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Transtornos mentais menores entre estudantes de medicina

Minor mental disorders among medical students

Resumos

OBJETIVO: O objetivo do estudo foi estimar a prevalência de Transtornos Mentais Menores (TMM) entre os estudantes do curso de Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e avaliar possíveis correlações entre TMM e fatores de risco. MÉTODOS: Estudo transversal realizado de abril a agosto de 2012 com 384 alunos do curso de Medicina. O questionário utilizado foi autoaplicável e anônimo. Foram coletados dados sociodemográficos e a rede de apoio social. Para o rastreamento de TMM, utilizou-se o Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20). RESULTADOS: A prevalência total de TMM encontrada foi de 33,6%, que esteve independentemente associada ao período do curso (p < 0,001; 9,7% a 63,3%), à idade (p < 0,05; 25% a 42,6%), a não seguir uma religião (p < 0,05; 44,8%). CONCLUSÃO: Os dados demonstram elevada prevalência de TMM nessa população e a importância de subsidiar ações para prevenção e cuidado com a saúde mental dos estudantes de Medicina, melhorando sua qualidade de vida.

Transtornos Mentais; Estudantes de Medicina; Fatores de Risco; Saúde Mental


OBJECTIVE: The objective of this study was to estimate the prevalence of minor mental disorders (MMR) among medical students of the Federal University of Paraíba (UFPB) and to evaluate possible correlations between MMR and risk factors. METHODS: CRoss-sectional study conducted from April to August 2012 involving 384 medicine students. The questionnaire was self-administered and anonymous. We collected sociodemographic data and information on their social support networks. For screening MMR, we used the Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20). RESULTS: The overall prevalence of TMM was found to be 33.6%, which was independently correlated to the duration of the course (p <0.001, 9.7% to 63.3%), age (p <0.05, 25% to 42.6%), not following a religion (p <0.05, 44.8%). CONCLUSION: The data demonstrate a high prevalence of MMR in this population group and the importance of support programs for mental health prevention and care of medical students, improving their quality of life.

Mental Disorders; Medical Students; Risk Factors; Mental Health


PESQUISA

Transtornos mentais menores entre estudantes de medicina

Minor mental disorders among medical students

Emmanuelle Santana Rocha; André Petraglia Sassi

Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa (PB), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Emmanuelle Santana Rocha Rua Nurisman de Andrade Carneiro, 255 Bancários - João Pessoa CEP. 58052-284 PB E-mail: emmanuelle_sr@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: O objetivo do estudo foi estimar a prevalência de Transtornos Mentais Menores (TMM) entre os estudantes do curso de Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e avaliar possíveis correlações entre TMM e fatores de risco.

MÉTODOS: Estudo transversal realizado de abril a agosto de 2012 com 384 alunos do curso de Medicina. O questionário utilizado foi autoaplicável e anônimo. Foram coletados dados sociodemográficos e a rede de apoio social. Para o rastreamento de TMM, utilizou-se o Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20).

RESULTADOS: A prevalência total de TMM encontrada foi de 33,6%, que esteve independentemente associada ao período do curso (p < 0,001; 9,7% a 63,3%), à idade (p < 0,05; 25% a 42,6%), a não seguir uma religião (p < 0,05; 44,8%).

CONCLUSÃO: Os dados demonstram elevada prevalência de TMM nessa população e a importância de subsidiar ações para prevenção e cuidado com a saúde mental dos estudantes de Medicina, melhorando sua qualidade de vida.

Palavras-chave: Transtornos Mentais; Estudantes de Medicina; Fatores de Risco; Saúde Mental.

ABSTRACT

OBJECTIVE: The objective of this study was to estimate the prevalence of minor mental disorders (MMR) among medical students of the Federal University of Paraíba (UFPB) and to evaluate possible correlations between MMR and risk factors.

METHODS: CRoss-sectional study conducted from April to August 2012 involving 384 medicine students. The questionnaire was self-administered and anonymous. We collected sociodemographic data and information on their social support networks. For screening MMR, we used the Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20).

RESULTS: The overall prevalence of TMM was found to be 33.6%, which was independently correlated to the duration of the course (p <0.001, 9.7% to 63.3%), age (p <0.05, 25% to 42.6%), not following a religion (p <0.05, 44.8%).

