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Flutuação dos corpos: elementos para a discussão sobre sua aprendizagem em alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental

Floating bodies: elements for the discussion of the students who are learning in the early years of elementary school

Resumos

O presente trabalho teve como objetivo investigar uma situação de ensino e aprendizagem de conceitos relacionados ao tema "flutuação dos corpos" em estudantes dos anos iniciais do Ensino Fundamental. As atividades foram desenvolvidas em uma turma de onze estudantes da faixa etária aproximada de nove anos de idade, alunos de uma escola privada de Uberlândia/MG. Partiu-se de atividades desenvolvidas em sala de aula, tendo por base uma metodologia de ensino que privilegiou a problematização, a manipulação de materiais e a interação entre alunos com níveis de conhecimento distintos. Os resultados discutem aspectos sobre a aprendizagem deste conceito em crianças desta faixa etária.

flutuação dos corpos; ensino de ciências; Ensino Fundamental


This study aimed to investigate a situation of teaching and learning of concepts related to the theme "floating bodies"students in the early years of elementary school. The activities were conducted in a class of eleven students from the age of about nine years old, students at a private school in Uberlândia/MG. Starting with activities developed in the classroom, based on a teaching methodology that focused on problem solving, materials handling and interaction among students with diferent skill levels. The results discuss aspects of the learning of this concept in children of this age group.

floating bodies; science education; elementary school


PESQUISA EM ENSINO DE FíSICA

Flutuação dos corpos: elementos para a discussão sobre sua aprendizagem em alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental

Floating bodies: elements for the discussion of the students who are learning in the early years of elementary school

Marcos Daniel LonghiniI, 1 1 E-mail: mdlonghini@faced.ufu.br. ; Maria Betânia Tenório NunesII; Gabriella Alves GrilloIII

IFaculdade de Educação, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil

IIEscola da Cidade, Uberlândia, MG, Brasil

IIIFaculdade de Educação, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG, Brasil

RESUMO

O presente trabalho teve como objetivo investigar uma situação de ensino e aprendizagem de conceitos relacionados ao tema "flutuação dos corpos" em estudantes dos anos iniciais do Ensino Fundamental. As atividades foram desenvolvidas em uma turma de onze estudantes da faixa etária aproximada de nove anos de idade, alunos de uma escola privada de Uberlândia/MG. Partiu-se de atividades desenvolvidas em sala de aula, tendo por base uma metodologia de ensino que privilegiou a problematização, a manipulação de materiais e a interação entre alunos com níveis de conhecimento distintos. Os resultados discutem aspectos sobre a aprendizagem deste conceito em crianças desta faixa etária.

Palavras-chave: flutuação dos corpos, ensino de ciências, Ensino Fundamental.

ABSTRACT

This study aimed to investigate a situation of teaching and learning of concepts related to the theme "floating bodies"students in the early years of elementary school. The activities were conducted in a class of eleven students from the age of about nine years old, students at a private school in Uberlândia/MG. Starting with activities developed in the classroom, based on a teaching methodology that focused on problem solving, materials handling and interaction among students with diferent skill levels. The results discuss aspects of the learning of this concept in children of this age group.

Keywords: floating bodies, science education, elementary school.

1. Introdução

O tema "flutuação dos corpos", a princípio, é associado ao ensino de física que, por sua vez, é um componente curricular presente prioritariamente no ensino médio. No entanto, temas desta área de conhecimento não só podem, como devem ser ensinados desde os primeiros anos da escolarização básica, conforme revela Schroeder [1], por exemplo. Corroboramos com o autor, quando afirma que o ensino de conteúdos de física a alunos dos anos iniciais não deve prezar pela matematização ou preparação para os anos posteriores, mas antes, tratase de uma oportunidade de os estudantes serem desafiados a resolver problemas de forma colaborativa, de aprender a aprender.

Tal afirmação vai ao encontro das ideias de Carnielli e cols. [2], quando apontam que o que se espera de atividades de ciências nas primeiras séries da escolarização não é ensinar um conceito em todo seu rigor científico, e sim, oferecer oportunidades de as crianças se envolverem em um clima de experimentação, de agir sobre os objetos apresentados, de propor ideias próprias e respeitar, também, as de seus pares.

