Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação da toxicidade aguda e subaguda, em ratos, do extrato etanólico das folhas e do látex de Synadenium umbellatum Pax.

Acute and subacute toxicity studies of the latex and of the ethanolic extract of the leaves of Synadenium umbellatum Pax in rats

Resumos

O uso de plantas medicinais tem sido muito significativo nos últimos anos, sendo incentivado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Synadenium umbellatum Pax, Euphorbiacea (vulgo cola-nota, cancerola, milagrosa) tem o látex usado empiricamente como antitumoral e antiinflamatório. Por existir espécies tóxicas nesta família e visando à segurança no uso de extratos vegetais, tal estudo avaliou a toxicidade pré-clínica do látex e do extrato etanólico das folhas (EEF) de S. umbellatum, por via oral, em ratas Wistar. O estudo seguiu diretrizes do Guideline 423 (toxicidade aguda) e Guideline 407 (toxicidade subaguda) da OECD (Organisation for Economic Cooperation and Development). Na toxicidade aguda do látex e do EEF, não se observou letalidade nem alterações fisiológicas e comportamentais das ratas na dose de 2000 mg/kg, sendo praticamente atóxico. Porém, na análise histopatológica, o látex ocasionou congestão e infiltrado leucocitário nos rins, fígado e pulmões, efeitos não observados com o EEF. Na toxicidade subaguda, doses de 50, 100 e 200 mg/kg de EEF não produziram alterações dose-dependentes significativas nos parâmetros laboratoriais e fisiológicos, nem alterações macroscópicas e histopatológicas nos órgãos das ratas. Contudo, o uso crônico da planta S. umbellatum merece mais estudos.

Synadenium umbellatum; toxicidade aguda; toxicidade subaguda; toxicidade préclinica


The use of medicinal plants has been being very significant in the last years, being the use encouraged by WHO. Synadenium umbellatum Pax, Euphorbiacea (popularly known as cola-note, cancerola, miraculous) has the latex used empirically as anti-cancerous and anti-inflammatory. For there being toxic species in this family and aiming at the safety in the use of vegetable extracts, such study evaluated the pre-clinical toxicity of the latex and of the ethanolic extract of the leaves (EEL) of S. umbellatum, administrated by oral route, in Wistar female rats. The study followed OECD's Guidelines for test of acute toxicity (Guideline 423) and for subacute toxicity (Guideline 407). In the acute toxicity of latex and EEL, behavioral and physiological alterations were not observed neither animal's death in the dose level of 2,000 mg/kg. However, the latex caused congestion and leukocytes infiltration of the kidneys, liver and lungs, effects not observed with EEL. In the subacute toxicity, dose levels of 50, 100 and 200 mg/kg of EEL did not produced significant dose-dependent alterations in the lab results and no physiologic, macroscopic and hystopathological alterations. EEL of S. umbellatum is practically poisonless in acute exposure; already the latex can cause hystological damages. The chronic use of S. umbellatum needs more specific studies.

Synadenium umbellatum; acute toxicity; subacute toxicity; pre-clinical toxicity


ARTIGO

Avaliação da toxicidade aguda e subaguda, em ratos, do extrato etanólico das folhas e do látex de Synadenium umbellatum Pax.

Acute and subacute toxicity studies of the latex and of the ethanolic extract of the leaves of Synadenium umbellatum Pax in rats

Luiz C. CunhaI, * * E-mail: lucacunha@gmail.com, Tel. +55-62-3209-6329 ; Flaubertt S. AzeredoI, II; Ana C. V. MendonçaI; Marcelo S. VieiraI; Liuba L. PucciI; Marize C. ValadaresI; Helemi O. G. FreitasIII; Ângela A. S. SenaIII; Ruy de Souza Lino JuniorIV

INúcleo de Estudos e Pesquisas Tóxico-Farmacológicas, Faculdade de Farmácia, Universidade Federal de Goiás, Avenida Universitária n° 1166, 74605-220 Goiânia-GO, Brasil

IIDepartamento de Farmácia-Bioquímica, Faculdades Objetivo, Av. T-2, 1993, Setor Bueno, 74215-010, Goiânia-GO, Brasil

