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Física dos anos iniciais: estudo sobre a queda livre dos corpos através da metodologia da mediação dialética

The physics of early years: study of free falling bodies by the methodology of dialectical mediation

Resumos

O modelo usado nas escolas brasileiras, baseado nos tipos de educação tradicional e progressiva, transmite as informações sem a preocupação de mostrar o significado real dos fatos, não levando em conta o conhecimento da criança. Mas, como trabalhar os conteúdos do conhecimento humano de maneira significativa? Uma das alternativas seria a Metodologia da Mediação Dialética (MMD), composta por quatro etapas ou momentos pedagógicos: resgatando, problematizando, sistematizando e produzindo. Essa opção teórica entende o trabalho educativo como uma relação processual entre ensino, aprendizagem e conteúdo, considerando-os como momentos independentes e indissoluvelmente vinculados desse trabalho, e não como elementos isolados ou termos estáticos. Assim, o objetivo do trabalho foi esclarecer a Metodologia da Mediação Dialética e desenvolver uma proposta de aula segundo a MMD focando-se na temática da queda livre dos corpos (força gravitacional, meio material e forma dos corpos). Para avaliar a metodologia, foram aplicados questionários após os experimentos visando obter o envolvimento dos alunos em cada um dos momentos predominantes. Os resultados demonstraram que a MMD (aliada à atividade experimental) é um instrumento que potencializa a superação do saber imediato, via contradições, permitindo ao aluno compreender o saber científico.

física; educação; metodologia da mediação dialética


The model used in Brazilian schools, based on both traditional and progressive education, transmits information without worrying to show the real meaning of things, and without taking into consideration the previous knowledge of the pupil. How to work with the contents of human knowledge in a meaningful way? One alternative way is the Methodology of Dialectical Mediation (MDM), which consists in four steps or pedagogical moments, rescuing, problem posing, systematizing and producing. This theoretical option considers the educational work as a relationship involving teaching, learning and contents, which are taken as independent moments tightly connected to the ongoing work, instead of isolated elements or static terms. The aim of the present work is to clarify the Methodology of Dialectical Mediation and develop a class proposal according to the MDM approach to the problem of the free falling bodies (gravity, material means and shape). To evaluate the methodology, questionnaires were applied after experiments, with the involvement of students at each predominant moment. The results suggested that the MMD, combined with experimental activity, is a tool that enhances the overcoming of immediate knowledge, allowing students to reach a better understanding of the scientific knowledge.

physics education; methodology of dialectical mediation


PESQUISA EM ENSINO DE FÍSICA

Física dos anos iniciais: estudo sobre a queda livre dos corpos através da metodologia da mediação dialética

The physics of early years: study of free falling bodies by the methodology of dialectical mediation

Pedro Belchior da Silveira JuniorI,1 1 E-mail: pbelchior@ymail.com. ; Maria Eliza Brefere ArnoniII

IFaculdade de Educação, Ciências e Artes Dom Bosco, Monte Aprazível, SP, Brasil

IIDepartamento de Educação, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho", São José do Rio Preto, SP, Brasil

RESUMO

O modelo usado nas escolas brasileiras, baseado nos tipos de educação tradicional e progressiva, transmite as informações sem a preocupação de mostrar o significado real dos fatos, não levando em conta o conhecimento da criança. Mas, como trabalhar os conteúdos do conhecimento humano de maneira significativa? Uma das alternativas seria a Metodologia da Mediação Dialética (MMD), composta por quatro etapas ou momentos pedagógicos: resgatando, problematizando, sistematizando e produzindo. Essa opção teórica entende o trabalho educativo como uma relação processual entre ensino, aprendizagem e conteúdo, considerando-os como momentos independentes e indissoluvelmente vinculados desse trabalho, e não como elementos isolados ou termos estáticos. Assim, o objetivo do trabalho foi esclarecer a Metodologia da Mediação Dialética e desenvolver uma proposta de aula segundo a MMD focando-se na temática da queda livre dos corpos (força gravitacional, meio material e forma dos corpos). Para avaliar a metodologia, foram aplicados questionários após os experimentos visando obter o envolvimento dos alunos em cada um dos momentos predominantes. Os resultados demonstraram que a MMD (aliada à atividade experimental) é um instrumento que potencializa a superação do saber imediato, via contradições, permitindo ao aluno compreender o saber científico.