CONCLUSION: The data demonstrate a high prevalence of MMR in this population group and the importance of support programs for mental health prevention and care of medical students, improving their quality of life.

Keywords: Mental Disorders; Medical Students; Risk Factors; Mental Health.

INTRODUÇÃO

Transtornos mentais menores (TMM) representam quadros menos graves e mais frequentes de transtornos mentais. Os sintomas incluem alterações de memória, dificuldade de concentração e de tomada de decisões, insônia, irritabilidade e fadiga, assim como queixas somáticas (cefaleia, falta de apetite, tremores, sintomas gastrointestinais, entre outros)1.

Ser portador de TMM representa custos em termos de sofrimento psíquico e impacto nos relacionamentos e na qualidade de vida, comprometendo o desempenho nas atividades diárias, sendo substrato para o desenvolvimento de transtornos mais graves1.

A epidemiologia define como fatores de risco variáveis sociais ou biológicas que, quando presentes, aumentam a probabilidade de ocorrência de dada doença. Nesse sentido, a literatura tem apontado algumas características que, quando presentes, se associam ao risco aumentado de morbidade mental menor2.

Os transtornos mentais têm maior chance de surgir pela primeira vez no início da vida adulta, principalmente no período universitário3,4. As situações de perda presentes no desenvolvimento normal se acentuam quando os jovens ingressam na universidade, pois se afastam de um círculo conhecido de relacionamentos familiares e sociais, o que pode desencadear situações de crise3,5. Tem-se encontrado maior taxa de sofrimento mental entre estudantes universitários, se comparados com jovens da mesma idade que não estão na universidade6.

A prevalência de TMM é mais elevada entre os estudantes de Medicina do que na população geral, pois eles estão sujeitos a potentes estressores, como uma rede de apoio deficiente, sobrecarga de conhecimentos, competição no processo de seleção, dificuldade na administração do tempo, individualismo, responsabilidade e expectativas sociais do papel de médico, contato com a morte e processos patológicos, o exame físico de pacientes, o medo de adquirir doenças, o medo de cometer erros e sentimentos de impotência diante de certas doenças. Esses fatores podem levar os estudantes a acionar mecanismos de defesa psicológicos, tais como dissociação ou isolamento afetivo1.

Alguns estudos demonstram que o gênero feminino é a variável mais intensamente associada de modo independente a ter transtorno psiquiátrico menor7, 8.

Os estudantes com TMM geralmente apresentam pior relacionamento com amigos, sentem-se discriminados e não apoiados pelos pais, têm problemas de uso de álcool ou drogas na família e provêm, em maior número, de ensino fundamental realizado em escola pública3.

No Brasil, em 1958, Loreto9 realizou o primeiro estudo sobre saúde mental em estudantes universitários. Identificou que cerca de um terço dos estudantes atendidos no Serviço de Higiene Mental para Estudantes da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) apresentava sintomatologia neurótica, e dois terços, dificuldades de personalidade e padrões de reações emocionais inadequados. As queixas se relacionaram mais à vida pessoal do que à acadêmica, apesar de os estudantes reconhecerem que as dificuldades emocionais prejudicavam o rendimento nos estudos9,10.

Estudo na Universidade Federal de Santa Maria, usando o Self-Reporting Questionnaire (SRQ-20) mostrou que a prevalência de TMM entre os estudantes do primeiro ao décimo semestre do curso de Medicina foi de 31,7%. Mostrou também haver aumento progressivo nos escores de depressão dos estudantes durante a escola médica, o que sugere que o sofrimento mental para essa população é crônico e persistente11.

Facundes e Ludermir12 encontraram na UFPE a prevalência de 34,1% de transtornos mentais menores, sendo significativamente maior entre os que se sentiam sobrecarregados e os que afirmaram a presença de situações especiais durante a infância e adolescência.

Pereira Lima et al.13, na Faculdade de Medicina de Botucatu, encontraram prevalência de 44,7% de TMM, associando-se independentemente a dificuldade para fazer amigos, avaliação ruim sobre desempenho escolar, pensar em abandonar o curso e não receber o apoio emocional necessário.