IIIFaculdade de Ciências Biológicas, Universidade de Rio Verde, Faz. Fontes do Saber - s/n. Campus Universitário, Caixa Postal 104, 75901-970 Rio Verde-GO, Brasil

IVInstituto de Patologia Tropical e Saúde Pública, Avenida Universitária s/n, Q. 62, Setor Universitário, 74605-220 Goiânia-GO, Brasil

RESUMO

O uso de plantas medicinais tem sido muito significativo nos últimos anos, sendo incentivado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Synadenium umbellatum Pax, Euphorbiacea (vulgo cola-nota, cancerola, milagrosa) tem o látex usado empiricamente como antitumoral e antiinflamatório. Por existir espécies tóxicas nesta família e visando à segurança no uso de extratos vegetais, tal estudo avaliou a toxicidade pré-clínica do látex e do extrato etanólico das folhas (EEF) de S. umbellatum, por via oral, em ratas Wistar. O estudo seguiu diretrizes do Guideline 423 (toxicidade aguda) e Guideline 407 (toxicidade subaguda) da OECD (Organisation for Economic Cooperation and Development). Na toxicidade aguda do látex e do EEF, não se observou letalidade nem alterações fisiológicas e comportamentais das ratas na dose de 2000 mg/kg, sendo praticamente atóxico. Porém, na análise histopatológica, o látex ocasionou congestão e infiltrado leucocitário nos rins, fígado e pulmões, efeitos não observados com o EEF. Na toxicidade subaguda, doses de 50, 100 e 200 mg/kg de EEF não produziram alterações dose-dependentes significativas nos parâmetros laboratoriais e fisiológicos, nem alterações macroscópicas e histopatológicas nos órgãos das ratas. Contudo, o uso crônico da planta S. umbellatum merece mais estudos.

Unitermos: Synadenium umbellatum, toxicidade aguda, toxicidade subaguda, toxicidade préclinica.

ABSTRACT

The use of medicinal plants has been being very significant in the last years, being the use encouraged by WHO. Synadenium umbellatum Pax, Euphorbiacea (popularly known as cola-note, cancerola, miraculous) has the latex used empirically as anti-cancerous and anti-inflammatory. For there being toxic species in this family and aiming at the safety in the use of vegetable extracts, such study evaluated the pre-clinical toxicity of the latex and of the ethanolic extract of the leaves (EEL) of S. umbellatum, administrated by oral route, in Wistar female rats. The study followed OECD's Guidelines for test of acute toxicity (Guideline 423) and for subacute toxicity (Guideline 407). In the acute toxicity of latex and EEL, behavioral and physiological alterations were not observed neither animal's death in the dose level of 2,000 mg/kg. However, the latex caused congestion and leukocytes infiltration of the kidneys, liver and lungs, effects not observed with EEL. In the subacute toxicity, dose levels of 50, 100 and 200 mg/kg of EEL did not produced significant dose-dependent alterations in the lab results and no physiologic, macroscopic and hystopathological alterations. EEL of S. umbellatum is practically poisonless in acute exposure; already the latex can cause hystological damages. The chronic use of S. umbellatum needs more specific studies.

Keywords: Synadenium umbellatum, acute toxicity, subacute toxicity, pre-clinical toxicity

INTRODUÇÃO

O uso de plantas medicinais tem sido muito significativo nos últimos anos, merecendo incentivo da OMS (WHO, 1993). No entanto, o uso popular, e mesmo o tradicional, não são suficientes para validar eticamente as plantas medicinais como medicamentos eficazes e seguros. (Turolla & Nascimento, 2006; Agra et al., 2007; 2008) Os estudos toxicológicos têm a finalidade de avaliar a idéia errônea de que produtos fitoterápicos, por serem naturais, são isentos de efeitos tóxicos ou adversos, e que o uso popular de plantas medicinais serve como validação da eficácia destes medicamentos (Lapa, 1999; Lapa, 2001; Craveiro et al., 2008; Marliére et al., 2008; Silveira et al., 2008).