Palavras-chave: física, educação, metodologia da mediação dialética.

ABSTRACT

The model used in Brazilian schools, based on both traditional and progressive education, transmits information without worrying to show the real meaning of things, and without taking into consideration the previous knowledge of the pupil. How to work with the contents of human knowledge in a meaningful way? One alternative way is the Methodology of Dialectical Mediation (MDM), which consists in four steps or pedagogical moments, rescuing, problem posing, systematizing and producing. This theoretical option considers the educational work as a relationship involving teaching, learning and contents, which are taken as independent moments tightly connected to the ongoing work, instead of isolated elements or static terms. The aim of the present work is to clarify the Methodology of Dialectical Mediation and develop a class proposal according to the MDM approach to the problem of the free falling bodies (gravity, material means and shape). To evaluate the methodology, questionnaires were applied after experiments, with the involvement of students at each predominant moment. The results suggested that the MMD, combined with experimental activity, is a tool that enhances the overcoming of immediate knowledge, allowing students to reach a better understanding of the scientific knowledge.

Keywords: physics education, methodology of dialectical mediation.

1. Introdução

Não é raro encontrarmos professores preocupados com a dinâmica do ensino de ciências no Brasil, reflexo da falta de condições adequadas de trabalho de nossos docentes. Tais dificuldades passam por um modelo eliminador da contradição, que faz com que a pesquisa seja vista como algo para iniciados, longe dos alunos, tirando a possibilidade da dúvida intelectual produtora da mesma. Os especialistas da Educação questionam a falta de teoria e conhecimento dos professores para o desenvolvimento do conteúdo selecionado, mas teoria não é método.

De posse da teoria, percebemos que o ato de ensinar não é tão simples. Deve envolver um compromisso entre o ensinar e o aprender, mediante a transformação do conceito científico em tema de ensino a fim de que ele se torne possível de ser ensinado, compreensível, e preservador do saber científico. Nos processos atualmente utilizados, as partes constantes do processo, das várias ciências de referência, são trabalhadas, entretanto o ambiente como um todo não o é, deixando de lado uma palavra fundamental, a relação.

Essa transformação ocorre quando recorremos ao modelo de aula de compreensão, expresso na Metodologia da Mediação Dialética (MMD), na qual o processo de organização metodológica do conteúdo de ensino tem papel fundamental, pois, através dele, conseguimos gerar contradições entre o saber anterior (imediato) e o saber (re)elaborado (mediato), provocando a superação, ou seja, a aprendizagem através de sínteses [1].

2. Conceito físico

Física pode ser definida como ciência das propriedades da matéria e das forças naturais. Na verdade, o termo vem do grego physiké e significa natureza. A física antiga, chamada grega ou aristotélica, embora cientificamente superada, é de grande importância para o ensino da física e das ciências, uma vez que, como cita Serzedello apud [2]: "(...) muitos dos conceitos ditos espontâneos, que os alunos trazem para a sala de aula, nada mais são que pensamentos aristotélicos, interpretações baseadas no senso comum, naquilo que os sentidos mostram".

O filósofo Aristóteles foi fundamental para que a física e as demais ciências ganhassem um maior impulso na Antigüidade, gerando contribuições e idéias sobre o movimento, a queda de corpos pesados (graves) e o geocentrismo. Segundo a filosofia de Aristóteles, os corpos caem para chegar ao seu lugar natural, seguindo a premissa natural da Antigüidade, período no qual se consideravam elementos primários a terra, a água, o ar e o fogo. Assim, por exemplo, quanto mais pesado um corpo (mais terra) mais rapidamente chegaria ao chão e a água espalha-se pelo chão porque seu lugar natural seria a superfície terrestre. Esse modelo de pensamento, ou seja, a lógica de Aristóteles irá predominar nos estudos físicos até o final da Idade Média, quase como uma afirmação sagrada.