Em estudo realizado com estudantes do curso de Medicina da Universidade Federal do Espírito Santo1 para avaliar possíveis correlações entre TMM e fatores de risco, a prevalência total de TMM encontrada foi de 37,1%, associada a não receber apoio emocional necessário.

No Brasil há escassez de estudos epidemiológicos sobre a morbidade psiquiátrica em estudantes universitários. A grande maioria dos estudos nacionais publicada está relacionada aos levantamentos dos índices de utilização dos serviços de saúde mental oferecidos pelas universidades, como no caso da clínica-escola de Psicologia da Universidade São Francisco, São Paulo14.

O estudo visa identificar a prevalência de transtornos mentais menores entre estudantes do curso de Medicina da UFPB e determinar a correlação com possíveis fatores de risco.

MÉTODOS

Modelo e Local de Estudo

Estudo transversal, realizado entre abril e agosto de 2012, com 384 alunos do primeiro ao sexto ano do curso de Medicina da UFPB, selecionados de acordo com a presença em sala no momento da pesquisa.

Seleção da Amostra e Coleta de Dados

O curso de Medicina da UFPB tem 643 alunos regularmente matriculados no semestre 2012.1, com 53 (+/ - 7) alunos em cada período da graduação, do 1º ao 12º.

Foram selecionados 32 alunos por turma, entregando-se os questionários àqueles que estavam presentes na aula no momento da pesquisa; os que estavam no internato (9º ao 12º) foram abordados no intervalo de suas atividades.

O tamanho da amostra foi calculado para estimar a taxa de prevalência de TMM em estudantes de Medicina da UFPB, com um intervalo de confiança de 95%. Tomou-se como base para cálculo uma taxa média de prevalência de 35%15, com variação de 5%. Considerando uma possível perda de aproximadamente 20%, o tamanho da amostra final necessário foi de 384 estudantes.

Instrumento de Coleta

Os questionários utilizados na pesquisa foram autoaplicáveis e anônimos.

O questionário sociodemográfico e psicossocial é baseado nas informações coletadas em estudos anteriores1 (p. 19). Esse instrumento contém dados socioeconômicos (período, idade, sexo, cor, religião, renda), sobre a rede de apoio (relacionamento dos pais, grupo de amigos, rejeição, apoio emocional) e história de patologias psiquiátricas (história familiar de TMM ou de doença mental, tratamento psiquiátrico medicamentoso, tratamento psicoterapêutico).

Para o rastreamento de TMM, foi utilizado o SRQ-20, instrumento desenvolvido para rastrear distúrbios psiquiátricos em centros de atenção primária à saúde, validado no Brasil e recomendado pela Organização Mundial da Saúde. Esse instrumento é composto por 20 perguntas com respostas "sim" ou "não", sendo quatro perguntas sobre sintomas físicos e 16 sobre desordens psicoemocionais. A cada resposta "sim" é atribuído um ponto, resultando numa pontuação final que varia de 0 a 20 pontos.

Os alunos foram distribuídos em dois grupos de acordo com a pontuação no SRQ-20, pois o ponto de corte é diferente. Homens com pontuação inferior ou igual a cinco e mulheres com pontuação inferior ou igual a sete foram classificados como "não suspeitos" para TMM. Homens com pontuação superior ou igual a seis e mulheres com pontuação superior ou igual a oito foram classificados como "suspeitos" para TMM.

Os alunos foram contatados em sala de aula, na universidade, ou no serviço em que prestavam seu rodízio de internato; todos leram e assinaram o termo de consentimento e receberam os questionários para serem respondidos. O aluno que não respondeu ao questionário foi considerado como "perda".

ANÁLISE DE DADOS

Foi utilizado o programa IBM SPSS Statistics 20.0. Foi criada uma variável TMM a partir do escore total de cada indivíduo no SRQ-20, no qual os sujeitos foram classificados como "suspeitos" de TMM ou não, de acordo com os pontos de corte.

Inicialmente, foi realizada uma análise descritiva da população estudada segundo as variáveis em estudo (presença de TMM e variáveis sociodemográficas).