A espécie botânica Synadenium umbellatum Pax. (nome em alusão as glândulas do ciátio concrescidas), é um arbusto latescente que atinge de 3 a 5 metros, de origem africana e pertence à ordem Geraniales e à família Euphorbiaceae. Encontra-se dispersa principalmente nos trópicos dos continentes africano e americano.

Várias espécies de Synadenium são conhecidas no mundo pelo seu uso como anti-inflamatório, anti câncer e analgésico (Jager, 1996). A S. umbellatum (popularmente chamado de "cola-nota", "avelós", "milagrosa", "cancerola", "leitosa-do-amazonas") contém látex leitoso com pH + 5,0, obtido das folhas ou do caule. No centro-oeste, o látex é utilizado empiricamente no combate a várias enfermidades, tais como, alergia, câncer, doença de Chagas, diabetes, gripe, hemorragias internas, impotência sexual, lepra, obesidade, úlcera nervosa, cólicas menstruais e dores no corpo ao câncer (Ortêncio, 1997).

Revisando a literatura, não encontrou nenhum relato acerca de estudos toxicológicos sobre o Synadenium umbellatum. No entanto, há relatos de toxicidade dérmica da sua sinonímia, a Synadenium grantii Hoof, cujo látex contem ésteres diterpenos (Bagavathi et al., 1988) e, por ser de uso ornamental, pode ocasionar intoxicação em crianças (Spoerke et al., 1985).

Assim, o estudo toxicológico, independentemente dos resultados farmacológicos, torna-se imprescindível devido aos motivos etnofamacológicos e às informações toxicológicas existentes. Por isso é que se propõe o presente trabalho cujo objetivo é avaliar a toxicidade pré-clínica aguda e subaguda da S. umbellatum em ratos por via oral.

MATERIAL E MÉTODOS

Material botânico

As folhas e látex de Synadenium umbellatum Pax foram coletados, no verão de 2005/2006, numa chácara, em Goiânia (781m de altitude, 16º40'15,5"S e 49º14'13,6"W), Goiás, Brasil. O material botânico foi identificado pelo professor adjunto de farmacognosia da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal de Goiás (FF-UFG), Dr. José Realino de Paula. Uma exsicata foi depositada no Herbário do Instituto de Ciências Biológicas da UFG, sob o número UFG-27160.

Animais

Foram utilizados um total de 52 ratos fêmeas albinas Wistar (Rattus norvergicus), não-isogênicas, nulíparas, com peso médio de 170 a 180 g, provenientes do biotério da UniCEUB-Labocien(Centro Universitário de Brasília). Do total de animais, 12 (doze) foram para o teste de toxicidade aguda e 40 (quarenta) para o teste de toxicidade subaguda.

No período de adaptação, os animais foram mantidos no biotério do NEPET por 10 dias sob condições padrões (temperatura de 22+3 ºC, umidade relativa do ar de 30–70% com controle do ciclo claro/escuro), conforme literatura específica (Brito, 1994). Os animais tiveram acesso à ração comercial de qualidade (Purina Labina®) e água ad libitum. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa Médica Humana e Animal do Hospital das Clinicas da Universidade Federal de Goiás (CEPMHA/HC/ UFG), sob protocolo 162/06, de 30/11/2006, atendendo resolução do Conselho Nacional de Saúde (Brasil, 1988) e aos "Princípios éticos na experimentação animal do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal" (Cobea, 2003).

Preparo do extrato

As folhas foram dessecadas a 40 °C em estufa com circulação de ar, por 72 h. Após a secagem, as folhas foram trituradas em um moinho de facas e, por cinco vezes, realizou a extração por maceração com álcool etílico 96°GL, seguida de filtração. O filtrado foi evaporado em rotaevaporador a 40 ºC sob pressão reduzida.

O extrato final seco foi suspenso com até 5% de Tween® 80 e diluído em solução salina para a preparação de soluções de acordo com a dose a ser administrada. O látex foi colhido do caule e folhas da planta em um tubo de ensaio, pesado e solubilizado com salina no estado in natura.

