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Família de crianças com deficiência e profissionais: componentes da parceria colaborativa na escola

Family of children with disabilities and professionals: components of the collaborative partnership in school

Resumos

O presente estudo tem como objetivo identificar e descrever os comportamentos dos profissionais da escola e dos familiares de crianças com deficiência que, na perspectiva dos dois lados, são propiciadores e mantenedores de uma parceria colaborativa efetiva e bem sucedida. O estudo foi conduzido com quatro grupos focais, compostos por familiares (FAM1 e FAM2) e por profissionais (PROF1 e PROF2). Foram conduzidas duas etapas de coleta de dados. Na Etapa 1, as reuniões tiveram por objetivo identificar os componentes da parceria colaborativa. Na Etapa 2, cada um dos grupos focais foi confrontado com os dados obtidos na primeira etapa, sendo que familiares foram confrontados com os dados dos profissionais e vice-versa. Por meio da análise qualitativa dos dados obtidos, foram identificadas e descritas as categorias levantadas pelos participantes referentes aos comportamentos que devem ser emitidos. O estudo apontou que, entre as categorias levantadas, são observadas características essenciais do processo colaborativo, tais como respeito mútuo, comunicação, confiança, participação, amabilidade, sinceridade, seriedade e imparcialidade. Espera-se que o levantamento e a descrição das categorias possam nortear os profissionais da escola e familiares de crianças com deficiência na busca do estabelecimento de uma parceria colaborativa efetiva e de sucesso.

relação família-escola; parceria colaborativa; crianças com deficiência; educação especial


This present study aims to identify and describe the behavior of professionals that work in the school and the family of children with disabilities that promote and maintain an effective and successful collaborative partnership, as viewed from both sides. The study was carried out with four focal groups, composed by families (FAM1 and FAM2) and professionals (PROF1 and PROF2). Two phases of data collection were conducted. In Phase 1 the meetings aimed to identify the components of collaborative partnerships. In Phase 2 each of the focal groups was confronted with data obtained during the first phase, i.e. the parents were presented with the data given by the professionals and vice versa. By qualitative analyses of the obtained data, the categories elicited by the participants related to the behaviors that should be emitted were identified and described. The study pointed out that among the elicited categories, essential characteristics of the collaborative process can be observed, such as mutual respect, communication, trust, participation, amicability, sincerity and impartiality. It is expected that the survey and description of the categories will guide professionals and family members of disabled children in search of successful and effective collaborative partnership.

family-school relationship; collaborative partnership; children with disability; special education


RELATO DE PESQUISA

Família de crianças com deficiência e profissionais: componentes da parceria colaborativa na escola

Family of children with disabilities and professionals: components of the collaborative partnership in school

Aline Maira da SilvaI; Enicéia Gonçalves MendesII

IMestre em Educação Especial. Doutoranda em Educação Especial no Programa de Pós-Graduação em Educação Especial da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) - alinemaira@yahoo.com.br

IIDoutora em Psicologia. Professora adjunta do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) - Programa de Pós-Graduação em Educação Especial - egmendes@power.ufscar.br.

RESUMO

O presente estudo tem como objetivo identificar e descrever os comportamentos dos profissionais da escola e dos familiares de crianças com deficiência que, na perspectiva dos dois lados, são propiciadores e mantenedores de uma parceria colaborativa efetiva e bem sucedida. O estudo foi conduzido com quatro grupos focais, compostos por familiares (FAM1 e FAM2) e por profissionais (PROF1 e PROF2). Foram conduzidas duas etapas de coleta de dados. Na Etapa 1, as reuniões tiveram por objetivo identificar os componentes da parceria colaborativa. Na Etapa 2, cada um dos grupos focais foi confrontado com os dados obtidos na primeira etapa, sendo que familiares foram confrontados com os dados dos profissionais e vice-versa. Por meio da análise qualitativa dos dados obtidos, foram identificadas e descritas as categorias levantadas pelos participantes referentes aos comportamentos que devem ser emitidos. O estudo apontou que, entre as categorias levantadas, são observadas características essenciais do processo colaborativo, tais como respeito mútuo, comunicação, confiança, participação, amabilidade, sinceridade, seriedade e imparcialidade. Espera-se que o levantamento e a descrição das categorias possam nortear os profissionais da escola e familiares de crianças com deficiência na busca do estabelecimento de uma parceria colaborativa efetiva e de sucesso.

Palavras-chave: relação família-escola; parceria colaborativa; crianças com deficiência; educação especial.

ABSTRACT

This present study aims to identify and describe the behavior of professionals that work in the school and the family of children with disabilities that promote and maintain an effective and successful collaborative partnership, as viewed from both sides. The study was carried out with four focal groups, composed by families (FAM1 and FAM2) and professionals (PROF1 and PROF2). Two phases of data collection were conducted. In Phase 1 the meetings aimed to identify the components of collaborative partnerships. In Phase 2 each of the focal groups was confronted with data obtained during the first phase, i.e. the parents were presented with the data given by the professionals and vice versa. By qualitative analyses of the obtained data, the categories elicited by the participants related to the behaviors that should be emitted were identified and described. The study pointed out that among the elicited categories, essential characteristics of the collaborative process can be observed, such as mutual respect, communication, trust, participation, amicability, sincerity and impartiality. It is expected that the survey and description of the categories will guide professionals and family members of disabled children in search of successful and effective collaborative partnership.

Keywords: family-school relationship; collaborative partnership, children with disability; special education.

