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Estrutura urbana e mobilidade populacional: implicações para o distanciamento social e disseminação da Covid-19

Urban structure and population mobility: implications for social distance and dissemination of COVID-19

Estructura urbana y movilidad poblacional: implicancias para el distanciamiento social y la diseminación de covid-19

Resumo

O mundo vem testemunhando a rápida disseminação dos casos confirmados da síndrome respiratória aguda por meio do coronavírus (Sars-CoV-2 Covid-19). Nos primeiros meses de pandemia, as estatísticas indicam que as grandes cidades tornaram-se palcos destacados de contágio e disseminação da Covid-19. Diante desse cenário, o presente estudo oferece argumentos que auxiliam na construção e aferição preliminar de três hipóteses: a estrutura urbana e a organização das cidades interferem na taxa de distanciamento social e, portanto, no ritmo de contágio da doença; na cidade, a forma com que o sistema de transporte de pessoas está estruturado desempenha papel relevante no ritmo de disseminação da Covid-19; e a pandemia e as práticas de distanciamento físico e social alteram os padrões de mobilidade intraurbana. Analisam-se dados nacionais e regionais disponíveis em órgãos oficiais e outros trabalhos empíricos sobre a Covid-19 à luz de estudos teóricos sobre mobilidade urbana. Em seguida, por método indutivo, é feita uma associação destes dados aos diferentes modelos de cidades (compacta x espraiada), considerando, em especial, aspectos de mobilidade urbana. Os argumentos desenvolvidos nesse estudo parecem corroborar o teor central das hipóteses apresentadas. É preciso desenvolver modelos que incorporem estes elementos para avançarmos na compreensão da pandemia e, também, de elementos que auxiliem na construção de cidades mais resilientes a fenômenos como a Covid-19.

Palavras-chave
Morfologia urbana; Cidades compactas; Cidades espraiadas; Mobilidade urbana; Covid-19

Abstract

The world has witnessed the rapid spread of confirmed cases of acute respiratory syndrome through coronavirus (SARS-CoV-2 COVID-19). In the first months of the pandemic, statistics indicate that large cities have become prominent places of contagion and dissemination of COVID-19. In view of this, the present study offers arguments that assist in the construction and preliminary assessment of three hypotheses: 1) the urban structure and the organization of cities interfere in social distancing rates and, therefore, in the rate of contagion of the disease; 2) in cities, the way in which transport system is structured plays an important role in the pace of dissemination of COVID-19; 3) the pandemic and practices of physical and social distancing alter patterns of intra-urban mobility. National and regional data available from official agencies and other empirical studies on COVID-19 are analyzed in the light of theoretical studies on urban mobility. Then, using the inductive method, an association of these data is made with the different city models (compact vs. sprawled), considering, in particular, aspects of urban mobility. The arguments developed in this study seem to corroborate the central issues of the hypotheses presented in this work. It is necessary to develop models that incorporate these elements to advance in understanding the pandemic and elements that help in the construction of cities more resilient to phenomena such as COVID-19.

Key words
Urban morphology; Compact cities; Urban sprawl; Urban mobility; COVID-19

Resumen

El mundo ha sido testigo de la rápida propagación de casos confirmados de síndrome respiratorio agudo a través del coronavirus (SARS-CoV-2, covid-19). En los primeros meses de la pandemia, las estadísticas indican que las grandes ciudades se han convertido en espacios prominentes de contagio y difusión de covid-19. En vista de esto, el presente estudio ofrece argumentos que ayudan en la construcción y evaluación preliminar de tres hipótesis: 1) la estructura urbana y la organización de las ciudades interfieren en la tasa de distancia social y, por lo tanto, en la tasa de contagio de la enfermedad; 2) en las ciudades, la forma en que se estructura el sistema de transporte colectivo de personas juega un papel importante en el ritmo de difusión de la covid-19; 3) la pandemia y las prácticas de distancia física y social alteran los patrones de movilidad intraurbana. Los datos nacionales y regionales disponibles de organismos oficiales y otros estudios empíricos sobre covid-19 se analizan a la luz de los estudios teóricos sobre movilidad urbana. Luego, utilizando el método inductivo, se hace una asociación de estos datos con los diferentes modelos de ciudad (compacto contra extendido), considerando, en particular, aspectos de la movilidad urbana. Los argumentos desarrollados en este estudio parecen corroborar el tenor central de las hipótesis. Es necesario desarrollar modelos que incorporen otros elementos para avanzar a la recopilación de datos de la pandemia y de otros elementos que permitan la construcción de ciudades más resistentes a los fenómenos como la covid-19.

Palabras clave
Morfología urbana; Ciudades compactas; Expansión urbana; Movilidad urbana; Covid-19

Introdução

O mundo vem testemunhando a rápida disseminação dos casos confirmados da síndrome respiratória aguda por meio do coronavírus (Sars-CoV-2 Covid-19). Nos primeiros meses de pandemia, as estatísticas indicam que as grandes cidades tornaram-se palcos privilegiados de contágio e espalhamento da Covid-19 (OMS, 2020). Grandes cidades de diversas partes do mundo apresentaram crescimento explosivo da doença, a exemplo de Nova Iorque, São Paulo e Milão. Estas centralidades serviram como grandes portas de entrada para o novo coronavírus e, também, como centros disseminadores da doença no território (RANSCOMBE, 2020RANSCOMBE, P. Rural areas at risk during COVID-19 pandemic. The Lancet Infectious Diseases, v. 20, n. 5, p. 545, May 2020.). Portanto, a cidade desponta como escala de análise essencial na compreensão da disseminação da Covid-19.

Diferenças na velocidade de contágio da doença são visíveis entre cidades, regiões e países, dada uma diversidade de fatores: efetividade de políticas públicas (ANDERSON et al., 2020ANDERSON, R. M.; HEESTERBEEK, H.; KLINKENBERG, D.; HOLLINGSWORTH, T. D. How will country-based mitigation measures influence the course of the COVID-19 epidemic? The Lancet, v. 395, n. 10228, p. 931-934, Mar. 2020.); aspectos culturais e comportamentais (SPEAKMAN, 2020SPEAKMAN, C. COVID-19 responses unmask cultural differences. China Daily, 12 Mar. 2020. Disponível em: https://www.chinadaily.com.cn/a/202003/12/WS5e69db5ea31012821727e8b6.html.
https://www.chinadaily.com.cn/a/202003/1...
); condições de saúde, saneamento e higiene (OMS, 2020); adensamento e distribuição espacial da população (VELAVAN; MEYER, 2020); timing do início da epidemia (REMUZZI; REMUZZI, 2020REMUZZI, A.; REMUZZI, G. COVID-19 and Italy: what next? The Lancet, v. 395, n. 10231, p. 1225-1228, 2020. DOI: 10.1016/S0140-6736(20)30627-9); contexto político (THE LANCET, 2020THE LANCET. COVID-19 in Brazil: “So what?”, v. 395, n. 10235, p. 1461, May 2020.), dentre outros.