Estudo da toxicidade aguda -Método de classes (OECD, 2001)

A dose inicial, selecionada entre as doses fixas de 5, 50, 300 e 2000 mg/kg, foi aquela mais propensa a produzir mortalidade. Pela manhã, fez-se a administração a três ratos fêmeas da dose de 2000 mg/ kg, por gavagem, do látex e do extrato etanólico das folhas de Synadenium umbellatum. Ocorrendo a morte de 0-1 animal até o 14º dia, repete-se a dose administrada em outros três animais. Se morresse mais de um animal, administraria doses seqüenciais menores até possibilitar estimativa de uma faixa de DL50, conforme os padrões da Globally Harmonised System (GHS).

Em ambas as etapas, foram realizadas observações comportamentais sistemáticas para avaliar o screening hipocrático que fornece uma estimativa geral da toxicidade da substância sobre o estado consciente e disposição geral, atividade e coordenação do sistema motor, reflexos e atividades sobre o sistema nervoso central e sobre o sistema nervoso autônomo (Malone & Robichaud, 1983). Parâmetros (tais como: atividade geral, frênito vocal, irritabilidade, resposta ao toque, resposta aperto cauda, contorção, posição trem posterior, reflexo endireitamento, tonus do corpo, força para agarrar, ataxia, reflexo auricular, reflexo corneal, tremores, convulsões, straub, hipnose, anestesia, lacrimação, ptose, micção, defecação, piloereção, hipotermia, respiração, cianose, hiperemia, morte) foram avaliados no tempo de 15 min, 30 min, 1 h, 2 h, 4 h e 8 h após a administração e, a partir de então, diariamente, até o décimo quarto dia. Sinais de toxicidade, a época do seu aparecimento, a intensidade, a duração e a progressão dos mesmos foram anotados, tabulando-as numa escala de 0 a 4 (ausente, raro, pouco, moderado, intenso), para posterior análise.

Os animais sobreviventes foram anestesiados com solução de xilazina-cetamina 0,2 mL/100 g (8,75 mL de cetamina (100 mg/mL) e 1,25 mL de xilazina (100 mg/mL), conforme protocolo da Cornell University/ Cornell Center for Animal Resources and Education, conforme descrito por Flecknell (1996) e Kohn (1997), e sacrificados por deslocamento cervical. Foram feitas as análises macroscópica e histopatológica dos órgãos e a pesagem do fígado e do baço para determinar seus pesos relativos (peso do órgão por 100 g do peso corpóreo).

Estudo da toxicidade subaguda (OECD, 1995)

Os animais foram divididos em cinco grupos com 8 fêmeas cada, totalizando 40 animais. A média de variação de peso entre cada grupo não ultrapassou 20%. Três doses diferentes (Grupo 1 -50 mg/kg; Grupo 2 -100 mg/kg; e Grupo 3 -200 mg/kg) do extrato etanólico das folhas de Synadenium umbellatum foram administradas por grupo, através de gavagem, diariamente, pela manhã, por 30 dias. Ao grupo controle (Grupo 4) foi administrado solução salina e Tween 80. A outro grupo, denominado satélite (Grupo 5), foi tratado com a dose máxima de 200 mg/kg do extrato etanólico de S. umbellatum, por 30 dias, permanecendo sem tratamento por mais 30 dias. O volume não excedeu 1 mL/kg do animal.

Foram observados e registrados, diariamente, dados fisiológicos (peso, consumo de água, consumo de ração, produção de fezes e produção de urina) e alterações comportamentais anormais durante todo o estudo.

A avaliação laboratorial incluiu: hemoglobina, hematócrito, contagem total e diferencial de leucócitos e contagem de plaquetas; alanina-aminotrasnferase (ALT ou TGP), aspartato-amininotransferase (AST ou TGO), fosfatase alcalina, gama-glutamiltransferase (gama GT), creatinina, uréia, proteínas totais, colesterol total, triglicérides, albumina, glicemia e uranálise (cor, densidade pH, nitrito, proteinas, glicose, corpos cetônicos, urobilinogênio, bilirrubina, células epiteliais, piócitos, hemáceas, cristais).