1 INTRODUÇÃO

Na área de Educação Especial, embora haja consenso na literatura sobre a importância da parceria entre escola e família (OMOTE, 1980; TURNBULL; TURNBULL, 1997; GARGIULO, 2002; PANIAGUA, 2004; DAVIES; HALL, 2005), as evidências têm apontado problemas na efetivação desta parceria. Talvez isso justifique o crescimento de estudos embasados na idéia do trabalho colaborativo, que pressupõe que profissionais não devem trabalhar sozinhos, mas em equipes que incluam também as famílias.

Ser colaborativo, segundo Turnbull e Turnbull (1997), significa trabalhar em conjunto com outras pessoas, criar um contexto que intensifique a ação coletiva e partilhar recursos. No caso da parceria colaborativa entre família e profissionais da escola, uma das dificuldades encontradas tem sido a falta de conhecimento sobre que componentes devem estar presentes nessa parceria para que ela tenha sucesso (DUNST, 2000; WINTON, 2000).

Com o objetivo de examinar práticas de serviços centrados na família, McWilliam, Tocci e Harbin (1998) entrevistaram profissionais provedores de serviços de Educação Especial. Foram levantados quatro temas relativos às atitudes dos profissionais em interações com familiares: a) como estabelecer um bom vínculo com os familiares e ajudá-los a participar da educação da criança; b) como pensar o melhor sobre os pais sem julgá-los, reconhecer o esforço dos mesmos e valorizar suas habilidades; c) como colocar-se no lugar dos pais tentando compreender suas preocupações, suas necessidades e prioridades; d) como desenvolver uma relação de reciprocidade e confiança.

Dinnebeil, Hale e Rule (1999) realizaram estudo com o objetivo de explorar a percepção de pais e coordenadores de serviço sobre práticas que influenciam na colaboração. Por meio da análise dos relatos foi possível identificar cinco categorias: a) filosofia e princípios norteadores dos programas de estimulação precoce e a maneira como pais e colaboradores percebiam tais programas; b) modo como o serviço de estimulação precoce era oferecido para as crianças e seus familiares; c) modo como a equipe de estimulação precoce trabalhava e como os membros da equipe atuavam em conjunto; d) políticas e práticas administrativas relacionadas com o planejamento dos serviços oferecidos; e) relação entre o programa de estimulação precoce e agências externas da comunidade.

Familiares e profissionais também foram alvo do estudo de Nelson, Summers e Turnbull (2004), cujo objetivo foi levantar a opinião de familiares e educadores sobre a relação entre eles. Para tanto, foram conduzidos grupos focais e entrevistas individuais com familiares de crianças com deficiência e com profissionais. Três temas foram relatados pelos participantes: a) disposição dos profissionais para se reunir com familiares em horários flexíveis e para se envolver com a vida do aluno e com o bem-estar do mesmo; b) exemplos das ações dos profissionais em sua atuação; c) características da relação entre pais e profissionais.

Kasahara e Turnbull (2005) também fizeram uso de grupos focais e entrevistas com o objetivo de levantar informações sobre o significado da parceria família - profissionais. Participaram do estudo mulheres japonesas que interagiam com freqüência com os profissionais responsáveis pela educação de seus filhos com deficiência. Os dados indicaram quatro temas que representaram as preferências e expectativas das participantes em relação à parceria: a) qualidade da relação entre criança e profissional; b) modo como os profissionais oferecem serviços e cuidados para as crianças com deficiência e seus familiares; c) características que devem fazer parte na interação entre familiares e profissionais; d) prioridades familiares relativas ao empoderamento e à orientação educacional.

Blue-Banning et al. (2004) investigaram a parceria colaborativa entre profissionais e familiares de pessoas com deficiência. O objetivo foi descrever os comportamentos emitidos por profissionais que são indicativos de uma parceria colaborativa, na perspectiva de profissionais e familiares. O estudo contou com a participação de familiares e profissionais e foram compostos grupos focais, sendo que no caso de participantes com proficiência limitada em inglês, foram realizadas entrevistas individuais ao invés dos grupos. Tanto as reuniões dos grupos focais como as entrevistas individuais foram direcionadas por um protocolo de entrevistas. Após análise dos dados, 39 categorias foram identificadas em seis eixos: comunicação; compromisso; igualdade ou reciprocidade entre os familiares e os profissionais; habilidades; confiança; respeito. Foi possível operacionalizar cada um dos eixos temáticos, descrevendo os comportamentos que devem ser emitidos por profissionais para que uma parceria de sucesso seja alcançada.

Considerando a importância de conhecer os componentes da parceria bem sucedida entre familiares e profissionais, de acordo com a realidade brasileira, o presente estudo teve como objetivo identificar e descrever os comportamentos dos profissionais que trabalham na escola e dos familiares de crianças com deficiência, que são propiciadores e mantenedores de uma parceria colaborativa bem sucedida, na perspectiva dos parceiros (familiares e profissionais).

2 MÉTODO

O estudo é baseado na abordagem qualitativa de pesquisa e envolveu entrevista com base na técnica dos grupos focais, na qual dados de natureza verbal são coletados por meio de interações grupais ao se discutir um tópico sugerido pelo pesquisador (MORGAN, 1997).

O método consistiu numa replicação parcial do estudo de Blue-Banning et al. (2004), anteriormente apresentado, tendo sido introduzidas as seguintes modificações metodológicas:

a) foram identificados e descritos os componentes da parceria colaborativa enfocando também os comportamentos a serem emitidos pelos familiares e não exclusivamente pelos profissionais;

b) os grupos focais foram compostos por profissionais que estavam diretamente relacionados à educação de crianças com deficiência, diferentemente do referido estudo que contou com a participação de administradores, provedores de serviços e profissionais da área da saúde;

c) quanto ao delineamento, no estudo de Blue-Banning et al. (2004) foram realizadas duas reuniões de coleta de dados, sendo que o presente estudo envolveu quatro reuniões com os grupos focais. Uma etapa adicional de reuniões foi introduzida para coletar dados sobre as reações dos participantes às informações levantadas no grupo dos parceiros. Além disso, não foram realizadas entrevistas individuais e o número de grupos foi menor no presente estudo.

