Arquivamento e comunicação de imagens radiológicas na formação médica online

Filing and communication of radiological images in online medical training

RESEARCH

Arquivamento e comunicação de imagens radiológicas na formação médica online

Filing and communication of radiological images in online medical training

Alexandre Nogueira dos Santos; Luís Paulo Leopoldo Mercado

Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil

^{Endereço para correspondência}

RESUMO

O estudo investiga as possibilidades de utilização dos recursos de arquivamento e comunicação de imagens nas salas de aula e à distância no processo de formação médica através da telemedicina. Discutem-se as possibilidades de usar programas de informática que reproduzem os recursos de diferentes meios de diagnóstico por imagem como ferramenta didática nas aulas de telemedicina, por meio do acesso a imagens radiológicas utilizando sistemas de informática para fins de emissão de laudos à distância na formação médica. Avaliou-se a apresentação de imagens digitais nas salas de aula dos cursos de saúde a partir da experiência de residentes em formação que atuam na modalidade online, por meio de questionários aplicados com especialistas e residentes que atuam no caso relatado no estudo. Os aspectos de formação docente dos médicos, especialmente para atuar em ambientes online, definição de metodologias de avaliação, interação entre os sujeitos envolvidos foram avaliados para considerar a possibilidade de usar a experiência em cursos de Medicina como um meio de educação à distância (EAD) utilizando Arquivamento e Comunicação de Imagens (PACS).

Palavras-chave: - Educação Online. - Telemedicina. - Telerradiologia.

ABSTRACT

The study investigates the possibilities of using the resources of archival and image communication in the classroom and distance learning in the process of medical education through Telemedicine. A discussion was held on the possibilities of using computer programs that replicate the features of different types of diagnostic imaging as an educational tool in the Telemedicine classroom, through access to radiological images using computer systems for issuing distance reports in medical education. The study evaluated the presentation of digital images in classroom health courses based on the experience of residents-in-training that work in the online mode, through questionnaires completed by experts and residents working on the respective case. Teacher training for physicians (especially for working in online environments), development of evaluation methodologies, and interaction between the individuals involved in the process were assessed to consider the possibility of using the experience in medical courses as a modality of distance education using a picture archiving and communication system (PACS).

Keywords: - Online Education. - Telemedicine. - Teleradiology.

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento da telemedicina possibilita, através de suas interfaces, que profissionais de diversas especialidades, muitas vezes em regiões distantes, interajam e participem de cursos de capacitação. O desempenho de sistemas de saúde depende diretamente da capacitação dos profissionais, e as dificuldades encontradas neste processo podem ser contornadas pela utilização de um meio que promova maior flexibilidade de tempo e espaço. As atividades de educação continuada requerem, tanto do aluno, como do professor, disponibilidade para vencer a resistência de construir seus conhecimentos em um ambiente online.

A telemedicina tem como um de seus objetivos a educação à distância (EAD). Assim, em ambientes online, como a internet, a tele e a videoconferência, os médicos podem atuar construindo conhecimento não só pelas interações entre diferentes especialidades, mas também pelo contato com grandes centros de pesquisa em um cenário globalizado.

Diante da realidade brasileira, em que os grandes centros médicos e de pesquisa se encontram nas regiões Sul e Sudeste, a educação médica à distância (EMaD) surge como uma possibilidade de difundir os conhecimentos médicos pelo País. Desta forma, a crescente especialização de profissionais nestes grandes centros, a presença e a dependência de tecnologias utilizadas na promoção da educação médica continuada (EMC) levam a uma capacitação dos trabalhadores da saúde.

O profissional especialista, cada vez mais, vem perdendo espaço para o profissional generalista, e isto implica uma nova visão das universidades: formar um profissional que domine várias áreas do saber. Desta forma, as tecnologias de informação e comunicação (TIC) surgem como uma ferramenta que contribui nesse processo interdisciplinar, promovendo a troca imediata de informações.

O uso do arquivamento e comunicação de imagens é uma importante ferramenta de ensino, que propicia discussões aprofundadas sobre o diagnóstico de várias patologias. Tudo isso em um ambiente dinâmico, que dispensa o professor de utilizar como material uma série de filmes radiográficos.

O desenvolvimento da radiologia digital acontece de maneira muito rápida. Imagens de exames radiológicos são acessadas por meio de redes em centros médicos com o objetivo de dinamizar o atendimento de pacientes nas mais diversas especialidades.