Na ausência de medicação eficiente e vacinas, a Organização Mundial da Saúde (OMS) defende que o distanciamento físico e social é o método mais eficaz para redução da velocidade de contágio da Covid-19 (LAU et al., 2020LAU, H.; KHOSRAWIPOUR, V.; KOCBACH, P.; MIKOLAJCZYK, A.; SCHUBERT, J.; BANIA, J.; KHOSRAWIPOUR, T. The positive impact of lockdown in Wuhan on containing the COVID-19 outbreak in China. Journal of Travel Medicine, v. 27, n. 3, 18 May 2020.; OMS, 2020). Estudos que exploram a disseminação da Covid-19 encontraram uma forte associação negativa entre o nível de exposição das pessoas e a taxa de crescimento da doença (SHEN et al., 2020SHEN, M.; PENG, Z.; XIAO, Y.; ZHANG, L. Modeling the epidemic trend of the 2019 novel coronavirus outbreak in China. bioRXIV, preprint, 2020. DOI: https://doi.org/10.1101/2020.01.23.916726.; LAU et al., 2020LAU, H.; KHOSRAWIPOUR, V.; KOCBACH, P.; MIKOLAJCZYK, A.; SCHUBERT, J.; BANIA, J.; KHOSRAWIPOUR, T. The positive impact of lockdown in Wuhan on containing the COVID-19 outbreak in China. Journal of Travel Medicine, v. 27, n. 3, 18 May 2020.). Quanto maior o distanciamento físico e social em tempos de pandemia, menor será a taxa de reprodução da Covid-19, ou seja, o número médio de pessoas que um indivíduo doente será capaz de infectar.

Entretanto, os estudos críticos da cidade sugerem que o distanciamento físico e social não está relacionado exclusivamente às políticas públicas ou às mudanças comportamentais em tempos de pandemia. Percebe-se com clareza a existência de uma relação dialética entre sociedade e espaço: as relações sociais moldam a cidade e, ao mesmo tempo, a cidade também é capaz de moldar as relações sociais (HARVEY, 2009HARVEY, D. Social justice and the city. Revised edition. Athens, GA: University of Georgia Press, 2009.; COLETTI, 1975COLETTI, L. Marxism and the dialectic. New Left Review, v. 93, p. 3-29, 1975.; CASTELLS, 1979CASTELLS, M. The urban question: a marxist approach. Cambridge: The MIT Press, 1979.). A morfologia, a infraestrutura, os projetos de mobilidade e as atividades econômicas são aspectos relevantes do desenvolvimento urbano que afetam as interações entre habitantes (BOCAREJO et al., 2016BOCAREJO, J.P.; PORTILLA, I.; MELENDEZ, D. Social fragmentation as a consequence of implementing a Bus Rapid Transit system in the city of Bogota. Urban Studies, v. 58, n. 8, p. 1617-1634, 2016. DOI: 10.1177/0042098015588739.). Isto posto, o presente estudo visa compartilhar reflexões acerca do impacto da estrutura urbana, da conformação da cidade e da organização dos meios de transporte no nível de distanciamento físico e social das populações e, consequentemente, na difusão da Covid-19 em diferentes contextos urbanos.

O estudo, pelo método indutivo, investiga três hipóteses:

  • a estrutura urbana e a organização das cidades (cidade compacta e cidade espraiada) interferem na taxa de distanciamento social e, portanto, no ritmo de contágio da doença. Diferentes concepções de cidade produzem oportunidades e desafios distintos em relação ao combate à Covid-19;

  • na cidade, a forma com que o sistema de transporte de pessoas está estruturado desempenha papel relevante no ritmo de disseminação da Covid-19;

  • a pandemia e as práticas de distanciamento físico e social alteram os padrões de mobilidade intraurbana.

O próximo tópico apresenta um breve panorama da disseminação da Covid-19 no mundo, destacando países e cidades pertencentes a distintos contextos regionais. A seguir, demonstram-se as principais características de dois modelos teóricos de cidade: cidade compacta e cidade espraiada. Mais adiante, é feita uma discussão baseada em estudos, dados e informações sobre grandes cidades em diferentes contextos regionais, a exemplo de Nova Iorque, Los Angeles e São Paulo. Busca-se compreender como diferentes modelos de cidade podem contribuir para a produção de respostas distintas ao surgimento e crescimento do número de casos da Covid-19. Ao final, refletimos sobre possíveis mudanças nos padrões de mobilidade urbana diante da expansão da pandemia.

Covid-19: breve panorama

Até 25 de junho de 2020, o mundo contabilizava 4,5 milhões de casos de Covid-19 e 479.133 óbitos. Países de diferentes contextos regionais sofreram perdas humanas significativas, a exemplo de Estados Unidos (120.955 óbitos), Espanha (28.327 óbitos), Brasil (52.345 óbitos) e China (4.697 óbitos). O Gráfico 1 demonstra as curvas de evolução de casos e óbitos pela Covid-19 nos Estados Unidos, Espanha, Brasil e China em 25/06/2020. As diferenças nos registros e na forma das curvas refletem os estágios distintos de evolução da doença (timing), a eficiência das medidas de enfrentamento, o nível de subnotificação e o contexto geral dos países. O achatamento das curvas de contágio e óbitos da China foi conquistado com base em medidas de distanciamento físico e social extremamente restritivas (ANDERSON et al., 2020ANDERSON, R. M.; HEESTERBEEK, H.; KLINKENBERG, D.; HOLLINGSWORTH, T. D. How will country-based mitigation measures influence the course of the COVID-19 epidemic? The Lancet, v. 395, n. 10228, p. 931-934, Mar. 2020.). Nos Estados Unidos, o gráfico indica o que pode vir a ser o início do processo de achatamento da curva de contágio e de óbitos até a data avaliada, embora vários estados norte-americanos venham buscando medidas mais rígidas de distanciamento físico e social na última semana de junho de 2020, diante do temor de uma segunda onda de contaminações (O’NEIL, 2020). No Brasil, o número de casos e a forma da curva são afetados pelos altos níveis de subnotificação provenientes das limitações nas testagens. Conforme o Gráfico 1, os dados disponíveis indicam crescimento no número de casos e óbitos. Ribeiro e Bernardes (2020)RIBEIRO, L. C.; BERNARDES, A. T. Estimate of underreporting of COVID-19 in Brazil by acute respiratory syndrome hospitalization reports. Nota Técnica. Belo Horizonte: Cedeplar, Universidade Federal de Minas Gerais, 2020. Disponível em: https://www.cedeplar.ufmg.br/noticias/1234-nota-tecnica-estimate-of-underreporting-of-covid-19-in-brazil-by-acute-respiratory-syndrome-hospitalization-reports. estimam que, no Brasil, os casos reais sejam 7,7 vezes superiores aos registrados. Cabe destacar que a subnotificação está presente, em maior ou menor medida, em praticamente todos os países, consequência do efeito dinâmico da pandemia e das limitações dos sistemas de controle e registro (LICHTENTHÄLER FILHO; LICHTENTHÄLER, 2020LICHTENTHÄLER FILHO R.; LICHTENTHÄLER, D. G. A dynamic model for Covid-19 in Brazil. medRxiv, May 19, 2020. DOI: https://doi.org/10.1101/2020.05.10.20097550.). Na Espanha, o Gráfico 1 demonstra que já é possível identificar uma tendência de achatamento da curva, tendo em vista o recente declínio no número de casos e óbitos.

GRÁFICO 1
Curvas de evolução de casos e óbitos confirmados pela Covid-19 China, Estados Unidos, Brasil e Espanha – 25/06/2020 (1)

Apesar da limitação das testagens e, consequentemente, das notificações, o volume de óbitos registrados ou sob suspeita no Brasil ultrapassou aquele observado na Espanha, seguindo uma trajetória preocupante. A literatura demonstra que as diferenças na evolução das curvas se devem, em parte, à assertividade e aplicação das políticas públicas e, também, ao timing da doença, com o registro do primeiro caso no Brasil em 26 de fevereiro de 2020, enquanto a epidemia iniciou-se antes nos Estados Unidos (20/01/2020) e na Espanha (31/01/2020) (OMS, 2020). Ainda, a data de início e a intensidade das políticas de distanciamento físico e social são fatores explicativos importantes (LAU et al., 2020LAU, H.; KHOSRAWIPOUR, V.; KOCBACH, P.; MIKOLAJCZYK, A.; SCHUBERT, J.; BANIA, J.; KHOSRAWIPOUR, T. The positive impact of lockdown in Wuhan on containing the COVID-19 outbreak in China. Journal of Travel Medicine, v. 27, n. 3, 18 May 2020.; OMS, 2020).