2.1 PARTICIPANTES

Foram recrutados 31 participantes: 13 familiares de crianças com deficiência e 18 profissionais que trabalham na escola. O recrutamento foi realizado por conveniência, e os grupos foram formados com familiares e profissionais que concordaram em participar. Os 31 participantes foram divididos em quatro grupos focais independentes, dois compostos exclusivamente por profissionais (PROF1 e PROF2) e dois por familiares (FAM1 e FAM2). Os grupos PROF1 e PROF2 foram compostos por nove participantes cada um, e nos grupos dos familiares, FAM1 e FAM2 foram compostos, respectivamente, por seis e sete participantes.

No grupo PROF1 a idade dos profissionais participantes variou entre 20 e 54 anos (mediana igual a 24 e desvio padrão de 12,46) e no grupo PROF2, a idade variou entre 22 e 56 anos (mediana igual a 35 e desvio padrão de 12,32). Em relação ao gênero, apenas dois participantes no grupo PROF1 e um no PROF2 eram do sexo masculino. Em relação às profissões exercidas, houve maior variação no grupo PROF2, sendo que as profissões dos participantes foram: monitoras de sala (três estudantes de Pedagogia que auxiliavam a professora em sala de aula), quatro pedagogos, dois educadores físicos, duas assistentes sociais e um profissional de cada profissão a seguir: psicopedagoga, psicóloga, cirurgiã dentista, coordenadora pedagógica, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta e professora de dança.

Participaram dos grupos compostos por familiares, 11 mães de crianças com deficiência e duas avós. A idade das participantes do grupo FAM1 variou entre 27 e 50 anos (mediana igual a 34,5 e desvio padrão de 8,69), e do grupo FAM2 variou entre 26 e 58 anos (mediana igual a 30 e desvio padrão de 11,34). Em relação ao grau de escolaridade, nove dos participantes tinham ensino fundamental incompleto, dois tinham ensino fundamental completo, e duas completaram o ensino médio. Em relação às crianças (filhos ou netos das familiares participantes), a idade variou entre três e seis anos, e os diagnósticos relatados foram: Síndrome de Down, Deficiência Intelectual, Deficiência Visual, Paralisia Cerebral, Síndrome de West e Síndrome de Costello.

2.2 LOCAL

As reuniões com os grupos foram conduzidas em três escolas especiais, localizadas em três diferentes cidades do interior do estado de São Paulo. A seleção das instituições foi baseada em dois critérios: anuência da direção para realizar o estudo e conveniência em termos de acesso à coleta de dados.

2.3 MATERIAL

Os materiais utilizados foram: roteiro semi-estruturado de entrevista para os grupos, filmadora e fitas VHS. O roteiro construído foi baseado no instrumento utilizado no estudo de Blue-Banning et al. (2004). Dessa forma, foram elaboradas duas questões com o mesmo objetivo das questões do roteiro original, ou seja, levantar e descrever os comportamentos a serem emitidos pelos profissionais. Além disso, foram elaboradas outras duas questões que visavam identificar e descrever os comportamentos a serem emitidos pelos familiares.

2.4 PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS

O Quadro 1 sintetiza o delineamento do estudo e os respectivos dados coletados em cada uma das reuniões, as denominadas "listas".


Etapa 1: Levantamento inicial dos componentes principais da parceria colaborativa na percepção de familiares e profissionais

Nesta etapa foram realizadas duas rodadas de reuniões (1ª e 2ª), de cerca de uma hora e meia para cada reunião em cada um dos quatro grupos. Durante a 1ª rodada de reuniões foram apresentados os objetivos do estudo e foi pedido que os participantes assinassem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e preenchessem a Ficha de Identificação. Em seguida, os participantes foram informados sobre o que era esperado deles, sobre a rotina da reunião e a duração da mesma. Também foi explicitada a forma como as reuniões seriam registradas e foi explicado o quanto era imprescindível a anuência dos participantes (GATTI, 2005).

Os participantes foram encorajados a compartilhar idéias e percepções entre si, com o intuito de gerar um amplo levantamento de possíveis fatores relacionados com uma parceria colaborativa bem sucedida. Foram efetuadas questões abertas referentes aos componentes principais que deveriam estar presentes para que uma parceria colaborativa obtivesse sucesso e fosse efetiva.

Após a primeira rodada de reuniões, os dados foram sistematizados em forma de listas contendo o sistema de categorias definidas e ilustradas a partir dos relatos para cada um dos grupos. Esta etapa resultou em quatro diferentes listas (A, B, C e D), sendo uma para cada grupo.

Em seguida, as duas listas obtidas nos grupos dos profissionais (lista A e lista B) foram compiladas numa única lista (lista AB), de modo a restar um único sistema contendo todas as categorias identificadas pelo conjunto de todos os profissionais. O mesmo foi feito com a lista dos dois grupos dos familiares (C e D), permitindo gerar também uma única lista (CD) para o conjunto dos familiares.

Na segunda reunião, a lista AB foi então apresentada pela pesquisadora aos grupos PROF1 e PROF2. Neste momento, foi solicitado aos profissionais que opinassem sobre a precisão e a relevância das categorias levantadas, e também que adicionassem informações caso considerassem necessário complementar as listas. A lista CD foi igualmente apresentada aos dois grupos dos familiares (FAM1 e FAM2).

Após esta segunda reunião, uma nova fase de análise dos dados coletados foi efetuada a fim de complementar e aperfeiçoar as listas AB e CD de categorias, com a incorporação dos dados coletados na segunda entrevista. Concluídas as duas listas (AB e CD), pôde ter início a segunda etapa do estudo.

