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Usando "dinheiro de plástico" e planejando o futuro: consumo, crédito e nova subjetividade em cidades médias

Resumo

Neste artigo, incorporamos as proposições de Lazzarato (2013) sobre a "produção do homem endividado", central à compreensão da sociedade atual, como ponto de vista transversal à análise de entrevistas com citadinos de seis cidades médias brasileiras, Marília, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São Carlos e São José do Rio Preto (SP) e Londrina (PR). Realizadas no âmbito do Projeto Temático "Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas: cidades médias e consumo", as entrevistas versam sobre o consumo e seus espaços, em sentido amplo. As referências ao uso do cartão de crédito e ao financiamento da casa própria, principalmente, mas também a empréstimos, cheques pré-datados, boletos bancários e cadernetas, em sua amplitude e diversidade vinculadas às diferenças entre as classes sociais e seus segmentos, e suas espacializações múltiplas e desiguais, possibilitam compreender os efeitos do processo de financeirização em sua relação com a ampliação da bancarização e do acesso ao crédito.

Palavras-chave:
consumo; crédito; financeirização; bancarização; práticas espaciais; cidades médias; produção do espaço urbano

Abstract

Within this work, we have incorporated Lazzarato’s proposals (2012) on "the making of the indebted man", central to understanding contemporary society, as a transversal viewpoint for analyzing interviews with residents from six mid-sized Brazilian cities: Marília, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São Carlos and São José do Rio Preto (all in the state of São Paulo), and Londrina (Paraná). The interviews were conducted within a thematic project entitled "Economical logics and contemporary spatial practices: mid-sized cities and consumption", and were broadly focused on consumption and its spaces. References mainly regarding credit card use and mortgages, but also to post-dated cheques, payment slips and other methods, broadly and diversely linked to the differences in social class, as well as their multiple and uneven spatializations, have enabled us to understand the effects caused by the financialization process and its relation with the expansion of bancarization and access to credit.

Keywords:
consumption; credit; financialization; bancarization; spatial practices; mid-sized cities; the production of urban space

Neste artigo, incorporamos as proposições de Lazzarato (2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.) sobre a "produção do homem endividado" e a "economia da dívida", centrais à compreensão da sociedade atual, como ponto de vista transversal à análise de entrevistas com citadinos de seis cidades médias1 1 Cidades médias são aquelas que desempenham papéis de intermediação no âmbito das redes urbanas das quais são constitutivas (SPOSITO, 2007), distinguindo-se, portanto, das cidades de porte médio, definidas com base no tamanho populacional, embora esse aspecto não seja desconsiderado. , Marília, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São Carlos e São José do Rio Preto, no estado de São Paulo, e Londrina, no estado do Paraná, de um total de 88 entrevistas2 2 As entrevistas foram realizadas de julho de 2012 a outubro de 2015. .

Realizadas no âmbito do Projeto Temático "Lógicas econômicas e práticas espaciais contemporâneas: cidades médias e consumo"3 3 Marília - 207.737 habitantes, Presidente Prudente - 203.370 habitantes, São Carlos - 213.070 habitantes, São José do Rio Preto - 383.558 habitantes e Ribeirão Preto - 603.401 habitantes (SP), e Londrina - 493.457 habitantes (PR) (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010). , as entrevistas versam sobre o consumo e seus espaços, em sentido amplo, desde a alimentação à habitação, passando pela aquisição dos serviços e as formas de pagamento. Por meio delas, privilegiamos a fala dos citadinos, ou seja, seus depoimentos sobre as experiências de consumo, as razões que apresentam para justificar suas escolhas a ele relacionadas, o modo como avaliam tais experiências, os discursos que elaboram a respeito de suas próprias práticas espaciais. Desse modo, apostamos na confluência das opiniões e justificativas e das descrições sobre práticas e fatos, como estratégia para apreensão do cotidiano das cidades pesquisadas e do papel que os citadinos desempenham na produção dos seus espaços urbanos. Levando em conta aspectos como idade, gênero, espaço de moradia, se inseridos no mundo do trabalho ou não, etc., foram propostos seis perfis de entrevistados com vistas a atingir uma diversidade de citadinos/consumidores.

Como evidencia o título do projeto que deu origem a essa pesquisa, as relações entre as lógicas econômicas e as práticas espaciais4 4 Como ainda são escassos os trabalhos direcionados às práticas espaciais produzidos no âmbito da Geografia brasileira - Souza (2013) é uma exceção, e Corrêa (1992) emprega a expressão para fazer referência à ação dos agentes econômicos, portanto, de modo incompatível com a proposta deste artigo -, incorporamos a perspectiva da análise da "Geografia da vida cotidiana" proposta por Lindón (2006), que estuda a relação espaço-sociedade das situações de interação, referidas às pessoas situadas espaço-temporalmente em um contexto intersubjetivo a partir do qual dão sentido ao espaço e ao outro. pautam as análises. No entanto, neste artigo, são apresentados os resultados que tiveram como foco as práticas espaciais e, especialmente, a importância adquirida pela ampliação do acesso ao crédito e ao consumo nas respostas obtidas através das entrevistas. Foi, assim, na busca por respostas teóricas aos desafios com os quais nos deparamos durante a pesquisa empírica, que incorporamos as contribuições de Lazzarato (2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.), para quem "la deuda es una relación económica indisociable de la producción del sujeto deudor y su ´moral`. [...] El concepto contemporáneo de ´economía` abarca, a la vez, la producción económica y la producción de la subjetividad" (p. 13); "las finanzas no son un exceso de especulación que habría que regular, [...] sino una relación de poder. [...] En términos políticos, economía de la deuda parece una expresión más apropiada que ´finanzas` o ´economía financiarizada`" (p. 29); "o crédito o deuda y su relación acreedor-deudor constituyen una relación de poder específica que implica modalidades específicas de producción y control de la subjetividad (una forma particular de homo oeconomicus, el ´hombre endeudado`). La relación acreedor-deudor se superpone a las relaciones capital-trabajo [...]. La deuda segrega una ´moral` propia, a la vez diferente y complementaria de la del ´trabajo`. El par ´esfuerzo-recompensa` de la ideología del trabajo se acompaña de la moral de la promesa (de reembolsar la deuda) y la culpa (de haberla contraído)." (p. 36-37).

As referências feitas pelos entrevistados ao uso do cartão de crédito e ao financiamento da casa própria, principalmente, mas também a empréstimos, cheques pré-datados, boletos bancários e cadernetas, em sua amplitude e diversidade fortemente vinculadas às diferenças entre as classes sociais e seus segmentos, e suas espacializações múltiplas e desiguais, possibilitam compreender os efeitos do processo de financeirização em sua relação com a ampliação da bancarização e do acesso ao crédito. Novas relações entre tempo e espaço são identificadas ao longo do artigo, assim como novos elementos para a compreensão das desigualdades sociais nas cidades brasileiras, decorrentes desse processo. Além disso, tais respostas dos entrevistados possibilitam a problematização da proposição de Lazzarato (2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.) face à realidade concreta das cidades médias brasileiras e o avanço em relação a tal proposição, com base na premissa de que teórico e empírico precisam ser constantemente confrontados.

Mas alguns pressupostos são fundamentais à discussão de temas como crédito e dívida, produção e consumo, uma vez que

[n]as economias monetárias em geral e na sociedade capitalista em particular, a intersecção do domínio sobre o dinheiro, o tempo e o espaço forma um nexo substancial, de poder social que não podemos nos dar ao luxo de ignorar. [...] O capital é um processo, não uma coisa. É um processo de reprodução da vida social por meio da produção de mercadorias em que todas as pessoas do mundo capitalista avançado estão profundamente implicadas. [...] O processo mascara e fetichiza, alcança crescimento mediante a destruição criativa, cria novos desejos e necessidades, explora a capacidade do trabalho e do desejo humanos, transforma espaços e acelera ritmos de vida. (HARVEY, 1989HARVEY, D. Condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 1989., p. 207, 307).

Assim, ao falar sobre as práticas espaciais que empregam para lidar com desejos e necessidades, os citadinos articulam condições objetivas de reprodução de padrões de vida universais ao capitalismo, caracterizadas por processos de reorganização do tempo e do espaço, em histórias de vida marcadas por lutas diversas, muitas das quais travadas no próprio "campo" do consumo, que se tornou fundamental, por exemplo, para instaurar e comunicar diferenças (BOURDIEU, 2008BOURDIEU, P. A distinção. Crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp, Porto Alegre: Zouk, 2008.).

Nesse "campo", os espaços de consumo desempenham papel estratégico, mas a diversidade dessas lutas e a impossibilidade de abarcá-las numa mesma chave explicativa revela que o consumo é categoria excessivamente ampla. Assim, para compreender como se produz objetivamente espaço a partir do consumo, ao menos três de seus diferentes papéis precisam ser levados em conta: 1. A possibilidade de integração proporcionada pelo mercado, com todas as diferenças socioespaciais decorrentes, materializadas, por exemplo, na compra da habitação de interesse social, atualmente denominada "habitação social de mercado" (SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Z. Habitação social, habitação de mercado: a confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.); 2. A integração simulada, por exemplo, nos shopping centers, quando há satisfação apenas pela possiblidade de ver e ser visto nesses espaços de consumo; 3. A exclusão produzida material ou subjetivamente pelo mercado, quando muros e seguranças armados ou mecanismos mais sutis, porém, igualmente eficazes, enviam mensagens claras de que "isso não é para você", em espaços residenciais fechados, shopping centers, lojas de luxo e agências bancárias personalizadas.

Ainda em relação ao consumo, outro aspecto a ser considerado é que ele vem sendo abordado, sobretudo, por sociólogos (ALONSO, 2006ALONSO, L. E. La era del consumo. Madri: Siglo XXI, 2006. ; BAUDRILLARD, 1991BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. Lisboa: Ed. 70, 1991.; BOURDIEU, 2008BOURDIEU, P. A distinção. Crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp, Porto Alegre: Zouk, 2008.; BAUMAN, 2010BAUMAN, Z. Vida a crédito. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.) que, tal como Lazzarato, não levam em conta a sua dimensão espacial, que se revelou fundamental quando direcionamos nossa atenção para as práticas espaciais de citadinos que vivem em realidades urbanas concretas, como são as seis cidades médias por nós pesquisadas. Assim, como explicitamos nas considerações finais deste artigo, nossa principal contribuição consistiu, simultaneamente, na demonstração da relevância da dimensão espacial para compreensão do processo recente de expansão do crédito e do consumo no Brasil, como na identificação das implicações desse processo na produção do espaço urbano de cidades médias, como as seis que são por nós pesquisadas.

Outro pressuposto diz respeito às mudanças no consumo que vem sendo experimentadas no Brasil desde a década de 1990, mas principalmente nos anos 2000, diretamente relacionadas ao crescimento da renda e do emprego e decorrentes de dois processos concomitantes: de um lado, expansão da renda interna, via políticas distributivas e aumento dos gastos públicos; de outro, ampliação e reordenamento de fluxos de capitais em busca de novos mercados. Nesse contexto, desde 2003, um conjunto de medidas adotadas em nível federal pelo primeiro Governo Lula (2003-2006) adquiriu maior visibilidade a partir de 20095 5 Segundo Governo Lula (2007 - 2010). , quando o economista Marcelo Neri6 6 Neri presidiu o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) de 09/2012 a 05/2014. anunciou o surgimento de uma "nova classe média" (NERI, 2011NERI, M. A nova classe média. São Paulo: Saraiva, 2011.) com grande reverberação na mídia e no marketing.

Quem seriam os novos citadinos que agora possuem significativo acesso à renda e, portanto, não podem mais ser classificados como "ralé"? Seriam eles uma nova classe? Segundo Souza (2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., p. 19)7 7 Jessé Souza é sociólogo e assumiu a presidência do IPEA em 05/2015. , esse impasse "acontece porque as categorias e os conceitos que todos nós nos acostumamos a usar, para pensar um mundo que se transforma tão rapidamente, não o explicam mais". Para esse sociólogo (SOUZA, 2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., p. 47), trata-se de "nova classe trabalhadora", uma vez que o seu acesso à renda foi conquistado à custa de um extraordinário esforço, com o qual lograram adaptar-se às condições do novo capitalismo flexível e financeiro e assim adquiriram um meio de transporte individual e ao menos uma "habitação social de mercado" (SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Z. Habitação social, habitação de mercado: a confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.), que passaram a equipar com todos os eletrodomésticos e demais equipamentos disponíveis no mercado, conforme registramos através de entrevistas, como as seguintes:

[Quais foram os bens de maior valor comprados nos últimos cinco anos?]