O Gráfico 2 apresenta as curvas de evolução dos casos confirmados pela Covid-19 em São Paulo, Nova Iorque, Los Angeles, Milão e Madri até 25 de junho de 2020. Observa-se que os casos em São Paulo ultrapassaram os valores registrados em Los Angeles, Milão e Madri. O gráfico demonstra que Nova Iorque conseguiu promover o achatamento da curva com a redução do número de casos diários a partir de maio de 2020, embora isso não tenha sido perceptível na escala nacional.

GRÁFICO 2
Evolução de casos confirmados pela Covid-19 São Paulo, Nova Iorque, Los Angeles, Milão e Madri – 25/06/2020 (1)

Diante das estatísticas de saúde preocupantes apresentadas por países e grandes centros urbanos, entendemos que atribuir o sucesso ou fracasso dos resultados de combate à Covid-19 apenas às escolhas governamentais é muito restrito e não abrange a complexidade da pandemia. Assim, o estudo traz à tona novos fatores para essa equação. Tendo em vista a concentração de casos e óbitos nas maiores cidades dos países mencionados, as características das cidades e das populações urbanas podem ser relevantes no entendimento do comportamento da pandemia. Muito além das tomadas de decisão das últimas semanas, um exame mais detalhado da realidade desses países revela uma unidade de análise crucial: a cidade.

Estrutura urbana e mobilidade: dois modelos de cidades

O processo de expansão das cidades trouxe resultados bastante distintos ao redor do mundo. Do ponto de vista morfológico e funcional, encontramos, na prática, diversas variações em torno de dois modelos de cidade: as cidades compactas e as espraiadas (BURTON et al., 1996BURTON, E.; JENKS, M.; WILLIAMS, K. The compact city. [S.l.]: Routledge, 2003.; ABDULLAHI et al., 2017ABDULLAHI, S.; PRADHAN, B.; AL-SHARIF, A.A.A. Sprawl versus compact development. In: PRADHAN, B. (ed.). Spatial modeling and assessment of urban form. Switzerland: Springer, 2017.). As cidades compactas são densas e favorecem a proximidade entre pessoas e oportunidades (educação, trabalho, lazer) (OECD, 2012OECD. Compact city policies: a comparative assessment. Paris: OECD, 2012. Disponível em: https://www.oecd.org/regional/greening-cities-regions/compact-city.htm.). Por outro lado, cidades espraiadas são caracterizadas pela criação de subúrbios e pelo distanciamento do centro e periferia (SOJA, 2000SOJA, E. W. Postmetropolis: critical studies of cities and regions. [S.l.]: Wiley, 2000.; DIELEMAN; WEGENER, 2004DIELEMAN, F.; WEGENER, M. Compact city and urban sprawl. Built Environment, v. 30, n. 4, p. 308-323. 2004.).

A contraposição destes dois modelos de cidade claramente pautou o processo de crescimento das grandes metrópoles mundiais. Surgiram cidades densas repletas de espaços multifuncionais e, também, áreas urbanas homogêneas e de baixa densidade, a exemplo dos subúrbios norte-americanos e das periferias latino-americanas. Essa dualidade tem reflexo no padrão de mobilidade das cidades (CERVERO; KOCKELMAN, 1997CERVERO, R.; KOCKELMAN, K. Travel demand and the 3Ds: density, diversity, and design. Transportation Research Part D: Transport and Environment, v. 2, n. 3, p. 199-219, Sep. 1997.; BANISTER, 2018BANISTER, D. Inequality in transport. [S.l]: Alexandrine Press, 2018.).

Na Europa, o modelo de cidades compactas prevalece em parte significativa das grandes aglomerações urbanas, a exemplo de Milão, Paris e Barcelona. A expansão urbana gerou uma ocupação intensiva do território, apresentando alta densidade nas áreas urbanas (SCHWARZ, 2010SCHWARZ, N. Urban form revisited: selecting indicators for characterizing European cities. Landscape and Urban Planning, v. 96, n. 1, p. 29-47, 2010. DOI: 10.1016/j.landurbplan.2010.01.007.). Nos Estados Unidos, a expansão urbana, em várias regiões, caracterizou-se pela manutenção e dependência do centro principal, de altíssima densidade, e pelo crescimento horizontal da área de expansão urbana. Uma das formas de ocupação típica desse modelo é dada pelos suburbs americanos (ADOLPHSON, 2010ADOLPHSON, M. Kernel densities and mixed functionality in a multicentred urban region. Planning & Design, v. 37, n. 3, p. 550, 2010.). Nova Iorque é uma clara exceção, tendo em vista sua natureza compacta, enquanto Los Angeles abarca toda a essência do que entendemos como cidade espraiada.

Em países periféricos, a exemplo do Brasil, o crescimento urbano acontece, muitas vezes, de forma horizontal e extensiva. Contudo, houve um agravante em relação às grandes cidades espraiadas dos Estados Unidos: o alto grau de exclusão socioespacial. Nos suburbs americanos, a população advinda de zonas de alta densidade, como o entorno do Central Business District, buscava amenidades e uma mudança no estilo de vida (LITMAN, 2019LITMAN, T. Evaluating transportation land use impacts: considering the impacts, benefits and costs of different land use development patterns. [S.l.]: Victoria Transport Policy Institute, 2019. Disponível em: https://www.vtpi.org/landuse.pdf.). Nos países periféricos, grande parte dessa mobilidade se deu por intermédio da expulsão da população de baixa renda para as periferias, as quais, marcadamente, apresentavam menor oferta de infraestrutura e serviços urbanos (MARICATO, 2000MARICATO, E. Urbanismo na periferia do mundo globalizado. São Paulo em Perspectiva, v. 14, n. 4, 2000. DOI: https://doi.org/10.1590/S0102-88392000000400004.).

A cidade compacta favorece o uso do transporte coletivo e ativo, promovendo espaços de permanência e uma rede equilibrada de transportes. A cidade espraiada geralmente está associada a um modelo de desenvolvimento menos sustentável e eficiente (FREDIANI et al., 2008FREDIANI, J.; GIACOBBE, N.; RAVELLA, O.; PISTOLA, J. Compact city – Sprawl city two interacting forms. In: 44th ISOCARP CONGRESS. Proceedings. Dalian, China, 19-23 September 2008.). Nas cidades espraiadas dos Estados Unidos, apesar da baixa densidade, houve um equilíbrio, naquele momento, entre “morar longe do local do trabalho” e o uso do automóvel. As famílias que optaram por esta migração, bem como os órgãos públicos e instituições privadas, garantiram um padrão conveniente de mobilidade por décadas (MULLER, 2004MULLER, P. O. Transportation and urban form: stages in the spatial evolution of the American metropolis. In: HANSO, S.; GIULIANO, G. (ed.). The geography of urban transportation. 3a. ed. New York: Guilford Publications, 2004.; LITMAN, 2019LITMAN, T. Evaluating transportation land use impacts: considering the impacts, benefits and costs of different land use development patterns. [S.l.]: Victoria Transport Policy Institute, 2019. Disponível em: https://www.vtpi.org/landuse.pdf.). Já no modelo latino-americano, a população periférica mais vulnerável não possui recursos para arcar com o padrão de mobilidade baseado no automóvel, tornando-se extremamente dependente de investimentos por parte do poder público (CERVERO, 2013aCERVERO, R. Transport infrastructure and the environment: sustainable mobility and urbanism. [S.l.]: Institute of Urban and Regional Development Berkeley, 2013a.; YAÑEZ-PAGANS, 2019YAÑEZ-PAGANS, M. D.; MITNIK, O. A.; SCHOLL, L.; VAZQUEZ, A. Urban transport systems in Latin America and the Caribbean: lessons and challenges. Latin American Economic Review, v. 28, n. 1, p. 15, 14. Dec. 2019.).

