidade, o desejo de acompanhamento e a capacidade de gerar e cuidar do filho, que está associada ao sentimento de gratificação psicológica. Nesse período, os pais reestruturam-se para a chegada do filho, assim como a relação conjugal e com os familiares e a comunidade. Inicia-se, nesse contexto, a identidade de pais e a organização familiar para um novo ciclo. No entanto, o papel parental e o ciclo de vida desses pais podem ser afetados em decorrência das características dos filhos e, possivelmente, um fato inesperado pode desencadear dilemas, desafios, emoções e sentimentos variados (Alexandre & Felizardo, 2009Alexandre, S. M., & Felizardo, S. (2009). O impacto do suporte social em famílias de crianças com deficiência. International Journal of Developmental and Education Psychology, 3(1), 267-274.).

Dessa forma, destaca-se a importância que as famílias representam no desenvolvimento do ser humano ao longo da vida, principalmente no que se refere à proporção de cuidados, de estímulos, de interações e de ensinamentos. Por esse contexto sofrer diversas transformações, as famílias de crianças com deficiência podem necessitar de maiores apoios, devido ao maior envolvimento parental a elas exigido. Pesquisas realizadas no contexto brasileiro têm produzido dados sobre as variáveis familiares em famílias de crianças com deficiência, assim como a importância de intervenções nesse tema (Santos, 2014Santos, S. L. (2014). Comparação das características familiares de crianças com diferentes faixas etárias (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil.; Spinazola, 2014Spinazola, C. C. (2014). Bem-estar e qualidade da estimulação: Comparando famílias de crianças público alvo da educação especial de zero a três anos e de quatro a seis anos (Trabalho de Conclusão de Curso). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil.; Azevedo, 2014Azevedo, T. L. (2014). Programa de intervenção com pais: Impactos no bem-estar familiar e na estimulação infantil (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil.; Cia, Gualda, & Christovam, 2015Cia, F., Gualda, D. S., & Christovam, A. C. C. (2015). Recursos, suporte social e necessidades de famílias de crianças pequenas público-alvo da educação especial. In E. G. Mendes, & M. A. Almeida (Orgs.), Educação especial inclusiva: Legados históricos e perspectivas futuras (pp. 185-205). São Carlos: Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial.).

Para Dunst (2000)Dunst, C. (2000). Apoiar e capacitar as famílias em intervenção precoce: O que aprendemos? In L. M. Correia, & A. M. Serrano (Orgs.), Envolvimento parental em intervenção precoce - das práticas centradas na criança às práticas centradas na família (pp. 77-92). Porto: Porto Editora., o comportamento de ajuda envolve identificar as necessidades e as prioridades familiares, assim como seu estilo de funcionamento e os apoios e os recursos sociais. Assim, é preciso reconhecer as necessidades abrangentes e individuais; além disso, levar em consideração que estas estão em constante mudanças. Por isso, é importante ajudar as famílias a encontrarem os recursos que se encaixam em seu estilo de vida.

Nesse sentido, o estudo de Gualda, Borges e Cia (2013)Gualda, D. S., Borges, L., & Cia, F. (2013). Famílias de crianças com necessidades educacionais especiais: Recursos e necessidades de apoio. Revista Educação Especial, Santa Maria, 26(46), 307-330. objetivou problematizar quais eram os recursos e as necessidades de famílias de crianças com deficiência. Participaram dessa pesquisa 12 pais de crianças com deficiência matriculadas na pré-escola, os quais tinham poder aquisitivo de médio a médio-baixo. Foram utilizados o Inventário de Recursos do Ambiente Familiar (RAF) e o Questionário sobre as Necessidades Familiares (QNF). Os resultados revelaram que os pais promoviam um ambiente estimulador aos filhos, principalmente no que se refere às tarefas escolares e por meio da preocupação com os atendimentos na sala de recursos e em instituição. Em relação às necessidades familiares, os pais indicaram maiores índices nos quesitos: (a) mais informações acerca dos serviços e apoios que seu filho poderá usufruir futuramente, (b) ter o acompanhamento de pessoas habilitadas a falar sobre a deficiência do filho, (c) saber explicar a situação de seu filho para amigos, crianças, vizinhos, (d) encontrar serviço de apoio social e educativo, (e) financeiramente e (f) ter espaço ou alguém para discutir e encontrar soluções. Os estudos desenvolvidos por Azevedo (2014)Azevedo, T. L. (2014). Programa de intervenção com pais: Impactos no bem-estar familiar e na estimulação infantil (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil., Santos (2014)Santos, S. L. (2014). Comparação das características familiares de crianças com diferentes faixas etárias (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil. e Spinazola (2014)Spinazola, C. C. (2014). Bem-estar e qualidade da estimulação: Comparando famílias de crianças público alvo da educação especial de zero a três anos e de quatro a seis anos (Trabalho de Conclusão de Curso). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil. evidenciaram que as famílias de crianças com deficiência em idade pré-escolar variaram em relação às necessidades e aos recursos presentes no ambiente familiar, dependendo da idade da criança. Para cada faixa etária, supõe-se que as famílias vão adquirindo novos conhecimentos e necessitando de suportes e recursos característicos. Esses estudos também problematizaram que, possivelmente, o tipo de deficiência que a criança tem influencia no ambiente familiar, para além da idade dela. Nesses três estudos, a maioria das amostras era composta por pais, mães ou responsáveis de crianças com deficiência intelectual, deficiência física ou autismo.