Por volta de 1500, os cientistas criaram um sistema de análise chamado de método experimental, a base do método científico, sendo que Galileu Galilei pode ser considerado o elo de transição entre a física medieval e a física moderna. Podemos dizer que Galileu era um verdadeiro físico experimental, mas também era adepto de experiências ideais, ou seja, imaginadas (experiências de pensamento) [3]. Segundo a história contada, Galileu deixou cair uma bala de canhão e uma de mosquete, cerca de cem vezes mais leve, do alto da Torre de Pisa, na Itália. Assim, chegou à conclusão de que dois corpos abandonados, ao mesmo tempo e de uma mesma altura, chegariam juntos (simultaneamente) ao solo, mesmo que tivessem pesos diferentes.

Mas devemos admitir que essa afirmação é surpreendente. Galileu chegou à conclusão de que, quando a resistência do ar influi pouco, os corpos diferentes soltos da mesma altura caem juntos e atingem o chão ao mesmo tempo. Isso, a princípio, pode parecer um absurdo. Notar que a distinção entre massa e peso não foi considerada. Se o experimento for realizado de forma sistemática e técnica qualquer tipo de influência ao movimento dos corpos deve ser eliminada. Assim, como a atmosfera influencia o movimento dos corpos em queda (alterando seu movimento) devemos controlar esse problema com mais eficiência, eliminando-se a atmosfera ou, pelo menos, tornando desprezível seu efeito sobre o movimento dos corpos. Para isso, é usada uma bomba de sucção que retira quase todos os gases presentes num recipiente chegando ao que chamamos de vácuo. Ao compararmos a queda de dois corpos, faz-se medidas das distâncias percorridas em cada intervalo de tempo, utilizando-se de uma lâmpada estroboscópica (aquela usual em discotecas) para fotografar em intervalos de tempo definidos [4].

Observa-se que as duas bolas caem simultaneamente, tal como afirmou Galileu. E, uma vez que caem juntas, podemos medir a distância por elas percorrida em cada intervalo de tempo, verificando que essa distância é a mesma. Contudo é preciso notar que a distância entre duas posições sucessivas vai aumentando. E, se elas percorrem, a cada intervalo de tempo, distâncias cada vez maiores, significa que a velocidade está aumentando. E se a velocidade varia no tempo significa que existe uma aceleração. Dos manuais acadêmicos [4, 5] sabemos que independentemente da massa e desprezando a interferência da atmosfera, a velocidade dos corpos em queda, perto da superfície da Terra, aumenta de 9,8 m/s a cada segundo: a chamada aceleração da gravidade (g). Assim, todo movimento retilíneo de descida, que ocorre nas proximidades da superfície da Terra, passa a ser chamado de queda livre, com sua velocidade variando sempre da mesma forma no tempo, ou seja, a aceleração é constante.

No cotidiano, o ar e os outros gases presentes na atmosfera resistem a movimentos realizados dentro deles: quando um corpo se move em contato com um líquido ou um gás, esses meios aplicam ao corpo forças que se opõem ao movimento. Outro ponto envolve o fato de que a velocidade de queda também aumenta até atingir um valor limite. Também pode se afirmar que na abertura de um paraquedas, por exemplo, a força de resistência se torna muito maior devido ao formato e ao tamanho do mesmo. Com isso, sua velocidade cai rapidamente atingindo valores menores que 10 km/h, seguros o suficiente para uma aterrissagem tranquila.

De posse dessas informações, podemos perceber a engenhosidade do mestre Galileu: o cientista utilizou dois corpos com formas semelhantes, restringindo o efeito da resistência da atmosfera (a resistência do ar), demonstrando que, apesar de massas diferentes, a altura da queda sendo igual e sabendo-se que a aceleração atua sobre cada um também de forma idêntica, os corpos chegariam ao mesmo tempo ao chão nas proximidades da superfície terrestre. E assim, finalizando, percebemos que o observar como, quando e em que situação um fenômeno ocorre (passos de Galileu) é de fundamental importância no processo de aprendizagem de uma criança.

3. Metodologia da Mediação Dialética (MMD)

A indagação necessária e atual que se lança aos educadores é sobre a melhor forma de serem trabalhados os conteúdos das ciências com significado, significância e utilidade. Uma das alternativas seria seguir a proposta da mediação dialética como metodologia de ensino-aprendizagem [1]. Tal processo possui sólido embasamento teórico-filosófico, valorizando a ação crítica do ser social, mergulhado na mediação dialética de dois pólos de tensão fundamentais: teoria e prática.