Essa configuração das cidades espraiadas traz baixa eficiência ao transporte público, em especial nas periferias das metrópoles. Grandes distâncias são necessárias para atender parcela da população que está localizada de forma dispersa no território. Consequentemente, o transporte possui baixa rotatividade e baixo número de passageiros equivalentes por quilômetro. Entre os resultados dessa estrutura de transporte mais sentidos pela população estão o alto valor praticado nas tarifas e a deterioração da qualidade do transporte, sobretudo em cidades que possuem baixa capacidade de subsídio (FERRAZ; TORRES, 2004FERRAZ, A. C. C. P.; TORRES, I. G. E. Transporte público urbano. 2. ed. ampliada e atualizada. São Carlos: Rima, 2004.; OUESLATI et al., 2015OUESLATI, W.; ALVANIDES, S.; GARROD, G. Determinants of urban sprawl in European cities. Urban Studies, v. 52, n. 9, p. 1594-1614, 2015. https://doi.org/10.1177/0042098015577773.; LITYŃSKI et al., 2017LITYŃSKI, P.; HOŁUJ, A. Urban sprawl costs: the valuation of households’ losses in Poland. Journal of Settlements and Spatial Planning, v. 8, n. 1, p. 11-35, 2017. DOI: 10.24193/02JSSP012017.).

Nas grandes cidades brasileiras, de forma contraditória, a população com mais recursos, de forma geral, é usuária cativa do transporte individual mesmo tendo residência nas proximidades das áreas centrais, de maior densidade, onde há maior oferta de infraestrutura e serviços de transporte público e ativos de deslocamento. Enquanto isso, a população mais vulnerável, que é extremamente dependente dos modos coletivos e ativos de transportes, não é atendida de forma eficiente (GOMIDE et al., 2006GOMIDE, A. A.; LEITE, S. K.; REBELO, J. Transporte público e pobreza urbana: um índice-síntese de serviço adequado. Brasília: Instituto de Pesquisa Economica Aplicada – Ipea, ago. 2006. (Texto para Discussão, n. 1209).; PEREIRA et al., 2019PEREIRA, R. H. M.; BRAGA, C. K. V.; SERRA, B.; NADALIN, V. G. Desigualdades socioespaciais de acesso a oportunidades nas cidades brasileiras. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea, 2019. (Texto para Discussão, 2535).).

Essa ambiguidade tem reflexo na configuração dos espaços de permanência, bem como de circulação. Nas áreas centrais, mais densas, a infraestrutura viária poderia ser mais bem aproveitada para permanência e circulação de pedestres e transporte coletivo, uma vez que o uso e ocupação do solo são favoráveis para tal. Isso responderia pela ausência em número e qualidade de áreas públicas, como parques urbanos, praças e calçadões, bem como de áreas de circulação exclusiva de transporte coletivo e ativo. Esta ausência é ainda mais sentida, de modo geral, na periferia, mesmo havendo grande número de potenciais usuários desses espaços, pois, nesse processo de exclusão socioespacial, tais áreas seriam, tecnicamente, menos adequadas para esse tipo de investimento por não apresentarem as condições urbanas e sociais “ideais”.

No cotidiano, esta organização da cidade e do transporte tornou as cidades espraiadas extremamente excludentes. Em países periféricos, de forma geral, a população mais vulnerável é exposta diariamente a péssimas condições de mobilidade, necessitando se deslocar por grandes distâncias em viagens de baixa qualidade, uma vez que os modos de transportes utilizados e a infraestrutura urbana são escassos e inadequados (INOSTROZA et al., 2010INOSTROZA L.; BAUR, T.; CSAPLOVICS, E. Urban sprawl and fragmentation in Latin America: a comparison with European cities. The myth of the diffuse Latin America city. Cambridge, MA: Lincoln Institute of Land Policy, 2010. (Working Paper).). A infraestrutura e os serviços de transportes não são pensados de forma integrada ao uso do solo, o que gera espaços amorfos, sujeitos à violência urbana e à priorização do uso do automóvel (CERVERO, 2013bCERVERO R. Linking urban transport and land use in developing countries. Journal of Transport and Land Use, v. 6, n. 1, p. 7-24, 2013b.). Isso reforça, naturalmente, o ciclo vicioso do transporte, com o desejo de migração dos modos coletivos de transporte para o individual motorizado, a despeito da precarização do primeiro.

Cidades diferentes ditam ritmos diferentes de contaminação?

Neste tópico, exploramos a realidade de cidades distintas com objetivo de lançar luz a duas das hipóteses desse estudo: a estrutura urbana e a organização das cidades (cidade compacta e cidade espraiada) interferem na taxa de distanciamento social e, portanto, no ritmo de contágio da doença – diferentes concepções de cidade produzem oportunidades e desafios distintos em relação ao combate à Covid-19 –; e, na cidade, a forma como o sistema de transporte de pessoas está estruturado desempenha papel relevante no ritmo de disseminação da Covid-19.

Iniciamos as reflexões explorando dados e informações sobre as duas maiores cidades dos Estados Unidos: Nova Iorque (8,39 milhões de habitantes distribuídos em 784 km2); e o condado de Los Angeles (3,99 milhões de habitantes distribuídos em 1.210 km2) (US CENSUS, 2019). Estas cidades são exemplos clássicos no campo dos estudos urbanos que exploram as peculiaridades e diferenças entre cidades compactas e espraiadas (SOJA, 2000SOJA, E. W. Postmetropolis: critical studies of cities and regions. [S.l.]: Wiley, 2000.). A seguir, exploramos informações sobre cidades brasileiras, a exemplo da Região Metropolitana de São Paulo (21,57 milhões de habitantes distribuídos em 7,9 mil km2), Rio de Janeiro

(11,83 milhões de habitantes em 6,7 mil km²) e Belo Horizonte (5,41 milhões de habitantes em 14,98 mil km²) (IBGE, 2010IBGE. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro, 2010.). O presente estudo não busca isolar completamente os efeitos advindos da complexidade dos fatores associados à velocidade e ao ritmo de espalhamento da Covid-19. Entendemos que o exame de cidades que apresentam forma e estrutura urbanas notadamente distintas poderá trazer elementos relevantes para este debate.

Nova Iorque, estruturada de forma mais compacta, foi organizada ao longo de corredores de transporte público, em especial o metrô. O metrô é referência de deslocamento para toda a população de Nova Iorque e região. Independentemente da classe social, trata-se do principal modo de transporte. O uso do carro é repelido por meio dos altos custos de estacionamento e pedágio. Em Nova Iorque, os espaços públicos são considerados no planejamento urbano, o que torna comum o fato de parques, praças e vias serem destinadas a eventos, feiras de alimentação, dentre outras atividades (FREY, 1999FREY, H. Designing the city: towards a more sustainable urban form. London: Spon Press, 1999.).