Na maioria dos estudos com famílias, que trabalharam com pelo menos uma das variáveis do presente estudo, houve prevalência de grupos específicos, por exemplo, mães de crianças com paralisia cerebral (Almeida & Sampaio, 2007Almeida, T., & Sampaio, F. M. (2007). Stress e suporte social em familiares de pessoas com paralisia cerebral. Psicologia, Saúde & Doenças, Lisboa, 8(1), 145-151.) e pais de crianças com deficiência intelectual (Barbosa, Pettengill, Farias, & Lemes, 2009Barbosa, M. A. M., Pettengill, M. A. M., Farias, T. L., & Lemes L. C. (2009). Cuidado da criança com deficiência: Suporte social acessado pelas mães. Revista Gaúcha de Enfermagem, Porto Alegre, 3(3), 406-412.). No estudo de Matsukura, Maturano, Oishi e Borasche (2007)Matsukura, T. S., Maturano, E. M., Oishi, J., & Borasche, G. (2007). Estresse e suporte social em mães de crianças com necessidades especiais. Revista Brasileira de Educação Especial, Bauru, 13(3), 415-428., há uma comparação entre grupos de pais de crianças com deficiência e desenvolvimento típico. Os estudos de Spinazola (2014)Spinazola, C. C. (2014). Bem-estar e qualidade da estimulação: Comparando famílias de crianças público alvo da educação especial de zero a três anos e de quatro a seis anos (Trabalho de Conclusão de Curso). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil. e Santos (2014)Santos, S. L. (2014). Comparação das características familiares de crianças com diferentes faixas etárias (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, SP, Brasil. comparam as diferentes faixas etárias, e o estudo de Gualda et al. (2013)Gualda, D. S., Borges, L., & Cia, F. (2013). Famílias de crianças com necessidades educacionais especiais: Recursos e necessidades de apoio. Revista Educação Especial, Santa Maria, 26(46), 307-330. descreve os recursos e as necessidades de famílias de diferentes deficiências. Nenhum desses estudos compara variáveis familiares dependendo da deficiência da criança.

Considerando a importância da família para o desenvolvimento infantil e que o conhecimento sobre ela pode embasar intervenções preventivas, a presente pesquisa teve por objetivos identificar e comparar as necessidades e o suporte social das famílias de crianças com deficiência física, síndrome de Down e autismo na perspectiva das mães.

2 Método

2.1 Participantes

Participaram da pesquisa 60 mães de crianças com deficiência de zero a seis anos, que foram divididas em três grupos (G1, G2 e G3). O G1(DF) foi formado por 20 mães de crianças com deficiência física; o G2 (SD) formado por 20 mães de crianças com síndrome de Down e o G3 (A) formado por 20 mães de crianças com autismo. No G1 (DF), a média de idade das mães era 33,8 anos. Com relação ao nível de escolaridade, a predominância, foi Ensino Médio completo (50%) e Superior completo (25%). Ao que se refere aos filhos, a média de idade foi de 3,68 anos. Os diagnósticos das crianças eram: paralisia cerebral (60%), deficiência física (20%), artrogripose (10%) e mielomeningocele (10%).

No G2 (SD), a média de idade das mães era 36,1. No fator escolarização, a maioria das mães desse grupo tinha Ensino Médio completo (45%) e Ensino Fundamental (30%). A média de idade dos filhos foi de 3,56. Os diagnósticos das crianças foram todos de síndrome de Down. No G3 (A), a média de idade das mães era de 36,5. A maioria das mães desse grupo tinha Ensino Médio completo (50%) e Superior completo (25%). Nesse grupo, a média de idade dos filhos foi de 4,72 anos e o diagnóstico de todas as crianças era de autismo. Em relação à escolarização das crianças, nos grupos G1(DF) e G2 (SD), 35% das crianças fazia intervenção precoce. No G3(A), a metade das crianças frequentava somente a pré-escola.

Ao comparar os dados sociodemográficos entre os três grupos, verificou-se que a idade das crianças apresentou diferenças estatisticamente significativas ou com tendência à diferença estatisticamente significativa. O grupo de crianças com autismo apresentou maior idade em comparação aos outros grupos (SD = t (38) =2,02, p < 0,05; DF = t (38) =1,88, p < 0,1). Nos demais dados sociodemográficos, não houve diferenças estatisticamente significativas entre os grupos.