Arnoni [6] indica a necessidade da superação da práxis comum, aquela decorrente de fatos do cotidiano, que oculta a essência do fato. A superação ocorre pela tomada de consciência do sujeito de sua possibilidade de transformar a realidade, chegando a uma práxis superior (crítica). Assim, como qualidade da práxis humana, podemos citar duas formas de conhecimento da coisa (objeto): a representação e o conceito. Portanto, na superação do conhecimento sensível e intuitivo (representação) pelo racional e teórico (conceito) ocorre também a superação da práxis comum pela crítica, ou do pensamento comum pelo pensamento racional, salientando-se a importância do ponto de partida (pensamento comum), fundamental para atingir o ponto de chegada (pensamento crítico).

A autora discorre também sobre a idéia do todo, de sua compreensão dialética e chega a um ponto de vital importância: as partes devem ter conexão entre si e com o todo. Além disso, esse citado todo deve ser dinâmico, pois o todo se cria na interação com as partes. Superando a mística de que os que pensam desenvolvem a práxis, e os que executam desenvolvem a prática, Arnoni enfatiza que todo agir prático do sujeito constitui uma práxis, partindo do princípio que todo ser social histórico age e pensa criando suas representações do contexto, variando-se apenas o grau de consciência do sujeito em relação ao pensar e o agir.

Ainda segundo Arnoni, o processo é um fluir teórico, propiciando transformação qualitativa do conhecimento inicial, imediato, quando ainda não foi compreendida a realidade, em saber mediato (conhecimento crítico e dialético) transformador da realidade. Sintetizando-se, podemos definir a Metodologia da Mediação Dialética (MMD) como a proposição metodológica formada por um processo de ensino que potencializa o processo de aprendizagem do aluno, permitindo ao professor, no seu ato de preparar o conteúdo, a partir da transformação do conceito científico em conteúdo de ensino, desenvolver um planejamento e uma avaliação crítica do processo de ensino e interferir no processo de aprendizagem, permitindo a elaboração do conhecimento pelo aluno.

De acordo com Arnoni apud [7]: "(...) didaticamente, a Metodologia da Mediação Dialética é composta por momentos pedagógicos (etapas) denominados de Resgatando/Registrando; Problematizando; Sistematizando e Produzindo". Explicitamente, o resgatando é a busca de um ponto de partida, o imediato do aluno sendo compartilhado com o professor; o problematizando coloca o aluno em contradição, ao mostrá-lo divergências entre o seu saber (imediato) e o conteúdo de ensino (mediato). A sistematização não ocorre pela simples problematização do aluno: a intervenção do professor é fundamental para que haja a superação e posterior interiorização do saber, culminando-se com o produzindo, através do qual, o professor tem em suas mãos o termo de avaliação do processo.

Assim, podemos concluir que a prática educativa (no sentido de práxis educacional particular) é uma palavra-chave nesse método proposto. Nela está contida a tensão máxima que possibilita o processo ensino e aprendizagem, essa relação fundamental pedagógica. Desse modo, a aula é também muito mais do que o que ocorre dentro das quatro paredes, é um processo que se inicia no planejamento (fundamentação teórica, transformação do conceito científico em conteúdo de ensino e um plano de aula), se desenvolve (a aplicação do processo na sala de aula) e culmina em um sistema funcional de avaliação (feedback).

4. Objetivos

O objetivo do presente trabalho foi explicitar a Metodologia da Mediação Dialética aplicada a conteúdo de física e desenvolver uma proposta de aula abordando-se a temática da queda dos corpos (força gravitacional, meio material e forma dos corpos). A intencionalidade visa a compreensão do aluno da importância da forma dos corpos no processo de queda (e no de manutenção de um voo) no meio material ar.

