Comportamento fisiológico de sementes de tangerina (Citrus reticulata Blanco) submetidas à desidratação

Physiological performance of tangerine (Citrus reticulata Blanco) seeds submitted to dehydration

BOTÂNICA E FISIOLOGIA

Comportamento fisiológico de sementes de tangerina (Citrus reticulata Blanco) submetidas à desidratação¹

Physiological performance of tangerine (Citrus reticulata Blanco) seeds submitted to dehydration

Leila Martins^I; Walter Rodrigues da Silva^II

^ILaboratório Central de Sementes e Mudas, DSMM – CATI. Caixa Postal 1291, CEP 13073-001 Campinas (SP), Brasil / E-mail: [e-mail]

^IIIn memoriam

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi o de estudar os efeitos imediatos da desidratação sobre o comportamento fisiológico das sementes de tangerina (Citrus reticulata Blanco var. Cleópatra). Assim, sementes extraídas manualmente de frutos maduros foram lavadas em água corrente e drenadas à sombra. Em seguida, uma porção representativa de sementes foi removida a fim de constituir o tratamento com o maior grau de umidade (49%) a ser estudado. As sementes remanescentes foram submetidas à desidratação em equipamento com circulação forçada de ar (28±2°C), visando à obtenção dos tratamentos (39; 32; 24; 13; 10 e 7% H₂O) referentes aos demais graus de umidade desejados. Foram realizadas avaliações do grau de umidade, da germinação, da taxa e da velocidade de emergência das plântulas, dos comprimentos da raiz, do hipocótilo e da plântula. Concluiu-se que o potencial fisiológico das sementes, considerando o intervalo de 49 a 7% para o grau de umidade, é favorecido pela desidratação até 39% H₂O.

Termos para Indexação: dessecação, semente recalcitrante.

ABSTRACT

The objective of this research was to study the immediate effects of dehydration on the physiological performance of 'Cleopatra' tangerine (Citrus reticulata Blanco) seeds. Seeds were hand extracted from mature fruits, washed in running water and then drained in the shade. Following that, a representative portion of the seeds was removed so as to constitute the treatment containing the highest water content (49%) to be studied. The remaining seeds were submitted to dehydration in an equipment with forced air flow (28º±2ºC) in order to obtain the treatments (39; 32; 24; 13; 10 and 7% H₂O) relative to the other moisture contents desired. Evaluations were made of the moisture level, the germination, the seedling emergence, and root, hypocotyl and seedling length. It was concluded that the physiological potential of the seeds, considering the interval of 49 to 7% moisture content, is favored by dehydration to 39% H₂O.

Index Terms: dehydration, recalcitrant seed.

INTRODUÇÃO

Na maioria das espécies, as sementes podem ser desidratadas sem perdas apreciáveis de vigor (Harrington, 1972; Toledo & Marcos Filho, 1977; Carvalho et al., 2002), havendo indicações de que a qualidade fisiológica, durante o armazenamento, seja mais afetada pelo grau de umidade das sementes do que pelos métodos de secagem a que foram submetidas (Araújo et al., 1989; Barboza & Herrera, 1990; Vasconcelos et al., 1992). No entanto, em sementes recalcitrantes, a desidratação favorece a deterioração (Farrant et al., 1988) similarmente ao relatado por Nakamura (1975), para as sementes de citros.

King & Roberts (1979) classificaram as sementes de citros, quanto à tolerância à secagem, como intermediárias e recalcitrantes. Hong & Ellis (1995) relataram que, de maneira generalizada, a manutenção do teor de água em torno de 40%, em sementes de citros, possibilitou a manutenção da viabilidade por vários anos. Segundo Roberts (1972), sementes de Citrus aurantium L. (laranja-azeda) submetidas à dessecação de 44 para 3,8% H₂O tiveram a qualidade fisiológica reduzida de 90 para 22%. Entretanto, Mumford & Panggabean (1982) observaram perda total de viabilidade, após cinco dias, pela dessecação abaixo de 8% H₂O.

Os trabalhos disponíveis a respeito das conseqüências da dessecação nas sementes de Citrus reticulata Blanco são escassos e, portanto, há a necessidade de intensificação na busca de informações sobre o tema. Dessa forma, o objetivo desta pesquisa foi o de estudar os efeitos imediatos da desidratação sobre o comportamento fisiológico das sementes de tangerina.

MATERIAL E MÉTODOS

A pesquisa, realizada no Laboratório Central de Sementes e Mudas do Departamento de Sementes, Mudas e Matrizes da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Campinas-SP), empregou sementes de tangerina (Citrus reticulata Blanco) da variedade Cleópatra que, extraídas manualmente de frutos maduros, foram lavadas em água corrente e drenadas à sombra. Em seguida, foi determinado o grau de umidade (Brasil, 1992) das sementes e removido o tratamento com o maior grau de umidade (49%) a ser estudado. As sementes remanescentes foram submetidas à secagem, em equipamento com circulação forçada de ar (28±2°C), visando à obtenção dos tratamentos (39; 32; 24; 13; 10 e 7% H₂O) referentes aos demais graus de umidade desejados.

Esses tratamentos foram obtidos através do acompanhamento da perda de massa das sementes durante a desidratação; para tanto, amostras de sementes destinadas ao monitoramento, com massas iniciais previamente conhecidas, foram acondicionadas em sacos de filó e distribuídas nas bandejas do secador para pesagens a intervalos regulares. As massas finais das amostras, correspondentes a cada um dos graus de umidade desejados, foram calculadas utilizando a equação descrita por Cromarty et al. (1985):

Mf=Mi(100-Ui)x(100-Uf)-1

onde:

Mf = massa da amostra (g) após a secagem;

Mi = massa da amostra (g) antes da secagem;

Ui = grau de umidade (%) antes da secagem;

Uf = grau de umidade (%) desejado após a secagem.