Compramos televisão 42 e 32 polegadas, dois smartphones, notebook. [Tudo nos últimos cinco anos?] Sim, mais geladeira... tem três anos, fogão tem dois anos. [Carro?] Carro eu comprei em trinta e seis [meses], estou pagando ainda. (Maurício8 8 Os nomes dos entrevistados são fictícios. , carpinteiro, Londrina, 13/06/20149 9 Data da realização da entrevista. )

[...] celular, Tablet, geladeira, TV, moto e um terreno. (Adolfo, porteiro, Ribeirão Preto, 17/06/2014)

[...] notebook, TV, moto, carro, armários, sofá, fogão e freezer. (Eva e Silvio, auxiliar de serviço e vendedor, São José do Rio Preto, 26/02/2014)

[...] reformei minha casa, comprei geladeira, cômoda e sapateira. (Laura, faxineira, Presidente Prudente, 12/04/2014)

[...] um carro novo para o marido e outro para o filho. Também teve TV e geladeira. (Mercedes, empregada doméstica, São Carlos, 21/02/2013).

"Já seria dinheiro de plástico". Essa expressão, empregada por uma jovem entrevistada10 10 Juliana, estudante, Marília, 12/04/2013. Essa jovem de 19 anos descreveu os pagamentos feitos pela mãe. , traduz bem a frequência e a naturalidade com que foram feitas referências ao uso do cartão de crédito em 78 das 88 entrevistas realizadas, o que nos levou a direcionar nossa atenção, neste artigo, ao seu uso e em suas relações com os diferentes espaços produzidos em cada uma das seis cidades médias pesquisadas. Como mediação entre essas duas dimensões, a "economia da dívida" (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.) fornece as chaves explicativas mais importantes.

Um esforço de distinção entre a função crédito e a função débito foi evidenciado por muitos entrevistados. Diante da pergunta "como costuma pagar suas compras?", as repostas "geralmente uso cartão de crédito", "sempre no cartão", "tudo no cartão", "não precisa mais andar com dinheiro", foram frequentes e confirmam a proposição de Lazzarato (2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013., p. 12) de que a "produção de uma nova subjetividade é tão constitutiva do conceito contemporâneo de economia, quanto a produção econômica". Nessa nova subjetividade, as relações entre consumo e dívida são cotidianamente alimentadas pelo uso do cartão de crédito que "instaura uma dívida permanente, para toda a vida" (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013., p. 23). Do ponto de vista dos bancos e agências de crédito, o "devedor ideal" é aquele que jamais paga integralmente sua dívidas, uma vez que elas foram por eles transformadas em fonte constante de lucros (BAUMAN, 2010BAUMAN, Z. Vida a crédito. Rio de Janeiro: Zahar, 2010., p. 30-31).

Além dos esforços de distinção entre as diferentes funções do mesmo cartão, as referências às diferentes estratégias econômicas empregadas para lidar com os gastos foram mencionadas nas entrevistas, caracterizando tal subjetividade e suas sutilezas: "depende, às vezes à vista, às vezes no cartão", "às vezes em dinheiro, às vezes no cartão", "às vezes no débito, às vezes no crédito".

Até mesmo a resposta "sempre à vista" apareceu em diversas entrevistas, para depois ser relativizada com as descrições sobre compras feitas a prazo, no cartão de crédito ou via financiamentos bancários, quando outra pergunta era feita: "e as compras maiores que mencionou [casa, carro, moto, eletrodomésticos...]?" Nesse caso, foi importante a atenção do pesquisador, pois a referência direta a tais compras era feita em bloco anterior de questões em relação à qual muitas compras foram descritas, conforme exemplificado anteriormente. Foram exceções os casos em que apenas um celular, por exemplo, havia sido comprado, o que sem dúvida deve ser contextualizado no processo de ampliação do acesso ao crédito e ao consumo ocorrido no Brasil desde os anos 2000, principalmente.

"Parei de utilizar o cartão de crédito"11 11 Resposta dada por Felipe (horticultor, Marília, 20/02/2013), quando lhe perguntamos sobre as formas usuais de pagamento empregadas quando faz compras.

Conforme os números mencionados indicam, a despeito da ampla predominância das referências ao uso cotidiano do cartão de crédito, houve exceções que merecem atenção e pelas quais iniciamos esta análise. Dois dos entrevistados que informaram não possuir cartão de crédito, acrescentaram que não possuíam "mais", ou seja, sugeriram que havia uma situação anterior, agora modificada. No caso de Felipe, a mudança do trabalho urbano, que desempenhava como motoboy em Marília, para horticultor em Avencas12 12 Avencas tem 635 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010), é distrito de Marília e localiza-se a 18 km da sede do município. está diretamente relacionada ao abandono do cartão de crédito e a uma ruptura na sua história de vida.

A participação da mãe de Felipe na entrevista revelou que o trabalho como horticultor foi, na realidade, um retorno à atividade anterior, uma vez que a família mora em Avencas há mais de 18 anos. Sua mãe contou ainda que sempre preferiu pagar suas prestações no carnê ou recorrer à ajuda familiar, com "cheque pré-datado emprestado pelo cunhado", que acha "cômoda". É também o cunhado que costuma ajudá-la com o transporte das compras de supermercado, feitas mensalmente, sempre em Marília, onde trabalha como empregada doméstica.

Nesse sentido, tanto o trabalho como motoboy, como o uso do cartão de crédito, tinham sido exceções nessa família composta por mãe (divorciada) e três filhos, com renda informada de três salários mínimos, cuja experiência cotidiana de trabalho e consumo envolve deslocamentos entre Avencas e Marília, trabalho não qualificado, apoio familiar e poucas possiblidades de mudança no futuro. A casa própria, só possível em Avencas, e as observações sobre "comodidade" feitas pela mãe, frente às estratégias de pagamento empregadas, combinadas a comentários do filho jovem do tipo "sou caseiro" e a seguinte resposta sobre compras em shopping center, "fora de cogitação", não impedem que tenham planos de mudança para Marília, sobretudo Felipe, que assim a justifica: "me acostumei".

O segundo caso diz respeito a Vitória13 13 Entrevista realizada em 27/02/2014. Vitória mudou-se para Londrina há 2 anos e reside em imóvel alugado. , comerciante, proprietária de uma pequena empresa de festas localizada no setor norte de Londrina, no Conjunto Habitacional Parigot de Souza, onde também mora, em área periférica, cuja ocupação por grandes empreendimentos imobiliários populares teve início no final dos anos 197014 14 Significativamente, no caso de Londrina, os maiores e mais valorizados espaços residenciais fechados horizontais localizam-se no setor sudoeste da cidade, onde também está o Catuaí Shopping Center (SILVA, 2013), o que é indicativo dos processos de produção do espaço urbano que estão em curso nessa cidade média. , com os chamados "Cinco Conjuntos", que contam atualmente com cerca de 100 mil habitantes, e foram caracterizados inicialmente pela atração de novos moradores que esperavam receber casas quando chegassem à cidade15 15 No âmbito de uma política populista que contribuiu para a transformação desses espaços periféricos em redutos eleitorais (SILVA, 2013). e pela produção de vazios urbanos, destinados à valorização imobiliária (SILVA, 2013SILVA, W. R. Londrina e a reestruturação urbana. Atividades econômicas, papéis, agentes e escalas. In: ELIAS, D.; SPOSITO, M. E. B.; SOARES, B. R. (Org.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional . São Paulo: Outras Expressões , 2013. p. 193-334.).

Vitória comentou durante a entrevista: "nós já tivemos muitos problemas com cartão de crédito, então a gente optou por pagar nossas contas à vista". Acrescentou, ainda: "como eu trabalho por conta, para não correr o risco de depois não ter como [...]". Suas respostas tanto podem sugerir a possibilidade de ter perdido acesso ao cartão de crédito, em função dos tais "problemas", como a relação direta com seu pequeno negócio, ou seja, a indistinção entre economia doméstica e profissional. No entanto, ela revelou que tem acesso a crédito: "a gente fez financiamento, estamos terminando de pagar o carro agora em março [...] a última parcela". Começamos a nos deparar, assim, com indicações explícitas da moral atribuída por Lazzarato ao "homem endividado", que é complementar à moral do trabalho e pauta-se numa nova subjetividade. Revelam-se as adaptações a mudanças a que cada um é submetido, à sua maneira, à economia da dívida. Mesmo o mais racional, o mais contido e o mais medroso a ela se submete, uma vez que "o devedor é livre, mas seus atos, seus comportamentos, devem realizar-se nos marcos da dívida que contraiu [...]. É livre na medida em que assume o ´modo de vida` compatível com o reembolso" (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013., p. 36-37).

Vitória orgulha-se de estar prestes a pagar a última prestação da dívida contraída com a compra do carro, mas os referidos problemas com cartão de crédito podem ser uma indicação de que abriu mão livremente de fazer investimentos no seu negócio próprio, o que deve limitar suas possiblidades de alcançar um futuro melhor por meio dele.

Dentre os outros oito entrevistados que informaram não possuir cartão de crédito, identificamos dois pequenos grupos: 1. um grupo de três jovens (com menos de 30 anos), para os quais a expressão alternativa é expressiva das opções empregadas (e justificadas com convicção), seja para recorrer ao crédito, mesmo sem possuir cartão, seja para recusar essa possibilidade; 2. outro grupo mais heterogêneo, que inclui desde entrevistados que revelaram dificuldades diversas de inclusão na "era do consumo" (ALONSO, 2006ALONSO, L. E. La era del consumo. Madri: Siglo XXI, 2006. ), até aqueles que descreveram estratégias pautadas em prioridades e formas de acesso ao crédito diversas. A explicitação da "moral do homem endividado" é comum a esse segundo grupo seja como desdobramento de uma vida marcada pelas ocasiões em que "gastava e depois não tinha como pagar"16 16 Natália, empregada doméstica, Ribeirão Preto,14/02/2014. , seja pelo comprometimento da renda familiar com o pagamento da prestação do primeiro imóvel17 17 Helena, vendedora, São José do Rio Preto, 17/09/2014. .

Em relação aos jovens e suas alternativas, começamos por Nicole18 18 Entrevista realizada em 25/10/2013. , uma estudante de 26 anos, moradora do centro de Marília19 19 O centro de Marilia, assim como de todas as seis cidades pesquisadas, experimenta intenso processo de popularização expresso em seus estabelecimentos comerciais, principalmente. A concorrência de dois shopping centers, Marília Shopping e Esmeralda Shopping, é importante fator de tal processo (MELAZZO, 2012). , casada, que elaborou um discurso de crítica ao consumismo, sobretudo, à padronização, por um lado, e à desigualdade social, por outro. Baseando-se no caso concreto da mãe, "que sempre comprou em crediário... é muito consumista", e na vivência da desigualdade social no interior da própria família, destacou que sempre pesquisa antes de comprar, prefere "brechós" para adquirir roupas, não tem celular ou Tablet e, se pudesse, mudaria para uma pequena cidade, como Oriente20 20 Oriente possui 5.402 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010) e localiza-se a 21 km de Marília. , mas "não tem condições".

Para Baudrillard (1991BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. Lisboa: Ed. 70, 1991., p. 109), tal reação, que consideramos alternativa, também é um "metaconsumo" e tende a expressar, sobretudo, uma reação à ostentação típica de uma "classe média ingênua". Isso se explica porque, para ele, toda a "sociedade do consumo" funda-se na manipulação, de modo absoluto. Considera ainda que o próprio consumo é um "sistema de comunicação" e uma forma de "integração ao grupo" (BAUDRILLARD, 1991BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. Lisboa: Ed. 70, 1991., p. 91-92). Para nós, o discurso crítico não pode ser desvalorizado, a despeito dos seus limites, especialmente quando pauta as práticas espaciais de jovens. Assim, a problematização da interpretação absoluta (pós-moderna) de Baudrillard (1991)BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. Lisboa: Ed. 70, 1991. pode ser feita a partir da sua própria obra, desde que suas contradições (e limites) sejam levados em conta, o que ocorre quando a obra é confrontada com a realidade empírica de consumidores concretos, como é o caso de Nicole, e quando a dimensão social não é desconsiderada.

Os outros dois jovens que declararam não ter cartão de crédito são diferentes. Camilo21 21 Entrevista realizada em 16/09/14. , morador de São José do Rio Preto, foi taxativo ao responder: "Para isso sou bem sistemático, então costuma ser tudo à vista... Não tenho cartão de crédito... acho desnecessário. Se não tenho dinheiro, não compro". Pequeno empresário da área da tecnologia da informação, contou depois que compra frequentemente pela internet e, nesse caso, usa "boleto bancário" ou "o cartão da firma", ou seja, o princípio anunciado logo no início limita-se à vida pessoal que, no entanto, pode tirar proveito da vida profissional ocasionalmente. Além disso, como é solteiro e mora com a mãe e um irmão num mesmo imóvel próprio há 12 anos, vale-se das relações de vizinhança para "ter conta"22 22 Prática que implica no pagamento mensal das despesas feitas num mesmo estabelecimento comercial e que envolve relações de confiança entre comerciante e consumidor, uma vez que cada despesa é anotada pelo comerciante (ou seu representante) e depois somada por ocasião do pagamento. na farmácia e na padaria, onde "o pessoal já me conhece" e "acerto no final do mês".