A radiologia digital pode contribuir com o processo de educação na saúde e para o desenvolvimento de outros recursos voltados a essa área. É possível que os alunos de cursos de Medicina passem a não depender de uma visita ou de um estágio para manter contato com os meios de diagnóstico e suas imagens, principalmente em universidades que disponham de um complexo hospitalar integrado, como no caso dos hospitais universitários.

A utilização do Arquivamento e Comunicação de Imagens (PACS) permite levar imagens para a sala de aula ou utilizá-las como ferramentas de educação online, com programas que criam um ambiente no qual os alunos podem se sentir diante de um equipamento de ecografia, tomografia computadorizada ou ressonância magnética.

TELEMEDICINA: CONTRIBUIÇÕES DAS TIC NA FORMAÇÃO MÉDICA ONLINE

Existem situações em que médicos residentes em radiodiagnóstico por imagem realizam procedimentos online. Imagens são transmitidas em tempo real de um pequeno para um grande centro de saúde, onde um especialista avalia o procedimento, podendo, inclusive, receber um grupo de novos alunos ou residentes para uma discussão de caso. Outras vezes, essas discussões são promovidas em salas de laudos virtuais.

Muitas vezes, a implantação destes sistemas não envolve apenas a necessidade de recursos financeiros, mas passa pela resistência dos próprios profissionais em utilizá-los e pela falta de formação específica, tanto para a docência, presencial e online, como para a utilização das TIC.

A telemedicina está relacionada a todas as ações realizadas por meio de informática médica, possibilitando o acompanhamento de pacientes, principalmente por meio de segunda opinião. Trata-se da maneira mais rica de interação com outras áreas de conhecimento, promovendo uma educação baseada no conceito de interdisciplinaridade.

Os cursos de Medicina já incluíram a disciplina de telemedicina, passando pela necessidade de um atendimento de qualidade para que decisões e orientações aconteçam à distância. Desta forma, uma vez que essa prática altera o relacionamento entre médicos e pacientes, é necessário que seja uma modalidade ensinada nas faculdades.

Tratando-se de um meio interativo, diferentes profissionais, assim como os próprios pacientes, passam a participar das ações de atendimento em projetos de prevenção de doenças. Por esta razão, avaliar a educação por telemedicina significa pensar não apenas nos alunos dos cursos de Medicina, mas também nos indivíduos de toda a sociedade.

O sistema e-Saude¹ é formado por alguns subsistemas - como a pesquisa e o desenvolvimento e inovação -, assim como o subsistema de formação, educação e treinamento possui uma lista de aplicações das TIC, tais como: redes cooperativas à distância para pesquisas médicas; institutos virtuais de pesquisa; tecnologias educacionais digitais aplicadas em cursos e faculdades da área de saúde para apoio ao ensino presencial; educação e treinamento à distância; sistemas integrados de informação acadêmica em medicina; telemedicina e telessaúde; telerradiologia; segunda opinião médica à distância; telediagnóstico; e as redes PACS.

Esses recursos fazem parte do conjunto de aplicações da telemedicina, que contribuem para a formação de médicos e de outros profissionais da saúde. Neste estudo serão abordados sistemas de telemedicina relacionados ao tráfego de imagens radiológicas em rede, objetivando a formação profissional como uma proposta de EAD. Desta forma, antes de uma discussão específica sobre esses sistemas, é necessário conceituar telemedicina, bem como abordar a utilização de seus recursos numa perspectiva de teleducação médica.

Pela educação online, os programas de telemedicina objetivam a melhoria do atendimento médico a partir da capacitação profissional com o uso de tecnologias na promoção da teleducação interativa, utilização de recursos como bibliotecas virtuais e videoconferência, desenvolvimento da teleducação formativa, segunda opinião entre especialistas online e offline, integrando a academia aos profissionais, principalmente de hospitais universitários, através de projetos de inclusão digital.

São muitas as contribuições da telemedicina para a formação médica online, já que se trata de um de seus principais objetivos. No Brasil, a Rede Universitária de Telemedicina (Rute), pela Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), desenvolve um projeto que interliga hospitais universitários. O objetivo principal da Rute é: "viabilizar o acesso das unidades de faculdades de Medicina e hospitais universitários e de ensino das diferentes regiões do País, que desenvolvem projetos na área de telemedicina, ao sistema de comunicação da RNP"².

A Rute busca trabalhar com mecanismos inovadores na educação em saúde, na colaboração à distância para pré-diagnóstico e na avaliação remota de dados de atendimento médico.

