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Estudando campos magnéticos e histerese com um anel de Rowland

Studying magnetic fields and hysteresis with a Rowland Ring

Resumos

Neste artigo, discuto uma implementação de um experimento simples destinado a laboratórios didáticos de eletromagnetismo como material de apoio para a investigação de campos magnéticos e histerese pelo aluno, empregando o clássico método do anel de Rowland. Um gerador de sinal produz H em um anel toroidal de material ferromagnético enquando que o sinal captado por uma bobina sensora é amplificado e integrado, possibilitando que a curva de histerese do material seja visualizada na tela de um osciloscópio pelo método de figuras de Lissajous. Uma metodologia adequada para explorar o experimento em um grupo de alunos também é apresentada.

campos magnéticos; histerese; anel de Rowland


In this paper, I discuss a simple experimental setup to be used in academic teaching laboratories in electromagnetism to support the student investigation of magnetic fields and hysteresis. It employs the classical Rowland ring method. A signal generator produces H in a toroidal ring made of ferromagnetic material while the signal picked up by a sensing coil is amplified and integrated, allowing the material hysteresis curve to be seen in a oscilloscope screen by plotting Lissajous curves. A student group methodological approach to explore the experiment is also presented.

magnetic fields; hysteresis; Rowland Ring


PRODUTOS E MATERIAIS DIDÁTICOS

Estudando campos magnéticos e histerese com um anel de Rowland

Studying magnetic fields and hysteresis with a Rowland Ring

Everton Lüdke1 1 E-mail: eludke@smail.ufsm.br

Departamento de Física, Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil

RESUMO

Neste artigo, discuto uma implementação de um experimento simples destinado a laboratórios didáticos de eletromagnetismo como material de apoio para a investigação de campos magnéticos e histerese pelo aluno, empregando o clássico método do anel de Rowland. Um gerador de sinal produz H em um anel toroidal de material ferromagnético enquando que o sinal captado por uma bobina sensora é amplificado e integrado, possibilitando que a curva de histerese do material seja visualizada na tela de um osciloscópio pelo método de figuras de Lissajous. Uma metodologia adequada para explorar o experimento em um grupo de alunos também é apresentada.

Palavras-chave: campos magnéticos, histerese, anel de Rowland.

ABSTRACT

In this paper, I discuss a simple experimental setup to be used in academic teaching laboratories in electromagnetism to support the student investigation of magnetic fields and hysteresis. It employs the classical Rowland ring method. A signal generator produces H in a toroidal ring made of ferromagnetic material while the signal picked up by a sensing coil is amplified and integrated, allowing the material hysteresis curve to be seen in a oscilloscope screen by plotting Lissajous curves. A student group methodological approach to explore the experiment is also presented.

Keywords: magnetic fields, hysteresis, Rowland Ring.

Introdução

A determinação experimental das propriedades de B e H em laboratórios de física requer não somente experimentos de baixo custo e fácil construção, mas que forneça dados que permitam estudar os conceitos de eletromagnetimo de uma maneira eficiente.

Nesse artigo, apresento a análise de histerese com um anel desenvolvido originalmente por Henry A. Rowland (1848-1901) com um custo de construção muito baixo. O anel de Rowland consiste em um anel toroidal coberto uniformemente por uma bobina magnetizadora e uma bobina sensora concentrada em um pólo do anel [1], que mede o fluxo magnético produzido no interior do anel. A corrente elétrica que flui nas espiras do enrolamento primário define a intensidade do campo magnético B no material. A bobina sensora de campo produz uma voltagem proporcional à taxa de variação de campo magnético no anel. Historicamente, medindo a voltagem integrada no tempo captada pela bobina de amostra com um galvanômetro balístico [2] e plotando os dados em função da corrente na bobina de magnetização, obtém-se a curva de histerese [3] para diversos materiais ferromagnéticos.