Milena23 23 Entrevista realizada em 21/02/2013. tem 24 anos, também é solteira e mora com os pais num bairro da periferia de São Carlos, Cidade Araci, há 21 anos. Trabalha como auxiliar administrativa, estuda numa faculdade particular à noite e tem planos para se casar em breve. Em função dessas práticas e compromissos, respondeu assim sobre os pagamentos das suas compras: "A prazo. Meu pai fica muito bravo comigo [...] Mas as minhas condições [...] eu pago a faculdade, pago a formatura... [Tem cartão de crédito?] Não, quando preciso, eu pego dos meus pais." Descreveu ainda o uso de crediário da "Jô Calçados" e de cartão "C&A", acrescentando sobre o parcelamento: "às vezes eu faço em mais vezes para ter mais facilidade para pagar".

Milena comentou também sobre sacrifícios, não diretamente atribuídos aos compromissos com as dívidas, mas sim aos planos para o casamento: "roupas e calçados, agora, só compro de quatro em quatro meses". Como possui carro e moto, que usa para se deslocar cotidianamente e são considerados fundamentais frente a uma rotina descrita como "de horários apertados" e "grandes distâncias", embora ainda conte com ajuda esporádica do pai que prometeu um terreno para que construa sua casa própria, vem conseguindo ampliar seu acesso ao consumo e à cidade, o que atribui, principalmente, à estabilidade do trabalho de seu pai. A importância das relações familiares é assim reafirmada (SOUZA, 2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012.).

Nesse caso, fica evidente que Milena possui alternativas de consumo e pagamento, inclusive de produtos caros, como moto e carro, mas não está satisfeita e tem planos para deixar o bairro Cidade Araci e ir morar num "condomínio fechado". Isso significaria, segundo sua opinião, uma tripla mudança: casamento, libertação de "estigmas territoriais" (WACQUANT, 2001WACQUANT, L. As prisões da miséria. Rio de Janeiro: Zahar , 2001.) e conquista do status inerente a esses novos habitats. Embora reconheça, assim como seus pais, tanto a melhora das condições de vida da sua família, como a melhora do bairro, cujos problemas vivenciou desde o início, discorda do pai em dois sentidos: na banalização das compras parceladas e no desejo de deixar o bairro. Para a compreensão desse segundo sentido, as muitas mudanças no Cidade Araci, algumas das quais foram descritas por seus pais e vizinhos24 24 Entrevistados por Oliveira (2015), em pesquisa de mestrado que deu origem ao livro "Os sentidos da casa própria: condomínios horizontais populares fechados e novas práticas espaciais em Presidente Prudente e São Carlos". como conquistas coletivas das quais se orgulham, não são suficientes para livrar seus moradores dos referidos "estigmas territoriais", uma vez que as mudanças objetivas podem ser realizadas numa temporalidade mais acelerada que as mudanças subjetivas (OLIVEIRA, 2015OLIVEIRA, V. F. Os sentidos da casa própria: condomínios horizontais populares fechados e novas práticas espaciais em Presidente Prudente e São Carlos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2015.). Para a jovem Milena, a solução seria, então, individual, com a mudança para um dos muitos espaços residenciais fechados, cotidianamente anunciados pelas campanhas de marketing como a forma mais moderna de se viver na cidade, e já disponíveis em São Carlos, para citadinos com diferentes faixas de renda, desde os populares, como o Terra Nova São Carlos, com residências de 44m2 (pesquisado por Oliveira (2015OLIVEIRA, V. F. Os sentidos da casa própria: condomínios horizontais populares fechados e novas práticas espaciais em Presidente Prudente e São Carlos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2015.)), até os mais luxuosos e exclusivos, como indica a presença de um campo de golf no complexo integrado pelos residenciais Damha I e II (pesquisados por Sposito e Góes (2013SPOSITO, M. E. B.; GÓES, E. M. Espaços fechados e cidades: Insegurança urbana e fragmentação socioespacial. São Paulo: Ed. UNESP, 2013.)).

Esses dois aspectos (a banalização das compras parceladas e o desejo de deixar o bairro) também foram mencionados em outras entrevistas, como características distintivas de gerações, como foi o caso de Maurício25 25 Engenheiro civil, São José do Rio Preto, 17/09/2014. , que ainda mora com os pais no Residencial Cidade Jardim, zona sul de São José do Rio Preto e é ainda mais explícito quando comenta que gostaria de mudar para um "condomínio fechado tipo Damha"26 26 A Damha Urbanizadora atua em diferentes estados brasileiros. Dentre as cidades que pesquisamos, está presente em três (Presidente Prudente, São Carlos e São José do Rio Preto), tendo se tornado uma referência nessas cidades (SPOSITO; GÓES, 2013; MILANI, 2016). , mas que seu pai não gostaria porque "acha ridículo convidar a pessoa e ela ter que deixar todos os documentos na portaria".

Outro conjunto mais heterogêneo de não possuidores de cartão de crédito, é composto por cinco entrevistados: 1. Marisa, que se mudou há pouco tempo para São José do Rio Preto27 27 Entrevista realizada em 23/01/2015. , vindo de Brasília, e trabalha com vendas em casa. Mora com a mãe numa casa alugada, situada no Condomínio Terra Nova. Sem mais detalhes, apenas informou que não tem cartão de crédito, nem de nenhuma loja ou empresa, e que prefere pagar à vista, acrescentando que "só pagaria a prazo uma casa ou um carro"; 2. Helena, moradora de São José do Rio Preto28 28 Entrevista realizada em 17/09/2014. , tem 22 anos, trabalha como vendedora numa marmoraria e casou-se recentemente, quando deixou a casa dos pais em Monte Aprazível29 29 Monte Aprazível tem 21.746 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010) e situa-se a 41 km de São José do Rio Preto. As práticas espaciais descritas pelos entrevistados, dentre os quais Helena é um caso exemplar, reafirmam o papel das cidades médias, como São José do Rio Preto, na rede urbana (SPOSITO, 2007). , para morar num apartamento financiado pelo Programa Minha Casa Minha Vida30 30 Em vigor de 2009 a 2016, esse programa subsidiou unidades habitacionais a partir do crédito e da redução de juros do financiamento, com o objetivo duplo de impactar a economia e ainda diminuir o déficit habitacional. no Parque das Flores II que, significativamente, a entrevistada informou localizar-se na zona leste, enquanto que se localiza na zona norte, área ainda estigmatizada, embora já seja bastante diversificada31 31 De um lado, é importante considerar que, como nos disse um entrevistado que atua no mercado imobiliário de São José do Rio Preto, "a zona norte é um lugar para pobre" (18/09/2014); de outro lado, na zona norte foi instalado o Shopping Cidade Norte, em 2012, o que evidencia tanto a ampliação do acesso ao consumo desses citadinos pobres, quanto o processo de fragmentação socioespacial que já está em curso nessa cidade média, onde também foi inaugurado o elitizado Shopping Iguatemi, em 2013, no setor sul (MILANI, 2016). . Com renda familiar informada de 3.000 a 3.500 reais, resultante do seu trabalho e do do marido, que é gerente de outra loja, contou que se desloca de carro e ele, de moto. Descreveu a compra de todos os móveis e eletrodomésticos de sua casa, inclusive ar-condicionado e móveis planejados, sobre os quais observou que "foi o que não teve como pedir aos padrinhos", em referência a outras redes de apoio que podem ser coincidentes ou não com as redes familiares já mencionadas.

Em relação ao comprometimento da renda com as prestações do apartamento, respondeu que "só o apartamento já está bom demais, a prestação é alta, então é só ela mesmo. [...] Nós não temos cartão de crédito, só de débito, para ter esse controle". Trata-se, portanto, de um uso mais limitado do cartão, mas não da ausência dele, o que pode ser interpretado como uma maneira de inserir-se na "economia da dívida" com uso de cartão, mesmo que não seja no "modo crédito". O emprego da palavra "controle", pela entrevistada, não deixa dúvida em relação ao alcance da "moral do homem endividado" (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.).

Os outros entrevistados desse conjunto descreveram situações de carência muito evidentes, que podem identificá-los ao que Souza (2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., p. 39) chamou de "ralé", para denunciar a situação dos trabalhadores que não foram capazes de adaptação às condições do novo capitalismo flexível e financeiro, nem de tirar proveito das políticas sociais implementadas desde os anos 2000.

Moradores de São José do Rio Preto, Marília e Ribeirão Preto, respectivamente, Vanessa, Robson e Natália têm casa própria, renda informada abaixo de 4 mil reais e baixa qualificação profissional. O caso de Vanessa32 32 Açougueira, São José do Rio Preto, 17/09/2014. chama atenção: contou que foi sorteada pelo Programa Minha Casa Minha Vida depois de 12 anos de espera pela casa própria, período no qual teve dois filhos, casou-se e descasou-se, mas morou sempre com a mãe, que nunca adquiriu casa própria33 33 Essa entrevista contém indicações sobre o aumento das possibilidades de acesso à casa própria, via "habitação social de mercado" (SHIMBO, 2012), em relação às gerações anteriores, conforme evidenciado na diferença entre a situação de Vanessa e de sua mãe, nesse aspecto. . Tem um novo companheiro que é açougueiro, como ela, e ajuda a melhorar sua casa, "fazendo o reboco" e "começando a levantar o muro", embora muitas outras "melhoras" sejam necessárias, especialmente agora que os dois irmãos de Vanessa também moram com eles.

As estratégias para ter acesso ao crédito que descreveu pautam-se na ajuda familiar, especialmente do pai e nos recursos disponibilizados34 34 Compra da cesta básica no próprio supermercado, com pagamento no mês seguinte, via folha de pagamento, e empréstimo, ambos disponibilizados para os seus funcionários. O empréstimo tem pagamento parcelado, cobrança de juros e desconto na folha de pagamento. pelo Supermercado Laranjão35 35 O Supermercado Laranjão é uma das âncoras do Shopping Cidade Norte, a que fizemos referência na nota 31. , onde trabalha com o companheiro. Além dos esforços para comprar a moto, suas respostas caracterizam a ambiguidade relacionada ao seu uso, uma vez que, de um lado, facilita o deslocamento para o trabalho, mas, de outro, para uma família grande, impacta, sobretudo no lazer, quase exclusivamente limitado ao bairro Nova Esperança. Localizado na zona norte da cidade, onde moram há três anos, ainda não tem praça, nem quadra de esportes, confirmando as críticas que vêm sendo feitas ao Programa Habitacional Minha Casa Minha Vida de que amplia o direito à habitação, mas continua a negar o direito à cidade (HIRATA, 2012HIRATA, F. "Minha Casa Minha Vida": Política habitacional e de geração de emprego ou aprofundamento da segregação urbana? Revista Aurora, v. 3, n. 4, p. 1-11, 2012. Disponível em: <http://www2.marilia.unesp.br/revistas/index.php/aurora/article/view/1202/1070> . Acesso em: 12 maio 2017.
http://www2.marilia.unesp.br/revistas/in...
; CARDOSO; ARAGÃO, 2013CARDOSO, A. L.; ARAGÃO, T. A. Do fim do BNH ao Programa Minha Casa Minha Vida: 25 anos da política habitacional no Brasil. In: CARDOSO, A. L. O Programa Minha Casa Minha Vida e seus efeitos territoriais. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2013. p. 17- 65.; ROLNIK, 2015ROLNIK, R. Guerra dos lugares. A colonização da terra e da moradia na era das finanças. São Paulo: Boitempo , 2015.).

Sua resposta sobre as mudanças nas condições de vida da sua família também foi marcada pela ambiguidade: "melhorou, mas não é um período bom de sobrar. Eu terminei de pagar a moto, já comprei o piso... mas não está sendo fácil, é tudo regrado e olhe lá, se não faltar um pouco". Tanto a importância do acesso ao crédito, quanto a combinação entre a moral do trabalho e a moral da dívida se evidenciam nessa resposta. Os controles sociais decorrentes materializam-se espacialmente nos limites de uma vida cotidianamente restrita à zona norte e ao bairro Nova Esperança, sem perspectiva de mudanças. Mas, quando fala de seus desejos, Vanessa mescla o reconhecimento desses limites, quando sonha com "churrasqueira", "varanda", "lavanderia", "subir uma laje", em sua casa situada no bairro Nova Esperança, e um carro que possibilitaria lazer para todos, fora do bairro, lembrando que significaria também "economia de vale transporte".