ARQUIVAMENTO E COMUNICAÇÃO DE IMAGENS: UMA METODOLOGIA INOVADORA USANDO TIC NA FORMAÇÃO MÉDICA

Na área de telerradiologia e telediagnóstico, existem projetos que vêm desempenhando atividades importantes na telemedicina brasileira. Para que estas redes entrem em funcionamento de fato, é necessário incorporar a manipulação de exames à distância à rotina de trabalho dos profissionais, de preferência desde o momento de sua formação. No Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV), em Porto Alegre (RS), esta formação já ocorre online, com residentes em obstetrícia realizando exames de ultrassonografia à distância e em tempo real. "A introdução de procedimentos relativamente simples de telemedicina no ambiente hospitalar, como é o caso do telediagnóstico por imagem, exige um esforço adicional de integração de profissionais, trabalho colaborativo e prática usual com PC"³.

O sistema PACS, uma aplicação da telerradiologia, se apresenta como uma metodologia inovadora que pode ser utilizada na formação médica online, principalmente de especialistas na área de diagnóstico por imagem.

A telerradiologia é uma modalidade que permite que usuários acessem imagens de exames radiológicos simultaneamente mesmo que estejam em lugares diferentes, melhorando o acesso e a qualidade de interpretação desses exames.

Um sistema telerradiológico consiste em três unidades fundamentais: uma unidade de envio das imagens, uma rede de transmissão e outra de recepção. Por estes recursos, imagens podem ser enviadas, inclusive para a residência de um radiologista, permitindo agilidade na avaliação dos exames e a realização imediata de consultas. Outra vantagem é que médicos de cidades distantes e que realizam um atendimento primário de saúde podem enviar imagens a fim de obter uma segunda opinião de um especialista que esteja em um centro maior.

É possível também que seja preciso consultar médicos de alguma subespecialidade - por exemplo, um radiologista pediátrico ou um neurorradiologista -, que são encontrados, em sua maioria, em hospitais de grande porte. Nestes casos, esta modalidade promove ações interdisciplinares, já que permite a participação de várias especialidades médicas.

Com a implantação desses novos sistemas e a possibilidade de disponibilização de imagens pela internet, é importante que os centros de diagnóstico criem meios que dispensem a presença física dos especialistas, ampliando as formas e a qualidade de atendimento de seus pacientes. Ao mesmo tempo, residentes de radiologia terão a oportunidade de dispor de uma ferramenta que lhes permitirá acessar uma quantidade maior de casos, discuti-los por meio de salas de laudo virtuais ou, até mesmo, realizar exames sob a avaliação e orientação de um especialista, mesmo que não estejam presentes em um grande centro de radiodiagnóstico.

Essa modalidade pode se tornar mais viável e dinâmica caso as imagens não apenas sejam enviadas, mas seus laudos sejam feitos mediante uma atividade colaborativa, online, o que motivaria mais os radiologistas e melhoraria a qualidade dos diagnósticos.

O processo de arquivamento e comunicação de imagens PACS permite acesso confiável e seguro às imagens radiológicas, que são informações médicas. Desde o momento em que são produzidas, nos equipamentos de radiodiagnóstico, até o momento em que são analisadas, passam, necessariamente, por três estágios: geração de imagens (relacionado à sua obtenção), gerenciamento das informações dessas imagens e análise.

Figura 1 - Clique para ampliar

 

A realidade digital e o progresso dos meios diagnósticos por imagem, como tomografia computadorizada, ressonância magnética e ultrassonografia, têm levado ao desenvolvimento e à implementação dos PACS, com o objetivo de integrar diferentes setores de um hospital ou de fazer a comunicação deste com outras clínicas, consultórios e postos de saúde.

Disponibilizar imagens radiológicas online e permitir que sejam acessadas por qualquer computador e em qualquer lugar exige um requisito básico: que elas sigam uma linguagem denominada Digital Imaging and Communication in Medicine (Dicom). Trata-se de um padrão universalmente utilizado no gerenciamento de informações em sistemas de telerradiologia que tem o objetivo de padronizar as imagens diagnósticas de exames como tomografia computadorizada, ressonância magnética, radiografias e ultrassonografia, de modo que elas possam trafegar em rede.

Nos programas Magic View 300 ou Osíris, "as imagens capturadas permitem ajustes de brilho, contraste e a aplicação de processamentos padrões, como realce de bordas, binarização, borramento e outros"⁴.