5. Parte experimental

O trabalho contou com os seguintes materiais para o seu desenvolvimento: bolinha de borracha, bolinha de tênis de mesa (ping-pong), bolinha de aço e bolinha de papel, além de folhas de papel e fita adesiva. Os experimentos e questionários foram articulados visando obter o envolvimento dos alunos (amostragem de 22 indivíduos aplicada em uma escola estadual da cidade de São José do Rio Preto - SP) em cada uma das etapas predominantes da MMD. O experimento desenvolvido teve por objetivo responder as perguntas mais comuns como:

Será que os alunos têm a real noção de que isso ocorre? Ou será que avaliarão segundo o senso comum de que corpos mais pesados caem primeiro? Ou será que surgirá outra hipótese? Assim, com o auxílio da professora regente da sala, os alunos foram divididos em grupos. Seguindo-se cada um dos momentos predominantes da MMD:

*Resgatando - No início são utilizadas somente as bolinhas de aço e papel, que são mostradas aos grupos de alunos formados. Cada aluno de cada grupo pode pegar na mão e "sentir" o peso de cada uma das bolinhas. Um momento importante é o ato de recolher as bolinhas, que não podem permanecer com os alunos. Em seguida é pedida uma atividade individual: desenho, respondendo qual bolinha pode chegar ao chão primeiro. Depois, os desenhos são recolhidos e pregados na lousa, efetuando-se o comentário dos mesmos.

*Problematizando - Neste momento ocorre uma intervenção do professor apresentando uma situação que contradiz o que foi falado na etapa resgatando, ou seja, ao soltar a bolinha de aço e a de papel, ao mesmo tempo, mostrar que chegam juntas. Após, na atividade individual permite-se deixar os alunos também soltarem as bolinhas (aço e papel), sendo que nesta hora o professor pergunta o porquê do ocorrido. Neste momento inicia-se, pelo professor, o levantamento de hipóteses, por exemplo, se seria devido ao material (uma preparação para o sistematizando).

*Sistematizando 1 - Ao voltar aos grupos e montar a sequência de práticas envolvendo as quatro bolinhas de diferentes materiais, segue-se o procedimento de soltar as bolinhas de uma mesma altura e observar qual deve chegar primeiro ao chão. A atividade em grupo envolve folhas de respostas distribuídas por grupo e a observação de que se as bolinhas podem chegar juntas, o questionário deve ser marcado com x nos dois espaços.

*Sistematizando 2 - Ao voltar aos grupos e montar a sequência de práticas há uma mudança: o material é só papel. A atividade em grupo envolve novas folhas de respostas distribuídas por grupo e novamente a folha em branco, individual, repetindo-se a observação de que se as bolinhas chegarem juntas, o questionário deve ser marcado com x nos dois espaços. Cada um dos grupos que termina um teste marca a resposta, observando-se a sequência:

1°) Soltar a bolinha de papel e a folha aberta;

2°) Soltar a bolinha e a folha dobrada uma vez;

3°) Soltar a bolinha e a folha dobrada duas vezes e assim sucessivamente.

A proposta é desenvolver uma atividade, intercalando-se algumas perguntas pertinentes entre os experimentos dos grupos.

*Produzindo - O produzindo visa verificar a eficiência do sistematizando ao pedir uma produção do aluno que contemple a temática trabalhada durante a aula. Assim, a indicação aos alunos de uma finalidade para o processo desenvolvido até o momento deve ser reforçada, por exemplo: falar aos alunos que o conteúdo trabalhado serve para muitas coisas, entre elas para o projeto de um avião. A atividade envolve novas folhas em branco, individual, para o seu desenvolvimento: fazer um aviãozinho de papel e soltar na classe junto com uma bola de papel amassada (do experimento anterior). Depois, há a comparação da bolinha de papel com o avião feito por cada um deles, através de outra atividade: desenhar o último experimento (avião e bolinha de papel) e escrever o que acontece (por quê?).

6. Resultados e discussões

6.1. Resgatando

Este é o momento de fazer aflorar as representações do sujeito em relação ao conteúdo em estudo. As elaborações geradas nessa etapa caracterizam aspectos do saber imediato, considerado como ponto de partida do processo de ensino.

Após uma apresentação e introdução da temática por meio de uma história sobre ciências e descobertas científicas, iniciou-se o procedimento da aula proposta efetivamente. Assim, a proposta da etapa do resgatando sobre a temática da queda dos corpos e o que influencia tal fato envolveu a distribuição de, inicialmente, duas bolinhas de materiais diferentes (aço e papel) para que os alunos pudessem tocá-las (e "sentissem" o seu peso). Após tal procedimento as mesmas foram recolhidas e perguntou-se aos alunos: ao soltar as duas bolinhas ao mesmo tempo e de uma mesma altura, qual chegará primeiro ao chão? Houve um uníssono de todos: a de aço.