Etapa 2: Troca de informações entre os grupos

Para que os participantes reagissem às informações levantadas nos outros grupos e para que pudessem debater sobre elas, foram realizadas mais duas rodadas de reuniões (3ª e 4ª), também com duração de aproximadamente uma hora, para reunião em cada um dos quatro grupos.

Nestas reuniões as listas finais produzidas pelo conjunto dos familiares (lista CD) e dos profissionais (lista AB) foram trocadas a fim de analisar como eles reagiriam às expectativas do outro componente da parceria. Assim, foi apresentado aos grupos PROF1 e PROF2 o conjunto das categorias levantadas pelo grupo FAM1 e FAM2 e vice-versa. Com isso, os participantes puderam opinar sobre a relevância das discussões realizadas e também puderam adicionar informações caso considerassem necessário complementar as listas, numa quarta rodada de reuniões.

2.5 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DOS DADOS

Todas as 16 reuniões conduzidas com os quatro grupos focais foram gravadas em fitas VHS e, posteriormente, transcritas. Para analisar as transcrições foi utilizada a análise de conteúdo que, de acordo com Bardin (1977), envolve operações de desmembramento do texto em unidades e em categorias segundo reagrupamentos analógicos.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 COMPORTAMENTOS ESPERADOS DOS FAMILIARES

Foram identificadas 12 categorias relacionadas aos comportamentos que devem ser emitidos pelos familiares na parceria colaborativa: comunicar-se com os profissionais; ser responsável pela educação do filho; manter expectativas adequadas; aceitar a deficiência do filho; respeitar os profissionais; reconhecer o trabalho dos profissionais; confiar no trabalho desenvolvido; acreditar no trabalho desenvolvido; questionar os profissionais de modo adequado; garantir a freqüência do aluno; visitar a escola; participar das atividades.

Três categorias foram levantadas por ambos os grupos: comunicar-se com os profissionais; ser responsável pela educação do filho; manter expectativas adequadas.

Quanto à categoria "comunicar-se com os profissionais", os participantes sugeriram que esta pode ser efetivada por meio do caderno de comunicação ou pessoalmente. Além disso, tanto os familiares quanto os profissionais acreditam que a família pode colaborar fornecendo sugestões, opiniões e esclarecendo dúvidas com os profissionais.

[...] a gente tem caderno [...] eu não escrevo todo dia porque eu tô aqui todo dia/eu também tô aqui então eu converso com elas. Conversar é melhor. (FAM1)

Entretanto, nesta mesma categoria, os familiares discutiram aspectos que não foram abordados pelos profissionais, tais como a expectativa de que eles tenham liberdade para falar com os profissionais como alguém íntimo e ter abertura para resolver divergências com diálogo. Também foi ressaltado que os profissionais devem se comunicar de forma clara e acessível.

Aiello (2002) confirma que uma das queixas mais freqüentes dos pais é a dificuldade em compreender a linguagem técnica utilizada pelos profissionais. No estudo de Blue-Banning et al. (2004), os familiares também relataram que gostariam de poder conversar com os profissionais como se eles fossem um membro da família. Além disso, os participantes consideraram que profissionais e pais devem ouvir cuidadosamente, abertamente e com imparcialidade o que o parceiro tem a dizer.

Quanto à categoria "ser responsável pela educação do filho", os participantes consideraram importante que os familiares dessem continuidade ao trabalho realizado pelos profissionais. Os familiares discutiram sobre a importância de seguir as orientações dos profissionais em casa e de dialogar com os profissionais quando encontrassem dificuldades para seguir as orientações fornecidas, mas destacaram que nem sempre podem ou desejam seguir rigidamente as orientações dadas.

Continuar o trabalho deles em casa. Colocar a criança na postura que elas pedem. Não pode deixar a criança tudo torta em casa. Isso é muito importante. (FAM1)

As evidências em relação a esta categoria indicam mais um modelo de relação família-profissional denominado como modelo de transplante (PANIAGUA, 2004) do que de colaboração, porque os familiares ainda se colocam como co-educadores, ou seguidores das orientações fornecidas pelos profissionais, embora admitam que nem sempre as orientações devam ser seguidas. Ao se manifestarem sobre os comentários dos familiares, os profissionais reconheceram que algumas orientações devem ser seguidas com moderação (exercícios musculares, por exemplo), mas apontaram que outras precisam ser seguidas rigidamente como, por exemplo, o emprego de técnicas adequadas de disciplina.

Assim, percebemos que a ótica dos profissionais também evidenciou o modelo do transplante que, segundo Paniagua (2004), é válido porque alguns pais, ao assumirem o papel de auxiliares dos profissionais, se sentem mais envolvidos e mais úteis. Por outro lado, muitas famílias podem perceber a obrigação de realizar intervenções com os filhos em casa como uma sobrecarga em sua rotina diária e com isso sentir que seu papel de pais fica distorcido.

Os participantes do estudo enfatizaram que é papel dos pais a responsabilidade pela educação do filho. No entanto, cabe salientar que promover tal atitude é também papel dos profissionais. No estudo de McWilliam, Tocci e Harbin (1998), os participantes discutiram que os profissionais são responsáveis por envolver a família, de modo que ela também se sinta responsável pela educação do filho. Para tanto, os profissionais entrevistados consideraram que precisam ser sensíveis e capazes de estabelecer um bom vínculo com os pais, conseguindo adquirir a confiança dos mesmos.

Em relação à categoria "manter expectativas adequadas", os participantes concordaram que os familiares precisam reconhecer os limites dos profissionais assim como os limites de desenvolvimento do filho com deficiência. Entretanto, os participantes também reconheceram que a ansiedade em observar progressos mais evidentes pode dificultar a manutenção de expectativas adequadas e impedir que os pequenos progressos sejam valorizados.