A partir destes recursos, uma modalidade de formação médica online adquire um grande diferencial: capacitar um aluno de um curso de Medicina ou um profissional já formado a partir dos mais variados recursos existentes nos meios de diagnóstico por imagem. Existem recursos de envio de imagens, inclusive pela internet, mas com a utilização dos sistemas PACS. Esta imagem pode se apresentar não apenas de maneira estática, mas ser manipulada de forma que o aluno se sinta como se estivesse diante de um equipamento ou, até mesmo, realizando um exame à distância.

ARQUIVAMENTO E COMUNICAÇÃO DE IMAGENS NA EDUCAÇÃO MÉDICA

Nos cursos de Medicina, o trabalho do residente em radiologia envolve a parte de laudos, algo ainda visto com receio se feito à distância. Em um sistema implantado no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto, os médicos residentes preparam os laudos, que serão conferidos pelos radiologistas e docentes. Nesse caso, recebem o status de laudo provisório no sistema, não sendo visíveis na rede até que seja feita a sua revisão⁴.

Uma experiência semelhante é a do Projeto POA_S@UDE, da prefeitura de Porto Alegre. Neste caso, residentes realizam exames que são avaliados à distância por um especialista, em tempo real, emitindo laudos provisórios, que são salvos em um servidor para posterior acesso e avaliação do especialista do HMIPV.

Em áreas de ensino fora da radiologia, como a cirurgia, por exemplo, "os cirurgiões devem ser capazes de tomar decisões diagnósticas logo após um exame, bem como acessar simultaneamente as imagens para discutir as sequências de imagens nas salas de ensino, ou nas salas de consulta"⁵.

Quanto ao uso destes recursos para a realização de um planejamento tridimensional de tratamentos radioterápicos, temos a importância de proporcionar ao aluno o acompanhamento do caso de um paciente com tumor, desde o diagnóstico até o tratamento, através de meios digitais. "Com o desenvolvimento dos métodos de imagem e de planejamento tridimensional, um grande número de informações passou a ser disponível para a análise do plano de tratamento pelos radioterapeutas"⁶.

O desenvolvimento da radiologia digital ainda está, na maioria dos casos, direcionado para a aquisição e o trânsito de imagens dentro das dependências de um hospital, mas uma nova visão pode levar essa tecnologia a ser responsável por impactar todo o sistema de ensino neste segmento.

Avaliando as tendências e potencialidades deste novo campo de estudo, percebe-se que as aplicações e vantagens podem não se restringir ao ambiente médico-hospitalar, estendendo-se a ambientes de ensino na área médica.

UTILIZAÇÃO DO PACS NA FORMAÇÃO MÉDICA ONLINE: O PROJETO POA_S@AUDE

O Teleconsult é um sistema de fácil utilização, que pode ser executado nos sistemas operacionais Windows 2000 ou XP. Permite a aquisição de imagens médicas de qualquer equipamento de ultrassonografia, além de visualizar instantaneamente as imagens dos exames realizados, sendo capaz de criar um banco de dados dos pacientes que realizaram exames.

Como ferramenta de telemedicina e EAD, pode ser utilizado no gerenciamento de estudos dos mais variados casos clínicos. Estes são armazenados em um banco de dados que também permite a importação e exportação de arquivos externos (a partir de banco de dados de outros centros de diagnóstico), possibilitando discussões entre especialistas através do envio de mensagens online ou offline. Neste caso, a resposta de um especialista a um médico ou residente que esteja realizando o exame pode ocorrer de forma síncrona ou assíncrona.

A transmissão de dados ocorre pela internet.

"No modo

online,

ambos os médicos visualizam a mesma imagem ou a série de imagens. Todas as interações com

mouse, chat

e anotações são transferidas em tempo real [...] O sistema trabalha e converte qualquer imagem Dicom, podendo se comunicar com equipamentos médicos da rede Dicom e, também, do protocolo de rede TCP/IP. [...] possui um pequeno banco de dados que armazena informações do paciente, índices para recuperação de imagens digitais e todo o histórico das teleconsultas"

³

.

O projeto POA_S@UDE utiliza, nas interações entre residentes e especialistas, a interface do sistema Teleconsult, dinamizando o processo de realização de exames de ultrassonografia em postos de saúde e a avaliação instantânea de especialistas presentes no hospital. "A ultrassonografia é, entre todos os exames de diagnóstico por imagem, o exame mais dependente do examinador, pelo fato de ser dinâmica e realizada em tempo real"⁷.