Para análise dos dados, as variáveis categóricas foram representadas por suas frequências absolutas. Ao considerar a variável de desfecho (presença ou ausência de TMM) e as possíveis exposições (presença ou ausência de cada fator), a análise bivariada trabalhou com uma resposta do tipo dicotômica com comparação de dois grupos.

O teste estatístico utilizado foi o qui-quadrado. Serão consideradas variáveis estatisticamente significativas aquelas com p < 0,05.

RESULTADOS

Dentre os 384 questionários entregues, obteve-se retorno de 354 (92,2% da amostra selecionada, com perda de 7,8%, o que não foi significativo para o estudo), representados por 118 (33,33%) alunos do 1º ao 4º período, 140 (39,54%) do 5º ao 8º período e 96 (27,11%) do 9º ao 12º período. Quanto à idade, 54 (15,3%) apresentavam até 19 anos, 172 (48,6%) tinham de 20 a 23 anos e 128 (36,2%) estavam com 24 anos ou mais. Quanto ao gênero, 175 (49,4%) eram do sexo feminino e 179 (50,4%) do sexo masculino. Em relação à cor, 193 (54,5%) se consideravam da cor branca, 138 (39) da cor parda, 13 (3,7%) da cor preta, 4 (1,1%) da cor amarela, 3 (0,8%) indígena e 3 (0,8%) não informaram a cor. Quanto à renda familiar, 27 (7,6%) possuíam renda de até R$ 1.500, 209 (59%) de R$ 1.500 a 10.000, 91 (25,7%) renda maior que R$ 10.000 e 27 (7,6%) não informaram.

Em relação à saúde mental, 119 estudantes (33,6%) obtiveram pontuação que os classifica como casos "suspeitos" de TMM (Gráfico 1). O estudo apontou maior prevalência de TMM entre os alunos do curso básico (41,5%) e do clínico (42%), sendo menor no internato (18,5%) (p < 0,001). Estratificando os resultados, notou-se que a maior prevalência foi encontrada no quinto período (63,3%) e a menor prevalência foi encontrada no décimo período, com apenas 9,7%.


Outras variáveis estatisticamente significativas relacionadas ao TMM (Tabela 1) foram: idade menor que 19 anos, com 42,6% (p = 0,027); não seguir alguma religião, com 44,8% (p = 0,005); dificuldade de fazer amigos, 77,5% (p = 0,005); sentir-se rejeitado por amigos ou outros na mesma faixa etária, 82,9% (p < 0,001); sentir que não recebe o apoio emocional que necessita, 52,9% (p < 0,001); e ter história familiar de doença psiquiátrica, com 43,8% (p = 0,003).

Não foram relacionadas aos TMM as seguintes variáveis (p >0,05): sexo masculino ou feminino, cor, possuir renda própria, renda familiar, ter uma religião específica ou ser membro praticante de alguma religião, morar com a família, utilizar medicação psiquiátrica, fazer psicoterapia e realizar automedicação (Tabela 2).

DISCUSSÃO

Embora as taxas de prevalência de TMM identificadas entre os estudantes de Medicina sejam extremamente variáveis, a prevalência encontrada neste estudo (33,6%) foi comparável à de outros estudos brasileiros, permanecendo dentro do intervalo de valores já apresentados. A prevalência foi superior às encontradas na Universidade Federal de Santa Maria (31,7%), na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (22,19%) e na Universidade Federal da Bahia (29,6%)16,11,17, mas inferior às encontradas na Universidade Federal de Pernambuco (42,6%) e na Universidade Estadual Paulista em Botucatu (44,7%)12,13.

Este estudo apontou maior prevalência de TMM entre os alunos do curso básico. Após o entusiasmo inicial da conquista de uma vaga no curso mais disputado no vestibular e a entrada na universidade, os alunos se deparam com uma fase de frustração, causada pela mudança de hábitos do cotidiano, dificuldade na administração do tempo entre uma excessiva carga de estudos e pouco tempo para atividades de lazer18.