2.2 Local de coleta de dados

A coleta de dados ocorreu nas residências das participantes, em uma universidade pública, em escolas públicas ou em instituições de ensino especializadas.

2.3 Aspectos éticos

A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da UFSCar (CAAE: 44754115.2.0000.5504). As mães receberam e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para sua participação.

2.4 Medidas avaliativas para as mães

Questionário sobre as necessidades das famílias - QNF (Pereira, 1996Pereira, F. (1996). As representações dos professores de educação especial e as necessidades das famílias (Tese de Doutorado). Secretariado Nacional para Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência, Lisboa, Portugal.) - É constituído por 28 itens, distribuídos em seis tópicos: (a) necessidades de informação; (b) necessidade de apoio; (c) explicar a outros; (d) serviços da comunidade;(e) necessidades financeiras; (f) funcionamento da vida familiar. O total máximo da escala é de 84. As respostas do questionário podem ser dadas entre uma escala de 1 a 3, sendo 1 (não necessito deste tipo de ajuda); 2 (não tenho certeza se necessito deste tipo de ajuda) e 3 (necessito deste tipo de ajuda).

Questionário de suporte social - QSS (traduzido e validado por Matsukura, Marturano, & Oishi, 2002Matsukura, T. S., Maturano, E. M., & Oishi, J. (2002). O questionário de suporte social (SSQ): Estudos da adaptação para o português. Revista Latino-Americana de Enfermagem, Ribeirão Preto, 10(5), 675-681.) - Tal instrumento foi construído para avaliar o contexto social no qual a família está inserida. É composto por 27 questões relativas ao suporte emocional ou ao suporte instrumental. Cada questão solicita duas partes de respostas e fornece dois escores. Na primeira parte, relaciona o número de pessoas que o respondente percebe como fontes de suporte social, podendo listar até nove possibilidades (ou a opção “nenhum”) e seu escore é denominado QSS-N. Na segunda parte, o indivíduo informa sobre sua satisfação com esse suporte, em escala de seis pontos, fornecendo o escore QSS-S.

2.5 Procedimento de coleta de dados

A coleta de dados ocorreu em diversos locais, sendo: escolas municipais, três instituições especializadas e em uma unidade saúde escola. Em primeiro lugar, a pesquisa foi desenvolvida em 34 escolas municipais e em duas instituições de ensino especializada. Foram considerados dados de 15 participantes dessa coleta. Os demais dados foram coletados em dois locais. Antes de tudo, foi estabelecido contato com a coordenadora de um centro de atendimento especializado, que autorizou a pesquisa, fornecendo lista com nomes e telefones dos pais que se encaixavam no perfil do estudo, para que, posteriormente, a pesquisadora entrasse em contato. Na sequência, a pesquisadora entrou em contato com uma unidade de saúde e recebeu das responsáveis pelos projetos de intervenção precoce uma lista com nomes e telefones dos pais que se encaixavam no perfil da pesquisa. Também foram realizados convites pessoalmente aos pais e/ou às mães que aguardavam atendimento dos filhos na unidade.

Todas as coletas seguiram o mesmo procedimento, sendo realizadas em forma de entrevista para preenchimento dos instrumentos. Para alocar as famílias nos três grupos foram considerados os diagnósticos das crianças disponibilizados nas instituições e apontados pelos pais nas entrevistas.

2.6 Procedimento de análise de dados

Por meio dos instrumentos (Questionário sobre as necessidades das famílias, Questionário de Suporte Social) foram obtidos dados quantitativos, os quais foram analisados usando métodos descritivos (medidas de tendência central e dispersão). Para comparar os dados das famílias de crianças com deficiência física, síndrome de Down e autismo, foi utilizado o teste-t, considerando a comparação de dois grupos separadamente (Cozby, 2006Cozby, P. C. (2006). Métodos de pesquisa em ciências do comportamento (2a ed.). São Paulo: Atlas.; Sampieri, Collado, & Lucio, 2006Sampieri, R. H., Collado, C. H., & Lucio, P. B. (2006). Metodologia de pesquisa (3a ed.). São Paulo: McGraw-Hill.). Utilizou-se o nível de significância p<0,1.

3 Resultados e discussão

3.1 Necessidades das famílias

A Tabela 1 compara as necessidades7 7 A avaliação das necessidades das Tabelas 1 a 5 variou entre 1 (não necessito deste tipo de ajuda); 2 (não tenho certeza se necessito deste tipo de ajuda) e 3 (necessito deste tipo de ajuda). de informações das mães, entre o G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A).

Tabela 1
Necessidades de informações das mães: comparação entre G1, G2 e G3

Na Tabela 1, necessidades de informações, no que se refere à comparação entre os grupos, identificou-se que o G1 (DF), comparado ao G2 (SD), demonstrou uma média com tendência estatisticamente maior com relação à necessidade de informação sobre a deficiência e as especificidades do filho (t (35,3) =1,80, p < 0,1).