A utilização de sistemas PACS neste contexto favorece a possibilidade de que profissionais e residentes desenvolvam atividades em conjunto, trocando informações durante e não após o procedimento. Isto não só aprimora o aprendizado, como também dinamiza o processo com a utilização de ferramentas como o sistema Teleconsult. Trata-se de um mecanismo inovador que pode contribuir para a formação médica não apenas em radiologia, mas também em outras especialidades que nela se baseiam para o estabelecimento de condutas terapêuticas.

No processo de formação online, no que se refere aos fundamentos e modelos da EAD, "o aprendiz encontra no computador conectado a possibilidade de intervenção nos fluxos de informação e nos processos de aprendizagem, podendo atuar individual e colaborativamente na construção do conhecimento"⁸. Desta forma, partir do acesso a imagens pela internet, é necessário avaliar o preparo dos professores para atuar em uma nova realidade online, bem como a participação dos alunos como seres mais autônomos.

MÉTODO

Esta pesquisa se desenvolveu no HMIPV, na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, analisando o projeto POA_S@ UDE a partir da realização de exames de ultrassom à distância em postos de saúde do bairro Restinga por residentes em medicina fetal, sob a orientação de médicos especialistas. Trata-se de um relato de uma experiência considerando a possibilidade de utilizá-la em uma perspectiva de EAD, uma vez que há um acompanhamento sistemático destes residentes.

O projeto POA_S@UDE foi desenvolvido com base no projeto T@lemed e está relacionado à realização de teleultrassonografias mediante um serviço de telemedicina da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre (SMS) e da Companhia de Processamento de Dados do Município de Porto Alegre (Procempa).

Foi constatado que um alto índice de pacientes gestantes faltava a exames agendados em hospitais do município por causas variadas, o que justifica as atividades realizadas à distância, como a EAD. Com a implantação deste sistema de telemedicina no HMIPV, o período de espera diminuiu de 120 para 34 dias, e o índice de faltas aos exames caiu de 40% para 10%, além de as pacientes passarem a fazer o pré-natal no próprio hospital.

Esses procedimentos são realizados por residentes em medicina fetal, ao mesmo tempo em que um especialista acompanha e orienta o procedimento em tempo real, mediante imagens da paciente e do exame, que são enviadas ao HMIPV. Esses residentes também passam por treinamentos teóricos e práticos em ultrassonografia fetal.

Desta forma, tratando-se da realização de exames orientados por uma relação especialista-residente à distância, esta experiência representa um meio de formação médica online na área de diagnóstico por imagem.

O projeto POA_S@UDE apresenta características que podem ser analisadas a partir de uma perspectiva de educação online, pelo fato de promover um processo de interação entre um médico especialista e um residente, mesmo tendo como principal objetivo atender gestantes de um bairro distante na cidade de Porto Alegre. Essas pacientes são submetidas a exames de ultrassom, em que os residentes (médicos em formação) recebem orientações à distância.

A metodologia utilizada foi o estudo de caso e teve por objetivo analisar como a implantação de um sistema PACS pode ser utilizada como recurso de formação médica online à distância. Esta análise ocorreu a partir das respostas a formulários enviados a médicos e residentes em medicina fetal.

O grupo de participantes da pesquisa foi composto por quatro pessoas (dois especialistas e dois residentes). Todas já vivenciaram ou estavam vivenciando o projeto POA_S@UDE em sua residência dentro do HMIPV. O critério de escolha dos participantes foi estar atuando ou ter atuado na realização de exames de ultrassom à distância.

O número de sujeitos envolvidos foi pequeno por se tratar de um projeto recente e destacado na utilização de atividades online envolvendo todos os recursos de exames de ultrassom, não apenas imagens estáticas, como também por estabelecer um processo de formação diferente da maioria das experiências no Brasil. Mesmo assim, todos os participantes do projeto, ao serem convidados, aceitaram colaborar com este estudo.

O primeiro procedimento foi o contato com os especialistas e residentes, bem como com a coordenação do projeto, a fim de explicitar os objetivos do estudo e solicitar a colaboração destes para a execução da pesquisa. Todos os participantes aceitaram fazer parte dela e formalizaram o consentimento via e-mail.

Os dados foram coletados mediante a aplicação de um formulário semiaberto aos sujeitos que aceitaram a participação. O formulário consistia em um roteiro com perguntas gerais, algumas apresentando opções de resposta. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa do HMIPV. Foi realizada uma análise qualitativa quanto à possibilidade de utilizar as experiências deste projeto como recurso de formação médica online.