[...] a mãe cria uma/uma barreira, né/uma expectativa e depois ela vê que não tá acontecendo/ela cobra/ela chega ela briga [...]. (PROF2)

Os profissionais também apontaram que a manutenção das expectativas adequadas envolve a aceitação da deficiência. Diante disso, os familiares manifestaram que, além de aceitar as necessidades, é preciso que a família se empenhe para promover o desenvolvimento do indivíduo de acordo com suas possibilidades.

Em relação a essa categoria, os participantes consideraram não apenas o papel dos familiares em manter expectativas adequadas, mas também o papel dos profissionais em ajudar no estabelecimento de tais expectativas. Dessa forma, todos concordaram que cabe aos profissionais esclarecer a família sobre as possibilidades de desenvolvimento da criança. Além disso, os profissionais relataram a necessidade de informar os familiares sobre a deficiência apresentada pelo aluno, sobre as diferenças existentes entre crianças que apresentam uma mesma deficiência e também sobre as etapas e as dificuldades das intervenções a serem realizadas.

Ao se manifestarem frente ao relato dos profissionais, os familiares opinaram que ajudar a família a manter expectativas adequadas é uma forma de demonstrar respeito e honestidade. Foi considerado que, embora os profissionais não devam mentir, é necessário considerar o estresse e o sofrimento apresentados pelos familiares e encontrar o melhor momento para fornecer informações que a família provavelmente terá dificuldade para assimilar.

Ainda considerando os comportamentos que devem ser emitidos por familiares, algumas categorias foram levantadas apenas pelas famílias: aceitar a deficiência do filho; respeitar os profissionais. De acordo com os familiares, aceitar a deficiência do filho significa não superproteger e não ter vergonha do filho. Os familiares admitiram que a aceitação é difícil e que, por vezes, eles apresentam recaídas. É interessante observar que os familiares têm clareza que o fato de aceitar a condição colabora com o estabelecimento da parceria com os profissionais.

A gente tem que aceitar o problema da criança. Eu levo a minha filha pra todos os lugares. Eu levo em festa, em velório, em casamento, em todo lugar. Eu não tenho que ter vergonha da minha filha, eu tenho orgulho dela. A aceitação é difícil. Tem fases que a gente cai. Às vezes eu vejo outras crianças da mesma idade e penso que a minha filha podia ser assim. (FAM2)

Ao se posicionarem em relação a essa categoria, os profissionais discutiram que aceitar também significa não negligenciar, impor regras de disciplina e aceitar os limites do filho. Além disso, os profissionais destacaram que, quando a família apresenta expectativas adequadas em relação ao desenvolvimento do filho, a aceitação é mais fácil.

A categoria "respeitar os profissionais" também foi levantada apenas pelos grupos dos familiares. Segundo esses participantes, o respeito envolve dialogar de maneira adequada, pensar previamente sobre o que discutir com os profissionais e averiguar os fatos ocorridos para não acusar os profissionais injustamente. Também foi incluída nessa categoria a necessidade de se adaptar às características pessoais do profissional e à sua maneira de trabalhar. Os participantes destacaram que o respeito deve ser recíproco. Esse fato é positivo, já que o respeito mútuo é descrito pela literatura como umas das características principais do trabalho colaborativo (WOOD, 1998).

[...] quando a gente tem uma crítica tem que falar/é, tem que primeiro analisar certinho, encontrar a melhor forma de falar. (FAM1)

Os profissionais enfatizaram a honestidade em seu posicionamento em relação à categoria em questão e, para eles, ser honesto significa relatar problemas ocorridos em casa, e não culpar a escola injustamente por fatos ocorridos com o aluno.

Além disso, foi discutido que é importante que os familiares se adaptem a algumas características dos profissionais, embora não seja esperado que eles mudem completamente o seu modo de ser. Foi ressaltado também que a adaptação deve ser recíproca e pode ser alcançada por meio do diálogo.

Foi discutido, em relação à categoria "reconhecer o trabalho dos profissionais", que uma das formas de reconhecimento é manter o aluno na escola e considerar o trabalho realizado como sendo importante para o filho. Em seu posicionamento sobre a categoria, os familiares consideraram que o reconhecimento pode ser demonstrado por meio de elogios e agradecimentos.

No que diz respeito à categoria "confiar no trabalho desenvolvido", os profissionais relataram que a confiança pode ser demonstrada quando os familiares solicitam sugestões sobre como agir com o filho ou pedem opinião sobre alguma atitude tomada. Os familiares acrescentaram que outra maneira de demonstrar confiança é continuar mantendo o filho sob os cuidados dos profissionais.

[...] quando na escola de pais eles perguntam "o que que eu faço", "eu fiz certo ou não", isso já demonstra uma certa confiança. Porque se a pessoa não confia, ela não vai perguntar o que fazer com o filho. (PROF1)

É importante destacar que os profissionais relataram como um dos comportamentos esperados dos familiares o comportamento de "confiar no trabalho desenvolvido", mas eles não discutiram sobre as atitudes que eles próprios devem apresentar para propiciar tal confiança.

A categoria "acreditar no desenvolvimento do filho" foi identificada como importante pelos profissionais. Além disso, eles observaram que os familiares precisam se empenhar para que o desenvolvimento ocorra e, para isso, foi apontada a necessidade de deixar o filho desempenhar certas atividades.