Levando em conta os desejos de Vanessa, podemos ampliar a problematização da crítica de Bauman (2010BAUMAN, Z. Vida a crédito. Rio de Janeiro: Zahar, 2010.) à promessa de antecipação "dos desejos" e, portanto, do futuro, materializado em mercadorias, sem necessidade de ganhar o suficiente para obtê-las, com base na qual o marketing contribuiu para a difusão do uso do cartão de crédito desde a sua origem. "Essa era a promessa, só que ela incluía uma cláusula difícil de decifrar, [...] o pagamento dos empréstimos tornará ainda mais difícil satisfazer os novos anseios" (BAUMAN, 2010BAUMAN, Z. Vida a crédito. Rio de Janeiro: Zahar, 2010., p. 29). Mas essa dívida foi transformada em "fonte permanente de lucro", ou seja, para bancos e empresas de cartões de crédito, o devedor ideal passou a ser aquele que jamais paga integralmente suas dívidas (BAUMAN, 2010). A pesquisa empírica e a atenção à dinâmica das classes sociais confere outro sentido a tal interpretação. As possiblidades de acesso ao crédito, limitadas para essa "ralé" (SOUZA, 2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012.), possibilitam uma antecipação da compra da casa e da moto, por exemplo, cujo impacto positivo no cotidiano dos entrevistados (e de suas famílias) foi amplamente valorizado e demonstrado por eles, mas são tardias e insuficientes, porque demorou 12 anos, a família não pode ser transportada na moto e "olhe lá, se não faltar um pouco", envolvendo a "produção do homem endividado" com sua moral própria (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.). Tudo isso ocorre ao mesmo tempo em que suas dívidas são fonte de lucro para bancos e empresas de cartão de crédito, conforme dinâmica contraditória própria do capitalismo.

Robson36 36 Funcionária pública, Marília, 13/04/2013. descreveu uma rotina na qual o consumo desempenha papel limitado, especialmente quando se trata de adquirir produtos que sua renda familiar, estimada em cerca de 4 mil reais, não consegue pagar à vista. "A gente não é de ter tudo novo, trocar sempre e comprar demais..." O financiamento da casa situada no Jardim Eldorado, feito há 20 anos, não merece maior atenção durante a entrevista, mas o fato de a filha ter deixado de trabalhar para estudar na Unesp, uma universidade pública, sim.

Os esforços da esposa para complementar sua renda, organizando "viagens de compras", e a "esperteza" do filho para ganhar dinheiro, com vendas pela internet, foram positivamente destacados, enquanto seu empenho em conferir continuidade tanto à recusa familiar ao cartão de crédito - "ninguém gosta" - quanto ao cuidado com as compras - "pensa muito antes, faz os cálculos" - acabaram sendo relativizados quando acrescentou com alguma preocupação: "meu filho já não pensa muito assim, [...] ganha muito, gasta demais".

Natália37 37 Entrevista realizada em 14/02/2014, Ribeirão Preto. é empregada doméstica e tem 62 anos. Seu marido está aposentado e mal ganha para pagar seus remédios, segundo ela nos contou, mas, no passado, o trabalho dele na construção da casa onde ainda moram, foi fundamental. Descrito como caso típico de produção da periferia urbana, o longo processo começou com a compra do terreno na Vila Virgínia, há 40 anos, quando ainda não era asfaltada, e já integrava uma área de alta e média exclusão, tal como também se caracteriza o setor norte de Ribeirão Preto (DAL POZZO, 2015DAL POZZO, C. Fragmentação Socioespacial em Cidades Médias Paulistas. Os territórios do consumo segmentado em Ribeirão Preto e Presidente Prudente. 2015. 400 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2015. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/pos/geo/dis_teses/15/dr/clayton_pozzo.pdf> . Acesso em: 12 maio 2017.
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).

Levaram 10 anos construindo, primeiro dois cômodos e banheiro, com ajuda de amigos, depois mais dois cômodos, com o marido sempre encarregado do alicerce. Embora afirme estar satisfeita com sua casa, em que mora com o marido e o filho de 35 anos, e com o fato de residir na Vila Virgínia, acrescentou que "construir dá muito trabalho", sugerindo que não vislumbra outras possiblidades diferentes daquelas já experimentadas, explicitando a colonização do futuro pelo presente (GIDDENS, 2002GIDDENS, A. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro: Zahar , 2002., p. 112). Mais limitada ainda, do ponto de vista espacial, foi a descrição que fez dos seus hábitos de consumo: "Ultimamente, quando preciso, vou perto de casa mesmo. Além de poder comprar sem ser à vista, evito transtornos. Não preciso fazer carnê [...] Eu pago quando puder... [Conhece a proprietária?] Ela é minha vizinha." (Natália, empregada doméstica, Ribeirão Preto, 14/02/2014).

Simultaneamente, tira proveito de relações de vizinhança mantidas há muitos anos e tem acesso limitado à cidade e aos seus espaços de consumo e lazer. Mais uma vez, há correspondência entre a limitação das possibilidades de acesso a formas variadas de crédito e a limitação do acesso à cidade média onde vive. A despeito das distâncias metricamente mais curtas e do custo de vida mais baixo que caracterizam as cidades médias, comparativamente às metrópoles, Natália descreveu uma vida quase restrita a um bairro periférico38 38 Do ponto e vista dos deslocamentos, fez referência ao uso do ônibus para ir ao trabalho e ao fato de o filho ter comprado uma moto nova, com ajuda de uma cunhada que trabalha no comércio, "ele paga 200 reais por mês". , embora cotidianamente conectada a outra área da cidade, onde trabalha. "Eu não vou ao centro, eu passo pelo centro." Desse modo significativo, ela sintetizou seus deslocamentos cotidianos, fornecendo evidências de que, além do processo de segregação socioespacial (PRÉVÔT-SCHAPIRA; PINEDA, 2008PRÉVÔT-SCHAPIRA, M.; PINEDA, R. C. Buenos Aires: la fragmentación en los intersticios de una sociedad polarizada. EURE, v. 34, n. 103, p. 73-92, dez. 2008. https://doi.org/10.4067/s0250-71612008000300004
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), também o processo de fragmentação socioespacial está em curso em Ribeirão Preto, tal como demonstrado por Dal Pozzo (2015DAL POZZO, C. Fragmentação Socioespacial em Cidades Médias Paulistas. Os territórios do consumo segmentado em Ribeirão Preto e Presidente Prudente. 2015. 400 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2015. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/pos/geo/dis_teses/15/dr/clayton_pozzo.pdf> . Acesso em: 12 maio 2017.
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, p. 124), mesmo que uma "tênue e relativa diminuição dos níveis de desigualdade" tenha sido por ele identificada entre 2000 e 2010.

Dois outros aspectos mencionados por Natália são relevantes sobre a correspondência entre a limitação das possibilidades de acesso a formas variadas de crédito e a limitação do acesso à cidade média onde vive. Primeiro, quando afirmou não ter cartão de crédito, fez menção a experiências anteriores, negativas: "não, não quero. Além de você gastar o cartão, gasta o dinheiro também. Acaba não tendo como pagar depois. [...] Antes tinha a caderneta [...] depois não tinha o dinheiro para pagar." Segundo, comentou que foi ao Novo Shopping39 39 Localizado na zona leste de Ribeirão Preto, o Novo Shopping, inaugurado em 1999, é considerado o mais popular, dentre os quatro existentes nessa cidade. Além disso, também é o mais frequentado pelos moradores das pequenas cidades do entorno, o que é favorecido pela proximidade com as rodovias (Anhanguera, Duarte Nogueira [SP-322], Abrão Assed [SP-333]) e pelos transportes coletivos disponíveis (BORGES, 2016), o que evidencia as implicações do papel desempenhado por essa cidade média na rede urbana para a compreensão das suas características intraurbanas (SPOSITO, 2007; DAL POZZO, 2015). recentemente, com "o fusquinha velho" do marido, porque apenas lá encontrou uma "motoca elétrica" desejada pela neta, que pagou à vista. Além da reiteração da moral da dívida, esses aspectos apontam para uma relativização da correspondência entre a limitação das possibilidades de acesso a formas variadas de crédito e a limitação do acesso à cidade. Isso ocorre porque, enquanto "campo", o consumo possibilita a combinação de estratégias cotidianas, predominantes, com estratégias esporádicas, que comportam excepcionalidades.

A excepcionalidade dessas estratégias demonstra que são relevantes, mas insuficientes para alterar a predominância das relações entre a limitação das possibilidades de acesso a formas variadas de crédito e a limitação do acesso à cidade que identificamos a partir das entrevistas com Vanessa, Robson e Natália, assim como Felipe, Vitória e Nicole. No caso de Milena, a despeito dos esforços empreendidos no sentido da superação de tal limitação, o estigma territorial que ainda experimenta, como moradora do bairro Cidade Araci, e a caracterização das práticas espaciais de seus pais, muito mais restritas ao espaço periférico de residência, são indicativos do caráter dinâmico dessas relações. Desse modo, espaço e tempo são variáveis fundamentais para a apreensão das trajetórias desses citadinos e dos processos nos quais estão envolvidos, dentre os quais, os processos de produção do espaço urbano.

"Tudo no cartão de crédito"40 40 Resposta dada, por exemplo, pelo casal Henrique e Patrícia (engenheiro e funcionária pública, São Carlos, 22/02/2013), entre outros, quando perguntamos sobre as formas usuais de pagamento.

Dentre o amplo conjunto de entrevistas em que o uso do cartão de crédito e "a dívida permanente" que implica foram mencionados com naturalidade, em apenas três a renda foi informada como "superior a 30 mil reais"41 41 O emprego de entrevistas com citadinos de classe média e alta, como procedimento metodológico, tem revelado que a informação sobre a renda, prevista no perfil inicial de cada entrevistado, pode gerar constrangimento e tende a ser informada abaixo do valor real, embora haja exceções. . Duas delas foram feitas em São Carlos, com Henrique, engenheiro de uma grande empresa, e com Lourdes, dona de casa, casada com um executivo da mesma empresa. No caso desse segundo casal, dois aspectos são relevantes: os traços de um habitus de altos funcionários de grandes empresas que com elas se identificam, evitando o estabelecimento de qualquer identidade como trabalhadores, e que se estende aos seus familiares, combina-se às características de alguém que nunca trabalhou fora de casa. Tal combinação evidenciou-se na displicência com que Lourdes45 42 Dona de casa, São Carlos, 16/01/2015. se referiu às compras de maior valor e às formas de pagamento, assim como a outras perguntas, com a resposta "não me lembro".

Por outro lado, a entrevista feita com Henrique, da qual sua esposa43 43 Entrevista realizada em 22/02/2013, São Carlos. Sua esposa é funcionária pública. também participou, foi rica em detalhes sobre suas práticas espaciais de consumo, formas de pagamento e, inclusive, pela narrativa que elabora com habilidade para dar coerência a todas elas, pautada no trabalho e na capacidade de planejamento, ou seja, de "pensamento prospectivo"44 44 Baseado na relação com o tempo, o pensamento prospectivo é a capacidade de "pensar o futuro como mais importante que o presente", "privilégio das classes em que o aguilhão da necessidade não às vincula à prisão do presente sempre atualizado como necessidade permanente", segundo Souza (2012, p.51-52). , que podem ser interpretados como combinações, subjetivamente articuladas, da moral do trabalho com a moral da dívida. Sua narrativa estrutura-se em três eixos bem conectados: mudança recente para um espaço residencial fechado, "vantagens" garantidas pela empresa em que trabalha e multiplicidade de possiblidades espaciais acessadas, muito além da cidade média onde residem e trabalham.

Relacionada ao "momento profissional" do casal e ao fato de os filhos terem saído de casa, estando já formados e trabalhando em outras cidades, a opção por morar no Parque Sabará45 45 O Parque Sabará foi o primeiro espaço residencial fechado implantado em São Carlos, em 1976. começou a ser "planejada" com a busca pela "oportunidade" adequada, levando em conta um montante de dinheiro que já haviam reservado para esse fim. Entretanto, levaram em conta também que esse seria o objetivo cada vez mais comum dentre aqueles que pudessem residir num dos espaços residenciais fechados disponíveis em São Carlos desde 1976, com intensa expansão nos anos 1990, assim como ocorreu nas outras cinco cidades médias dessa pesquisa, com desdobramentos importantes do ponto de vista da produção do espaço urbano (SPOSITO; GÓES, 2013SPOSITO, M. E. B.; GÓES, E. M. Espaços fechados e cidades: Insegurança urbana e fragmentação socioespacial. São Paulo: Ed. UNESP, 2013.; DAL POZZO, 2015DAL POZZO, C. Fragmentação Socioespacial em Cidades Médias Paulistas. Os territórios do consumo segmentado em Ribeirão Preto e Presidente Prudente. 2015. 400 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2015. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/pos/geo/dis_teses/15/dr/clayton_pozzo.pdf> . Acesso em: 12 maio 2017.
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; MILANI, 2016MILANI, P. H. A produção da diferenciação socioespacial em Catanduva e São José do Rio Preto - SP: uma análise a partir do cotidiano dos moradores de espaços residenciais fechados. 2016. 252 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2016.Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/handle/11449/148016> . Acesso em: 12 maio 2017.
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), especialmente em função de algumas das suas especificidades, tais como:

Primeramente, es un hecho que las tierras urbanas y la construcción de inmuebles tienen costos menores en las ciudades medias, por lo cual es más amplio el abanico social de los que optan por vivir en áreas residenciales cerradas, vigiladas y de acceso controlado. […] En segundo lugar, complementando el primer punto destacado, la posibilidad concreta de familias de medio poder adquisitivo optar por este tipo de urbanizaciones cerradas en ciudades medias es facilitada por los propios incorporadores, ya sea porque en la fase inicial de implantación de los fraccionamientos los precios de los lotes no son muy altos o porque las ventas son realizadas a plazo, mediante pagos mensuales. […] En tercer lugar, los costos que significa mantener la residencia en esos espacios y la vida cotidiana, en función de la opción por espacios cerrados, son diferentes de aquellos observados en las metrópolis. Servicios de jardinaje, limpieza y conservación, exigidos por inmuebles del estándar observado, son más baratos en el interior del Estado de Sao Paulo, así como los desplazamientos entre los fraccionamientos cerrados y otros espacios urbanos (para trabajar, estudiar, consumir o entretenerse) (GÓES; SPOSITO; SOBARZO, 2008GÓES, E. M.; SPOSITO, M. E. B.; SOBARZO, O. Urbanización difusa, espacio público e inseguridad. Ciudades, n. 77, jan./mar. 2008., p. 23).