DISCUSSÃO

Com base na análise dos dados coletados, foram identificados três grandes eixos temáticos, que serviram de subsídio para a discussão dos resultados:

A Prática Médica como Instrumento de Formação

Foi avaliada a possibilidade de utilizar a experiência do projeto POA_S@UDE como instrumento de formação médica online segundo a perspectiva dos orientadores e dos residentes.

Na função de orientadores dos residentes no projeto POA_S@UDE estão médicos especialistas em medicina fetal. Esta orientação dos exames de ultrassonografia ocorre online, mas no projeto estes especialistas não exercem a função de professores. Trata-se de atividades práticas realizadas online durante o processo de aprendizado desse residente⁹. Serão analisadas as contribuições de dois residentes, dos quais o primeiro concluiu sua residência, e o segundo se encontra no início das atividades.

As atividades realizadas no projeto POA_S@UDE constituem um método de formação através da prática que não representa uma prática clínica, mas combina atendimento à população com atividades de ensino. A formação dos participantes do projeto teve caráter apenas técnico para a realização dos exames, ou seja, não ocorreu nenhum tipo de formação pedagógica desses participantes.

A prática médica é uma atividade inerente à proposta do projeto de telediagnóstico analisado e representa a tendência e a necessidade já relatada de utilizá-la em seu processo na formação profissional. Analisando as expectativas dos participantes quanto ao aspecto de formação do projeto, foi verificado que não existe nenhum tipo de formação dos médicos para exercer a função de professores.

Inicialmente, considerando que o projeto não está inserido em um curso de Medicina, mas, sim, em um ambiente hospitalar, não existe a figura do professor, da avaliação por meio de provas e diferentes disciplinas. A utilização deste modelo na formação médica, principalmente nos cursos de Medicina, requer que sejam incluídas na proposta inicial de projetos como o POA_S@UDE algumas características fundamentais a todo processo educativo, tais como: a formação pedagógica dos médicos para atuarem como professores, o domínio das TIC como instrumento de ensino-aprendizagem e não apenas como objeto de realização de exames à distância, e a definição de estratégias de avaliação dos residentes/alunos de cursos de Medicina a partir da utilização online destes recursos.

Uma vez considerada a perspectiva de utilização desta experiência como EAD, é importante haver uma sintonia entre seus diferentes focos, o atendimento à população e o ensino¹⁰. Desta forma, os aspectos de formação, necessariamente, devem envolver não só o preparo para a execução de exames à distância, como também uma formação pedagógica na qual os orientadores proponham atividades que levem à formação de médicos que conduzam seu aprendizado de forma autônoma.

Arquivamento e Comunicação de Imagens como Ferramenta de EAD

A radiologia tem se beneficiado da telemedicina nas áreas de telediagnóstico, segunda opinião e EAD, utilizando a formação médica através dos recursos interativos dos sistemas PACS como fontes de desenvolvimento de habilidades para trabalhar com estes recursos^8,11,12.

Há uma série de benefícios decorrentes da utilização dos sistemas PACS na formação médica que podem ser percebidos no objeto de análise deste estudo. Os exames são realizados à distância, e é desta maneira que ocorre todo o processo de interação entre o especialista e o residente, pois ambos se encontram diante de um computador no qual existe a possibilidade de interação não apenas entre eles, mas também com os próprios recursos do método diagnóstico⁸. A interação com o método está relacionada à possibilidade de estar distante de um equipamento de radiodiagnóstico e, mesmo assim, acessar todas as funções inerentes ao exame.

Quando o residente executa qualquer tipo de função ligada ao procedimento, é possível haver um acompanhamento, uma intervenção ou uma sugestão de ambas as partes para o melhor andamento e resultado das atividades.

As questões relacionadas à utilização dos sistemas PACS como ferramenta de EAD representam a mais complexa categoria de análise deste estudo.

Foram analisadas a avaliação e a realização de tarefas pelos residentes de acordo com a perspectiva dos integrantes do projeto, e os processos de motivação e interação tão necessários e mencionados em diversas publicações acerca da educação online.

Quando questionados sobre a preocupação em motivar os residentes durante as atividades, tanto os especialistas como os próprios residentes afirmaram existir este estímulo, porém não apontaram a maneira como isso acontece. Da mesma forma, todos registram que sempre há colaboração de todos os participantes do projeto. O fato de considerarem que as atividades à distância não influenciam e não causam dificuldades ao aprendizado dos residentes demonstra o benefício do telediagnóstico dentro da telemedicina¹¹, não apenas na perspectiva do teleatendimento da população, por meio de teleconsulta e segunda opinião, mas também quando afirmam tratar-se de uma especialidade cujas atividades podem ser utilizadas na EAD.