Os dados podem indicar que pelo fato de as crianças terem deficiência física, as mães necessitavam de mais informações específicas quanto ao manuseio, posicionamentos e ajustes com equipamentos. No estudo de Fujisawa, Tanaka, Camargo e Sasaki (2009)Fujisawa, D. S., Tanaka, E. D. O., Camargo, M. Z., & Sasaki T. (2009). Mielomeningocele: O relato de mães frente ao diagnóstico e suas vivências. In D. S. Fujisawa, M. C. Marquezine, E. D. O. Tanaka, R. M. Busto, & E. J. Manzini (Orgs.), Família e Educação especial (Nº 7, pp. 101-117). Londrina: Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial., as mães de crianças com deficiência física relataram que tiveram que aprender a lidar com a realização de curativos e cuidados especiais que os filhos demandavam, principalmente após procedimentos cirúrgicos. Além disso, acredita-se que, conforme a criança se desenvolve, tais necessidades vão sendo alteradas, pensando em estímulos desenvolvimentais, mais especificamente no que se referem à autonomia e à mobilidade, o que pode trazer mais preocupações para os pais.

O G2 (SD), em contrapartida, apresentou média com tendência estatisticamente maior que o G1 (DF), no seguinte item: necessito de mais informações sobre a maneira de falar com meu filho (t (39,9) =1,79, p < 0,1). As crianças com SD apresentam um atraso intelectual, de linguagem, assim como algumas dificuldades na fala, ocasionando, dessa maneira, um vocabulário reduzido e dificuldades de compreensão (Bissoto, 2005Bissoto, M. L. (2005). Desenvolvimento cognitivo e o processo de aprendizagem do portador de síndrome de Down: Revendo concepções e perspectivas educacionais. Revista Ciência e Cognição, Rio de Janeiro, 4, 80-88.). Essas características demandam habilidades por parte dos pais para manter maiores níveis de interações com os filhos, tal como se comunicar de uma forma que os filhos consigam compreender. Uma estratégia que poderia ser dada aos pais seria a utilização de comandos simples e objetivos (Millam, Spinazola, & Orlando, 2015Millan, A. E., Spinazola, C. C., & Orlando, R. M. (2015). Deficiência Intelectual: Caracterização e atendimento educacional. Revista Educação, Batatais, 5(2), 73-94.).

O G3 (A) apresentou média estatisticamente maior (ou com tendência estatisticamente maior), em comparação com G1 (DF) nos fatores: (a) necessito de mais informações sobre a maneira de falar com meu filho (t= (38) 1,84, p < 0,1), e (b) necessito de mais informações sobre a maneira como a criança cresce e se desenvolve (t= (23,0) 2,26, p < 0,05). Indivíduos com autismo ou Transtorno do Espectro Autista (TEA) apresentam dificuldades em padrões comportamentais, interação e comunicação (Desen, Braz, 2014Desen, M. A., Braz, M. P. (2014). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5a ed.). Washington (DC): APA.). Por esse motivo, levanta-se a hipótese de que, assim como as mães de crianças com SD, as com filhos com autismo também podem apresentar maiores necessidades para manter padrões de interações, por isso a necessidade do modo como falar com o filho, assim como aumento da necessidade para saber mais sobre o desenvolvimento infantil. Talvez mesmo as crianças com deficiência física, que tenham comprometimento da linguagem, os pais veem como maior necessidade as questões que permeiam o desenvolvimento físico dos filhos.

O G3 (A) apresentou média com tendência estatisticamente maior, comparado ao G2 (SD) no fator: (a) necessidade de mais informações sobre os serviços e os apoios de que meu filho poderá beneficiar no futuro (t= (22,3)1,76, p < 0,1). O G3 (A) é formado por mães com filhos um pouco mais velhos o que tende a apontar que as mães já começam a se preocupar com mais ênfase com o que o filho conseguirá fazer, principalmente no que tange à escolarização deles.

A Tabela 2 compara as necessidades de apoio das mães, entre o G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A).

Tabela 2
Necessidades de apoio das mães: comparação entre G1, G2 e G3

Na Tabela 2, necessidades de apoio, na comparação entre os grupos, o G2 (SD) apresentou média estatisticamente maior que o G1 (DF), no seguinte item: necessito de ter alguém da minha família com quem possa falar mais sobre os problemas que a deficiência do meu filho coloca (t (38) =2,21, p < 0,05).

Ao comparar o G2 (SD) e o G3 (A), o G2 demonstrou uma média com tendência estatisticamente maior nos seguintes itens: (a) necessito de ter alguém da minha família com quem possa falar mais sobre os problemas que a deficiência do meu filho coloca (t= (38)1,96, p < 0,1); (b) necessito de ter mais amigos com quem conversar (t= (38)1,90, p < 0,1), e (c) no total da subescala de apoio (t= (35,9)1,78, p < 0,1).