Aqui as professoras ensinam a criança comer sozinha, com garfo tal e depois chega em casa e a mãe dá comida na boca e fala que o filho não sabe comer sozinho. (PROF2)

Segundo Dallabrida (1996), fazer pelos filhos o que eles são capazes de fazer sozinhos é uma maneira de superproteção. Além disso, os pais podem fazer tudo pelos filhos porque precisam que seus filhos dependam deles ou então porque consideram menos trabalhoso fazer pela criança do que encorajar e ensinar essa criança a fazer tudo sozinha o que, em alguns casos, significaria maior quantidade de tempo gasto, exigindo dos cuidadores mais paciência (PRACONI, 1988).

Em relação à categoria "visitar a escola", os profissionais consideraram as visitas importantes, mas ressaltaram que as mesmas devem ser esporádicas e agendadas para não atrapalhar a rotina dos alunos. Além disso, antes de fazer a visita, os familiares precisam ter um conhecimento prévio sobre os objetivos das atividades realizadas em sala de aula e, durante a visita, os familiares não podem interferir no trabalho dos profissionais.

[...] eu acho que os pais têm direito de vir na escola, só que eles teriam que agendar, a gente tem que ficar sabendo [...] então, é claro que eles têm direito a vir, mas de uma maneira bem estruturada/antecipada/não todos os dias. (PROF1)

Diante desses comentários, é possível perceber uma contradição no discurso dos profissionais que, embora comentem a importância das visitas, impõe várias condições para que ela seja efetivada. Tal postura é negativa para o estabelecimento da parceria colaborativa, que prevê a igualdade entre familiares e profissionais e uma relação de proximidade e confiança mútua. Entretanto, ao tomarem conhecimento sobre os comentários dos profissionais, os familiares não demonstraram incômodo, o que pode indicar que, para eles, os profissionais ocupam uma posição superior que os permite estabelecer regras sem antes consultá-los.

Quanto à categoria "participar das atividades realizadas", foi levantado que a participação dos familiares pode ser demonstrada em várias atitudes, tais como: visitar a escola; perguntar se a escola precisa de algo e fornecer, quando possível, o que a escola precisa; ler o que os profissionais escrevem no caderno de comunicação e ajudar na preparação das festas promovidas pela escola, além de participar das mesmas.

Ver sempre o caderno também mostra que o pai é participativo/assinar o caderninho, pra mostrar que ele tá vendo, se comunicando com a gente. (PROF1)

É importante observar que a participação dos familiares no planejamento educacional não foi mencionada, ou seja, familiares não são considerados parceiros no momento de selecionar e priorizar objetivos educacionais a serem buscados assim como de planejar as melhores estratégias para alcançar tais objetivos. Turnbull e Turnbull (1997) consideram importante que os familiares estejam envolvidos no processo de tomada de decisões, decidindo quais questões educacionais devem ser priorizadas, escolhendo a extensão do envolvimento familiar em cada questão educacional e selecionando objetivos e serviços apropriados para o aluno.

3.2 COMPORTAMENTOS ESPERADOS DOS PROFISSIONAIS

No que diz respeito aos comportamentos que são esperados dos profissionais, foram identificadas 19 categorias: comunicar-se com os familiares; ajudar os familiares a manter expectativas adequadas; respeitar os alunos e os familiares; comunicar-se com outros profissionais; ser amistoso; separar os problemas pessoais da atividade profissional; promover o desenvolvimento do aluno; estar atento aos problemas dos familiares e tentar resolvê-los; preocupar-se com o aluno fora da escola; incorporar ao trabalho sugestões fornecidas pelos familiares; oferecer grupos aos pais; oferecer orientações aos pais; demonstrar seriedade; ser sincero; ser imparcial; conhecer as características dos familiares e alunos; incentivar a participação dos familiares; reunir-se com familiares; mostrar aos familiares as atividades realizadas.

Três categorias foram levantadas por ambos os grupos: comunicar-se com os familiares; ajudar os familiares a manter expectativas adequadas; respeitar os alunos e os familiares. Em relação à categoria "comunicar-se com familiares", os participantes sugeriram o caderno de comunicação. Os profissionais indicaram, além do caderno de comunicação, o telefone e as reuniões. Segundo os familiares, os profissionais devem fornecer oportunidades para eles se expressarem e elaborarem suas perguntas. Além disso, foi indicado que os profissionais devem dialogar com a família do aluno sobre o trabalho desenvolvido para existir correspondência entre o comportamento dos profissionais e dos familiares.

Eles dão oportunidade pra gente falar aquilo que a gente pensa. (FAM1)

Por sua vez, os profissionais relataram que a comunicação pode ter como objetivos informar os familiares sobre como foi o dia do aluno na escola, perguntar sobre faltas e sobre o uso do uniforme e também sobre encaminhamentos e resultados de exames. Foi também ressaltado que a comunicação não deve ser realizada apenas para relatar problemas.

Então eu só vou comunicar quando tem alguma alteração, quando acontece alguma coisa errada? Não. (PROF1)

Ainda sobre essa categoria, os participantes (pais e coordenadores de serviço) do estudo realizado por Dinnebeil, Hale e Rule (1999) discutiram sobre a importância de existir um profissional com quem os familiares pudessem se comunicar, e apontaram que o compartilhamento de conhecimento e informação é crítico para a comunicação.

Ao discutirem sobre comunicação, os profissionais do estudo desenvolvido por Blue-Banning et al. (2004) enfatizaram a importância de se comunicar com os familiares de maneira honesta, cuidadosa e respeitosa, evitando o uso de jargões. Também foi relatada a necessidade de checar, com tato, para ter certeza de que todos os pais entenderam as informações, descrições de direitos e documentos que lhes foram entregues.

