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Quão porosa deve ser uma rocha para que seja permeável?

How porous must a rock be in order to become permeable?

Resumos

Nesta breve nota, visamos a introdução de alguns conceitos e operações importantes sobre a aplicações das teorias da percolação e da renormalização ao estudo de meios porosos. A exposição em forma de problema/solução intenta um viés didático e não exaustivo. Referências mais abrangentes são fornecidas no fim.

meios porosos; percolação; renormalização


In this short paper, we aim to introduce some important concepts and operations about the application of ideas from percolation and renormalization theories to the study of porous media. The exhibition in the form of problem/solution attempts an educational and non exhaustive view. References are provided at the end.

porous media; percolation; renormalization


ARTIGOS GERAIS

Quão porosa deve ser uma rocha para que seja permeável?

How porous must a rock be in order to become permeable?

Andre Rafael Cunha1 1 E-mail: cunha@lmpt.ufsc.br. ; Celso Peres Fernandes; Lus Orlando Emerich dos Santos

Laboratório de Meios Porosos e Propriedades Termofásicas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil

RESUMO

Nesta breve nota, visamos a introdução de alguns conceitos e operações importantes sobre a aplicações das teorias da percolação e da renormalização ao estudo de meios porosos. A exposição em forma de problema/solução intenta um viés didático e não exaustivo. Referências mais abrangentes são fornecidas no fim.

Palavras-chave: meios porosos, percolação, renormalização.

ABSTRACT

In this short paper, we aim to introduce some important concepts and operations about the application of ideas from percolation and renormalization theories to the study of porous media. The exhibition in the form of problem/solution attempts an educational and non exhaustive view. References are provided at the end.

Keywords: porous media, percolation, renormalization.

1 Introdução e problema

Algumas vezes em física aplicada desejamos saber se determinado solo ou rocha é ou não permeável, e para tanto os interpretamos como sendo uma rede formada por sítios aleatoriamente ocupados, que simbolizam a fase sólida, e vazios que representam a fase porosa. A Fig. 1 exibe um exemplo para tal modelo.

Figura 1.
a) Meio poroso interpretado como uma rede de sítios ocupados (fase sólida) e vazios (fase porosa). b) Dica de resolução. Fonte: Ref. [6].

Define-se a grandeza porosidade como a razão dos sítios vazios pelo total de sítios da rede. E interpretamos esse valor como a probabilidade p0 de um sítio qualquer da rede assumir a condição de poro.

Propomos a seguinte questão: qual o valor de p0 para que o meio poroso seja permeável?

Para que o meio poroso em questão seja permeável da esquerda para a direita, por exemplo, é necessário que haja um aglomerado percolante (em inglês, percolate cluster) de unidades porosas, i.e., um caminho contínuo[2 2 Como caminho contínuo estamos nos referindo a sítios que possuem um lado em comum e não apenas um vértice. ] formando sítios vazios entre as duas extremidades.

Sugestão:

divida a rede em sub-redes conforme a figura Fig. 1b.

2 Solução

Adotando a sugestão proposta, vamos considerar as subdivisões das redes. De acordo com a Fig. 1b, a célula de 1 ordem é formada por quatro sítios. A de 2 ordem, formada por quatro células de 1ª ordem. E assim por diante.

A célula de 1 ordem será permeável se também houver um caminho percolante (da esquerda para direita, por exemplo), ou seja, um arranjo adequado de sólidos e poros nos quatro sítios que a formam; assim, a probabilidade p1 dessa célula ser permeável é uma função de p0.

A Fig 2 exibe todas as possíveis configurações para a célula de 1 ordem. Em (a), os quatro sítios porosos formam um caminho percolante entre o lado esquerdo e o direito; essa configuração ocorre com probabilidade . Em (b), três dos quatro sítios são porosos, e em todas os casos a célula é permeável; a probabilidade é . Em (c), apenas o primeiro e o sexto arranjo são permeáveis; e com probabilidade . Em (d), a célula de 1 ordem não é permeável; e a soma da probabilidade de tais estados é . Por fim, a disposição exibida (e) também não é permeável e ocorre com probabilidade .


Figura 2. Configurações de células de 1ª ordem. O sinal "+'' significa que a célula é permeável, e "-'' o contrário. Fonte: Ref. .

Somando todas as possibilidades da célula de 1ª ordem ser permeável, temos

Se procedermos analogamente com esse processo de renormalização para a célula de 2ª ordem, concluiremos que

e indutivamente encontra-se a seguinte relação recursiva para a célula de ordem n+1

Para , vem que [2]

ou em uma notação mais concisa,

Podemos, por um instante, reinterpretar o lado direito da equação acima como uma função do parâmetro x, e escrever

Logo, a Eq. (1) se traduz

i.e., busca-se o valor de x tal que a aplicação da função f o deixa inalterado, em outras palavras, a solução da equação é um ponto fixo. No intervalo (pois x equivale a uma probabilidade), temos as soluções . Definindo obtemos os valores de para os pontos fixos acima: respectivamente. O fato de significa que são pontos fixos estáveis, ou seja, aplicações sucessivas da função nas proximidades desse ponto fixo retornará ao próprio ponto, i.e., . O inverso ocorre se , e por isso dizemos que é um ponto fixo instável (ver Fig.3 ).


Figura 3. Exemplo de iteração para 0.75

Da análise anterior, concluímos que p* = .618 é um ponto crítico, e que implica que que significa que o meio poroso não é permeável. Em contrapartida, para resulta em e que o meio poroso é permeável.

3 Conclusão

Neste breve artigo tratamos de um exemplo simples buscando introduzir algumas ideias sobre o uso da teoria da percolação no estudo de meios porosos. Nossa perspectiva partiu da teoria da renormalização. Por isso, segmentando a rede em células menores, a partir das quais realizamos operações visando descrever a propriedade do todo. Dessa forma, conseguimos encontrar um valor crítico de porosidade, a partir do qual o material passa a ser permeável.

Esse tipo de interpretação de um meio poroso é obviamente um modelo simplista de duas dimensões onde assumimos a hipótese de homogeneidade estatística, bem como a forma quadrática para células; mas é suficientemente útil para revelar características dos materiais reais -- como o valor crítico --, pois a teoria da percolação nos fornece um modelo simples no qual se observa esse tipo de transição de fase.

Como referências adicionais citamos as Refs.[1,3,5,] .

Agradecimentos

ARC agradece à CAPES e ao Programa de Pós-Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais da Universidade Federal de Santa Catarina.

Recebido em 8/9/2012

Aceito em 2/2/2013

Publicado em 24/4/2013

  • [1] P. M. Adler, Porous Media: Geometry and Transports (Butterworth-Heinemann, Oxford, 1992)
  • [2] M.J. Feigenbaum, Physica D 7, 16 (1983).
  • [3] M. Sahimi, Applications of Percolation Theory (Taylor & Francis, London, 1994).
  • [4] M. Sahimi, Rev. Mod. Phys. 65, 1393 (1993).
  • [5] D. Stauffer and A. Aharony, Introduction to Percolation Theory (Taylor & Francis, London, 1994).
  • [6] D. Turcotte, Fractals and Chaos in Geology and Geophysics (Cambridge University Press, Cambridge, 1997).
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    E-mail:
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    Como caminho contínuo estamos nos referindo a sítios que possuem um lado em comum e não apenas um vértice.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      08 Set 2012
    • Aceito
      02 Fev 2013
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