A forma como se dá o desempenho das atividades dos residentes representa também um item muito importante na avaliação do projeto segundo a perspectiva de EAD. Um dos desafios da proposta é a comparação necessária entre a atividade e a avaliação dos residentes que realizam exames online e de forma presencial. Neste caso, mesmo destacando as vantagens da realização de exames online, os participantes da pesquisa apontam que em alguns momentos o caráter presencial permite uma avaliação mais aprofundada das atividades do residente, como a destreza na realização dos exames.

A independência dos alunos na realização de tarefas online acaba por se refletir no perfil do médico¹⁰, de modo que ele seja capaz de conduzir de forma autônoma suas ações e seu processo de formação ao longo da carreira.

Por se tratar de um exame realizado em tempo real, durante o acompanhamento o especialista tem a oportunidade de questionar o residente sobre as imagens que estão sendo exibidas online, através de contato por áudio e vídeo.

A interação entre residente e especialista se reflete apenas nos momentos em que os residentes podem esclarecer dúvidas ou ser questionados por quem os orienta, mas também representa um espaço de contribuição desses residentes, no qual eles podem emitir opiniões sobre as imagens analisadas, contribuindo no diagnóstico dos exames.

Mesmo diante de todas as características presentes numa atividade de educação online, considera-se a possibilidade de que esta não seja uma modalidade exclusiva de ensino. É possível combinar atividades presenciais com atividades online e, portanto, diante da perspectiva de utilizar a experiência do POA_S@UDE como forma de EAD, com base na experiência dos sujeitos envolvidos no projeto, a necessidade de alguns encontros presenciais é importante em determinados momentos.

A utilização dos PACS como ferramenta de EAD pode representar um meio eficaz de interação entre os sujeitos, uma vez que lhes permite trocar informações sobre os exames rea-lizados em tempo real e promove atividades que motivam os que usam estes recursos.

O Projeto POA_S@UDE na Perspectiva de Formação Médica online

Analisar a EAD nas ações de telemedicina tem por objetivo analisar a possibilidade de usar a experiência do projeto POA_S@UDE para este fim. É considerada também a necessidade de uma formação médica generalista, crítica e reflexiva do médico formado^10,13,14.

Na avaliação da possibilidade de utilizar o projeto POA_S@UDE como um modelo de formação médica online, é importante considerar a impressão de seus participantes a partir desta perspectiva. Para os especialistas orientadores deste projeto, desde sua implantação o POA_S@UDE apresentou este objetivo.

O Quadro 1 apresenta as características positivas e negativas apontadas pelos protagonistas do projeto POA_S@UDE, nas respostas ao questionário.

Verificou-se que um modelo do projeto POA_S@UDE, se seguido por universidades e cursos de formação médica, representa a possibilidade de o aprendiz ser capaz de intervir e contribuir diretamente na sua formação e nas atividades que lhe são propostas, bem como colaborar a todo momento com a troca de informações que acabam por construir todo o seu conhecimento⁸. Tudo isto de maneira inovadora e a partir de um aperfeiçoamento que ocorra durante a realização do seu trabalho.

Para isto, as instituições que utilizarem este modelo deverão investir na capacitação desses orientadores, agora professores, de modo que as atividades desenvolvidas por eles permitam que os alunos tenham a liberdade, referida na coleta de dados, de construir seu conhecimento. As atividades de avaliação deveriam ser focadas no aprendizado prático, avaliando o treinamento em serviço, na simulação do ambiente profissional real⁹.

É também interessante que os alunos tenham contato com a maior variedade possível de casos, simples ou complexos, pois isto faria com que o aprendizado não se detivesse apenas na realização dos exames, mas abrangesse a valorização de um conhecimento mais amplo, complexo, interdisciplinar, com o desenvolvimento de habilidades que levem a um pensamento cada vez mais crítico.

A experiência analisada envolveu a realização de exames de apenas uma modalidade diagnóstica, mas o investimento na utilização de sistemas PACS em instituições educacionais permite empregar outros tipos de exames radiológicos nos mesmos moldes, o que representa uma importante ferramenta de formação médica online em radiologia e nas demais especialidades médicas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O sistema PACS permite uma utilização variada, desde o tráfego em rede de imagens em hospitais, entre cidades distantes, ou online, como forma de consulta ou ferramenta de ensino.