Como posicionamento sobre as discussões realizadas pelos profissionais, os familiares destacaram que o caderno de comunicação deve ser enviado na mochila do aluno todos os dias e preenchido com informações sobre o dia do aluno na escola. Os familiares consideraram que o caderno de comunicação é uma oportunidade para se comunicar com o professor quando o contato pessoal não é possível. Além disso, os familiares discutiram que os profissionais devem entrar em contato com a família para fornecer orientações e perguntar sobre as atitudes da mãe em relação ao aluno.

No que diz respeito à categoria "respeitar familiares e alunos", os participantes discutiram a necessidade de falar com os familiares de forma acessível, ouvindo e acolhendo suas dificuldades. De acordo com os profissionais, é necessário demonstrar respeito em relação às características do aluno durante as interações, mas também no momento de planejar atividades. Além disso, o respeito envolve estar atento aos desejos e às necessidades do aluno e reconhecer que os familiares são capazes de ajudar os profissionais em seu trabalho. Segundo os familiares, ser respeitoso envolve ser educado e ter cuidado para não deixar os familiares inseguros.

[...] porque eles são respeitados, cada um dentro da sua individualidade. Então de acordo com isso a gente monta o PEI, porque uns são mais rápidos, outros são mais lentos. (PROF1)

Em relação ao respeito, as mães do estudo de Kasahara e Turnbull (2005) destacaram o desejo de que os profissionais tratassem seus filhos como pessoas que possuem direitos humanos fundamentais e não como um caso para estudar e categorizar. Algumas participantes também enfatizaram que os profissionais devem compreender e respeitar as intenções de seus filhos e compartilhar as perspectivas que as crianças possuem, ao invés de aplicar e impor concepções prévias sobre o desempenho dos alunos. As mães também demonstraram apreciar profissionais que promovem a aceitação da criança com deficiência por parte das outras crianças.

Examinando ainda os comportamentos que devem ser emitidos pelos profissionais, algumas categorias foram levantadas apenas pelos familiares: comunicar-se com outros profissionais; ser amistoso; separar problemas pessoais da atividade profissional; promover o desenvolvimento do aluno; estar atento aos problemas dos familiares e tentar resolvê-los; incorporar sugestões fornecidas pelos familiares; preocupar-se com o aluno fora da escola; oferecer grupos aos pais; fornecer orientações aos familiares.

Foi levantada a importância de os profissionais serem amistosos, tratando alunos e familiares com carinho, sendo agradável e receptivo. Os pais participantes do estudo de Nelson, Summers e Turnbull (2004) relataram que cortesia, relações amigáveis e solicitude devem fazer parte da conduta profissional e podem ser consideradas essenciais para o estabelecimento do vínculo com os pais.

Em relação à categoria "estar atento aos problemas dos familiares e tentar resolvê-los", segundo os familiares, significa que os profissionais devem ser atenciosos com a família, ouvir o que ela tem para falar e perguntar sobre o aluno. Também foi considerado o comportamento de tentar resolver os problemas apresentados pelos familiares desde que estes sejam comunicados pessoalmente ou por escrito e o comportamento de ajudar os familiares quando eles estão vivenciando um momento de crise.

A mesma discussão foi realizada pelos profissionais entrevistados no estudo de McWilliam, Tocci e Harbin (1998). Eles relataram que os profissionais devem ser responsivos, atendendo aos interesses dos pais, prestando atenção e agindo quando os mesmos expressam uma necessidade ou um problema. Para tanto, foi ressaltado que o serviço oferecido deve ser individualizado e flexível.

Ao se posicionarem sobre a categoria em questão, os profissionais discutiram que os problemas comunicados devem ser resolvidos quando possível e, quando eles não puderem ser resolvidos diretamente pelos profissionais, estes devem encaminhar os familiares para serviços de assistência que tenham condições de fazê-lo.

Os familiares discutiram a importância dos profissionais se preocuparem com o bem estar do aluno e de sua família não apenas durante as aulas ("preocupar-se com o aluno fora da escola").

[...] entrava na UTI 2 horas, saía de lá 2 e meia, quando era 2 e 35 eles tavam ligando [...] Então eu percebi assim, eles não querem saber só como a criança tá aqui, eles querem saber também como a criança tá passando em casa [...] (FAM2)

Os profissionais manifestaram-se em relação à categoria relatando a importância de acompanhar o aluno quando este é hospitalizado, visitar o aluno quando ele foi submetido a procedimentos cirúrgicos e está se recuperando em casa, ligar para a família quando o aluno apresenta muitas faltas e comparecer a festas de aniversário e casamento quando são convidados. Nesse mesmo sentido, os profissionais participantes do estudo de Nelson, Summers e Turnbull (2004) enfatizaram que compartilhar aspectos da vida pessoal dos pais é um meio importante para estabelecer uma relação de confiança.

Ainda em relação aos comportamentos esperados dos profissionais, as categorias levantadas apenas pelos profissionais foram: demonstrar seriedade; ser sincero; ser imparcial; conhecer as características dos familiares e dos alunos; incentivar a participação dos familiares; reunir-se com familiares; mostrar aos familiares as atividades realizadas.

Segundo os profissionais, demonstrar seriedade envolve os seguintes aspectos: realizar atividades estruturadas de acordo com um planejamento educacional individualizado; planejar atividades tendo em vista um objetivo e considerando as habilidades do aluno; respeitar o código de ética da profissão assim como as regras da escola; ser responsável; trabalhar não apenas pelo salário, mas porque gosta do que faz e acredita no trabalho desenvolvido.

As mães que participaram do estudo de Kasahara e Turnbull (2005) discutiram sobre seriedade ao apresentar os princípios que devem ser seguidos por um serviço de alta qualidade. Segundo as mães, os profissionais devem ser flexíveis e realizar adaptações em suas intervenções para oferecer serviços realmente individualizados e adaptados de acordo com as especificidades individuais.