Ao refletir sobre Nova Iorque, Baraka (1964)BARAKA, A. Dutchman. Play perfomed in New York. 1964. considera o metrô uma oportunidade espacial para o encontro, ou seja, uma plataforma para observação e interação social que aprisiona habitantes em um caminho repetitivo. De fato, o metrô é o lugar do encontro e, também, da aglomeração. Dados fornecidos pela concessionária que administra o metrô de Nova Iorque revela que 1.757 bilhão de deslocamentos individuais foram realizados em 2016. Em Nova Iorque, o transporte de massa é descentralizado e ramificado, conectando Manhattan aos demais distritos (Bronx, Brooklyn, Manhattan, Queens e Staten Island). Na cidade, 54,5% dos domicílios não possuem carro, sendo que em Manhattan esse percentual chega a 76,6%, influência do maior nível de adensamento e da melhor oferta de transporte público de massa (NYCEDC, 2018NYCEDC. New Yorkers and their cars. 2018. Disponível em: https://edc.nyc/article/new-yorkers-and-their-cars.
https://edc.nyc/article/new-yorkers-and-...
).

O metrô é um ambiente de enorme circulação de pessoas e de alta exposição dos usuários a materiais particulados (NIEUWENHUIJSEN et al., 2007NIEUWENHUIJSEN, M. J.; GÓMEZ-PERALES, J. E.; COLVILE, R. N. Levels of particulate air pollution, its elemental composition, determinants and health effects in metro systems. Atmospheric Environment, v. 41, n. 37, p. 7995-8006, Dec. 2007.; MARTINS et al., 2015MARTINS, V.; MORENO, T.; MINGUILLÓN, M.; AMATO, F.; DE MIGUEL, E.; CAPDEVILA, M.; QUEROL, X. Exposure to airborne particulate matter in the subway system. Science of The Total Environment, v. 511, p. 711-722, Apr. 2015.) e agentes patogênicos (COOLEY et al., 2011COOLEY, P.; BROWN, S.; CAJKA, J.; CHASTEEN, B.; GANAPATHI, L.; GREFENSTETTE, J.; HOLLINGSWORTH, C.; LEE, B.Y.; LEVINE, B.; WHEATON, W.; WAGENER, D. The role of subway travel in an influenza epidemic: a New York City simulation. Journal of Urban Health, v. 88, n. 5, p. 982-995, 9 Oct. 2011.). Em estudo recente, Harris (2020)HARRIS, J. The subways seeded the massive coronavirus epidemic in New York City. Cambridge, MA: NBER, 2020. (NBER Working Paper, n. 27021). demonstra que o metrô semeou a Covid-19, de forma massiva, na cidade de Nova Iorque. Na visão do autor, o metrô foi o principal disseminador da doença na cidade, enquanto as linhas de ônibus funcionaram como rotas secundárias de transmissão. Harris (2020) encontrou forte correlação positiva entre a distância de domicílios que apresentaram registros de Covid-19 e estações de metrô. Este estudo demonstra que, em Nova Iorque, o sistema de transportes foi um importante facilitador na rápida disseminação da doença.

Essa análise sobre a dinâmica epidemiológica no sistema de transportes é corroborada por Yang et al. (2012)YANG, X.-H.; WANGB, B.; CHENA, S.-Y.; WANG, W.-L. Epidemic dynamics behavior in some bus transport networks. Physica A, v. 391, p. 917-924, 2012.. Os autores avaliaram as redes de transportes de ônibus de Beijing, Shangai e Hangzhou e observaram que a estrutura e a propriedade dessas redes têm grandes implicações no problema de controle da dispersão de epidemias de doenças infecciosas. Eles concluem que, dependendo do nível de infecção, haverá ou não a propagação da epidemia na rede de ônibus.

Mais recentemente, no contexto da pandemia da Covid-19, Zheng et al. (2020)ZHENG, R.; XU, Y.; WANG, W.; NING, G.; BI, Y. Spatial transmission of COVID-19 via public and private transportation in China. Travel Medicine and Infectious Disease, Mar. 2020. DOI: 10.1016/j.tmaid.2020.101626. realizaram um estudo para avaliar o papel do transporte público intermunicipal na transmissão espacial da Covid-19 em voos, ônibus e trens diários de Wuhan para diversas cidades circunvizinhas, ao longo de janeiro de 2020. O número diário e o acumulado de casos de Covid-19 em cada cidade também foram obtidos. Até 9 de fevereiro, segundo os autores, havia 330 cidades, além de Wuhan, com casos confirmados de Covid-19 na China continental. Na pesquisa, os autores exploram a associação entre a frequência de voos, trens e ônibus de Wuhan e o número diário e cumulativo de casos Covid-19 em outras cidades. O estudo encontrou correlação positiva entre a disseminação da doença e a frequência de viagens realizadas por trens e ônibus. Ademais, Ruizhi et al. (2020) não observaram nenhuma correlação entre a variável dependente e a frequência de viagens de carro e avião. Conforme o estudo, a distância entre as demais cidades e Wuhan estava associada, negativamente, ao número de casos de Covid-19. Esta correlação, segundo o artigo, tornou-se cada vez mais forte e estável após 1º de fevereiro.

As descobertas obtidas por Ruizhi et al. (2020) indicam que casos associados ao transporte público tiveram um papel importante na disseminação da Covid-19 e que a conectividade e a distância entre o epicentro e o destino foram importantes determinantes na taxa de disseminação do vírus. Dessa forma, o estudo aponta que fortes medidas preventivas devem ser tomadas em cidades com distâncias mais curtas e conectividade de transporte público mais frequente com o epicentro, pois os indivíduos infectados podem ser vetores de transmissão da doença.

No outro extremo está Los Angeles, uma cidade estruturada pelo uso intensivo do automóvel. Grandes corredores viários permitem a conexão do centro urbano com seu entorno. A cidade se espraia extensivamente no território. A concentração das atividades é marcante no centro principal e num conjunto de subcentros, enquanto o restante do território assume um elevado grau de especialização, principalmente para o uso residencial. O domínio do transporte automotivo particular constrange a existência de espaços públicos adequados de permanência e convivência na cidade. O transporte ativo é escasso, pois as vias são utilizadas, preferencialmente, para a circulação de veículos motorizados (SOJA, 1996SOJA, E. W. Thirdspace: journeys to Los Angeles and other real-and-imagined places. Capital & Class, v. 22, n. 1, p. 137-139, 11 Mar. 1998.; 2000; NEWMAN; KENWORTHY, 2007NEWMAN, P. W. G.; KENWORTHY, J. R. Transport and urban form in thirty-two of the world’s principal cities. Transport Reviews, v. 11, n. 3, p. 249-272, Jul. 1991.; OECD; 2018OECD. Rethinking urban sprawl. Paris: OECD, 2018.).

O metrô de Los Angeles se estrutura de forma radiocêntrica, articulando a área central com a periferia de menor densidade. Em 2018, dados fornecidos pela operadora local revelam que 108 milhões de viagens individuais foram feitas no metrô de Los Angeles, valor 15,7 vezes inferior ao registrado em Nova Iorque em 2016. Em Los Angeles, apenas 12,2% dos domicílios não possuem carro, percentual nitidamente menor do que o observado em Nova Iorque (54,5%) (U.S. CENSUS BUREAU, 2015U.S. CENSUS BUREAU. Population and housing unit estimates. 2015. Disponível em: https://www.census.gov/programs-surveys/popest.html.
https://www.census.gov/programs-surveys/...
). Em reportagem publicada no portal “The Globe and Mail”, o virologista David Evans (Universidade de Alberta) explica que a única forma de contaminação no interior de automóveis é o contato com um eventual passageiro contaminado (TCHIR, 2020TCHIR, J. What are the risks of getting COVID-19 while driving around? 2020. Disponível em: https://www.theglobeandmail.com/drive/mobility/article-what-are-the-risks-of-getting-covid-19-while-driving-around/.
https://www.theglobeandmail.com/drive/mo...
). Nesse caso, o risco de contaminação por Covid-19 no trajeto em transporte privado é bastante inferior ao observado nos transportes públicos de massa, podendo ser controlado por medidas simples, a exemplo da redução de jornadas compartilhadas.