Os resultados podem indicar que o G2 (SD), em comparação ao G1 (DF) e ao G3 (A), deve estar necessitando de maior apoio em diversas áreas, o que tende a aumentar a necessidade de ter alguém para conversar. Henn, Piccinni e Garcias (2008)Henn, C. G., Piccinini, C. A., & Garcias, G. L. (2008). A família no contexto da síndrome de Down: Revisando a literatura. Psicologia em Estudo, Maringá, 13(3), 485-493. salientam sobre a importância de programas de intervenção e prevenção para as famílias de crianças com SD, principalmente nos primeiros anos de vida. Esses dados também podem ter relação com as necessidades de ajuda no funcionamento da vida familiar (vide Tabela 6). O G2 (SD) é o grupo que mais precisa de ajuda com relação à necessidade nesse quesito e, principalmente, no que tange ao apoio mútuo entre os membros familiares em situações difíceis, o que tende a aumentar a necessidade de apoio, essencialmente com relação a ter pessoas da família para conversar.

Tabela 3
Necessidades de explicar aos outros: comparação entre G1, G2 e G3
Tabela 4
Necessidades de serviços da comunidade: comparação entre G1, G2 e G3
Tabela 5
Necessidades financeiras: comparação entre G1, G2 e G3
Tabela 6
Necessidades de funcionamento da vida familiar: comparação entre G1, G2 e G3

A Tabela 3 compara a necessidade de ajuda para explicar aos outros sobre a situação do filho entre G1 (DF) G2 (SD) e G3 (A).

Na Tabela 3, explicar aos outros, constatou-se que o G1 (DF), comparado ao G2 (SD), demostrou uma média estatisticamente maior no seguinte quesito: necessito de ajuda para saber como responder quando amigos, vizinhos ou estranhos me fazem perguntas sobre a situação do meu filho (t (31,8) =2,41, p < 0,05). De fato, muitas crianças com deficiência física fazem uso de equipamentos especiais ou possuem dificuldades motoras aparentes, o que ocasiona perguntas frequentes sobre a sua deficiência e demanda dos pais habilidades sociais para lidar com essas situações.

O G3 (A) apresentou média com tendência estatisticamente maior, em comparação ao G1(DF) com relação à necessidade de mais ajuda sobre a forma de explicar a situação do filho aos amigos (t= (38) 1,69, p< 0,1). Esse resultado pode ser um indicativo da preocupação das mães em explicar de uma maneira que os amigos compreendam sobre as questões características do autismo, como comportamentos estereotipados e falta de interação social. Em um estudo de Silva e Chaves (2014)Silva, R. S., & Chaves, E. F. (2014). Autismo, reações e consequências nas relações familiares. Encontro: Revista de Psicologia, Londrina, 17(26), 35-45., as mães revelaram que evitavam sair com os filhos, em decorrência dos comportamentos deles, pois assim não precisavam explicar a situação dos filhos. Nesse ponto, destaca-se a importância de ajuda profissional a essas mães para lidar com os comportamentos dos filhos e aumento de habilidades sociais para explicar quando solicitadas. A pesquisa de Griffith, Hastings, Nash e Hill (2010)Griffith, G. M., Hastings, R. P., Nash, S., & Hill, C. (2010). Using matched groups to explore child behavior problems and maternal well-being in children with Down syndrome and autismo. Journal of Autism & Developmental Disorders, 9(5), 610-619., ao comparar grupos de mães que possuíam filhos com síndrome de Down, deficiência intelectual de diversas causas e autismo, revelou que as mães de crianças com autismo possuíam uma visão menos positiva dos filhos e maior nível de estresse. Lyons, Leon, Phelps e Dunleavy (2010)Lyons, A. M., Leon, S. C., Phelps, C. E. R., & Dunleavy, A. M. (2010). The impact of child symptom severity on stress among parents of children with ASD: The moderating role of coping styles. Journal of Child and Family Studies, 19(4), 516-524. indicaram que o grau de severidade da deficiência ou transtornos é um fator que impacta no estresse parental. Tal variável não foi investigada no presente estudo, mas pode ter influenciado nos resultados apresentados.

A Tabela 4 compara as necessidades de ajuda quanto aos serviços da comunidade entre G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A).

Sobre a Tabela 4, serviços da comunidade, nota-se que não houve diferenças significativas entre os grupos, porém G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A) apresentaram necessidades de ajuda para encontrar um serviço de apoio social e educativo para o filho e mostraram necessidades de ajuda para encontrar um serviço que quando tiverem necessidade (descansar, ir ao cinema, a uma festa, etc.) fique com os filhos, por períodos curtos, e que esteja habilitado para assumir essa responsabilidade. O G1 (DF) e G3 (A) revelaram também mais necessidades de ajuda para encontrar um médico que compreenda as mães e os filhos.