Após a eutanásia, foi feito a avaliação macroscópica à vista desarmada dos órgãos, além da pesagem de fígado e baço para determinar os pesos relativos. Foram colhidas amostras de fígado, pulmão, coração, rim, baço, intestino, estômago, esôfago e cérebro dos animais para exame histopatológico, cujas fatias foram fixadas em formol tamponado 10% por 24h, embutidas em blocos de parafina, seccionadas à 5µm e corados com hematoxilina e eosina (Junqueira, 1983).

A principal finalidade da análise histopatológica era avaliar a integridade tecidual dos órgãos extipados. Dentre os principais parâmetros investigados estão lesões celulares reversíveis (degenerações) e irreversíveis (necrose e apoptose), infiltração de leucócitos, congestão, extravasamento de sangue e fibrose. A intensidade de acometimento variou de discreta (menos de 25% do órgão), moderada e acentuada (maior que 50%).

Análise estatística dos dados

Os resultados foram expressos através de média ± desvio padrão (Média ± DP). Fez-se tratamento estatístico através da análise de variância (ANOVA) de uma via, seguida pelo teste de comparação múltipla de Tukey, usando software validado (GraphPad Prism4®). Considerou-se um nível de significância de 5% (Centeno, 1990).

RESULTADOS

Toxicidade aguda

A dose de 2000 mg/kg, tanto do látex quanto do extrato etanólico das folhas (EEF) de Synadenium umbellatum não ocasionou a morte de nenhum animal.

Pelo screening hipocrático, observou-se leve sonolência ou estado de consciência moderado (escore 2) durante primeira hora, normalizando a posteriori (estado de consciência normal / intensa -escore 4).

Os órgãos não mostraram alterações macroscópicas anormais e os pesos relativos dos órgãos e não tiveram diferença estatística significativa entre os animais tratados com o látex e com o EEF (Tabela 1).

A análise histopatológica detectou congestão e infiltração leucocitária no fígado, nos rins e nos pulmões dos animais tratados com látex (2000 mg/kg), enquanto, os órgãos dos animais que receberam o EEF permaneceram intactos (Figura 1).


Toxicidade sub-aguda

Ocorreu a perda, acidentalmente, de dois animais (um do grupo 2 -100 mg/kg -e outro no grupo 3 -200 mg/kg) no decorrer do experimento, ficando estes grupos com 7 animais para cálculo das médias. Os outros permaneceram com 8 animais.

Não foram observadas diferenças significativas, em comparação ao grupo controle, na evolução ponderal das ratas tratadas com EEF nas doses de 50, 100 e 200 mg/kg, nem variação significativa nos pesos relativos do fígado e baço (Tabela 2). Nos hábitos fisiológicos diários (consumo de água e ração e produção de fezes e urina) também não houve variação significativa entre os grupos tratados e o grupo controle (Tabela 3).

As ratas não demonstraram mudanças comportamentais anormais durante o estudo, nem foram encontradas alterações macroscópicas nos órgãos dos animais durante a necropsia, estatisticamente significativas.

Não foi observada variação significativa nos parâmetros hematológicos (hemograma completo e contagem total e diferencial de leucócitos) e uranálise dos grupos tratados com o controle. Os resultados bioquímicos de glicemia, colesterol total, proteínas totais, albumina do grupo satélite aumentaram, apresentando diferença significativa em relação ao grupo controle e com os outros grupos tratados.

A fostatase alcalina aumentou nos grupos tratados, apresentando diferença significativa em relação ao controle, exceto com o grupo de 100 mg/kg (Tabela 4).

Não foram observadas alterações histopatológicas dose-dependente significantes nos grupos tratados em relação ao controle. Contudo, todos os grupos, inclusive o controle, tiveram ratas com alterações na integridade tecidual do fígado, rins e, principalmente, pulmões (Tabela 5). Coração e cérebro não tiveram alterações anormais enquanto baço intestino e estomago apresentaram alterações isoladas em alguns animais (Tabela 5).