Quanto à flutuação dos corpos, apesar de um assunto presente no cotidiano das pessoas, trata-se de um tema complexo, devido aos conceitos implicados [3]. Em relação ao seu ensino, algumas experiências têm sido relatadas a partir de pesquisas como a de Zanon e Freitas [4]; Martinelli e Costa e Silva [5]; Ribeiro e Santos [6]; Santos, Santos e Berbat [7]; Calderón Canales e cols. [8]; Solano, Fernández e Jiménez [9] e Polônio Castro e cols. [10], por exemplo.

Resultados de alguns destes trabalhos revelam que as crianças tendem a associar o fato de um objeto afundar ou flutuar a aspectos como sua massa ou formato [11], ao material do qual é feito [12], conforme também revelam Martinelli e cols. [5], exemplificado nas explicações dos estudantes, como: "[...] a bola afunda porque é pesada e porque tem muito peso; [...] o palito afunda porque não tá aberto que nem o barco; [...] o barco flutua porque é feito de madeira e motor, porque o motor tem força demais; [...] o algodão flutuou porque ele é feito de espuma".

Outra característica que os estudantes empregam para explicar a flutuação ou afundamento dos corpos é a quantidade de líquido na qual o objeto será imerso ou a profundidade do recipiente [10, 11].

Tais dados revelam o quanto este tema tem sido explorado e as dificuldades que os estudantes encontram no momento de aprendê-lo, tendo em vista o confronto entre suas ideias construídas no cotidiano, uma vez se tratar de um tema presente na vida das pessoas, e os modelos científicos que o explicam.

Tendo por base tais informações, realizamos uma sequência de práticas de ensino sobre o tema "flutuação dos corpos", a partir de um conjunto de atividades experimentais, as quais serão relatadas neste artigo. Empregamos as atividades do projeto "A Mão na Massa" [13], e as implementamos junto a um grupo de estudantes, tendo por base a ideia de interação entre pares, apoiados na concepção de Vygostky de aprendizagem [14].

Segundo tal concepção, para se determinar o avanço cognitivo de uma criança é preciso estabelecer os parâmetros de referência sobre os quais se pretende avaliar que tarefas ela é capaz de realizar sozinha. Desse modo, observando-se o nível de independência da criança na realização de determinadas tarefas, é possível estabelecer o seu 'nível desenvolvimento real' - aquilo que já é capaz de realizar sem ajuda de terceiros. Esse nível nos mostra os processos de desenvolvimento já estruturados, conforme cita Oliveira [15].

Vygotsky [14] chama a atenção para o fato de que nem sempre a criança consegue realizar determinadas atividades sozinha. Porém, com a orientação de um adulto ou de um colega mais experiente, é capaz de cumpri-las. Essa condição estabelece o 'nível de desenvolvimento potencial', ou seja, a capacidade de solucionar uma atividade, porém com a ajuda de um parceiro.

A variação entre o nível de desenvolvimento potencial e o nível de desenvolvimento real irá determinar o que Vygotsky chama de 'zona de desenvolvimento proximal'. Ela define as estruturas mentais que estão em amadurecimento, conduzindo ao processo de aprendizagem.

2. A pesquisa desenvolvida

A partir dos apontamentos indicados anteriormente, esta pesquisa tem como objetivo investigar a respeito da aprendizagem de conceitos relacionados ao tema "flutuação dos corpos" em estudantes dos anos iniciais do ensino fundamental. Partiu-se de atividades desenvolvidas em sala de aula, tendo por base uma metodologia de ensino que privilegiou a problematização, a manipulação de materiais e a interação entre alunos com níveis de conhecimento distintos.

Conforme citado anteriormente, tomamos como eixo para condução do trabalho algumas atividades do módulo do programa "A Mão na Massa", intitulado: "Flutua ou Afunda" [13]. As atividades foram desenvolvidas em uma turma de onze estudantes da faixa etária aproximada de nove anos de idade, de uma escola privada de Uberlândia/MG.

Antes do início das atividades, os estudantes foram avaliados a partir de um teste diagnóstico (pré-teste) e suas respostas organizadas em categorias em ordem crescente de complexidade.

Essa metodologia teve como objetivo identificar seu(s) modelo(s) explicativo(s) em relação aos conceitos em discussão, os quais podem se configurar como concepções, desde as mais distantes do ponto de vista científico, até esquemas explicativos que se aproximam aos da ciência. Tal sondagem visou identificar o 'nível de desenvolvimento real' [14] de cada estudante. Assim, num primeiro momento, as atividades foram aplicadas aos alunos, individualmente, ocasião na qual a criança deveria pensar sobre a questão e respondê-la, sem, no entanto, manipular os materiais para verificar suas hipóteses.