Os resultados apontam sobre a questão da necessidade da oferta de apoio às famílias. Messa et al. (2005)Messa, A. A., Araújo, C. O. de, Freitas, C. S., Penna, E. C. G., Yasui, E. M., Aguiar, L. G. ... Blascovi-Assis, S. M. (2005). Lazer familiar: Um estudo sobre a percepção de pais de crianças com deficiência. Programa de distúrbios do desenvolvimento da Universidade de Mackenzie, 5, 12-26. Recuperado em 21 de abril de 2018 de http://www.mackenzie.br/fileadmin/Pos_Graduacao/Mestrado/Disturbios_do_Desenvolvimento/Publicacoes/volume_V/lazer_familiar.pdf.
http://www.mackenzie.br/fileadmin/Pos_Gr...
relatam que, após o nascimento dos filhos com deficiência, as atividades de lazer predominantes no grupo familiar eram: visitas a parentes, assistir TV e ouvir música, e poucas eram as atividades em ambientes socializadores, principalmente em decorrência da saúde frágil dos filhos, as restrições quanto atividades, a falta de dinheiro e locais adequados.

De maneira geral, as necessidades de serviços da comunidade podem apontar para o fato da carência da oferta de serviços adequados aos pais e aos filhos, o que gera essa demanda aumentada com relação à ajuda para encontrá-los. Percebe-se, portanto, que, para que estas venham a ser supridas, é fundamental que sejam dadas respostas no âmbito macrossistêmico, como políticas públicas que subsidiem as famílias na garantia de serviços para todos os membros (Bronfenbrenner, 2011Bronfenbrenner, U. (2011). Bioecologia do desenvolvimento humano: Tornando os seres humanos mais humanos. São Paulo: Artmed.).

A Tabela 5 compara as necessidades financeiras das mães entre G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A).

Com relação à Tabela 5, necessidades financeiras, o G1 (DF) comparado com G2 (SD), apresentou uma média estatisticamente maior, em relação aos seguintes itens: necessito de maior ajuda para obter o material ou equipamento especial de que meu filho necessita (t (38) =3,58, p < 0,001) e total da subescala de necessidades financeiras (t (38) =2,14, p < 0,05). Entre G1 (DF) e G3 (A), percebeu-se que o G1 (DF) apresentou média estatisticamente maior que o G3 (A), nos seguintes itens: necessito de ajuda para obter o material ou equipamento de que o filho necessita (t= (35,8) 4,12, p < 0,001) e no total da subescala financeira (t= (38) 1,73, p < 0,05). Esses dados demostram que, devido às necessidades de cadeira de rodas, andadores, órteses e outros materiais e equipamentos, as famílias acabam tendo aumento nas despesas financeiras, visto que o sistema público ainda não consegue sanar todas as demandas relacionadas a essas necessidades (Sá & Rabinovich, 2006Sá, S. M. P., & Rabinovich, E. P. (2006). Compreendendo a família da criança com deficiência física. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, São Paulo, 16(1), 68-84.; Fujisawa et al., 2009Fujisawa, D. S., Tanaka, E. D. O., Camargo, M. Z., & Sasaki T. (2009). Mielomeningocele: O relato de mães frente ao diagnóstico e suas vivências. In D. S. Fujisawa, M. C. Marquezine, E. D. O. Tanaka, R. M. Busto, & E. J. Manzini (Orgs.), Família e Educação especial (Nº 7, pp. 101-117). Londrina: Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial.).

A Tabela 6 compara as necessidades de ajuda no funcionamento da vida familiar das mães, entre G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A).

Na Tabela 6, funcionamento da vida familiar, G2 (SD) apresentou média com tendência estatisticamente maior que o G1 (DF), nos seguintes itens: (a) a nossa família necessita de ajuda para encontrar forma de, nos momentos difíceis, nos apoiarmos mutuamente (t (38) =1,78, p < 0,1) e (b) e no total da subescala de funcionamento da vida familiar (t (35,2) =1,76, p < 0,1). Esses dados podem ser um indicativo de que essas famílias estão passando por fases de reajustes familiares, por se tratarem de crianças pequenas ainda.

Desse modo, salienta-se a importância de apoio psicológico com relação à aceitação dos filhos, visto que estes podem causar problemas no funcionamento da vida familiar como observado no G2 (SD). Além disso, a síndrome de Down tem um fenótipo específico, que pode ser um fator que contribui para a estigmatização. As características da pessoa, tanto externas quanto internas, podem exercer influências na forma como as outras pessoas lidam com elas; dessa forma, afetam o contexto, as experiências e as relações que acontecem ao longo do tempo (Martins & Szymanski, 2004Martins, E., & Szymanski, H. (2004). A abordagem ecológica de Urie Bronfenbrenner em estudos com famílias. Estudos e pesquisas em Psicologia, Rio de Janeiro, 4(1), 63-77.). Portanto, levanta-se a hipótese que famílias de crianças com deficiência que possuam características bem específica e maior visibilidade na sociedade como a SD podem ter uma maior necessidade de ajuda com aceitação da criança, o que influência nas relações familiares, principalmente entre o casal.