2. Descrição do experimento

Uma argola de ferro com r1 = 0,02837 m e raio de seção reta de r = 0,00295 m foi adquirida em uma loja de ferragens e sobre ela as espiras foram enroladas. Um carretel vazio de linha de costura foi enrolado com cerca de 12 m de fio de cobre esmaltado e o toróide foi enrolado passando-se o carretel através da sua abertura, em movimento circular de dentro para fora, construindo-se as espiras lado a lado até completar o perímetro da argola com N1 = 560 espiras próximas de fio esmaltado de cobre 28 AWG (Φ = 0,320 mm). A bobina sensora foi feita com N2 = 70 espiras de fio 32 AWG (Φ = 0,203 mm) enroladas sobre um trecho da argola de 1,2 cm de extensão, conforme a Fig. 1.


Se o toróide for fino o suficiente em comparação com o seu raio, o campo magnético no seu interior é da mesma ordem que o campo de um solenóide linear com o mesmo número de espiras por onde circula a mesma corrente elétrica. Com essa densidade de espiras no enrolamento de campo de n ~ 1492 m-1 e uma corrente instantânea de 100 mA, espera-se uma indução magnética no interior do material na ordem de B = µ rµ0nI0 ~ 940 mT, adotando-se (µr ~ 5000) para o ferro.

O campo magnético no interior do anel de Rowland fino de raio R ~ r1 ~ r2 e área de seção transversa A, com uma corrente alternada I = Im cos(ωt) circulante no enrolamento primário com N1 espiras de fio de cobre esmaltado é dada por [1]

Uma espira de prova com N2 espiras próximas é enrolada em uma seção do anel onde se desenvolve uma força eletromotriz induzida, dada pela variação do fluxo da indu cão magnética B no seu interior Ve = N2/dt = N2A dB/dt. Acoplando o sinal da espira de prova à entrada de um amplificador operacional configurado como um integrador de Miller de ganho G e constante de integra cão τ = RC, temos que

Logo a voltagem de saída do amplificador integrador é proporcional ao valor médio do campo magnético B dentro do intervalo de integração e a aplicação dessas equa cões possibilita a calibração da escala dos desenhos em papel milimetrado em unidades de B e H.

O gráfico da histerese é determinado plotando V no eixo da abscissa e I0 no eixo das ordenadas, tendo sido empregado um osciloscópio analógico Goldstar OS9040D em modo de figura de Lissajous com a entrada de deflexão x conectada ao ponto Vx do circuito da Fig. 2 e a deflexão vertical conectada ao ponto Vy. Aumentando a intensidade do feixe, os alunos podem superpor uma folha de papel milimetrado e traçar as curvas de histerese diretamente com lápis preto.


3. Análise do experimento

A Fig. 3 mostra a geometria padrão da curva de histerese desenhada pelos alunos em papel milimetrado a partir das figuras de Lissajous do osciloscópio. As escalas podem ser estimadas pelos alunos, calculando os valores esperados de B e H para os valores da amplitude da corrente elétrica que pode ser obtida pela medida da diferença de potencial nos terminais do resistor de 100 Ω em série com o enrolamento primário do anel (I = Vx/100 Ω), com o auxílio das Eqs. (1) e (2), sabendo-se que Vy = Vb.


À medida que a força magnetizadora H varia de 0 a +H e desse ponto para -H, o valor de B segue a curva abcdefgb, de modo que o trecho ab é a curva ordinária de magnetiza cão que determina a permeabilidade magnética. A por cão bcdefgb é o laço simétrico de histerese propriamente dito, que pode ser analisado graficamente pelo aluno como a diferença de alargamento entre os ramos superiores e inferiores.

Para o processamento dos dados, os alunos calculam os valores de H e B a partir das medidas dos potenciais V1 e V2 empregando fórmulas-padrão para o transformador toroidal encontradas em livros-texto de eletromagnetismo. No regime linear identificado na curva, eles podem determinar o valor da permeabilidade magnética do ferro com base nos valores de H e B obtidos e comparar com o valor aceito de 6,28× 10-3 H m-1, e analisar os gráficos de B vs. H e µ vs. H a partir dos dados coletados a fim de obter a coercividade Hc e a retentividade do material [5], onde os valores -Hc ocorre no ponto d e +Hc no ponto g conforme a Fig. 3.