DISCUSSÃO

O extrato alcoólico das folhas e o látex de Synadenium umbellatum mostraram possuir baixa toxicidade aguda, evidenciada pela ausência de sinais clínicos relevantes no screening toxicológico, bem como ausência e morte durante todo o período de observação com a dose de 2000 mg/kg. Pelo método de classes, o S. umbellatum se enquadra na Classe 5 (substância com DL50 superior a 2000 mg/kg e menor que 5000 mg/kg), sendo considerada de baixa toxicidade. Somente em casos excepcionais é que existe justificativa do uso da dose de 5000 mg/kg (OECD, 2001; Brasil, 2004). Já que não é uma necessidade imperiosa, o látex é utilizado em doses muito baixas pela população (aproximadamente 140 mg/dia), e devido o extrato da planta ser de difícil solubilização aquosa, resolveu-se por não testar a dose máxima.

Vale ressaltar que o teste de toxicidade aguda deve priorizar a via utilizada pelos humanos. Pela via intraperitoneal, em camundongos, a S. umbellatum demonstrou possuir DL50 entre 150 a 160 mg/ kg (Oliveira et al., 2005). Mesmo sendo espécies diferentes, é notório que a resposta dos animais frente à administração por gavagem não será a mesma daquela observada quando utilizada a via intraperitoneal, devido às diferenças existentes entre os perfis de absorção estomacal e intestinal como pH, superfície de absorção, motilidade intestinal, irrigação sanguínea (Klaassen & Watkins, 2001). Por esse motivo, o teste de toxicidade aguda foi realizado utilizando a via oral já que não há relato do uso da S. umbellatum por outra via de administração.

O screening hipocrático é um ensaio bastante útil e comumente usado na triagem preliminar de plantas para detectar atividades farmacológicas e toxicológicas (Lucio et al., 2000). O extrato etanólico das folhas (EEF) e o látex de Synadenium umbellatum demonstraram influenciar a atividade geral e consciência dos animais, que ficaram mais quietos durante a primeira hora de observação. Não influenciou a coordenação motora, os reflexos e nem alterou atividades relacionados com o sistema nervoso central (SNC) ou sistema nervoso autônomo, o que pode ser indício de que a planta pode possuir alguma atividade sedativa seletiva na depressão do SNC ou relaxante muscular (Kanjanapothi et al., 2004; Oliveira, 2007).

Na toxicidade subaguda, os sinais de toxicidade sistêmica são definidos a partir da redução na massa corporal dos animais experimentais (Tofovic, & Jackson, 1999; Raza et al., 2002; Teo et al., 2002). Além da redução do desenvolvimento ponderal, a toxicidade sistêmica se manifesta através da redução nos consumos de água e ração, alterações de comportamento, apatia e má condição da pelagem, como a presença de pêlos arrepiados (Melo, 2001). Outros sinais de toxicidade podem se expressar pela alteração da massa relativa dos órgãos, alterações hematológicas e bioquímicas sangüíneas (Gonzalez & Silva, 2003). O extrato etanólico das folhas de S. umbellatum não produziu alteração significativa nos parâmetros fisiológicos e laboratoriais (hematológicos, bioquímicos e uranálise) entre os grupos tratados nos 30 dias em relação ao controle. Aliás, mostrou-se um equilíbrio de peso entre os animais do mesmo grupo (diminuição do desviopadrão) e um ganho ponderal de no mínimo 20% em todos os grupos (Tabela 2).

Houve um aumento nos valores da glicemia, albumina, colesterol total e proteínas totais do grupo satélite, que mostraram diferença significativa com o controle e demais grupos (Tabela 4). Isto pode ser explicado pela diminuição do estresse que era ocasionado pela administração diária do produto, bem como o incômodo das observações dos parâmetros fisiológicos. Tais atitudes do pesquisador podem ocasionar alterações metabólicas e fisiológicas que interferem nos parâmetros alterados, a maioria deles relacionados diretamente aos hábitos alimentares. Além do mais, a não causalidade com o produto fica corroborado pela ausência de diferença estatística entre o controle e a dose de 200 mg/kg, a qual é a mesma dose do satélite.