Responderam praticamente da mesma forma, achando muito fácil, como por exemplo: "a bolinha de aço é mais pesada, logo cai primeiro...". Alguns até riram, acharam a pergunta boba: "(que) era lógico...". Duas alunas não concordaram, achando que a bolinha de papel cairia primeiro: "como o papel é mais leve, ele sobe mais e assim tem mais facilidade para descer também...".

Foi então distribuída uma folha para que os alunos desenhassem os dois momentos citados: em um quadro superior, as duas bolinhas no alto lado a lado e em um segundo momento qual bolinha chegaria primeiro ao solo. Exemplos são mostrados na Fig. 1.


Pela observação dos desenhos, percebemos que o senso comum predominou. A maioria dos desenhos mostrou a bolinha de aço "chegando primeiro" que a de papel, corroborando com o que era esperado, ou seja, para as crianças o peso é fator preponderante na queda dos corpos. Salienta-se que duas alunas pensaram de forma diferente: desenharam a bolinha de papel chegando antes da de aço; suas explicações seguiram pelo caminho inverso, afirmando que ao ser mais leve o papel "flutua" e sobe mais rápido, assim pode descer mais rápido também.

6.2. Problematizando

Como afirmado, a intervenção do professor foi efetuada apresentando-se uma situação que contradiz o resgatando, ou seja, ao soltar a bolinha de aço e a de papel ao mesmo tempo foi demonstrado que as mesmas chegam juntas. Foi permitido que os alunos também soltassem as bolinhas (aço e papel), sendo que nesta hora o professor perguntou o porquê do ocorrido.

Neste momento iniciou-se pelo professor o levantamento de hipóteses: será que foi devido ao material? (preparação para o sistematizando). O importante foi questionar o saber imediato (resgatando), na perspectiva do saber mediato pretendido (saber científico), explicitando-se a contradição entre ambos, isto é o problematizando, momento que apresentou para a criança, pela ausência do conceito, uma contradição da chegada ao mesmo tempo das bolinhas citadas. Tal fato Galileu comprovou ao utilizar dois corpos com formas semelhantes, restringindo o efeito da resistência da atmosfera (a resistência do ar), podendo demonstrar que, apesar de massas diferentes, a altura da queda sendo igual e sabendo-se que a aceleração, como demonstrado, atua sobre cada um também de forma idêntica, os corpos chegariam ao mesmo tempo ao chão nas proximidades da superfície terrestre.

As respostas encontradas são as mais variadas, como: "(...) as bolinhas de papel e aço chegam juntas porque tem alguma ligação..." Então acrescentamos se valeria então somente para aço e papel, para a qual tivemos a resposta categórica: "É...".

Continuamos então afirmando que se por acaso soltássemos uma bolinha de aço e uma de ping-pong, qual chegaria primeiro. A resposta de um dos alunos indicou a linha de raciocínio predominante: "A de aço, lógico, é mais pesada que a de ping-pong, que é vazia...".

E ainda continuamos na pesquisa perguntando o que ocorreria se fosse uma de borracha e uma de aço, para a qual a resposta dos alunos pode ser exemplificada por: "Ah... a de aço também porque é mais pesada...". Alteramos os materiais e prosseguimos perguntando se fosse uma de borracha e uma de ping-pong. A resposta de um dos alunos foi: "Ah, aí é a de borracha que chega primeiro, porque a de ping-pong é muito leve e a borracha pula...".

Neste momento a intervenção do professor é muito importante para que haja um levantamento de hipóteses, ou seja, uma preparação para a sistematização, pois o problematizando coloca o aluno em contradição ao mostrar para ele as divergências entre o seu saber (imediato) e o conteúdo de ensino (mediato), mas salientando-se que a sistematização não ocorre pela simples problematização do aluno.

6.3. Sistematizando 1

Como já enfatizado, a sistematização não ocorre pela simples problematização do aluno: a intervenção do professor é fundamental para que haja a superação e posterior interiorização do saber. Assim, é importante trabalhar aspectos do saber científico provocando a superação do imediato no mediato, propiciando ao aluno a elaboração de novas sínteses.

A observação da Tabela 1 indica que os grupos perceberam que chegavam juntas as bolinhas, ao menos na maioria das vezes. Três grupos ainda marcaram que uma delas chegava primeiro, mas devido a algo que somente foi percebido no momento e que é alvo de uma observação: como explicar que não é preciso sempre um ganhar?