Nos resultados estratificados por período do curso, a maior frequência foi encontrada no quinto período, que é um momento de transição para os estágios clínicos do curso, com disciplinas como Gastroenterologia e Pneumologia. Não há consenso na literatura sobre o momento do curso em que o risco de desenvolver transtornos mentais é maior, pois esse dado sofre influência das características de cada escola médica, das disciplinas, dos professores e dos alunos envolvidos, o que torna complexa a comparação com outros estudos16,19,13. No internato, mesmo com a proximidade do fim da graduação, das provas de residência e da inserção no mercado de trabalho, encontrou-se a menor frequência de casos suspeitos de TMM de todo o curso1, por ser um grupo com faixa etária com mais de 20 anos, fase adulta jovem, com a personalidade já formada e com maior amadurecimento, capacitando-os a lidar melhor com os estressores.

A idade, assim como no estudo de Benvegnú et al. (1996)11, se associou a ser "suspeito" de TMM, com maior prevalência entre os estudantes de até 19 anos (42,6%), por ser um grupo que se encontra na adolescência e por ter que lidar, além do curso, com as transformações e conflitos inerentes desse período.

Não houve associação entre as condições sociodemográficas (cor e renda familiar) dos estudantes de Medicina e TMM. A explicação possível é que, por se tratar de um grupo muito homogêneo em suas características sociodemográficas e econômicas, as pequenas diferenças encontradas perderam importância diante de outras categorias mais discrepantes no grupo13.

Há relatos na literatura de associação entre sexo feminino e casos suspeitos de TMM na população geral20, porém sexo não foi uma variável estatisticamente significativa neste estudo, como também ocorreu em outros estudos entre estudantes de Medicina16, 12,13.

Não foram relacionados ao TMM morar com a família e exercer atividade remunerada, ao contrário do que foi demonstrado no estudo de Giglio10, pois morar com a família deveria estar associado com menores taxas de TMM, devido à rede de apoio que seria oferecida, e exercer atividade remunerada deveria estar ligado a maiores taxas de TMM, visto que o estudante divide seu tempo com outras atividades estressantes, além do curso. A automedicação, utilizada por muitos estudantes, por já se sentirem aptos ao próprio diagnóstico e tratamento, também não pôde ser correlacionada com o TMM.

O modelo multicausal de transtornos mentais prevê a influência de fatores genéticos e ambientais. Neste modelo, uma relação longitudinal causal entre os eventos estressores, o surgimento de sintomas e de transtornos mentais apresenta plausibilidade biológica aceitável. Segundo Kendler at al.21, numerosos estudos têm demonstrado que a exposição a eventos de vida estressores é substancialmente influenciada por fatores genéticos. Alguns indivíduos não se expõem a eventos de vida estressores ao acaso, mas apresentam tendência a selecionar situações com maior probabilidade de constituírem um evento de vida estressor. A avaliação negativa do evento estressor pode ser atribuída a uma vulnerabilidade que não está ligada ao evento estressor propriamente dito. A variabilidade individual provavelmente se deve a uma suscetibilidade mediada geneticamente, que influencia a forma de o indivíduo avaliar e enfrentar os eventos de vida estressores dependentes e independentes22. No presente estudo houve forte associação entre TMM e história familiar de transtorno mental, corroborando a influência dos fatores genéticos e ambientais.

Aqueles que seguem alguma religião, não importa qual seja, e mesmo os não religiosos praticantes tiveram menor incidência de TMM. A influência da espiritualidade na saúde física, mental e social tem sido amplamente demonstrada23,24,25. Há evidências crescentes de que a religiosidade - uma das dimensões da espiritualidade - está associada com saúde mental. Um estudo de revisão mostrou associação positiva com a religiosidade em 50% dos casos e negativa em 25% deles. Nessa revisão, a religiosidade foi considerada um fator protetor para suicídio, abuso de drogas e álcool, comportamento delinquente, satisfação marital, sofrimento psicológico e alguns diagnósticos de psicoses funcionais26.