3.2 Suporte social das famílias

A Tabela 7 compara o número e a média de pessoas que ofereciam suporte social entre G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A).

Tabela 7
Número e média de pessoas que ofereciam suporte social em variadas situações de vida: comparação entre G1, G2 e G3

Como mostram os dados da Tabela 7, o G1 (SD) apresentou menor número de pessoas suportivas, seguido do G3 (A) e G2 (DF). Nos três grupos, os aspectos de vida aos quais as famílias apresentaram maiores índices de pessoas suportivas foram: (a) você acha que é parte importante da vida de quais pessoas e (b) quem você sente que gosta de você verdadeira e profundamente. Na sequência, o G1 (DF) apresentou maior média no fator que diz respeito às pessoas que realmente as mães podem contar para ouvi-las quando precisam conversar. O G2 (SD) e o G3 (A) mostraram maiores médias com relação ao suporte social no quesito de apresentarem mais pessoas que as apreciam. O G2 (SD) também demostrou média alta com relação às pessoas suportivas diante de uma situação de falecimento de algum parente muito próximo.

Em relação à comparação entre os grupos, entre o G1 (DF) e G2 (SD), o G2 (SD) apresentou uma média estatisticamente maior (ou com tendência estatisticamente maior), quando comparado ao G1 (DF), nos seguintes fatores: (a) quem vai confortar e abraçar você quando você precisar disso (t (26,4) = 2,28, p < 0,05); (b) quem você acha que poderia ajudar se morresse um parente seu, muito próximo (t (32,6) = 1,71, p < 0,05); e (c) com quem você pode realmente contar para apoiá-la em decisões importantes que você toma (t (22,7) = 1,80, p < 0,1).

Entre o G1 (DF) e G3 (A), os dados apontaram que o G3 (A), comparado ao G1 (DF), apresentou média estatisticamente maior nos itens: (a) você acha que é parte importante da vida de quais pessoas (t (38) = 1,78, p < 0,05); e (b) quem vai confortar e abraçar você quando você precisar disso (t (38) = 2,89, p < 0,05). Já, entre o G2 (SD) e o G3 (A) não houve diferenças significativas.

Percebeu-se que não houve muitas diferenças significativas na comparação entre os grupos. No entanto, notou-se que o G2 (SD) e G3 (A) apresentaram maior número de pessoas suportivas, assim como média estaticamente maior comparado ao G1 (DF) nos itens que apresentaram diferenças significativas. No estudo de Almeida e Sampaio (2007)Almeida, T., & Sampaio, F. M. (2007). Stress e suporte social em familiares de pessoas com paralisia cerebral. Psicologia, Saúde & Doenças, Lisboa, 8(1), 145-151., que foi realizado somente com mães de crianças com Paralisia Cerebral, o suporte social variou com relação à idade das mães, idade dos filhos e em função do nível de autonomia da criança. No entanto, quanto mais movimentação autônoma os filhos possuíam, mais percepção de suporte social com relação às atividades sociais as mães relataram, comparados às mães cujos filhos tinham menor nível de movimentação independente. Dessa maneira, esses resultados podem ser um indicativo de que as crianças, tanto pela deficiência como pela idade no G1 (DF), são mais dependentes das mães, fato que faz com que as mães tenham menos tempo para realizar atividades sociais e, em decorrência disso, elas também tenham menor número de pessoas que lhes dão apoio social. Ressalta-se, portanto, a necessidade da maximização do suporte social com essas mães, seja de profissionais, de familiares, de serviços de saúde e da comunidade que possam ir até a residência da família, visto que esse maior nível de dependência da criança afeta as condições das mães de manterem com frequência as atividades sociais.

A Tabela 8 compara o grau de satisfação com o suporte social recebido entre o G1 (DF), G2 (SD) e G3 (A). Como os itens da escala de suporte social estão contidos na Tabela 7, na íntegra, a Tabela 8 focará apenas nos itens que apresentaram diferenças estatisticamente entre os grupos.

Tabela 8
Grau de satisfação do suporte social recebido: comparação entre G1, G2 e G3

Ao comparar os grupos com relação à satisfação com suporte recebido, o G1(DF) apresentou um grau de satisfação estatisticamente maior (ou com tendência estatisticamente maior), quando comparado ao G2 (SD), nos itens: (a) com quem você poderia realmente contar para ajudar caso você fosse despedida do emprego (t(29)= 1,70, p < 0,1); (b) com quem você pode contar para ouvir seus sentimentos mais íntimos de forma aberta e sem criticar você (t(35,6)= 2,24, p < 0,05); e (c) com quem você pode realmente contar para ajudá-la a se sentir melhor quando você está muito irritada e pronta para ficar brava com qualquer coisa (t(20,3)= 2,32, p < 0,05). O G2 (SD), quando comparado ao G1 (DF), apresentou um grau de satisfação com tendência estatisticamente maior no item: (a) quem você acha que a ajudaria se um bom amigo seu tivesse sofrido um acidente de carro e estivesse hospitalizado em estado grave (t (19,5) = 1,98, p < 0,1).