Como havíamos pedido para repetirem o experimento ao menos cinco vezes (idéia de média aritmética embutida, mas não citada), percebemos também que os alunos usavam a seguinte regra: contavam quem "ganhava" em cada experimento e consideravam aquele que chegava primeiro, mais vezes; por exemplo, aço "ganhou" três vezes e borracha "ganhou" duas vezes, escolhiam o aço.

Usamos este momento para falar que se ambas chegaram primeiro em alguma oportunidade, também poderão chegar em primeiro lugar ao chão e todos concordaram com esta colocação. Acrescentamos que isto ocorre porque há um desnível entre uma bolinha e outra no momento de serem abandonadas de certa altura, ou seja, se a de borracha estiver um pouco mais para baixo, chegará primeiro, mas se for a de aço esta última chegará então em primeiro lugar e novamente todos concordaram.

Também citamos que se demorarmos em soltar, uma em relação à outra, há diferenças. Se a de borracha começar a cair antes da bolinha de aço, ela chegará primeiro e assim todos concordaram. Então quando soltamos as bolinhas de uma mesma altura e ao mesmo tempo elas devem chegar juntas: soltamos juntas, chegam juntas! Finalmente todos concordaram.

6.4. Sistematizando 2

A proposta foi desenvolver a atividade intercalando-se perguntas entre os experimentos dos grupos, na sequência:

1) Quem vai chegar primeiro? A bolinha ou o papel aberto?

2) E agora, dobrando uma vez? Quem chega primeiro?

3) E agora, dobrando mais uma vez? Quem chega primeiro?

4) A folha agora demorou o mesmo tempo para chegar até o chão?

Observando-se o Tabela 2 e algumas respostas interessantes percebemos a importância do sistematizando. Exemplos:

"Ah... a folha de papel, o ar "segura" a folha: a bolinha chega primeiro.";

"A bolinha chega primeiro!";

"Não! Foi mais rápido...";

"A bolinha chega primeiro! Mas foi bem pertinho...";

"A bolinha chega primeiro! Não, é o papel! Chegaram juntas!".

Percebemos, a partir da terceira rodada de "dobramentos" que a confusão se instalou, pois cada um começou a encontrar ganhadores que são diferentes, mas o que ocorreu? A explicação é a mesma usada anteriormente no Sistematizando 1 para as bolinhas de materiais diferentes.

6.5. Produzindo

Neste momento o intuito é expressar a síntese do trabalho educativo, o saber aprendido. Esta síntese representa o ponto de chegada do trabalho educativo. Possivelmente, com maior grau de complexidade que as representações inicialmente apresentadas (resgatando).

É um ponto provisório de chegada que se torna imediatamente um novo ponto de partida e o ciclo não se fecha, pois, o ponto de chegada (produzindo) tem propriedades diferentes do ponto de partida (resgatando) e, por permanecer aberto, cria possibilidade para que novos ciclos se iniciem, na perspectiva da mediação dialética.

Assim, o produzindo visa verificar a eficiência do sistematizando, ao pedir uma produção ao aluno que contemple a temática trabalhada durante a aula. Como já afirmado, foi dito para os alunos que o que nós havíamos aprendido servia para muitas coisas, entre elas para o projeto de um avião e foi feito o pedido de duas atividades, como seguem alguns dos desenhos da Atividade 2, Figs. 2 e 3:



A observação dos desenhos indica que a percepção de queda pela forma do objeto foi fixada, além das explicações serem coerentes com o conteúdo científico trabalhado no experimento desenvolvido. Não houve necessidade de decorar o conceito, nem ceifar o conhecimento prévio dos alunos, mas apenas trabalhá-lo de forma que a fixação ocorresse naturalmente pelo próprio movimento do aluno.

Assim, supera-se o modelo tradicional, que privilegia um conhecimento acabado, descontextualizado, sem história, cuja verdade única é atingida por ação da repetição e utilização irrestrita da memória, a "decoreba". Esse modelo formal, eliminador da contradição faz com que a pesquisa seja vista como algo para iniciados, extremamente longe dos alunos, tirando a possibilidade da dúvida intelectual, produtora da pesquisa, ser explorada de forma adequada e plena.