Estudos transversais têm como limitação a impossibilidade de atribuir causalidade ou consequência às associações encontradas, já que analisam desfecho e exposição simultaneamente. Entretanto, apontam as direções nas quais os fatores preditivos se associam com o desfecho estudado. Procurou-se minimizar o viés de informação com o anonimato das respostas e a utilização de instrumentos autoaplicáveis, apenas com respostas objetivas. Quanto a erros na classificação do TMM, buscou-se um instrumento validado anteriormente no Brasil27, escolhendo-se um ponto de corte baseado em estudos anteriores com estudantes de Medicina12,13. É importante ressaltar, porém, que a avaliação pode ter sido influenciada pelo momento vivido por cada estudante na ocasião, já que o questionário deveria ser respondido com base nos 30 dias anteriores. Da mesma forma, os casos suspeitos de TMM podem não ter sido detectados nos estudantes já em acompanhamento psiquiátrico ou psicológico1.

Deve-se considerar que o SRQ-20 simplesmente rastreia casos suspeitos de TMM, sendo o padrão-ouro para diagnóstico a entrevista com o psiquiatra28. Estudos longitudinais sobre morbidade psiquiátrica seriam mais adequados para estimar a ocorrência de transtornos mentais durante a vida acadêmica e a influência do currículo médico nesse contexto, pois poderiam contribuir para a identificação de fatores de risco potenciais no desenvolvimento de TMM nessa população12.

Diversos são os fatores preditivos para TMM relatados na literatura. Sentir-se sobrecarregado, presença de situações especiais durante a infância e adolescência que indiquem sofrimento mental preexistente, alterações no padrão de sono, avaliação ruim sobre desempenho escolar, dificuldade de fazer amigos, pensar em abandonar o curso e não receber o apoio emocional que necessita foram identificados na literatura como alguns dos fatores de maior risco para a ocorrência de TMM1,16,12,13,29,30.

As instituições de ensino superior devem refletir criticamente sobre o contexto do ensino médico, conhecer as características de seus alunos e os momentos considerados cruciais ao longo do curso, com a finalidade de articular estratégias para auxiliar o estudante a enfrentar as dificuldades do cotidiano13. A tarefa primordial é fornecer ao aluno um espaço para reflexão sobre seus sentimentos e emoções, mediante debate aberto e franco sobre suas vulnerabilidades, limitações e patologias31.

Dados sobre TMM são importantes para subsidiar ações de prevenção e cuidado com a saúde mental da população, melhorando a qualidade de vida e, consequentemente, auxiliando em sua formação profissional.

Estudantes universitários são considerados um grupo especial de investimento social do País, particularmente em razão de funções de liderança que deverão exercer na sociedade em futuro próximo32. Estudos devem ser empreendidos dando ênfase às dimensões mais vulneráveis nessa fase da vida.

Sugere-se que as instituições formadoras estejam atentas, estabelecendo intervenções voltadas ao acolhimento e ao cuidado em relação ao sofrimento dos estudantes.

CONCLUSÃO

Os resultados encontrados demonstram que, nessa população, existe alta prevalência de TMM e que o período do curso, idade, religiosidade, história familiar de TMM ou doenças psiquiátricas e as queixas psicossociais são os fatores mais associados aos quadros desses transtornos. A alta prevalência encontrada pode estar associada a fatores presentes desde antes da graduação, o que ficou demonstrado pelo maior acometimento dos estudantes do início do curso, fato que pode estar relacionado até mesmo aos motivos que levam esses alunos a escolherem a carreira médica.

Essas informações são importantes para subsidiar ações de prevenção e cuidado com a saúde mental dos estudantes de Medicina, melhorando a qualidade de vida deles e auxiliando em sua formação profissional1.

Recebido em: 25/11/2012

Reencaminhado em: 19/03/2013

Aprovado em: 19/03/2013

CONFLITO DE INTERESSES: Emmanuelle Santana Rocha é aluna da instituição pesquisada e André Petraglia Sassi é funcionário da mesma instituição, Universidade Federal da Paraíba.

CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES

Emmanuelle Santana Rocha pesquisou, avaliou os dados e escreveu o artigo. André Petraglia Sassi escreveu o artigo

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  • Endereço para correspondência:
    Emmanuelle Santana Rocha
    Rua Nurisman de Andrade Carneiro, 255 Bancários -
    João Pessoa CEP. 58052-284 PB
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      25 Nov 2012
    • Aceito
      19 Mar 2013
    • Revisado
      19 Mar 2013
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