Henrique e Patrícia compraram uma casa financiada que pagaram em três anos, mesmo período em que realizaram uma "reforma enorme", na qual o cartão de crédito foi usado "praticamente para tudo". Com a mudança, trocaram todos os eletrodomésticos e demais equipamentos, cuja compra foi feita em Miami e pela internet, principalmente. Também trocaram os dois carros por modelos zero km. O dele é "fornecido" pela empresa, que ainda arca com as suas despesas, inclusive de combustível, e o dela, resolveram comprar igual ao dele.

Quando perguntamos sobre o impacto dessas despesas na sua renda, Henrique respondeu: "não impactou nada porque o aluguel da outra casa pagava a parcela do financiamento e já tínhamos um montante que sempre guardamos", acrescentando depois: "eu acho que esse é o perfil do assalariado, de quem não tinha nada e para conseguir... Então nós planejamos". Suas respostas podem ser melhor compreendidas quando contextualizadas no âmbito das mudanças recentes identificadas por Dunker (2015DUNKER, C. Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicologia do Brasil entre muros. São Paulo: Boitempo, 2015., p. 91):

O batalhador exprime, assim, uma nova modalidade de subjetivação na qual o trabalho adquire uma centralidade inovadora. [...] Torna-se crucial criar e contar uma história que legitimasse o sucesso social, para além da posse bruta dos signos de ascensão. No intervalo de 20 anos, o Brasil aprendeu que é preciso justificar a riqueza e que a ascensão social, destituída de uma história que a legitime pode ser tão suspeita ou condenável quanto a exclusão e a invisibilidade.

Embora seja necessário problematizar o alcance dessa assertiva de Dunker porque a dialética entre permanência e mudança tem se mostrado fundamental, no caso de Henrique, há evidente comprovação que remete a mudanças na narrativa desse segmento da classe média46 46 Sem desconsiderar a dificuldade de definição precisa de classe média, adotamos o entendimento de classes sociais de Souza (2012), para quem elas não são determinadas pela renda, nem pela simples posição na produção, mas por uma visão de mundo prática que se mostra em todos os comportamentos e atitudes. e ao seu papel, uma vez que

é necessário perceber como os "capitais impessoais" que constituem toda hierarquia social e permitem a reprodução da sociedade moderna, o capital cultural e o capital econômico, são diferencialmente apropriados. O capital cultural, sob a forma de conhecimento técnico e escolar, é fundamental para a reprodução tanto do mercado quanto do Estado modernos. É essa circunstância que torna as classes médias, constituídas historicamente pela apropriação diferencial do capital cultural, uma das classes dominantes desse tipo de sociedade. (SOUZA, 2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., p. 25).

Esse papel desempenhado por segmentos de classe média assume especial importância nas cidades médias brasileiras, nas quais, conforme já comentado, os custos de vida são mais baixos, comparativamente às metrópoles, possibilitando que um estilo de vida típico da elite, seja por ela compartilhado, como demonstra sua presença majoritária em espaços residenciais fechados (SPOSITO; GÓES, 2013SPOSITO, M. E. B.; GÓES, E. M. Espaços fechados e cidades: Insegurança urbana e fragmentação socioespacial. São Paulo: Ed. UNESP, 2013.), e como reiteram as práticas espaciais descritas por Henrique e sua esposa, no âmbito do processo de ascensão econômica, cultural e social que caracterizam.

Esse também foi o caso do casal entrevistado em São José do Rio Preto, Marcos e Lívia47 47 Entrevista realizada em 18/09/2014. , que surpreendeu ao informar, logo no início, uma renda mensal de 100 mil reais. Sua narrativa estrutura-se em torno da atuação como empreendedores imobiliários que sintetizaram como "construtor e decoradora", quando perguntamos sobre suas profissões. Ao longo da entrevista, no entanto, tornou-se evidente que seu trabalho vai muito além disso. Assim se compreende que, embora pareçam ter em comum com o casal Henrique e Patricia, o fato de residirem num espaço residencial fechado, nesse caso, no Conjunto Residencial Damha I48 48 Localizado no setor leste de São José do Rio Preto, O Damha I integra um conjunto de seis empreendimentos fechados da mesma incorporadora (MILANI, 2016). , mudaram inúmeras vezes de casa dentro desse espaço, porque estão constantemente "construindo e vendendo", inclusive as casas em que moram. Para eles, trata-se, portanto, de um espaço de negócios, mais que um espaço de residência.

Marcos e Lívia explicaram também que não investem e não morariam na zona sul, área habitada, segundo sua opinião, predominantemente pela elite, "gente que tem conhecimento, cultura de berço... e gosta de ostentar", tanto porque os imóveis lá localizados são mais caros, como porque o casal afirma não possuir e não valorizar esses atributos, de tal modo que também elaboram, ainda que de modo particular, uma narrativa que justifica sua renda elevada e seus imóveis pelo trabalho (DUNKER, 2015DUNKER, C. Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicologia do Brasil entre muros. São Paulo: Boitempo, 2015., p. 91), porque no Damha I, que consideram o "melhor condomínio de São José do Rio Preto", "mora quem batalhou para conseguir alguma coisa".

Especificamente em relação ao uso do cartão de crédito, além de observar que "pagam a maioria das coisas à vista", inclusive os carros, que trocam "a cada ano, às vezes até menos", numa evidente banalização do consumo de bens de preço elevado, acrescentaram que "se aquele valor não tem desconto à vista, acabamos usando cartão de crédito porque ganhamos bônus". Nesse caso, reiterando a importância de se levar em conta a dinâmica das classes sociais e de seus segmentos, não apenas inexiste qualquer necessidade de "antecipação" (BAUMAN, 2010BAUMAN, Z. Vida a crédito. Rio de Janeiro: Zahar, 2010., p. 29), como o uso do cartão de crédito se inscreve entre as inúmeras estratégias voltadas à ampliação da sua renda, seja direta, ou indiretamente. Ou seja, para esse casal, a vida é um negócio muito lucrativo e o uso do cartão de crédito, assim como as compras nos EUA e pela internet, integram o conjunto de práticas espaciais que descreveram.

"Às vezes em dinheiro, às vezes no cartão"49 49 Essa foi a resposta dada, por exemplo, por Rodrigo (bombeiro, 31/10/2013, São Carlos) e Jorge (decorador, 12/04/2013, Marília), entre outros, quando lhes perguntamos sobre as formas usuais de pagamento empregadas quando fazem compras.

Nos tópicos anteriores, dedicamo-nos à análise de dois conjuntos de entrevistas, dentre as 88 realizadas, que são exemplares das desigualdades sociais nas cidades brasileiras. Entre esses dois conjuntos, uma ampla maioria de entrevistados descreveu práticas espaciais de consumo pautadas em combinações entre lojas populares do centro e no shopping center, em shopping centers mais ou menos elitizados, em grandes e pequenas lojas, em diferentes supermercados, em lojas e pela internet; e entre diferentes formas de pagamento que, em geral, envolvem o uso de alguma forma de crédito, muito especialmente do cartão de crédito. Muitos deles falaram de combinações entre todos os tipos de estabelecimentos comerciais, instrumentos e formas de pagamento. Assim, embora apareçam "nuevas áreas más alejadas de comercio y servicios, orientadas a los nuevos residentes de las periferias urbanas, redefiniendo la centralidad intra-urbana al multiplicarla y segmentarla desde o punto de vista espacial y social" (GÓES; SPOSITO; SOBARSO, 2008GÓES, E. M.; SPOSITO, M. E. B.; SOBARZO, O. Urbanización difusa, espacio público e inseguridad. Ciudades, n. 77, jan./mar. 2008., p. 23), as distâncias menores que caracterizam as cidades médias, comparadas às metrópoles, favorecem as combinações descritas.

Frente ao desafio de levar em conta esse amplo conjunto de entrevistas nos limites de um artigo, optamos por selecionar duas, escolhidas pelo interesse que despertaram, em função da riqueza de detalhes com que foram narradas as estratégias que empregam cotidianamente para ampliar sua participação na "era do consumo" (ALONSO, 2006ALONSO, L. E. La era del consumo. Madri: Siglo XXI, 2006. ).

Mercedes e Adolfo inscrevem-se entre os "batalhadores" (SOUZA, 2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012.) que entrevistamos e suas idades muito diferentes sugerem que podem começar muito cedo, especialmente quando constituem família ainda na juventude e costumam seguir lutando para além dos 50 anos. Esse é o caso de Mercedes50 50 Entrevista realizada em 21/02/2013. , 56 anos, empregada doméstica e moradora do Santa Felícia, bairro da periferia norte de São Carlos, há 23 anos, tempo suficiente para a consolidação dele, com ampliação das ofertas de consumo e serviços, tendo "até Carrefour".

Atualmente, ela mora com o marido e um filho, ambos trabalhadores, e o neto de 12 anos. No entanto, as referências constantes à filha, que possui loja no Santa Felícia, explicitam a importância das relações familiares no sentido das parcerias e ajuda mútua que implicam, sempre "ajuntando", por um lado, na produção de complementos à renda de dois mil e duzentos reais que Mercedes informou, composta pelo seu salário e os ganhos do marido como pedreiro que, nos últimos cinco anos, "não melhorou muito, se brincar ele até...". Por outro lado, o socorro frente aos contratempos e momentos importantes, que geram "sufoco", como foi o caso do casamento da filha, porque "não conseguia comprar uma casa [...], comprou o terreno, eu fui lá ajudei, ajudo a construir [...], passou aquele sufoco [...] Aí veio o outro, de novo, então...", são também indicativos de ampliação das possibilidades de acesso à moradia, para além do pagamento de aluguel, mesmo que implique em "sufoco".

Ao contrário do que essas passagens podem sugerir, sua narrativa, embora muito menos coerente e organizada do que aquela elaborada por entrevistados de segmentos de classe média e de elite, impressiona pelas conquistas relatadas e pelas referências reiteradas aos esforços, sacrifícios e habilidade, dela e da filha, principalmente. "Nesses cinco anos a gente fez um gasto meio ultrapassado51 51 No sentido de que ultrapassou sua capacidade de pagamento, conforme explicou em seguida. até." Assim começou sua descrição da compra de dois carros modelo zero km, um para o marido52 52 O carro do marido foi financiado em 60 meses, sem entrada, e é pago por ele. e outro para o filho, uma TV nova e a geladeira que a filha havia comprado, e que "passou para ela", junto com as últimas prestações a serem pagas, sempre matizadas pela moral da dívida. Além disso, relatou: "ano passado coloquei piso em toda a minha casa, troquei o piso porque o primeiro estava ruim, colocamos portão, tava tudo assim... naquele nível mais ou menos [...] Agora começou, a gente ia fazer a reforma de pintura essas coisas..."

No entanto, a maior atenção foi direcionada ao caso do carro do filho, novo "sufoco", porque que ele não teve mais condições de pagar suas prestações, assumidas por Mercedes, enquanto não conseguem vendê-lo.

Não tinha mais como devolver o carro, eu tinha que pagar as parcelas, senão sujava o nome, então eu consegui fazer o maior esforço, trabalhando mais, eu trabalho até de sábado e com as vendas, Natura, Avon [...] que é tudo renda minha, entendeu? Minha filha que passa tudo, fica na loja, mas é renda minha. Eu vou pra Ibitinga, faço compra [...], a gente fica [...] fazendo essas coisas... (Mercedes, empregada doméstica, São Carlos, 21/02/2013).