Após a aplicação dos pré-testes, as mesmas atividades foram implementadas em sala de aula, quinzenalmente. Nessa oportunidade os alunos voltavam a pensar sobre suas hipóteses e deveriam discuti-las, com seus pares, antes de manipular os objetos. Organizamos os grupos buscando inserir estudantes com níveis de respostas distintos, objetivando a interação entre os parceiros que pensavam de formas variadas. Nem sempre conseguimos organizar grupos heterogêneos, tendo em vista que, para algumas atividades, grande parte dos alunos se concentrava em uma ou duas categorias apenas.

Da mesma forma como no trabalho de Havu-Nuutinen [16], envolvendo o ensino da mesma temática, nesta pesquisa o papel do professor foi o de organizador das atividades e fomentador das discussões entre os integrantes das equipes. Ele também organizava, após cada aula, as ideias dos alunos na forma de um texto coletivo, produzido pelos próprios estudantes, respeitando as terminologias e vocabulário que eles empregavam.

Como no pré-teste, após a implementação de cada atividade em sala de aula, os alunos, individualmente, foram submetidos às mesmas questões, pós-testes, para o qual usamos as mesmas categorias de respostas.

Esses dados nos permitiram verificar se após a atividade conjunta em sala de aula os alunos permaneciam ou não com o mesmo modelo explicativo previamente empregado, possibilitando compreender em quais aspectos eles obtêm maior ou menor avanço. Com isso, pretendemos trazer alguns elementos para discussão a respeito de como as crianças dessa faixa etária aprendem sobre o tema flutuação dos corpos.

Para facilitar a leitura deste texto, optamos por apresentar cada atividade desenvolvida junto aos dados obtidos com os estudantes, os quais foram organizados em figuras. Também trazemos os textos coletivos produzidos pelos alunos, o que nos permite perceber como vão organizando suas ideias no decorrer do processo.

3. Resultados obtidos e discussão

Devido ao volume de dados obtidos, os resultados foram organizados em figuras que revelam a quantidade de alunos em cada categoria, antes e depois de cada aula.

No resultado do pré-teste, a idéia que prevaleceu nas respostas dos alunos foi indicar o "peso" como aspecto primordial para a flutuação dos objetos, classificadas como respostas da categoria 1. Parece ser esta uma ideia intuitiva, baseada em experiências do cotidiano, nas quais objetos pesados afundam quando colocados na água. Tais dados são expressos na Fig. 1.


Dois estudantes, além do "peso", apontam outras características, como permeabilidade, o que leva o objeto também a se tornar mais pesado. Foi o caso do algodão e bloco de madeira, por exemplo. Classificamos essas respostas como categoria 2.

Por outro lado, dois estudantes atribuíram uma terceira característica, que é o fato de o objeto preservar espaços onde retém ar (categoria 3).

No decorrer da atividade em sala de aula, os alunos receberam os mesmos objetos e um recipiente com água. Deveriam, novamente, discutir suas ideias em grupo e realizar os testes, tentando chegar a uma conclusão. Após discussões coletivas, os discentes, com auxílio da professora, elaboraram um texto coletivo, apontado abaixo, onde ficam evidentes suas ideias até o momento: "Os objetos mais leves que afundaram, ficaram pesados porque absorveram água. Caso não absorvessem, não afundariam. Se colocasse filme plástico nos objetos que absorveram água, eles não afundariam[...]".

Os cones maciço e oco foram objetos que fortemente contribuíram para a discussão dos aspectos que interferem na flutuação, pois tinham o mesmo formato, porém com massas distintas. O teste com estes objetos parece ter trazido novos elementos para a discussão, conforme revela outro trecho do texto coletivo: "[...] O pino sem massinha não afundou por causa do peso, do tamanho e do formato. Sabemos que o pino de massinha afundou por causa do peso. Se fosse uma tampinha leve, ele não afundaria, pois não ficaria com muito peso".

De forma geral, a figura aponta que após as atividades houve um aumento no número de alunos em categorias cujas respostas são mais elaboradas. Ocorre, principalmente, uma diminuição de nível 1 e aumento do 2, o que revela que os estudantes passam a incorporar mais de um aspecto na influência da flutuação, percebido após a prática com a diversidade de materiais e interação com os colegas.