À medida que foram sendo atingidos graus de umidade próximos aos desejados, amostras foram retiradas, homogeneizadas e divididas em frações que, por sua vez, foram embaladas em sacos de polietileno (0,14mm de espessura) e mantidas a 10±2°C, provisoriamente, até a obtenção de todos os tratamentos.

Foram realizadas as seguintes avaliações:

a) Determinação do grau de umidade: foi conduzido a 105±3°C/24h, pelo método da estufa (Brasil, 1992), em duas amostras de 25 sementes por repetição. Os resultados obtidos, com base na massa úmida, foram expressos em porcentagem.

b) Teste de germinação: foram distribuídas 200 sementes (8 repetições de 25 sementes) em rolos de papel toalha mantidos a 30°C e umedecidos em volume de água equivalente a três vezes o seu peso sem hidratação. As avaliações, realizadas aos 21; 28 e 35 dias após a instalação do teste, forneceram a porcentagem de plântulas normais (Brasil, 1992). Diante da ocorrência de poliembrionia na espécie, foi considerado, exclusivamente, um indivíduo para cada semente.

c) Emergência das plântulas: foram semeadas 100 sementes (10 repetições de 10 sementes), a 2cm de profundidade, em areia mantida com disponibilidade hídrica próxima à da capacidade de campo, em ambiente sombreado e desprovido de controles de temperatura e de umidade relativa. Foi considerada a taxa (%) de plântulas que, 42 dias após a instalação do teste, apresentavam a parte área exposta acima da superfície do substrato; da mesma forma adotada no teste de germinação, foi considerado um indivíduo para cada semente.

d) Velocidade de emergência das plântulas: foi obtida, a partir da contagem diária do número de plântulas emersas no teste de emergência das plântulas, através do cálculo de índice segundo Marcos Filho et al. (1987).

e) Comprimentos da raiz, do hipocótilo e da plântula: aos 42 dias após a instalação do teste de emergência das plântulas, foram tomadas, considerando um indivíduo por semente instalada, as distâncias (cm) do ápice da raiz à região de transição com o hipocótilo (comprimento da raiz) e desta à região de inserção das folhas cotiledonares (comprimento do hipocótilo); a soma de ambas as medidas representou o comprimento da plântula. Os dados médios foram obtidos pelo quociente entre o somatório das medidas registradas em cada determinação e o número de sementes utilizadas.

O delineamento experimental utilizado foi o inteiramente casualizado, e a comparação das médias foi realizada pelo teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade; os dados do grau de umidade não foram submetidos à análise estatística.

Adicionalmente, os tratamentos receberam pontuações (Tabela 1) segundo critérios de classificação estatística, fundamentados nas comparações realizadas pelo teste de Tukey, semelhantes aos empregados por Caliari & Silva (2001); Martins & Silva (2005) e Martins et al. (2005). Assim, dentro de cada avaliação da qualidade fisiológica, foi atribuída a cada um dos tratamentos a pontuação parcial resultante do somatório das pontuações positivas ou nulas (número de tratamentos estatisticamente superados) com as negativas ou nulas (número de tratamentos estatisticamente superiores); o somatório das pontuações parciais constituiu a pontuação total do tratamento.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os graus de umidade determinados, constantes da Tabela 2, apresentaram valores próximos aos desejados e, dessa maneira, indicaram adequação do método de secagem utilizado para obter os tratamentos.

Os dados fisiológicos (Tabela 2), considerando as avaliações de germinação e vigor, indicaram que a desidratação, a partir de 39% H₂O, tendeu a favorecer o progresso da deterioração das sementes. Contudo, quando confrontados entre si, os testes apresentaram desuniformidade nas comparações de potencial fisiológico entre os tratamentos; essa variação, admitida como resultante de particularidades inerentes à natureza de cada determinação (Grabe, 1976; Marcos Filho et al., 1984), dificultou o estabelecimento de hierarquização dos dados obtidos em todos os testes.

Na busca dessa complementação, os resultados obtidos nos testes fisiológicos foram conjuntamente interpretados, através da atribuição de pontuações (Tabela 3) aos tratamentos, utilizando o critério de classificação estatística aplicado por Caliari & Silva (2001); Martins & Silva (2005) e Martins et al. (2005). Nessa classificação, além de haver sido confirmada a tendência previamente observada para a deterioração, o teor de água de 39%, apresentando a maior pontuação total, destacou-se dos demais na preservação do potencial fisiológico das sementes. Esse benefício, decorrente da redução moderada do grau de umidade inicial (neste caso, de 49% para 39% H₂O), foi observado similarmente por Mungomery et al. (1966) e, também, em outras espécies de sementes sensíveis à dessecação (Hor et al., 1984; Boyce, 1989; Gentil et al., 2004).

Assim, a interpretação dos dados sugere que, durante a desidratação, o grau de umidade interfere na deterioração das sementes de tangerina. Graus de umidade superiores a 39% apresentam menor deterioração; já, nos valores inferiores, o processo da deterioração é favorecido.

CONCLUSÕES

O potencial fisiológico das sementes de tangerina, considerado o intervalo de 49 a 7% para o grau de umidade, é favorecido pela desidratação até 39% H₂O.

AGRADECIMENTO

Os autores agradecem o Engenheiro Agrônomo Victor Branco de Araújo, da CATI Sementes e Mudas, pela valiosa colaboração para a execução do trabalho.

Recebido: 14/06/2005. Aceito para publicação: 08/03/2006.

Apoiado financeiramente pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).

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1

(Trabalho 097/2005).

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  19 Jun 2006
• Data do Fascículo
  Abr 2006

Histórico

• Recebido
  14 Jun 2005
• Aceito
  08 Mar 2006