A relação entre alunos e professores não pode ser hierárquica, com dominação e subordinação inerentes, cabendo papel fundamental à mediação. Como o imediato dos alunos está diretamente relacionado ao seu cotidiano, cabe ao professor fornecer as condições para o aluno chegar ao mediato, via superação, ou seja, sem uma boa preparação da aula tanto o professor quanto o aluno não conseguem sair do imediato.

Assim, Arnoni apud Almeida [1] indica que a relação professor-aluno, via Ontologia do Ser Social e da mediação, coloca os termos em situação de opostos não antagônicos, não alcançando a igualdade, pois um nega o outro, ao mesmo tempo em que se explicam e se complementam: o professor não pode aprender com o aluno e o aluno não pode ensinar o professor, pois o ensinar está no plano mediato e o aprender no imediato.

Ainda de acordo com Almeida, o professor ensina e o aluno aprende porque ensino e aprendizagem são relações distintas: o ensino é a relação do professor com o conhecimento (mediato) e a aprendizagem é a relação do aluno com o conhecimento (imediato). Desse modo, percebemos que não há relação de mediação entre ensino e aprendizagem, pois somente ocorre mediação entre o ser humano e a natureza, ou entre seres humanos, ao qual está inserido o processo educativo.

7. Conclusões

Nesse projeto, os experimentos foram planejados e conduzidos segundo a Metodologia da Mediação Dialética, os quais foram considerados como atividades de problematização do conteúdo de ensino, que além de resgatarem o saber cotidiano do aluno, geraram a contradição, explicitando as divergências existentes entre o saber imediato e o saber científico em estudo (saber mediato). Desse modo, a contradição potencializou a superação do saber imediato no mediato e possibilitou que o aluno elaborasse sínteses, o saber efetivamente aprendido.

Como dinâmica de aula proposta, acreditamos que seja uma das melhores alternativas de ensino, senão a melhor, pois alia na alternativa o ensino-aprendizagem através de uma metodologia organizacional do conteúdo de ensino, permitindo ao professor avaliar, diante de seu conhecimento, onde o aluno está (saber imediato) e onde deve chegar (saber mediato) e, mais importante, permitir que o aluno construa o seu saber (superação e posterior síntese) através do Resgatando, Problematizando, Sistematizando e Produzindo da MMD.

Assim, o presente trabalho demonstrou um novo olhar no ensino de ciências, em especial na disciplina de física, a qual é normalmente parte do grupo das disciplinas temidas pelos alunos. Diante de um projeto envolvendo conteúdo científico e metodologia de ensino intimamente articulados, os alunos têm a oportunidade de realmente aprender através de suas próprias sínteses em relação à temática apresentada (queda dos corpos), o que é observado, de forma clara, no último momento (produzindo) indicando a potencialidade do método apresentado.

Recebido em 18/8/2012

Aceito em 2/2/2013

Publicado em 26/9/2013

Copyright by the Sociedade Brasileira de Física. Printed in Brazil.

  • [1] J.L.V. Almeida, M.E.B. Arnoni e E.M. Oliveira, Mediação Dialética na Educação Escolar: Teoria e Prática (Edições Loyola, São Paulo, 2007).
  • [2] M. Serzedello, in: Sala de Aula: Ensino e Aprendizagem, org. por M.A. Granville (Papirus, São Paulo, 2008).
  • [3] M. Schenberg, Pensando a Física (Landy Editora, São Paulo, 2001), 5Ş ed.
  • [4] Fundação Roberto Marinho, Telecurso2000 (2º grau): Física (Globo, Rio de Janeiro, 1996).
  • [5] N.G. Ferraro e P.A.T. Soares, Física Básica: Volume Único (Atual Editora, São Paulo, 1998).
  • [6] M.E.B. Arnoni, in: Perspectivas Contemporâneas da Filosofia da Educação Coletânea de Textos do I Simpósio Internacional em "Educação e Filosofia", org. por P. Pagni (FFC/Unesp Marília, 2006), CD-ROM.
  • [7] M.E.B. Arnoni, Revista Unorp 8, 41 (2004).
  • 1
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Out 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013

    Histórico

    • Recebido
      18 Ago 2012
    • Aceito
      02 Fev 2013
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