Ao comparar o grau de satisfação entre as mães do G1 (DF) e G3 (A), verificou-se que o G1 (DF) apresentou média estatisticamente maior no item: com quem você pode ser totalmente você mesma (t (19,0) =2,04, p < 0,05). No que se refere na comparação entre G2 (SD) e G3 (A), os dados mostraram que o G3 (A) apresentou uma média estaticamente maior, quando comparados ao G2 (SD) no seguinte item: com quem você pode contar para ouvir seus sentimentos mais íntimos de forma aberta e sem criticar você (t (36,9) =1,97, p < 0,05).

Os dados apontam que, apesar do G1 (DF) contar com um número menor de pessoas suportivas (vide Tabela 7), é o grupo com maior grau de satisfação quanto ao suporte recebido. Esses resultados podem indicar que o G1 (DF) apresenta mais qualidade no apoio que recebe, sendo observado, por exemplo, que, em situações de desemprego, situações de irritação, conversa e intimidade, ele apresentou média estatisticamente maior comparado ao G2 (SD) e G3 (A). O G2 (SD) mostrou-se menos satisfeito com suporte social recebido. Esses dados podem confirmar o fato de os pais estarem com mais dificuldades em relação às características físicas do filho com SD.

No estudo de Matsukura et al. (2007)Matsukura, T. S., Maturano, E. M., Oishi, J., & Borasche, G. (2007). Estresse e suporte social em mães de crianças com necessidades especiais. Revista Brasileira de Educação Especial, Bauru, 13(3), 415-428., destaca-se a importância de intervenções para ampliação das redes de apoio, salientando sobre programas que visem a compreensão sobre a adequação e a satisfação com suporte social recebido. Mais qualidade no suporte social pode acarretar uma ampliação dos sistemas de rede social, que vão influenciar o desenvolvimento da criança, que, muitas vezes, não mantem a relação direta com as pessoas que estabelecem a ajuda aos pais (Martins, Szymanski, 2004Martins, E., & Szymanski, H. (2004). A abordagem ecológica de Urie Bronfenbrenner em estudos com famílias. Estudos e pesquisas em Psicologia, Rio de Janeiro, 4(1), 63-77.; Poletto, Koller, 2008Poletto, M., & Koller, S. H. (2008). Contextos ecológicos: Promotores de resiliência, fatores de risco e de proteção. Estudos de Psicologia, Campinas, 25(3), 405-416.).

4 Conclusão

Este estudo revelou que as mães mesmo com filhos com diferentes deficiências apresentaram aspectos parecidos. Esse fato mostra que as mães passam por situações e vivências muito semelhantes. Contudo, por meio da comparação entre os grupos, identificou-se, por exemplo, que mães de crianças com deficiência física (G1) possuem maiores necessidades financeiras e uma menor quantidade de pessoas suportivas com quem podem contar. O G2 (SD) apresentou necessidade de apoio, assim como uma ajuda no funcionamento da vida familiar. O G3 (A) apresentou necessidades quanto à forma de explicar a situação dos filhos à sociedade e estabelecer comunicação com os filhos. Esses dados trazem subsídios importantes para a implementação de políticas e programas de apoio frente às variáveis estudadas, para que assim cada vez mais se possa oferecer apoio a essas famílias desde o nascimento da criança, com vistas à diminuição dos impactos sob todos os membros familiares.

Ademais, constatar as necessidades e o suporte social possibilita pensar em estudos futuros com famílias com diferentes diagnósticos, no sentido de levá-las a reconhecer os recursos externos a elas e os apoios necessários para lidar com as dificuldades da vida em família. Acredita-se que este estudo pode contribuir para o conhecimento acerca de famílias de crianças com deficiência, assim como poderá subsidiar futuras pesquisas de intervenção para minimização das necessidades familiares, aumento do suporte social e da estimulação e da interação entre pais e filhos da faixa etária abordada.

Como limitação do estudo, ressalta-se a importância de ampliação das amostras em cada grupo, assim como abordar a comparação com mães de crianças com deficiências sensoriais, atraso no desenvolvimento e diferentes níveis de deficiência dos filhos.

  • 2
    Apoio financeiro: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
  • 7
    A avaliação das necessidades das Tabelas 1 a 5 variou entre 1 (não necessito deste tipo de ajuda); 2 (não tenho certeza se necessito deste tipo de ajuda) e 3 (necessito deste tipo de ajuda).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2018

Histórico

  • Recebido
    09 Out 2017
  • Revisado
    23 Fev 2018
  • Aceito
    25 Fev 2018
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