No seu cotidiano, isso significou pagar três prestações mensais, do carro, financiado em 48 meses, da geladeira e da TV, compradas no cartão de crédito, em seis e dez prestações "sem juros". Foi com orgulho que contou:

Paguei, então, graças a Deus, até adiantei as prestações, para poder não ter sabe assim... Para não ficar com dívida. [E agora você está tentando vender?] Tentando vender para poder ficar mais tranquila. Porque no fim, eu fiquei zerada, eu tinha um pouquinho, fiquei sem nada. (Mercedes, empregada doméstica, São Carlos, 21/02/2013).

Essa resposta contém também resignação, uma vez que o "pouquinho" que tinha estava destinado à reforma da sua casa, que precisou ser adiada. Mas as estratégias diversas, que vão muito além da rotina própria de uma empregada doméstica, foram destacadas desde o início da entrevista e mesclam algumas mais comuns, diretamente relacionadas ao consumo, "eu compro assim, quase que semanalmente, porque eu procuro muito as promoções", "e quando eu preciso de alguma coisa assim, minha filha tem a loja", com outras mais inovadoras, relacionadas ao trabalho e à carência:

A minha filha usa internet. Ela usa com meu nome mesmo, porque a gente vende Natura, já há mais de 18 anos, aí ela que faz o pedido, mas na internet da vizinha [risos]. [Porque ela não tem o computador?] Ela não tem.

Fiz um empréstimo de banco, a gente trabalha com o Banco do Povo também, por causa da loja... Eu fiz no Banco do Povo53 53 O "Banco do Povo Paulista" é uma parceria entre o Governo do Estado de São Paulo e a Prefeitura Municipal de São Carlos, desde 2002, com a finalidade de facilitar o acesso ao crédito aos "empreendedores de pequenos negócios, formalizados ou não". (Disponível em: <www.saocarlos.sp.gov.br>. Acesso em: 15 jan. 2016). [...], eu faço já há mais... diz que começou há mais de 10 anos. Nós éramos sacoleiros, depois que minha filha resolveu montar a loja, então sempre está nesse meio, então a gente tem uma divisão [...] Eu vou lá e faço [empréstimo de] 4,5 mil [reais] porque ele é meio por cento ao mês... [De juros?] É, então é coisa que a gente não acha por aí, é uma vantagem muito boa. [...] Isso aí, já é uma oportunidade. Então a gente compra porque eu faço compras também, entendeu? Então, agora eu até já nem tenho Banco do Povo, já quitei o meu, até era pra fazer, eu falei: "Não, vamos dar um tempo". Aí ela [a filha] fez, senão a gente está sempre precisando de dinheiro para repor alguma coisa na loja, então a gente faz assim, divide. Mas eu tenho pago três mil, acho que é três mil e 600, eu fiz faz três meses, porque eu não queria atrasar o negócio do carro, entendeu? Então eu fui juntando tudo o que eu tinha para ver se esse negócio vai acabar. [riso] (Mercedes, empregada doméstica, São Carlos, 21/02/2013).

Em todas as estratégias descritas, o recurso ao crédito desempenha papel importante e vem acompanhado de forte preocupação com o compromisso que implica, enquanto "dívida eterna", e os controles decorrentes, caracterizados, mais uma vez, com clareza, pela combinação subjetiva da moral do trabalho com a moral da dívida, que se objetiva num cotidiano limitado ao Santo Felícia e, mais ainda, à casa de Mercedes, quando se trata de lazer, ou seja, do pouco tempo em que não está trabalhando.

Adolfo54 54 Entrevista realizada em 17/06/2014. tem 29 anos e dois empregos, como porteiro, em dois edifícios da zona sul de Ribeirão Preto, bem distantes do Jardim Paiva (zona norte), onde mora numa casa alugada, com a esposa, que não trabalha, e dois filhos pequenos. Com renda entre 2.000 e 2.500 reais, contou sempre com muito bom humor, que comprou recentemente celular, Tablet, geladeira, TV, moto e um terreno em Jardinópolis55 55 Jardinópolis possui 41.228 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010) e localiza-se a 18 km de Ribeirão Preto. As práticas espaciais descritas por Adolfo são expressivas do papel desempenhado pelas cidades médias no âmbito da rede urbana, ao mesmo tempo em que evidenciam o acerto da conceituação que vem sendo construída que não se limita à escala intraurbana (SPOSITO, 2007). , fornecendo detalhes sobre necessidades e desejos que justificam cada um deles. A geladeira estava velha e gastava muita energia, a nova foi comprada nas Casas Bahia, em 15 prestações, mas como o limite do seu cartão de crédito é baixo, utilizou o crediário da própria loja. Com planos de assistir à Copa do Mundo de Futebol, disputada no Brasil em 2014, comprou a TV no Carrefour, depois de ver um anúncio no jornal.

Eu fui até lá para comprar uma TV de 32", na verdade, aí levei um dinheiro para dar de entrada, vi que a TV compensava, pedi para o rapaz somar para mim, e ia dar o valor de R$150,00 na de 32". Vi a de 46", falei: "eu dando os R$300,00 vê quanto vai sair", aí saiu o mesmo valor, mesmo eu dando os R$300,00, então escolhi a de 46", comprei uma maior. (Adolfo, porteiro, Ribeirão Preto, 17/06/2014).

A moto é necessária para chegar aos seus dois empregos, sobretudo no período noturno em que trabalha atualmente, e também foi financiada. Sobre a compra do terreno, explicou:

E a cidade também ficou cara para moradia. Então, está muito fora de mão da classe mais baixa, está difícil. Então, eu consegui comprar em Jardinópolis, um terreno lá, eu vou construir ali. [...] vou vir para cá para trabalhar e vou morar lá.

[E essas possibilidades de programas tipo "Minha Casa, Minha Vida"?] Já fiz o cadastramento, tudo, mas ainda não saiu nada. Mas eu não fui ver o financiamento, para fazer o financiamento, porque acho que o financiamento sai mais caro que construir. Paga muitos anos, você demora trinta anos para construir, eu vou demorar quinze para pagar um terreno. Nesse intervalo dos quinze, eu construo. (Adolfo, porteiro, Ribeirão Preto, 17/06/2014).

Depois de desligado o gravador, detalhou seu projeto de construção de uma casa de três dormitórios, com base na premissa de que ainda é jovem, portanto, ele e sua companheira "podem aguentar essa correria por mais uns cinco anos"56 56 Referindo-se aos seus dois empregos e ao trabalho no período noturno. , quando espera que o filho mais velho comece a ajudar e terão "uma vida mais tranquila". Evidenciando capacidade de "pensamento prospectivo" (SOUZA, 2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., p. 51), seu projeto mescla mudança e permanência, moral do trabalho e moral da dívida, além de adaptação às novas condições impostas pelo capitalismo flexível, por um lado, e, por outro, a importância das relações familiares, envolvendo o futuro trabalho da esposa que, por enquanto, apenas dedica-se a cuidar dos filhos pequenos e não dispõe de capacitação profissional, e do filho mais velho, de quem espera que ingresse no mundo do trabalho quando complete 15 anos, ou seja, para quem não vislumbra, nesse aspecto, um futuro diferente daquele partilhado com seus pais.

Considerações finais

As 88 entrevistas realizadas com citadinos, moradores de seis cidades médias, possibilitaram o registro de narrativas, pelas quais se comprova que "a produção de uma nova subjetividade é tão constitutiva do conceito contemporâneo de economia, quanto a produção econômica" (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013., p. 12). Tanto o uso do dinheiro, como o do cartão de crédito, ao qual dedicamos especial atenção, redimensionam as relações entre tempo e espaço, mas o fazem de maneiras diferentes e é nesse sentido que reconhecemos na proposição de Lazzarato (2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.) sobre a "produção do homem endividado" e a "economia da dívida", uma contribuição inovadora e buscamos demonstrar como se consubstancia nas cidades médias, através das práticas dos citadinos.

Nessa articulação entre teórico e empírico, novas relações entre tempo e espaço foram identificadas, assim como novos elementos para a compreensão das desigualdades sociais nas cidades brasileiras e dos efeitos do processo de financeirização em sua relação com a ampliação da bancarização e do acesso ao crédito. Ainda que a capacidade de pensamento prospectivo tenha pautado muitas das estratégias descritas pelos "batalhadores", todos eles residentes em áreas periféricas, não sendo portanto exclusiva dos segmentos das classes médias e elite, as possibilidades favoráveis a elas disponibilizadas pelas suas relações familiares, escolares, de lazer e, inclusive, nos espaços residenciais, por vezes fechados, mas sempre caracterizados pela presença de toda infraestrutura e serviços urbanos, foram amplamente evidenciadas. A correspondência entre a limitação das possibilidades de acesso a formas variadas de crédito e a limitação do acesso à cidade compareceu, portanto, como novo aspecto a ser considerado quando se busca compreender processos de produção do espaço urbano.

Nas cidades médias pesquisadas, desde os anos 1970, a implantação de programas habitacionais, com recursos do Sistema Financeiro da Habitação e da Companhia de Desenvolvimento Habitacional (anos 1980), teve como resultado formas múltiplas de segregação socioespacial, mais ou menos intensas, mais ou menos transitórias. Isso ocorreu porque grande parte desses empreendimentos assentou-se sobre espaços distantes, mal integrados ao tecido e à vida urbana já constituídos, muitos dos quais foram melhorando suas condições mediante mobilização dos moradores, como ocorre no Conjunto Habitacional Parigot de Souza (Londrina), Cidade Araci (São Carlos), Jardim Eldorado (Marília), Vila Virgínia (Ribeirão Preto), Santa Felícia (São Carlos), em que residem, sucessivamente, Vitória, Milena, Robson, Natália e Mercedes, para quem o veículo individual, sempre comprado no crédito, representou conquista importante.

Novas práticas e representações sociais de segregação foram produzidas em todas essas cidades, a partir da implantação dos conjuntos habitacionais do Programa Minha Casa Minha Vida. Entretanto, novas estratégias são cotidianamente empregadas para superar os limites impostos pelas condições que os caracterizam, todas elas pautadas, simultaneamente, no trabalho e na moral que lhe é própria, e no recurso ao crédito e na "moral da dívida" (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013., p. 37).

A partir dos anos 1990, a expansão dos espaços residenciais fechados adquire importância nas cidades médias brasileiras, tornando-se, progressivamente, a forma de morar mais desejada por segmentos das classes médias e da elite. Isso impactou a lógica centro-periferia que orienta a estruturação do espaço também nessas cidades, em função da localização de muitos desses empreendimentos. No entanto, as distâncias entre as áreas centrais em relação às periféricas, do ponto de vista espacial, são menores metricamente nas cidades médias, se comparadas às metrópoles, e isso é significante para compreendermos o processo de segregação nesses contextos urbanos, inclusive no que se refere ao desejo de muitos dos jovens moradores das periferias urbanas que entrevistamos de morar num "condomínio fechado", diferenciando-se de seus pais, que, muito mais frequentemente, declararam-se satisfeitos com seu espaço de moradia.

Essas diferenças entre práticas espaciais também se inscrevem nas disputas que fazem do consumo um "campo" (BOURDIEU, 2008BOURDIEU, P. A distinção. Crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp, Porto Alegre: Zouk, 2008.), uma vez que a busca por distinção, diretamente relacionada ao desejo de morar num espaço residencial fechado, num limite, e de livrar-se de "estigmas territoriais" (WACQUANT, 2001WACQUANT, L. As prisões da miséria. Rio de Janeiro: Zahar , 2001.), noutro, não é importante para todos. Essa busca pode, inclusive, contrapor-se a relações familiares e de vizinhança, cuja valorização também não é unânime, mas que seguem integrando várias estratégias, seja de luta cotidiana por manter-se na "era do consumo", seja por lograr adaptar-se às suas condições, combinando novas e velhas práticas, como o uso do cartão de crédito e o trabalho infantil, para conquistar melhores condições de vida.

No que se refere à "moral da dívida" e à modulação da subjetividade do "homem endividado" (LAZZARATO, 2013LAZZARATO, M. La fábrica del hombre endeudado. Buenos Aires: Amarrortu, 2013.), reafirmamos que as diferenças entre as classes sociais e seus segmentos precisam ser levadas em conta, uma vez que tanto a dependência em relação ao crédito, em suas múltiplas possibilidades, quanto às resistências ao controle moral decorrente do endividamento, são muito menos efetivos entre segmentos das elites e mesmo entre segmentos da classe média, o que reitera o papel da "economia da dívida" como mecanismo de reprodução da sociedade capitalista, com a dominação de classe que lhe é própria. A modelação da subjetividade do homem endividado é mais uma forma de "violência simbólica", ao mesmo tempo em que, contraditoriamente, o acesso ao consumo que lhe é correlato pode ser também uma forma de ampliação, por vezes tardia, dos limites do seu acesso à cidade. Isso só pode ser identificado, no entanto, quando contrapomos a dinâmica social às interpretações pautadas no controle absoluto dos consumidores.