A fosfatase alcalina mostrou aumentada significativamente nos demais grupos em relação ao controle, exceto no grupo de 100 mg/kg. A fosfatase alcalina (ALP) está presente em vários tecidos, principalmente ósseo, no sistema hepatobiliar e na mucosa gastrointestinal e é indicadora da ocorrência de colestase (fluxo biliar prejudicado), que pode levar a um incremento dos níveis séricos em até 10 vezes (Santos et al., 2008). No entanto, não observou alterações em outros parâmetros relacionados com a função hepática e tal aumento não teve significância clínica. Sua explicação pode se dever à variabilidade biológica.

Nas doses de 50, 100 e 200 mg/kg, o extrato etanólico não produziu alterações dose-dependentes no exame histopatológico em relação ao grupo satélite. No entanto, houve tendências de alterações que consistiram, principalmente, na congestão e infiltração leucocitária nos pulmões, rins e fígado. Trabalhos demonstram que a S. grantii possui glicoproteínas complexas, denominadas lectinas, encontradas principalmente no látex, que são potentes aglutininas para eritrócitos humanos (Uzabakiliho et al., 1987; Mrinalini, 2002; Rajesh et al., 2006; Souza et al., 2005). Assim, a presença das lectinas pode influenciar a migração de leucócitos e o acúmulo de sangue nos vasos sanguíneos dos órgãos mais irrigados, culminando nos efeitos histopatológicos supracitados na toxicidade aguda do látex e na toxicidade subaguda das folhas.

Pode-se concluir que o extrato etanólico de folhas de Synadenium umbellatum tem baixa toxicidade em altas doses em curto prazo. Já o látex pode provocar alterações teciduais no fígado, rins e pulmões. Em casos de necessidade de uso prolongado são necessários estudos adicionais para verificar o desfecho de tais alterações histopatológicas. O emprego em humanos, para finalidade terapêutica, não foi estudado neste trabalho.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao CNPq pelo auxílio financeiro e a UniCEUB, pela doação dos animais de experimentação.

Oliveira RB 2007. Avaliação das atividades antinociceptiva, antiinflamatória e depressora do sistema nervoso central do extrato etanólico e de frações purificadas obtidos das folhas do Synadenium umbellatum Pax (cola-nota). Goiânia, 118p. Dissertação de Mestrado em Ciências Farmacêuticas, Universidade Federal de Goiás.