Enquanto a cidade de Nova Iorque (Bronx, Brooklyn, Manhattan, Queens e Staten Island) registrava 210.898 casos até 24 de junho (NYC, 2020NYC. COVID-19: Date Summary. Disponível em: https://www1.nyc.gov/site/doh/covid/covid-19-data.page. Acesso em: 25 jun. 2020.
https://www1.nyc.gov/site/doh/covid/covi...
), a cidade de Los Angeles somava 40.475 notificações no mesmo período (COUNTY OF LOS ANGELES PUBLIC HEALTH, 2020). Ainda que considerando a diferença no estoque populacional, as taxas de transmissão entre as duas cidades são notadamente distintas: 28,80 por mil habitantes em Nova Iorque contra 10,67 por mil habitantes em Los Angeles em 24 de junho de 2020 (NYC, 2020; COUNTY OF LOS ANGELES PUBLIC HEALTH, 2020).

Isso não significa que as diferenças morfológicas e de organização das cidades sejam o principal elemento que justificaria este abismo entre o número de casos registrados nas duas cidades. No entanto, entendemos que, somadas a outros fatores, as características dessas duas cidades podem estar associadas, em maior ou menor medida, às repercussões da Covid-19 em suas respectivas populações.

Aspectos relacionados à geografia urbana e ao planejamento das cidades podem estar associados à velocidade de contaminação da Covid-19, sobretudo no início da disseminação da doença, quando as cidades não haviam aplicado medidas de distanciamento físico e social. Nova Iorque pode estar sendo penalizada em relação a Los Angeles por exibir uma conformação urbana mais democrática, em que o uso intensivo do solo, a oferta de espaços públicos e o transporte público de massa acessível criam espaços propícios ao contato humano e, consequentemente, para o espalhamento da contaminação do vírus. Já Los Angeles, cujo processo de expansão contou com a figura indispensável do automóvel, vem apresentando maior resiliência a eventos de pandemia que exigem, num primeiro momento, a prática generalizada de distanciamento físico e social.

Além do sistema de transportes, existem outras características próprias de cidades compactas que devem ser consideradas nessa discussão, com destaque para o uso intensivo dos espaços públicos. Apesar de exibir altos níveis de densidade populacional, Nova Iorque possui 49% do seu território ocupado por espaços públicos (15% do total corresponde aos parques urbanos). A combinação entre alta densidade populacional e alta oferta de espaços públicos explica as elevadas taxas de utilização dessas áreas em Nova Iorque (calçadas, ruas, parques, praças, dentre outros) (CARMONA et al., 2004CARMONA, M.; FREEMAN. J.; ROSE, S.; WOOLLEY, H. The value of public space: how high quality parks and public spaces create economic, social and environmental value. New York: Cabe Space, 2004.). Em Nova Iorque, o estudo da prefeitura intitulado Active design: shaping the sidewalk experience demonstra que existe uma alta proporção na cidade de edifícios sem recuo dotados de faixadas ativas, incentivando a ocupação das calçadas pelos pedestres (NYC, 2013). Nesse caso, é bem provável que estas características da morfologia urbana de Nova Iorque, que favorecem a aglomeração de pessoas, tenham catalisado a disseminação da Covid-19 no período pré-lockdown.

Ademais, tendo em vista a trajetória exibida pelo vírus nos primeiros meses de 2020, partindo de Wuhan (China) e circulando em outras cidades ao redor do mundo, existiu um recorte evidente por nível de renda na maior parte dos primeiros casos registrados, tendo em vista o perfil dos viajantes internacionais. Em cidades globais que possuem maiores níveis de desigualdade social, a exemplo de São Paulo (Brasil), esta diferenciação foi ainda mais notória. Segundo Rossi (2020)ROSSI, A. Do Einstein para o SUS: a rota letal da COVID-19. Revista Piauí. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/do-einstein-para-o-sus-rota-letal-da-covid-19/.
https://piaui.folha.uol.com.br/do-einste...
, em texto intitulado “Do Einstein para o SUS: a rota letal da Covid-19”, o espalhamento da doença nas áreas periféricas e populosas de São Paulo, a exemplo das zonas Leste e Norte da cidade, ocorreu apenas após registros dos primeiros casos em regiões ricas atendidas pelo setor privado de saúde. Até 16 de maio, dados da prefeitura de São Paulo revelam que 11 distritos periféricos já ultrapassavam a marca de 100 óbitos, com destaque para Brasilândia (156 óbitos até o dia 16 de maio) (SÃO PAULO, 2020).

A relação entre os mecanismos de mobilidade e a Covid-19 se articula a um outro componente fundamental: a desigualdade e segregação socioespacial. Altos níveis de desigualdade e segregação socioespacial tornam o espalhamento do vírus menos “democrático”, dificultando, em um primeiro momento, a disseminação da Covid-19 nas periferias mais carentes das grandes cidades.

No entanto, Nova Iorque exibe uma situação singular. A multiplicidade e a diversidade de espaços de mobilidade, seja de permanência ou de circulação, propiciaram um ambiente favorável à difusão do vírus entre as classes sociais na cidade. Apesar de contar com níveis significativos de desigualdade e segregação socioespacial, Nova Iorque possui um sistema de transporte capaz de articular periferias mais distantes ao centro (Manhattan), sendo utilizado com frequência, de forma democrática e massiva, por pessoas de todos os segmentos sociais. Em 2018, dados do U.S. Census Bureau demonstravam que Nova Iorque era a quinta cidade dos Estados Unidos com maior disparidade de renda, enquanto Los Angeles ocupava a 15ª posição. Essa combinação explosiva de alta desigualdade e maior democratização no acesso aos meios de mobilidade e aos espaços públicos, provavelmente, foi fator determinante na rápida disseminação da Covid-19 na cidade, diferente do que foi verificado, até o momento, em Los Angeles. Em Nova Iorque, a disseminação do vírus nos bairros periféricos já é bem superior àquela verificada no centro, conforme dados da prefeitura da cidade em 20 de junho de 2020: Bronx (47.514 casos), Kings (59.507 casos), Queens (65.276 casos), Richmond (14.073 casos) e Manhattan (28.380 casos) (NYC, 2020).

No Brasil, há diferenças significativas nos aspectos de mobilidade, em especial da divisão modal, que diferenciam as cidades brasileiras de Nova Iorque e Los Angeles. Apesar do número significativo de viagens por modos individuais motorizados, aquelas realizadas em transporte público têm maior participação na divisão modal nas grandes cidades e regiões metropolitanas do país. Por exemplo, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, segundo ARMBH (2012), o transporte coletivo representa 31,40% das viagens, enquanto o transporte individual responde por 30,71% e o restante corresponde a viagens não motorizadas. Na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, a participação do transporte coletivo é ainda maior, chegando a 43% (PDTU, 2012).

Além disso, ao analisar mais profundamente estes dados, observa-se que os sistemas públicos de transportes são utilizados mais intensivamente pela população de baixa renda e representam os piores tempos de viagem. Dados da prefeitura de São Paulo referentes às viagens realizadas em janeiro de 2018 revelam que 80,74% dos usuários do transporte público ganhavam menos de dois salários mínimos (SÃO PAULO, 2018SÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes da Prefeitura da Cidade de São Paulo. 2018. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/transportes/.
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
). Esta composição torna o transporte público excludente.