Nesta segunda atividade, o pré-teste revelou que há quase um consenso entre os alunos de que a massinha em formato de esfera irá afundar, enquanto a de placa, utuar. A dúvida, na maioria das vezes, foi em relação ao formato de caixa. Seguindo a mesma linha de raciocínio da questão anterior, a explicação é baseada no peso. Para quase totalidade dos estudantes, mesmo a quantidade inicial de massa sendo a mesma, quando distribuída no formato de placa, diminui seu "peso", ao passo que no de esfera, torna-se mais pesada. Isso revela que para quase todos os alunos ainda não possuem a noção de conservação de massa, da maneira como apontam Piaget e Inhelder [17].

No decorrer da aula, os alunos receberam uma porção de massa de modelar e, com ela, deveriam moldar um formato que flutuasse. Pudemos perceber que os estudantes tentaram aproximar ao de um barco, inserindo a "borda" de modo a evitar a entrada de água e, consequentemente, o aumento de peso. Isso fica relevado nas ideias expressas no texto coletivo, quando afirmam: "O primeiro modelo era o da prancha, porque a parte plana iria segurar o peso da massinha. Mas não deu certo porque era aberto e não sustentou o peso. Então a Samira observou o modelo de berço e o de prancha. E ela fez o modelo de barquinho de papel e flutuou".

Atividade 2: Influência do formato na flutuação.

Um olhar panorâmico relevado pela Fig. 2 indica que os alunos avançam para categorias superiores após a atividade em sala de aula, mas nem todos o fazem. A figura revela, ainda, que a prática reforça as ideias que os alunos já tinham, ou seja, de que o formato mais aberto auxilia na flutuação, mostrando a grande permanência na categoria 2. No entanto, a dúvida que existia em relação ao formato de caixa se dissipa, e permanecem apontando que o formato inuencia, porém, é necessário que, além de aberto, uma vez que "diminui o peso", também possua bordas, para que a água não adentre. Somente um aluno apresenta uma ideia de que há influência também do líquido.


No pré-teste da atividade 3, o que pudemos perceber é que todos acreditam que a massa inuencia na flutuação, sendo que o corpo com massa maior, mais facilmente afundará. Tal explicação segue a mesma linha de raciocínio que as atividades anteriores, conforme revela a Fig. 3.


No desenvolvimento da aula, aos alunos eram dados dois frascos, massinha de modelar e um vasilhame com água. A tarefa consistia em fazer um dos frascos flutuar e o outro afundar. O que verificamos é que os estudantes empregam nesta atividade a ideia da influência da massa e preenchem um dos potinhos com massinha de modelar e o outro não. Verificam esta hipótese e comprovam que ela é verdadeira.

O texto coletivo releva esse raciocínio: "Nesta aula vimos que o pote precisa de um peso suficiente para afundar. Nós vimos que foi necessário massinha para afundar. Concluímos que para afundar tem que ter um peso certo. Dependendo do objeto ele precisa de mais ou menos quantidade para afundar".

A atividade corrobora com tal ideia, uma vez que, no pós-teste, algumas explicações são refinadas, mas permanece a crença da influência da massa, conforme percebemos na Fig. 3. Para alguns, o potinho mais leve só afundará se entrar água, tornando-o 'mais pesado'

Nessa atividade, o pré-teste revelou que, para a maioria dos alunos, a quantidade de água não inuencia na flutuação (categoria 2). Para alguns, no entanto, pouca água não oferece condições para flutuar, ou muita água faz com que afunde (categoria 1), conforme aponta a Fig. 4.


No desenvolvimento da aula, cada grupo recebeu um frasco e massinha de modelar, suficiente para preenchê-lo. Deveriam pensar se haveria alguma diferença quando colocassem seus potinhos em recipientes com quantidades distintas de água. Alguns alunos, que no pré-teste disseram que o volume de água não inuenciava, mudaram de opinião durante as discussões, tendo em vista que conversaram com os colegas sobre nadar em piscinas rasas ou profundas. Para esses alunos, é mais fácil boiar nas profundas do que nas rasas. No entanto, o resultado do teste com os recipientes mostrouse contrário, uma vez que a quantidade de água não influenciou na flutuação. Para os grupos com os potinhos com pouca massa ocorreu flutuação, independente da quantidade de água, assim como o afundamento naquelas equipes que utilizaram maior quantidade de massinha. Tal ideia fica expressa no texto coletivo: "Os potes bem cheio de massinha afundaram. Não importa a quantidade de água ou a profundidade. Depende do peso do objeto e do formato".