Para a argola de ferro, os alunos facilmente concluem que os valores de coercividades são iguais, tanto na porção ascendente quanto na porção descendente da curva. Entretanto, deve-se explicar ao aluno que sólidos antiferromagnéticos [4] possuem valores de coercividades distintos para campos crescentes e decrescentes, como resultado de efeito de desvio por anisotropia ("exchange bias", [5, 6]), ocorrendo principalmente em filmes de materiais magnéticos e antiferromagéticos.

A análise da curva de histerese na tela do osciloscópio permite que os alunos explorem o significado físico da retentividade de materiais ferromagnéticos que é resultante da presença de domínios magnéticos no material e que a re-orientação da M ocorre às custas de troca de energia com o meio através do oscilador que gera o campo.

Os alunos também foram capazes de determinar a remanência magnética a partir de Br interpolada nos pontos c e f na Fig. 3, concluindo que a coercividade é a medida do campo magnético reverso necessário para zerar a magnetização após o magneto estar saturado, enquanto que a remanência é a medida da magnetização remanescente quando o campo magnético aplicado possui um valor instantâneo nulo, sendo quantidades importantes para a produção de magnetos permanentes de boa qualidade.

A área da curva de histerese pode ser obtida apenas depois que a escala em papel milimetrado estiver calibrada, por aproxima cão gráfica. Essa quantidade é equivalente ao trabalho elétrico Wb necessário para promover a magnetização do anel e a reorientação completa dos domínios magnéticos, sendo expressa por [1]

Como parte das atividades, os alunos percebem facilmente que o formato característico da curva é dado pela diferença das permeabilidades relativas Δµ = µ0 |µr,d-µr,m| nos percursos de magnetização e desmagnetização, que se relaciona com a taxa de variação da densidade de fluxo magnético B com a intensidade da força magnetizadora dada por Δµ = ∂B/∂H, mostrando que a permeabilidade magnética é uma quantidade física que só faz sentido de ser definida univocamente para materiais nos quais a curva de histerese for estreita.

4. Conclusões

O método prático para análise de histerese descrito nesse artigo possui um ótimo potencial didático-pedagógico para ensino das bases teóricas e experimentais do eletromagnetismo, a um custo extremamente baixo e que permite aos alunos familiarizarem-se com as definições de B e H e estudar a coercividade e a retentividade magnéticas de ferromagnetos.

O experimento também possibilita ao aluno aprender que rela cões lineares tipo M = χmH só existem em materiais diamagnéticos e paramagnéticos e que não existem relações unívocas entre a magnetização M e o campo magnetizante H em ferromagnetos.

Recebido em 5/11/2008; Revisado em 6/11/2009; Aceito em 1/12/2009; Publicado em 14/5/2010

  • [1] P. Lorrain, D.R. Corson and F. Lorrain, Electromagnetic Fields and Waves (W.H. Freeman and Company, New York, 1988), 3rd ed., p. 375-376 and p. 422-425.
  • [2] O.M. Steward, Phys. Rev.(Series I) 16, 158 (1903).
  • [3] A.E. Benfield, Am. Journ. Physics 11, 43 (1943).
  • [4] T. Gray, Science 17, 533 (1995).
  • [5] J.D. Livingston, J. Appl. Phys. 52, 2541 (1981).
  • [6] M. Kiwi, J. Magn. Magn. Mater. 234, 584 (2001).
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    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Jul 2010
    • Data do Fascículo
      Mar 2010

    Histórico

    • Aceito
      01 Dez 2009
    • Revisado
      06 Nov 2009
    • Recebido
      05 Nov 2008
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