Esta diferenciação dos transportes, associada ao processo de segregação socioespacial das cidades brasileiras, pode explicar parcialmente o relativo “atraso” (em relação ao verificado em Nova Iorque e mesmo Los Angeles) no espalhamento do vírus nas regiões periféricas. Apesar dessa relativa “vantagem”, devemos salientar que as medidas de distanciamento físico e social em prática nas regiões acima citadas, assim nas outras grandes metrópoles brasileiras, são essenciais no combate à Covid-19. Observamos, na segunda quinzena de maio de 2020, a forte disseminação do vírus nas periferias mais carentes das grandes cidades brasileiras, com destaque para Rio de Janeiro e São Paulo. As perspectivas são muito preocupantes, tendo em vista a altíssima vulnerabilidade das famílias à epidemia (alta densidade das aglomerações, número elevado de moradores por domicílio, baixa cobertura de saneamento) e à provável incapacidade do Estado de prover os recursos adequados para o tratamento dos doentes, além de cuidados da proteção dos mesmos durante seus deslocamentos.

Ademais, nas economias centrais, os sistemas de transportes coletivos das grandes cidades contam com fortes subsídios públicos para garantir o atendimento às especificações e preservar a baixa ocupação veicular. No Brasil, em especial no Rio de Janeiro, os operadores são múltiplos e dependem da receita tarifária, uma vez que o usuário financia a maior parte dos custos envolvidos. Em tempos de pandemia, o declínio da receita tarifária pressiona os operadores a diminuir fortemente a oferta, contrariando a diretriz de baixa ocupação veicular necessária à contenção do contágio. Este padrão pode ser observado em várias cidades do país, a exemplo de São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Dados da Secretaria Estadual de Transportes do Rio de Janeiro informam que, nos trens, metrô e barcas, a oferta reduziu-se em 50% e a demanda aumentou 70% (ORRICO; OLIVEIRA, 2020ORRICO, R. D.; OLIVEIRA, M. H. S. A mobilidade urbana e ações de combate à Covid-19. Nota Técnica. Rio de Janeiro: Coppe – Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2020.).

As cidades brasileiras provavelmente experimentarão, a posteriori, maior dificuldade de controle da pandemia no processo de retomada das atividades, uma vez que a maior parte da população é extremamente dependente do transporte público. Diferentemente, em Los Angeles, a maior parte da população provavelmente irá se “beneficiar” do reforço do uso dos modos individuais como forma de distanciamento físico e social, aumentando os congestionamentos e a poluição.

Mudanças nos padrões de mobilidade intraurbana

Neste tópico, exploramos a terceira hipótese do presente estudo: a pandemia e as práticas de distanciamento físico e social alteram os padrões de mobilidade intraurbana. Dados que medem intenção de deslocamento de uma parcela da população (usuários do aplicativo Apple Maps), ao serem utilizados como proxy de deslocamento, sugerem mudanças nos padrões de mobilidade. É importante ressaltar que os dados permitem avaliações apenas dos usuários do aplicativo, não possibilitando qualquer extrapolação de conclusões sobre padrões de mobilidade da população em geral ou por estratos sociais. Existe um recorte socioeconômico importante nessa amostra, tendo em vista a seleção de pessoas que têm acesso a smartphones fabricados pela Apple, que possuem modelos de custo superior à média do mercado. Muito provavelmente, os dados referentes às cidades dos Estados Unidos e da Europa são mais abrangentes em relação ao total da população, em função de uma maior condição de acesso a este tipo de produto. Em cidades com maiores níveis de desigualdade e pobreza, provavelmente, os dados referem-se a uma parcela mais limitada da população.

O aplicativo apresenta informações sobre buscas por rotas de localização conforme tipos de mobilidade (automóvel, caminhada ou metrô). Em todas as cidades pesquisadas, por exemplo, Nova Iorque, Los Angeles, Milão, São Paulo, Cidade do México e Madri, foi possível identificar um padrão similar: menor redução de buscas por trajetos realizados por automóvel em relação à caminhada. Se em todas as cidades as rotas pesquisadas ou realizadas por caminhada eram mais relevantes no período pré-crise, estas se tornaram iguais ou menores, proporcionalmente, do que os trajetos pesquisados ou realizados por automóvel.

De forma geral, entre algumas cidades analisadas, os dados sugerem que o automóvel pode estar assumindo papel relevante para parte da população no deslocamento no interior das cidades avaliadas durante a pandemia. Conforme mencionado no tópico anterior, o automóvel, a princípio, oferece um deslocamento de menor risco, sendo plenamente plausível imaginar que, caso tenham condições, indivíduos utilizem o automóvel em detrimento do transporte coletivo. De fato, essa preferência pelo automóvel em tempos de pandemia foi comprovada em evento recente na cidade de São Paulo. Em 12 de maio de 2020, medidas restritivas à circulação de automóveis em São Paulo resultaram em aumento no número de usuários no transporte coletivo, o que poderia significar a ampliação do risco de contaminação para esta população. Informações divulgadas pelas concessionárias revelaram aumento de cerca de 10% no número de passageiros nos ônibus (de 2,8 milhões para 3,1 milhões) e metrô (de 1,2 milhão para 1,3 milhão) (SÃO PAULO, 2020bSÃO PAULO (Município). Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes da Prefeitura da Cidade de São Paulo, 2020b. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/transportes/.
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/...
). Estes dados sugerem que cerca de 10% dos deslocamentos de São Paulo provavelmente seriam realizados por automóveis caso não existisse medida de restrição.

Ademais, cabe destacar que os mecanismos de busca são utilizados para consulta de rotas menos conhecidas, geralmente realizadas em áreas mais distantes da residência do indivíduo. Parte destes deslocamentos provavelmente está associada ao uso de algum modo de transporte coletivo, permitindo que buscas por rotas ocorram em áreas mais distantes. Dessa forma, é possível inferir que, provavelmente, a redução dos deslocamentos por meio de caminhada associada ao uso de transporte coletivo foi significativa. Estudos posteriores poderão confirmar empiricamente esta hipótese.

A exemplo da Apple, o Google liberou uma série de dados sobre padrões de mobilidade em cidades, estados e países de todas as partes do mundo, comparando a mobilidade na data do relatório (19 de junho de 2020) com o valor de referência (valor mediano do período de cinco semanas entre 3 de janeiro e 6 de fevereiro de 2020) (disponível em www.google.com/covid19/mobility/). É possível encontrar informações sobre destinos de mobilidade por categorias preestabelecidas: comércio varejista e recreação; mercados e farmácias; parques; estações de transporte (metrô, ônibus, dentre outras); espaços de trabalho; e áreas residenciais. Dentre as cidades avaliadas neste tópico, o Google não disponibiliza dados para Milão e São Paulo, existindo informações apenas na escala regional (estado ou província).

Os dados indicam que, no período avaliado, a redução na mobilidade foi maior em Nova Iorque do que em Los Angeles. Em relação aos destinos avaliados, Nova Iorque apresentou maior queda de movimentos diários destinados a estabelecimentos de comércio varejista e recreação (-33%, contra -30% em Los Angeles), às estações de transporte (-48%, contra -38%) e aos espaços de trabalho (-44%, contra -40%). Somente entre os movimentos diários destinados a mercados e farmácias que a queda de Los Angeles foi maior (0%, contra -4%). Dessa forma, é possível inferir que, considerando a população avaliada, as medidas de distanciamento físico e social foram mais severas em Nova Iorque, na comparação com Los Angeles. Provavelmente, o timing e a gravidade da doença em Nova Iorque, na primeira quinzena de abril de 2020, contribuíram enormemente para o clima de cautela na população. No entanto, a própria configuração da cidade de Los Angeles (espraiada) e seu sistema de transporte fortemente baseado no automóvel sugerem que, em alguma medida, estas características que tornam a cidade mais resistente à disseminação da Covid-19 também podem estar favorecendo um maior dinamismo interno, permitindo uma taxa de mobilidade maior sem que, necessariamente, ocorra a explosão dos casos da doença. Ademais, os dados disponibilizados para Madri e Cidade do México demonstram que Los Angeles, dentre as quatro cidades avaliadas, possui, de forma geral, os menores níveis de redução de mobilidade intraurbana.