Numa análise geral da atividade, verificamos que houve uma diminuição da categoria 2 e aumento da 3; porém 3 alunos ficaram na categoria 1.

Segundo a Fig. 5, o pré-teste da atividade 5 revelou que a maior parte dos alunos acredita que a massinha irá afundar quando colocada na água, como se fosse uma tendência natural afundar em sua presença. Logo, a balança penderá para o lado onde a massinha estiver na água (categoria 3). Para três alunos, ocorre o contrário, pois a massinha bóia na água, ou nos sentimos mais leves quando imersos nela (categoria 4).


A atividade em aula foi dividida em três momentos: no primeiro, os alunos deveriam segurar com os dedos um potinho vazio e tapado, imerso num recipiente com água. O intuito é fazer com que eles percebam que o líquido exerce uma força sobre o objeto, tentando trazê-lo à superfície. Num segundo momento, um potinho cheio de massinha foi pendurado na ponta de uma pequena haste, que se envergava com o peso do objeto. Eles tiveram que pensar o que ocorreria quando o potinho, preso pela varinha, fosse colocado na água.

Por fim, o terceiro momento consistiu na mesma atividade do pré-teste, usando a balança. Os comentários das aulas revelam o emprego de novas relações para explicar a flutuação dos objetos, como a percepção da influência da água, conforme revela o texto produzido em conjunto pelos alunos: "Na experiência de hoje a turma do 4º ano fez um experimento que testou a possibilidade da água fazer um objeto flutuar. A turma pensava que a água não inuenciava para um objeto flutuar, após a experiência a turma percebeu que a água pode fazer um objeto flutuar, especialmente por causa do segundo momento, em que colocamos o objeto em contato com a água. Quando colocamos na água o copinho com a massinha, preso numa vara, a água fez pressão e tirou o peso dele. No 3º momento o 4º ano confirmou que a água inuencia na possibilidade de um objeto flutuar".

O pós-teste revelou que houve, principalmente, uma diminuição nas respostas segundo o categoria 3 e aumento na 4. Para os alunos que mudaram para o nível subseqüente, a explicação foi de que a 'água tira a gravidade ou o peso da massinha'. Alguns estudantes ainda se mantiveram no categoria 3, afirmando que a água puxa a massinha para baixo.

Em relação ao pré-teste desta atividade, a figura revela que antes da atividade, destacava-se a categoria 3, na qual não há interferência dos diferentes líquidos. Para aqueles que acreditam que o líquido interfere, suas explicações são sempre baseadas em características dos líquidos, como, a "água é salgada", "o óleo é mole ou escorregadio e não dá conta de segurar o objeto".

Para a atividade em sala de aula, empregamos um densímetro feito de canudinho de plástico e massinha, com o qual os alunos iriam fazer o teste da flutuação em diferentes líquidos - água pura, água com sal e água com óleo.

Devido ao nome do rudimentar instrumento, os estudantes quiseram saber no que consistia; ocasião em que um dicionário foi empregado para verificar o significado do termo "densidade". Houve a leitura coletiva de seu significado, sem que com isso tenham mostrado compreender o conceito.

Com a realização da atividade, verificaram que o densímetro apresentou comportamento diferenciado, dependendo do líquido no qual foi imerso. Para a água salgada, a explicação estava associada ao fato de o sal "dar poder" ou algum tipo de força à água, para que sustentasse o objeto. Para a água com óleo, os alunos observaram que este último inuencia no comportamento do densímetro, afundando na camada de óleo e flutuando na de água.

Suas explicações são apresentadas no texto coletivo: "Hoje fizemos uma experiência sobre a densidade. Tínhamos dois potes com água doce e um com água salgada. Então colocamos o densímetro que é feito com um canudo e uma bolinha feita de massinha na ponta. Quando colocamos o densímetro na água salgada ele utuou. E na água doce o densímetro afundou. Depois colocamos o densímetro na água doce e óleo. Em volta da massinha ficou uma camada de óleo e por isso ele flutuou. Então percebemos que o sal e o óleo misturados com a água doce, aumentam a densidade da água e ajuda a flutuar".