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  • WACQUANT, L. As prisões da miséria Rio de Janeiro: Zahar , 2001.
  • 1
    Cidades médias são aquelas que desempenham papéis de intermediação no âmbito das redes urbanas das quais são constitutivas (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.), distinguindo-se, portanto, das cidades de porte médio, definidas com base no tamanho populacional, embora esse aspecto não seja desconsiderado.
  • 2
    As entrevistas foram realizadas de julho de 2012 a outubro de 2015.
  • 3
    Marília - 207.737 habitantes, Presidente Prudente - 203.370 habitantes, São Carlos - 213.070 habitantes, São José do Rio Preto - 383.558 habitantes e Ribeirão Preto - 603.401 habitantes (SP), e Londrina - 493.457 habitantes (PR) (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ).
  • 4
    Como ainda são escassos os trabalhos direcionados às práticas espaciais produzidos no âmbito da Geografia brasileira - Souza (2013SOUZA, M. L. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.) é uma exceção, e Corrêa (1992CORRÊA, R. L. Corporação, Práticas Espaciais e Gestão do território. Revista Brasileira de Geografia, v. 54, n. 3, p. 115-122, jul./set. 1992.) emprega a expressão para fazer referência à ação dos agentes econômicos, portanto, de modo incompatível com a proposta deste artigo -, incorporamos a perspectiva da análise da "Geografia da vida cotidiana" proposta por Lindón (2006LINDÓN, A. Geografias da vida cotidiana. In: LINDÓN, A.; HIERNAUX, D. Tratado de Geografia Humana. Barcelona: Antrophos, 2006. p. 356- 400.), que estuda a relação espaço-sociedade das situações de interação, referidas às pessoas situadas espaço-temporalmente em um contexto intersubjetivo a partir do qual dão sentido ao espaço e ao outro.
  • 5
    Segundo Governo Lula (2007 - 2010).
  • 6
    Neri presidiu o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) de 09/2012 a 05/2014.
  • 7
    Jessé Souza é sociólogo e assumiu a presidência do IPEA em 05/2015.
  • 8
    Os nomes dos entrevistados são fictícios.
  • 9
    Data da realização da entrevista.
  • 10
    Juliana, estudante, Marília, 12/04/2013. Essa jovem de 19 anos descreveu os pagamentos feitos pela mãe.
  • 11
    Resposta dada por Felipe (horticultor, Marília, 20/02/2013), quando lhe perguntamos sobre as formas usuais de pagamento empregadas quando faz compras.
  • 12
    Avencas tem 635 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ), é distrito de Marília e localiza-se a 18 km da sede do município.
  • 13
    Entrevista realizada em 27/02/2014. Vitória mudou-se para Londrina há 2 anos e reside em imóvel alugado.
  • 14
    Significativamente, no caso de Londrina, os maiores e mais valorizados espaços residenciais fechados horizontais localizam-se no setor sudoeste da cidade, onde também está o Catuaí Shopping Center (SILVA, 2013SILVA, W. R. Londrina e a reestruturação urbana. Atividades econômicas, papéis, agentes e escalas. In: ELIAS, D.; SPOSITO, M. E. B.; SOARES, B. R. (Org.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional . São Paulo: Outras Expressões , 2013. p. 193-334.), o que é indicativo dos processos de produção do espaço urbano que estão em curso nessa cidade média.
  • 15
    No âmbito de uma política populista que contribuiu para a transformação desses espaços periféricos em redutos eleitorais (SILVA, 2013SILVA, W. R. Londrina e a reestruturação urbana. Atividades econômicas, papéis, agentes e escalas. In: ELIAS, D.; SPOSITO, M. E. B.; SOARES, B. R. (Org.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional . São Paulo: Outras Expressões , 2013. p. 193-334.).
  • 16
    Natália, empregada doméstica, Ribeirão Preto,14/02/2014.
  • 17
    Helena, vendedora, São José do Rio Preto, 17/09/2014.
  • 18
    Entrevista realizada em 25/10/2013.
  • 19
    O centro de Marilia, assim como de todas as seis cidades pesquisadas, experimenta intenso processo de popularização expresso em seus estabelecimentos comerciais, principalmente. A concorrência de dois shopping centers, Marília Shopping e Esmeralda Shopping, é importante fator de tal processo (MELAZZO, 2012MELAZZO, E. S. Marília: especialização industrial e diversificação do consumo. Trajetórias de uma cidade média. In: SPOSITO, M. E. B.; SOARES, B. R. (Org.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional. São Paulo: Outras Expressões, 2012. p. 161-279.).
  • 20
    Oriente possui 5.402 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ) e localiza-se a 21 km de Marília.
  • 21
    Entrevista realizada em 16/09/14.
  • 22
    Prática que implica no pagamento mensal das despesas feitas num mesmo estabelecimento comercial e que envolve relações de confiança entre comerciante e consumidor, uma vez que cada despesa é anotada pelo comerciante (ou seu representante) e depois somada por ocasião do pagamento.
  • 23
    Entrevista realizada em 21/02/2013.
  • 24
    Entrevistados por Oliveira (2015)OLIVEIRA, V. F. Os sentidos da casa própria: condomínios horizontais populares fechados e novas práticas espaciais em Presidente Prudente e São Carlos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2015., em pesquisa de mestrado que deu origem ao livro "Os sentidos da casa própria: condomínios horizontais populares fechados e novas práticas espaciais em Presidente Prudente e São Carlos".
  • 25
    Engenheiro civil, São José do Rio Preto, 17/09/2014.
  • 26
    A Damha Urbanizadora atua em diferentes estados brasileiros. Dentre as cidades que pesquisamos, está presente em três (Presidente Prudente, São Carlos e São José do Rio Preto), tendo se tornado uma referência nessas cidades (SPOSITO; GÓES, 2013SPOSITO, M. E. B.; GÓES, E. M. Espaços fechados e cidades: Insegurança urbana e fragmentação socioespacial. São Paulo: Ed. UNESP, 2013.; MILANI, 2016MILANI, P. H. A produção da diferenciação socioespacial em Catanduva e São José do Rio Preto - SP: uma análise a partir do cotidiano dos moradores de espaços residenciais fechados. 2016. 252 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2016.Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/handle/11449/148016> . Acesso em: 12 maio 2017.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    ).
  • 27
    Entrevista realizada em 23/01/2015.
  • 28
    Entrevista realizada em 17/09/2014.
  • 29
    Monte Aprazível tem 21.746 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ) e situa-se a 41 km de São José do Rio Preto. As práticas espaciais descritas pelos entrevistados, dentre os quais Helena é um caso exemplar, reafirmam o papel das cidades médias, como São José do Rio Preto, na rede urbana (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.).
  • 30
    Em vigor de 2009 a 2016, esse programa subsidiou unidades habitacionais a partir do crédito e da redução de juros do financiamento, com o objetivo duplo de impactar a economia e ainda diminuir o déficit habitacional.
  • 31
    De um lado, é importante considerar que, como nos disse um entrevistado que atua no mercado imobiliário de São José do Rio Preto, "a zona norte é um lugar para pobre" (18/09/2014); de outro lado, na zona norte foi instalado o Shopping Cidade Norte, em 2012, o que evidencia tanto a ampliação do acesso ao consumo desses citadinos pobres, quanto o processo de fragmentação socioespacial que já está em curso nessa cidade média, onde também foi inaugurado o elitizado Shopping Iguatemi, em 2013, no setor sul (MILANI, 2016MILANI, P. H. A produção da diferenciação socioespacial em Catanduva e São José do Rio Preto - SP: uma análise a partir do cotidiano dos moradores de espaços residenciais fechados. 2016. 252 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2016.Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/handle/11449/148016> . Acesso em: 12 maio 2017.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    ).
  • 32
    Açougueira, São José do Rio Preto, 17/09/2014.
  • 33
    Essa entrevista contém indicações sobre o aumento das possibilidades de acesso à casa própria, via "habitação social de mercado" (SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Z. Habitação social, habitação de mercado: a confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.), em relação às gerações anteriores, conforme evidenciado na diferença entre a situação de Vanessa e de sua mãe, nesse aspecto.
  • 34
    Compra da cesta básica no próprio supermercado, com pagamento no mês seguinte, via folha de pagamento, e empréstimo, ambos disponibilizados para os seus funcionários. O empréstimo tem pagamento parcelado, cobrança de juros e desconto na folha de pagamento.
  • 35
    O Supermercado Laranjão é uma das âncoras do Shopping Cidade Norte, a que fizemos referência na nota 31.
  • 36
    Funcionária pública, Marília, 13/04/2013.
  • 37
    Entrevista realizada em 14/02/2014, Ribeirão Preto.
  • 38
    Do ponto e vista dos deslocamentos, fez referência ao uso do ônibus para ir ao trabalho e ao fato de o filho ter comprado uma moto nova, com ajuda de uma cunhada que trabalha no comércio, "ele paga 200 reais por mês".
  • 39
    Localizado na zona leste de Ribeirão Preto, o Novo Shopping, inaugurado em 1999, é considerado o mais popular, dentre os quatro existentes nessa cidade. Além disso, também é o mais frequentado pelos moradores das pequenas cidades do entorno, o que é favorecido pela proximidade com as rodovias (Anhanguera, Duarte Nogueira [SP-322], Abrão Assed [SP-333]) e pelos transportes coletivos disponíveis (BORGES, 2016BORGES, M. C. "Novo Shopping Ribeirão Preto: o "centro com ar-condicionado" - comparações entre os shopping centers de Ribeirão Preto - SP. Fapesp, 2016, Relatório de Pesquisa de Iniciação Científica.), o que evidencia as implicações do papel desempenhado por essa cidade média na rede urbana para a compreensão das suas características intraurbanas (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.; DAL POZZO, 2015DAL POZZO, C. Fragmentação Socioespacial em Cidades Médias Paulistas. Os territórios do consumo segmentado em Ribeirão Preto e Presidente Prudente. 2015. 400 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2015. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/pos/geo/dis_teses/15/dr/clayton_pozzo.pdf> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www2.fct.unesp.br/pos/geo/dis_tes...
    ).
  • 40
    Resposta dada, por exemplo, pelo casal Henrique e Patrícia (engenheiro e funcionária pública, São Carlos, 22/02/2013), entre outros, quando perguntamos sobre as formas usuais de pagamento.
  • 41
    O emprego de entrevistas com citadinos de classe média e alta, como procedimento metodológico, tem revelado que a informação sobre a renda, prevista no perfil inicial de cada entrevistado, pode gerar constrangimento e tende a ser informada abaixo do valor real, embora haja exceções.
  • 42
    Dona de casa, São Carlos, 16/01/2015.
  • 43
    Entrevista realizada em 22/02/2013, São Carlos. Sua esposa é funcionária pública.
  • 44
    Baseado na relação com o tempo, o pensamento prospectivo é a capacidade de "pensar o futuro como mais importante que o presente", "privilégio das classes em que o aguilhão da necessidade não às vincula à prisão do presente sempre atualizado como necessidade permanente", segundo Souza (2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., p.51-52).
  • 45
    O Parque Sabará foi o primeiro espaço residencial fechado implantado em São Carlos, em 1976.
  • 46
    Sem desconsiderar a dificuldade de definição precisa de classe média, adotamos o entendimento de classes sociais de Souza (2012)SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., para quem elas não são determinadas pela renda, nem pela simples posição na produção, mas por uma visão de mundo prática que se mostra em todos os comportamentos e atitudes.
  • 47
    Entrevista realizada em 18/09/2014.
  • 48
    Localizado no setor leste de São José do Rio Preto, O Damha I integra um conjunto de seis empreendimentos fechados da mesma incorporadora (MILANI, 2016MILANI, P. H. A produção da diferenciação socioespacial em Catanduva e São José do Rio Preto - SP: uma análise a partir do cotidiano dos moradores de espaços residenciais fechados. 2016. 252 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2016.Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/handle/11449/148016> . Acesso em: 12 maio 2017.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    ).
  • 49
    Essa foi a resposta dada, por exemplo, por Rodrigo (bombeiro, 31/10/2013, São Carlos) e Jorge (decorador, 12/04/2013, Marília), entre outros, quando lhes perguntamos sobre as formas usuais de pagamento empregadas quando fazem compras.
  • 50
    Entrevista realizada em 21/02/2013.
  • 51
    No sentido de que ultrapassou sua capacidade de pagamento, conforme explicou em seguida.
  • 52
    O carro do marido foi financiado em 60 meses, sem entrada, e é pago por ele.
  • 53
    O "Banco do Povo Paulista" é uma parceria entre o Governo do Estado de São Paulo e a Prefeitura Municipal de São Carlos, desde 2002, com a finalidade de facilitar o acesso ao crédito aos "empreendedores de pequenos negócios, formalizados ou não". (Disponível em: <www.saocarlos.sp.gov.br>. Acesso em: 15 jan. 2016).
  • 54
    Entrevista realizada em 17/06/2014.
  • 55
    Jardinópolis possui 41.228 habitantes (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ) e localiza-se a 18 km de Ribeirão Preto. As práticas espaciais descritas por Adolfo são expressivas do papel desempenhado pelas cidades médias no âmbito da rede urbana, ao mesmo tempo em que evidenciam o acerto da conceituação que vem sendo construída que não se limita à escala intraurbana (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.).
  • 56
    Referindo-se aos seus dois empregos e ao trabalho no período noturno.
  • 1
    Mid-sized cities are those that play intermediation roles within urban networks of which they are a constitent part (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.), thus distinguishing themselves from mid-sized cities as defined by population size, although this aspect is not disregarded.
  • 2
    The interviews were conducted between July 2012 and October 2015.
  • 3