Em relação à categoria "ser sincero", os profissionais relacionaram a sinceridade com o comportamento de explicar de maneira acessível sobre a deficiência do aluno, assim como sobre as limitações e as possibilidades de desenvolvimento deste aluno. Além disso, a sinceridade foi considerada como um elemento importante para a existência da confiança na relação família-profissional.

[...] o primeiro ponto que deve ser visto é a verdade. Seu filho tem capacidade pra fazer isso, seu filho não tem capacidade pra fazer aquilo [...] eu acho que é aí que começa a confiança, o vínculo entre a família e a escola. (PROF1)

Em seu posicionamento sobre a categoria, os familiares discutiram que os profissionais devem expor sua opinião sobre as possibilidades de desenvolvimento do aluno, conversando claramente com a família sem fazer uso de frases vagas. Os familiares também relataram que o fato de os profissionais fornecerem opiniões discordantes os confunde porque eles ficam sem saber em quem acreditar. Para eles, é melhor saber a verdade, mesmo que esta provoque sofrimento, porque diante da sinceridade é possível se adaptar à realidade e evitar sofrimento futuro.

[...] eu sempre procuro vários profissionais, e cada uma me dá uma versão. Eu não sei em quem acreditar. É melhor a gente sofrer e saber que é x e x. (FAM1)

Este tema foi abordado pelos familiares do estudo de Blue-Banning et al. (2004), que relataram a importância de ser sensível para informações que devem ser conduzidas privadamente, evitar implicações de culpa e lembrar de incluir comentários positivos sobre a criança assim como propor desafios.

Ao discutir sobre imparcialidade, os profissionais relataram a importância de não julgar os comportamentos dos familiares e dos alunos e sim conversar com os pais para entender o significado de tais comportamentos. Também foi relatado que os profissionais não devem julgar que o aluno não é capaz de realizar determinada atividade antes que isso seja constatado na prática, porque essa atitude influencia negativamente a realizações de intervenções. Em seu posicionamento, os familiares opinaram que, antes de fazer julgamentos, os profissionais devem procurar conhecê-los melhor.

Eles não podem me julgar pelo que eles vêem. Eles têm que me conhecer. (FAM2)

Em relação à imparcialidade, os profissionais entrevistados por McWilliam, Tocci e Harbin (1998) discutiram sobre a importância de pensar o melhor sobre a família, acreditar nas habilidades dos pais e manter uma visão otimista sobre o desenvolvimento da criança sem julgá-la.

4 CONCLUSÕES

Considerando o estudo realizado por Blue-Banning et al. (2004), e outras pesquisas supramencionadas realizadas em outras realidades, identifica-se como tema comum a questão da igualdade. Todos enfatizam a importância da igualdade para a parceria colaborativa, sendo que os familiares acreditam que, para atingi-la, é necessário realizar o empoderamento1 1 Tradução do termo em língua inglesa empowerment, que vem sendo freqüentemente traduzido pelo neologismo "empoderamento", devido à falta de um termo em português que signifique transferir ou devolver o controle da própria vida para a pessoa ao invés de tutelá-la ou tentar controlá-la (MENDES, 2006). dos familiares. Eles descreveram que os profissionais devem encorajar os familiares a expressarem suas opiniões e ajudá-los a adquirir habilidades para participar plenamente na tomada de decisões.

Assim, em outros países os estudos com profissionais da Educação Especial parecem apontar o empoderamento dos pais como algo importante para que eles possam participar como iguais no processo de tomada de decisões sobre serviços a serem oferecidos para crianças e a si próprios. Para realizar o empoderamento dos pais, os profissionais participantes do estudo de Blue-Banning et al. (2004), apontaram as seguintes estratégias: informá-los sobre seus direitos; ajudá-los a elaborar questões para o médico; orientá-los a expressarem suas opiniões e oferecer suporte moral aos pais.

O que chama a atenção no presente estudo é o fato de este tema não ter sido levantado pelos participantes, o que pode indicar que familiares e profissionais, na realidade brasileira, ainda não se colocam em posição de igualdade.

Outro indicador de que não parece haver igualdade na relação, foi o fato de os familiares terem reagido pouco às categorias levantadas pelos profissionais, já que não houve reação a oito categorias. Mais especificamente, os familiares manifestaram-se menos em relação às categorias levantadas pelos profissionais relacionadas com os comportamentos a serem apresentados pelos mesmos. Nesse caso, os familiares reagiram apenas à metade das categorias levantadas. Cabe destacar que os profissionais deixaram de reagir à apenas duas categorias levantadas pelos familiares.

Considerando que a igualdade entre parceiros é fundamental para a existência da colaboração, é possível argumentar que tanto familiares quanto profissionais ainda precisam amadurecer no sentido de saber qual é o seu papel na parceria e qual é o papel do outro.

No entanto, o estudo aponta que ambos estão caminhando nesse sentido, já que entre as categorias levantadas são observadas características essenciais do processo colaborativo, tais como respeito mútuo, comunicação, confiança, participação, amabilidade, sinceridade, seriedade e imparcialidade.

Recebido em 09/11/2007

Reformulado em 10/06/2008

Aprovado em 16/08/2008

Apoio financeiro: FAPESP.

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  • 1
    Tradução do termo em língua inglesa
    empowerment, que vem sendo freqüentemente traduzido pelo neologismo "empoderamento", devido à falta de um termo em português que signifique transferir ou devolver o controle da própria vida para a pessoa ao invés de tutelá-la ou tentar controlá-la (MENDES, 2006).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Set 2008
    • Data do Fascículo
      Ago 2008

    Histórico

    • Recebido
      09 Nov 2007
    • Revisado
      10 Jun 2008
    • Aceito
      16 Ago 2008
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