Após a atividade, nenhum aluno se manteve na categoria 1, conforme Fig. 6, havendo aumento expressivo da 2, o que indica algumas mudanças no sentido de conceber que o líquido pode ter influência. No entanto, também é notável o número de alunos que acreditam que no óleo a massinha irá afundar, diferentemente dos recipientes com água, e assim continuam respondendo, após a aula. Mesmo após passarem a empregar o termo "densidade" para tentar explicar o fato, não o compreendem como a relação entre a massa e o volume e, sim, como "espessura" ou viscosidade dos líquidos.


4. Considerações finais

As atividades envolvendo o tema flutuação dos corpos com alunos dos anos iniciais do ensino fundamental, mais especificamente, com estudantes de idade em torno de nove anos, revelou aspectos importantes que devem ser levados em consideração ao abordar esta temática em sala de aula neste nível de ensino.

Algumas ideias parecem estar fortemente arraigadas aos esquemas explicativos dos alunos. A mais comum delas é perceber a influência da massa na flutuação (também conforme a Ref. [4]), sendo que objetos mais pesados, maciços, de materiais "pesados" ou que absorvem água, são facilmente identificados como aqueles que afundam, conforme dados também obtidos por Martinelli e cols. [5].

Quando a atividade desfoca dos objetos e passa a analisar os líquidos onde eles são imersos, alguns alunos tendem a atribuir ao volume do recipiente alguma influência na flutuação, conforme a Ref. [4]. Também, apesar de perceberem que a água exerce algum tipo de força sobre os objetos, não há clareza se ela os ajuda a flutuar ou a afundar. Quanto às características dos líquidos, são sempre referenciadas aquelas visíveis, como a presença ou não de sal ou sua viscosidade, por exemplo.

Confirmando tais idéias, a densidade, tanto dos objetos, quanto dos líquidos, não é uma característica percebida pelos alunos, conforme também aponta Havu-Nuutien [16]. Acreditamos que isso ocorre devido ao fato de a densidade não ser uma característica perceptível tal qual a massa, a presença de sal, a viscosidade, a porosidade, dentre outros. Isso pode estar relacionado ao que Pozo e Crespo [18] definem como 'contiguidade espacial entre causa e efeito', isto é, os alunos tendem a associas suas explicações sobre um fenômeno áquilo que está mais próximo.

Apesar disto, os estudantes apresentam indícios de tentativas de emprego da relação entre massa e volume, quando afirmam que objetos, mesmo com maior massa, mas que possuem cavidade, poros ou são "espalhados", flutuam. Isso parece indicar que, possivelmente, os alunos necessitam ter contato com discussões relativas à densidade dos corpos, antes de abordar sua flutuação.

Percebemos que, apesar de os alunos empregarem um rol de explicações mais amplas no decorrer do processo, conforme também obteve Havu-Nuutinen [16], no decorrer das atividades não há uma linha de raciocínio él a que os estudantes seguem para poder explicar os fenômenos com que se deparam. As respostas parecem se adequar à circunstância e a natureza da atividade.

Elas podem se modificar no decorrer das práticas, como por exemplo, uma aluna, que na atividade sobre a influência do volume, afirmou que este aspecto interfere na flutuação. Todavia, quando se vê diante de três potes com líquidos diferentes, afirmou que não haveria diferença, pois o volume dos líquidos é o mesmo.

Percebemos, também, que o processo de exposição de ideias, argumentação, interação entre alunos, mostrou-se uma estratégia que favorece sua participação, conforme também revela Martinelli e cols. [5] e Havu-Nuutinen [16].

Os textos coletivos foram sendo refinados a cada encontro, como se pode perceber nas transcrições anteriores. O próprio linguajar dos alunos passa por um processo de aperfeiçoamento, conforme também revela Teodoria e Tomazello [19], tratando-se de oportunidade que o professor encontra para inserir novas terminologias científicas.

Não podemos afirmar que os alunos em estudo tenham chegado ao final do processo com uma clara compreensão de uma teoria geral sobre a flutuação dos corpos, mas certamente, o estudo das diferentes variáveis ofereceu a eles elementos para serem pensados e retomados em outro momento da escolarização, quando outros esquemas cognitivos estiverem desenvolvidos, como a conservação da massa, por exemplo.

5. Agradecimento

Os autores agradecem o apoio da FAPEMIG.

Recebido em 15/3/2010; Aceito em 19/1/2011; Publicado em 28/9/2011

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Nov 2011
    • Data do Fascículo
      Set 2011

    Histórico

    • Recebido
      15 Mar 2010
    • Aceito
      28 Set 2011
    • Revisado
      19 Jan 2011
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