    The populations of the cities are as follows: Marília - 207.737, Presidente Prudente - 203.370, São Carlos - 213.070, São José do Rio Preto - 383.558 and Ribeirão Preto - 603.401 (SP), and Londrina - 493.457 (PR) (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ).
  • 4
    As studies regarding spatial practices are still relatively scarce in the field of Brazilian geography - Souza (2013SOUZA, M. L. Os conceitos fundamentais da pesquisa sócio-espacial. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.) is an exception, and Corrêa (1992CORRÊA, R. L. Corporação, Práticas Espaciais e Gestão do território. Revista Brasileira de Geografia, v. 54, n. 3, p. 115-122, jul./set. 1992.) uses the expression to refer to the action of economic agents, and therefore, incompatible with the proposal of this article -, we have incorporated the perspective from an analysis of "The geography of everyday life" proposed by Lindón (2006LINDÓN, A. Geografias da vida cotidiana. In: LINDÓN, A.; HIERNAUX, D. Tratado de Geografia Humana. Barcelona: Antrophos, 2006. p. 356- 400.), who studied the relation between space and society in interactive situations, referring to people spatially and temporally located in an intersubjective context from which they give sense to space and others.
  • 5
    During the second term of the Lula Government (2007-2010).
  • 6
    Neri presided over the Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) from 09/2012 to 05/2014.
  • 7
    Jessé Souza is a sociologist and took over as president of IPEA in 05/2015.
  • 8
    The names of the interviewees are fictitious.
  • 9
    The date on which the interview was conducted.
  • 10
    Juliana, student, Marília, 12/04/2013. This young woman aged 19 described the payments made by her mother.
  • 11
    Response given by Felipe (horticulturalist, Marília, 20/02/2013), when asked about the forms of payment he used when shopping.
  • 12
    Avencas has a population of 635 (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ), and is a district of Marília, located 18 km from the municipal headquarters.
  • 13
    Interview conducted on 27/02/2014. Vitória had moved to Londrina 2 years before and lived in rented property.
  • 14
    Significantly, in the case of Londrina, the largest and most valued horizontal gated condominiums are located in the southwest sector of the city, where the Catuaí Shopping Center is also located (SILVA, 2013SILVA, W. R. Londrina e a reestruturação urbana. Atividades econômicas, papéis, agentes e escalas. In: ELIAS, D.; SPOSITO, M. E. B.; SOARES, B. R. (Org.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional . São Paulo: Outras Expressões , 2013. p. 193-334.), which is indicative of the production processes of urban space that are under progress in this mid-sized city.
  • 15
    Within the framework of a populist policy that has contributed to the transformation of these peripheral spaces into electoral realms (SILVA, 2013SILVA, W. R. Londrina e a reestruturação urbana. Atividades econômicas, papéis, agentes e escalas. In: ELIAS, D.; SPOSITO, M. E. B.; SOARES, B. R. (Org.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional . São Paulo: Outras Expressões , 2013. p. 193-334.).
  • 16
    Natália, housemaid, Ribeirão Preto, 14/02/2014.
  • 17
    Helena, sales assistent, São José do Rio Preto, 17/09/2014.
  • 18
    Interview conducted on 25/10/2013.
  • 19
    The center of Marilia, much like all six cities surveyed, has undergone an intense popularization process expressed mainly in its commercial establishments. The competition between two shopping malls, Marília Shopping and Esmeralda Shopping, has been an important factor in this process (MELAZZO, 2012MELAZZO, E. S. Marília: especialização industrial e diversificação do consumo. Trajetórias de uma cidade média. In: SPOSITO, M. E. B.; SOARES, B. R. (Org.). Agentes econômicos e reestruturação urbana e regional. São Paulo: Outras Expressões, 2012. p. 161-279.).
  • 20
    Oriente has a population of 5.402 (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ) and is 21 km from Marília.
  • 21
    Interview conducted on 16/09/14.
  • 22
    This practice implies the monthly payment of expenses incurred in a commercial establishment and which involves trust between the trader and the consumer, since each expense is recorded by the trader (or representative) and then added up at the time of payment.
  • 23
    Interview conducted on 21/02/2013.
  • 24
    Interviewed by Oliveira (2015)OLIVEIRA, V. F. Os sentidos da casa própria: condomínios horizontais populares fechados e novas práticas espaciais em Presidente Prudente e São Carlos. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2015., for a master research which resulted in the book "The meaning of your own home: popular horizontal gated communities and new spatial practices in Presidente Prudente e São Carlos".
  • 25
    Civil engineer, São José do Rio Preto, 17/09/2014.
  • 26
    Damha Urbanizadora is active in many Brazilian states. In the cities we surveyed, it was present in three (Presidente Prudente, São Carlos and São José do Rio Preto), with the tendency of becoming a reference point in these cities (SPOSITO; GÓES, 2013SPOSITO, M. E. B.; GÓES, E. M. Espaços fechados e cidades: Insegurança urbana e fragmentação socioespacial. São Paulo: Ed. UNESP, 2013.; MILANI, 2016MILANI, P. H. A produção da diferenciação socioespacial em Catanduva e São José do Rio Preto - SP: uma análise a partir do cotidiano dos moradores de espaços residenciais fechados. 2016. 252 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2016.Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/handle/11449/148016> . Acesso em: 12 maio 2017.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    ).
  • 27
    Interview conducted on 23/01/2015.
  • 28
    Interview conducted on 17/09/2014.
  • 29
    Monte Aprazível has a population of 21,746 (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ) and is 41 km from São José do Rio Preto. The spatial practices described by the interviewees, of which Helena is a good example, reaffirms the role of mid-sized cities, such as São José do Rio Preto, in the urban network (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.).
  • 30
    In force from 2009 to 2016, this government housing program subsidized housing units based on credit and reduced interest rates on mortgages, with the double objective of impacting the economy and reducing the housing deficit.
  • 31
    On the one hand, it is important to consider that, as mentioned by one interviewee who works in the real estate business in São José do Rio Preto, "the northern zone is a place for the poor" (09/18/2014); on the other hand, the Cidade Norte Shopping Mall was built in 2012 in the northern region, which demonstrates both the greater access to consumption attained by these poorer residents, as well as the process of socio-spatial fragmentation that is already under way in this mid-sized city, where the elitist shopping mall called Iguatemi was inaugurated in 2013 in the southern region (MILANI, 2016MILANI, P. H. A produção da diferenciação socioespacial em Catanduva e São José do Rio Preto - SP: uma análise a partir do cotidiano dos moradores de espaços residenciais fechados. 2016. 252 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2016.Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/handle/11449/148016> . Acesso em: 12 maio 2017.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    ).
  • 32
    Butcher, São José do Rio Preto, 17/09/2014.
  • 33
    This interview contains indications regarding the greater possibility of becoming a home owner, through "market social housing" (SHIMBO, 2012SHIMBO, L. Z. Habitação social, habitação de mercado: a confluência entre Estado, empresas construtoras e capital financeiro. Belo Horizonte: C/Arte, 2012.), than in previous generations, as revealed by the difference in situation between Vanessa and her mother.
  • 34
    Employees were allowed to buy the "basic basket" at the same supermarket, and have the payment deducted from their wages the following month, as well as taking out loans. Loans could be paid back in installments, with interest charges discounted from their wages.
  • 35
    The supermarket Laranjão is one of the anchor stores at the Cidade Norte Shopping Mall, referred to in note 31.
  • 36
    Public servant, Marília, 13/04/2013.
  • 37
    Interview conducted on 14/02/2014, in Ribeirão Preto.
  • 38
    From the viewpoint of moving around, she refers to the fact of going to work by bus and that her son has bought a new motorcycle, with the help of a sister-in-law who works in a shop, "He pays 200 Reals a month".
  • 39
    Located in the eastern zone of Ribeirão Preto, the Novo Shopping Mall, inaugurated in 1999, is considered the most popular among the four that exist in this city. In addition, it is also the most frequented by residents from the surrounding small towns, which is favored by the proximity to the highways (Anhanguera, Duarte Nogueira [SP-322], Abrão Assed [SP-333] and by the available public transport BORGES, 2016BORGES, M. C. "Novo Shopping Ribeirão Preto: o "centro com ar-condicionado" - comparações entre os shopping centers de Ribeirão Preto - SP. Fapesp, 2016, Relatório de Pesquisa de Iniciação Científica.), which indicates the implications of the role played by this mid-sized city in the urban network to understand its intra-urban characteristics (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.; DAL POZZO, 2015DAL POZZO, C. Fragmentação Socioespacial em Cidades Médias Paulistas. Os territórios do consumo segmentado em Ribeirão Preto e Presidente Prudente. 2015. 400 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2015. Disponível em: <http://www2.fct.unesp.br/pos/geo/dis_teses/15/dr/clayton_pozzo.pdf> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www2.fct.unesp.br/pos/geo/dis_tes...
    ).
  • 40
    This response was given, for example, by the couple Henrique and Patrícia (engineer and public servant, São Carlos, 22/02/2013), amongst others, when we asked them about their usual forms of payments.
  • 41
    Conducting interviews with residents from the upper and middle classes, as a methodological procedure, has revealed that information on income, foreseen in the initial profile of each interviewee, may cause embarrassment and often the amount informed tends to be below the actual value, although there are exceptions.
  • 42
    Housewife, São Carlos, 16/01/2015.
  • 43
    Interview conducted on 22/02/2013, São Carlos. His wife is a public servant.
  • 44
    Based on the relationship with time, prospective thinking is the capacity to "think about the future as being more important than the present", "the privilege of classes in which the sting of necessity does not bind them to the prison of a present always updated as a permanent necessity", according to Souza (2012SOUZA, J. Os batalhadores brasileiros. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2012., p.51-52).
  • 45
    Parque Sabará was the very first gated community to open in São Carlos, in 1976.
  • 46
    Without disregarding the difficulty of precise definition of the middle class, we adopt Souza's understanding of social class (2012), for whom they are not determined by income, neither by the simple position in the production, but by a practical world view that is revealed in all behaviors and attitudes.
  • 47
    Interview conducted on 18/09/2014.
  • 48
    Located in the eastern sector of São José do Rio Preto, Damha I is part of a group of six gated projects by the same developer (MILANI, 2016MILANI, P. H. A produção da diferenciação socioespacial em Catanduva e São José do Rio Preto - SP: uma análise a partir do cotidiano dos moradores de espaços residenciais fechados. 2016. 252 f. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Presidente Prudente, 2016.Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/handle/11449/148016> . Acesso em: 12 maio 2017.
    https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
    ).
  • 49
    This response was given, for example, by Rodrigo (fire fighter, 31/10/2013, São Carlos) and Jorge (decorator, 12/04/2013, Marília), amongst others, when they were asked about their usual forms of payment.
  • 50
    Interview conducted on 21/02/2013.
  • 51
    In the sense that she had spent beyond her means, according to what she said afterwards.
  • 52
    The husband’s car was bought in 60 monthly installments, with no down payment, which he paid himself.
  • 53
    The Banco do Povo Paulista has been a partnership between the São Paulo State Government and the São Carlos City Hall since 2002, and to aims to facilitate access to credit for "small businesses, whether formalized or not". (Available at: <www.saocarlos.sp.gov.br>. Accessed on: 15th Jan. 2016).
  • 54
    Sacoleiros were originally women who rode the buses to Paraguay with big bags, bought everything from electronics to perfume (all duty free) to bring back to sell in Brazil.
  • 55
    Interview conducted on 17/06/2014.
  • 56
    Jardinópolis has a population of 41.228 (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2010INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> . Acesso em: 12 maio 2017.
    http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/...
    ) and is 18km from Ribeirão Preto. The spatial practices described by Adolfo express the role played by mid-sized cities within the urban network, while at the same time evidencing the correctness of the conceptualization that has been constructed and which is not only limited to the intra-urban scale (SPOSITO, 2007SPOSITO, M. E. B. (Org.). Cidades médias: espaços em transição. São Paulo: Expressão Popular, 2007.).
  • 57
    Referring to his two jobs and his night shift.

Disponibilidade de dados

Citações de dados

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Censo Demográfico 2010 Rio de Janeiro: IBGE, 2010. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010> Acesso em: 12 maio 2017.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2018

Histórico

  • Recebido
    29 Nov 2016
  • Aceito
    09 Maio 2017
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