Na perspectiva educacional, assim como qualquer atividade na EAD, a utilização dos PACS na formação médica requer uma avaliação aprofundada destas atividades e da capacitação dos indivíduos envolvidos - e esta requer não só conhecimento pedagógico dos professores, como também preparo específico para atuar em ambientes de educação online.

A falta de formação pedagógica desses profissionais não está ligada apenas ao desinteresse dos médicos em investir neste tipo de capacitação. Não podemos deixar de considerar que, mesmo sendo a EAD um dos focos das atividades de telemedicina, é difícil encontrar em suas especialidades projetos que tenham na formação o seu principal objetivo.

Diante da realidade social brasileira, as atividades de telemedicina, em sua maioria, estão direcionadas ao atendimento da população em situações em que a distância é um fator crítico. Além de implementar esses sistemas, é necessário que eles atendam, sob a ótica da EAD, um grande número de instituições e de alunos.

Foi analisada uma experiência que reduz a fila de espera por um exame de ultrassom e que, por isto, tem um papel social muito importante no atendimento da população carente e que representa uma experiência bem-sucedida também na formação de residentes. Assim, a partir da definição de atividades mais direcionadas a este aspecto educativo, com a ampliação do número de aprendizes, do número de instituições envolvidas e do acesso de indivíduos que estejam em locais distantes, como proposto pelas atividades de telemedicina, trata-se de uma experiência a ser seguida por cursos da área médica.

Da mesma forma como os procedimentos médicos têm se beneficiado e se desenvolvido juntamente com o avanço tecnológico cada vez mais rápido, esta tecnologia em pouco tempo representará a base da formação em Medicina, de acordo com o perfil do médico do futuro.

Neste futuro, é necessário pensar que os hospitais universitários poderão contar com sistemas PACS, interligando suas clínicas e salas de aula, nas quais os alunos poderão contar com uma ampla estrutura que organize todas as imagens dos mais variados métodos de diagnóstico em um servidor único. Neste caso, estes exames poderiam ser agrupados de acordo com cada especialidade, de modo que todos os professores passassem a utilizá-los como ferramenta didática e instrumento de discussão, interação e, certamente, de construção de conhecimento.

A radiologia é uma especialidade de caráter interdisciplinar marcante, pois todas as especialidades solicitam exames. Portanto, todos devem ter um conhecimento aprofundado pelo menos das imagens relacionadas aos exames de sua especialidade. Por esta razão, não está sendo apresentada uma proposta exclusiva para o ensino na área de diagnóstico. A implantação do PACS poderá envolver a formação de qualquer aluno, independentemente da especialidade em que esteja focado.

As atividades de ensino-aprendizagem, tratando-se de hospitais universitários, por exemplo, podem ser enriquecidas em grupos de interesse pertencentes à Rute, com a participação de hospitais de todo o Brasil, em momentos de consulta à distância, segunda opinião e implantação de cursos de educação continuada online.

A experiência POA_S@UDE pode representar um grande projeto de telemedicina e educação online a partir do momento em que se una a outros projetos, ampliando o número de pessoas e instituições participantes e fazendo com que elas troquem informações entre si a partir da troca de experiências entre os projetos aos quais pertencem.

A partir das contribuições dos participantes da pesquisa, conclui-se que as atividades realizadas neste projeto do HMI-PV não estão presentes apenas nas rotinas de atendimento hospitalar, mas estão inseridas em um contexto de formação médica online. Trata-se de uma experiência que comprova algumas hipóteses levantadas a partir da questão fundamental desta pesquisa, isto é, a possibilidade de realizar atividades de ensino online a partir de programas que simulam equipamentos de radiodiagnóstico e promovem, de maneira dinâmica, a discussão de exames entre médicos em formação e especialistas.

Recebido em: 25/10/2009

Reencaminhado em: 03/03/2010

Reencaminhado em: 10/03/2010

Aprovado em: 12/03/2010

CONFLITO DE INTERESSES

Declarou não haver.

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Os autores contribuíram com a coleta e análise dos dados,bem como da redação do artigo.

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Endereço para correspondência:

Alexandre Nogueira dos Santos

Av. Desembargador Valente de Lima, 1014 apt. 703

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  28 Fev 2011
• Data do Fascículo
  Dez 2010

Histórico

• Aceito
  12 Mar 2010
• Revisado
  03 Mar 2010
• Recebido
  25 Out 2009