As informações do Google deixam claro que houve mudanças importante nos padrões de mobilidade nas cidades avaliadas, uma vez que os dados referem-se a movimentos diários concretos e não apenas às buscas por rotas em aplicativo. Primeiramente, observamos uma redução geral no volume de deslocamentos diários registrado para todos os destinos, considerando as políticas e ações voluntárias de distanciamento físico e social. Ademais, deslocamentos com destino a serviços essenciais, a exemplo de mercados e farmácias, apresentaram menor redução em relação aos outros destinos avaliados em Nova Iorque e Los Angeles.

Levantamentos recentes de informações sobre congestionamento e utilização do transporte público confirmam mudanças significativas no perfil de mobilidade urbana nas grandes cidades mais afetadas pela Covid-19. A título de exemplo, dados do portal TomTom, que apresenta um histórico sobre o trânsito de veículos de grandes cidades, demonstram que, nos dias úteis da última semana de maio de 2020 (25 a 29), os congestionamentos de Los Angeles foram de 22% a 47% menores na comparação com a média de 2019 nos horários de pico. Em Nova Iorque, estes valores corresponderam a -51% e -42% e, em São Paulo, foram de -68% e -61% em relação à média de 2019. Ou seja, nas três cidades avaliadas, percebemos forte redução no volume de congestionamentos.

Em Wuhan, após o achatamento da curva de contágio e o controle do crescimento da Covid-19, os níveis de trânsito de veículos na última semana de maio de 2020 já estavam muito próximos à média de 2019 nos horários de pico, variando entre +25% e -7% em relação à média. Apesar de não existir dados disponíveis sobre a utilização do transporte público na cidade de Wuhan para o mês de maio, uma reportagem recente divulgada no jornal Financial Times, intitulada “Rejeição ao transporte público alivia montadoras”, revela que, segundo a consultoria Bernsten, as taxas de utilização do metrô estavam em torno de 50% nas grandes cidades chinesas. A reportagem demonstra que a população das grandes cidades chinesas tem preferido o transporte privado em detrimento dos modos públicos neste momento de insegurança (CAMPBELL et al., 2020CAMPBELL, P.; MILLER, J.; BUSHEY, C.; INAGAKI, K. Rejeição ao transporte público alivia montadoras. Cidades veem mudança de comportamento do consumidor. Financial Times, 25/05/2020. Disponível em: https://valor.globo.com/publicacoes/suplementos/noticia/2020/05/25/rejeicao-ao-transporte-publico-alivia-montadoras.ghtml.
https://valor.globo.com/publicacoes/supl...
).

Ademais, algumas pesquisas têm sugerido que a pandemia poderá trazer mudanças mais definitivas no perfil da mobilidade urbana. A pesquisa recente da Auto Trader revelou que, no Reino Unido, metade dos portadores de licença para dirigir que não possuem carro consideram comprar um automóvel para evitar utilizar o transporte público após o fim das medidas de distanciamento físico e social (WOODHOUSE, 2020WOODHOUSE, A.; Public transport distancing. AutoTrader, Jun. 2020. Disponível em: https://www.autotrader.co.uk/content/news/public-transport-distancing.
https://www.autotrader.co.uk/content/new...
). Nos Estados Unidos, dados do Google (2020) revelam que sete vezes mais pessoas buscaram na internet a expressão: “é um bom momento para comprar um carro” na segunda quinzena de março. A compra de um veículo é uma decisão que possui repercussões para o deslocamento do indivíduo no médio e longo prazos, com efeitos que poderão superar o período de pandemia. Provavelmente, as poucas atratividade e praticidade do transporte individual privado em centros urbanos consolidados deverão prevalecer no longo prazo, sobretudo em cidades que possuem um histórico consistente de valorização do transporte público.

Ao final, novas bases de dados formuladas por agentes públicos e privados estão sendo disponibilizadas nesse momento de pandemia, oferecendo oportunidades de análises até então não existentes, a exemplo das informações disponibilizadas pela Apple e pelo Google utilizadas neste tópico.

Considerações finais

Os argumentos ora colocados que associam a estrutura urbana e mobilidade à contaminação pela Covid-19, de forma indutiva, parecem corroborar as hipóteses apresentadas neste trabalho. Estudos posteriores poderão tratar empiricamente o tema, à medida que dados e informações sobre a pandemia sejam disponibilizados.

Conforme demonstramos neste estudo, cidades compactas, a exemplo de Nova Iorque, que contam com maior densidade populacional e uso intensivo do sistema de transporte, estariam, num primeiro momento, mais suscetíveis à propagação do vírus diante dos baixos níveis cotidianos de distanciamento físico e social, sobretudo no período pré-lockdown. A lição apreendida é que, se as mesmas tivessem aproveitado a alta capacidade de gestão dos serviços de transporte público, as ações de isolamento, como fechamento e restrição de circulação, poderiam ter maior efetividade, dada a abrangência populacional da ação.

Em cidades espraiadas, a exemplo de Los Angeles e São Paulo, a velocidade de propagação do vírus tenderia a ser mais lenta num primeiro momento, dado o próprio distanciamento físico e social intrínseco a este modelo de cidade. Em Los Angeles, o distanciamento parece reforçado pelo padrão de mobilidade, em que o modo individual motorizado é predominante nos deslocamentos diários. Nas grandes cidades brasileiras, como São Paulo, há diferenças significativas no modelo de espraiamento. Entre outros fatores, existem, em geral, elevada segregação socioespacial e predominância dos modos coletivos de transportes. Essas diferenças podem estar contribuindo para resultados bem diferentes no montante e no ritmo de disseminação da Covid-19. Altos níveis de vulnerabilidade socioespacial na periferia da Região Metropolitana de São Paulo, o enorme contingente populacional e a alta dependência do transporte público da maioria da população periférica são aspectos importantes nessa análise.

Caso a pandemia se alongue, gestores e planejadores devem estar atentos aos possíveis efeitos da Covid-19 na mobilidade urbana. Como demonstramos, durante a pandemia, mudanças significativas ocorreram nos padrões de mobilidade urbana em grandes cidades, em especial a valorização do transporte privado. Essa percepção estaria associada ao menor risco de contaminação no transporte individual motorizado em relação ao coletivo. As consequências imediatas dessa percepção e posterior migração entre os modos seriam os congestionamentos, poluição e acidentes. Em seguida, decorrente desse processo, haveria um sucateamento do serviço de transporte público, uma vez que não teria o número de usuários suficiente para manter a oferta dos serviços, além de recursos para garantir medidas de distanciamento físico e social e higienização, o que poderia, inclusive, aumentar o risco de contaminação pelo vírus.

Para que isso não ocorra, e entendendo o transporte coletivo como essencial para o desenvolvimento urbano e promoção da equidade social, é fundamental compreender as benesses de uma gestão eficiente do transporte coletivo. A maior acessibilidade e melhor qualidade dos serviços de transporte coletivo podem auxiliar na construção de uma cidade mais democrática, bem como no controle de eventos como a pandemia da Covid-19, inclusive otimizando medidas de distanciamento.

Estudos futuros poderão demonstrar se as tendências observadas serão duradouras ou deixarão algum lastro após a possível superação definitiva da pandemia. Esperamos que os aprendizados nesses tempos de muita dificuldade acelerem mudanças positivas no campo da mobilidade urbana. A redução dos níveis de poluição nas cidades que adotaram medidas duras de isolamento físico e social poderá, quem sabe, inspirar a criação de concepções mais sustentáveis, valorizando ainda mais os modos coletivos e ativos de transportes.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2020
  • Aceito
    03 Jul 2020
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