Received 15 December 2008; Accepted 17 March 2009

  • Agra MF, França PF, Barbosa-Filho JM 2007. Synopsis of the plants known as medicinal and poisonous in Northeast of Brazil. Rev Bras Farmacogn 17: 114-140.
  • Agra MF, Silva KN, Basílio IJLD, França PF, Barbosa-Filho JM 2008. Survey of medicinal plants used in the region Northeast of Brazil. Rev Bras Farmacogn 18: 472508.
  • Bagavathi R, Sorg B, Hecker E 1988. Tigliane-type diterpene esters from Synadenium grantii. Planta Med 54: 506510.
  • Brasil 2004. Resolução nº 90, de 16 de março de 2004: Guia para realização de estudos de toxicidade pré-clínica de fitoterápicos Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
  • Brasil 1988. Resolução nº 01, de 13 de junho de 1988 - Dispõe sobre normas de pesquisa em saúde. Brasília: Conselho Nacional de Saúde, Ministério da Saúde.
  • Brito AS 1994. Manual de Ensaios Toxicológicos In Vivo Campinas: Unicamp. 122p.
  • Centeno AJ 1990. Curso de Estatística Aplicada à Biologia. Goiânia: Cegraf/UFG, 1a reimpressão, p. 188.
  • Cobea 2003. Princípios éticos na experimentação animal. Colégio Brasileiro de Experimentação Animal. Disponível em <http://www.ulbra.br/pesquisa/cobea. doc>, acesso em 10/09/2005.
  • Craveiro ACS, Carvalho DMM, Nunes RS, Fakhouri R, Rodrigues AS, Teixeira-Silva F 2008. Toxicidade aguda do extrato aquoso de folhas de Erythrina velutina em animais experimentais. Rev Bras Farmacogn 18 (Supl.): 739-743.
  • Flecknell P 1996. Laboratory Animal Anesthesia. New York: Academic Press.
  • González FHD, Silva SC 2003. Introdução à Bioquímica Clínica Veterinária. Porto Alegre: UFRGS, p.179-198.
  • Jager AK, Hutchings A, Van Staden J 1996. Screening of Zulu medicinal plants for prostaglandin-synthesis inhibitors. J Ethnopharmacol 52: 95-100.
  • Junqueira LCU, Junqueira LMMS 1983. Técnicas básicas de citologia e histologia Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.
  • Kanjanapothi D, Panthong A, Lertprasertsuke N 2004. Toxicity of crude rhizome extract of Kaempferia galanga L. (Proh Hom). J Ethnopharmacol 90: 359-365.
  • Klaassen CD, Watkins III EJB 2001. Absorção, Distribuição e Excreção dos Tóxicos. In: Toxicologia: A Ciência Básica dos. Tóxicos de Casaret e Doull McGraw-Hill, 5Ş Ed. pág. 79-100.
  • Kohn DF, Wixson SK, White WJ, Benson GJ 1997. Anesthesia and Analgesia in Laboratory Animals. New York: Academic Press.
  • Lapa AJ 1999. Farmacologia e toxicologia de produtos naturais. In: Simões C.M.O. (Ed). Farmacognosia da planta ao medicamento Florianópolis: Editora da Universidade Federal de Santa Catarina, p.181-196.
  • Lapa AJ, Caden S, Lima-Landman MTR, Lima TCM 2001 Métodos de avaliação da atividade farmacológica de plantas medicinais. Salvador: Sociedade Brasileira de Farmacologia e Terapêutica Experimental (SBFTE). 74p.
  • Lucio EMRA, Rosalen PL, Sharapin N, Souza Brito ARM 2000. Avaliação toxicológica aguda e creening hipocrático da epilsopilosina, alcalóide secundário de Pilocarpus microphyllus Stapf. Rev Bras Farmacogn 9/10: 23-25.
  • Malone MH, Robichaud RC 1983. The pharmacological evaluation of natura products -General and specific approaches to screening ethnopharmaceuticals. J Ethnopharmacol 8: 127-147.
  • Marliére LDP, Ribeiro AQ, Brandão MGL, Klein CH, Acurcio FA 2008. Utilização de fitoterápicos por idosos: resultados de um inquérito domiciliar em Belo Horizonte (MG), Brasil. Rev Bras Farmacogn 18 (Supl.): 754-760.
  • Mello FB 2001. Estudo dos efeitos de Lantana camara (Verbenaceae) sobre a fertilidade e reprodução de ratos. Porto Alegre, 120p. Dissertação de Mestrado em Ciências Veterinárias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
  • Mrinalini PJ, Vithayathil SM, Raju CS 2002. Isolation and characterization of proteolytic enzymes from the látex of Synadenium grantii Hook. Plant Sci 163: 131-139.
  • OECD 1995. Organisation for Economic Co-operation and Development. Guideline 407: Repeated Dose 28-day Oral Toxicity Study in Rodent. Acessado em 18 de dezembro 2008 em http://www.oecd.org/publications Paris: Head of Publications Service.
  • OECD 2001. Guideline 423: Acute Oral Toxicity -Acute Toxic Class Method. Acessado em 18 de dezembro 2008 em http://www.oecd.org/publications Paris: Head of Publications Service.
  • Oliveira RB, Cunha LC, Valadares MC, Filho MJP, Araújo DM, Paula JR, Bastos MA 2005. Toxicidade aguda de látex e extrato etanólico de folhas de Synadenium umbellatum em camundongos. Rev Eletr Farm 2: 143145.
  • Ortêncio WB 1997. Medicina popular do Centro-Oeste, 2ŞEdição. Brasília: Thesaurus.
  • Premaratna A, Shadaksharaswamy M, Naniappa S 1981. Isolation, purification and properties of a lectin form the látex of Synadenium grantii Hook f. Indian J Biochem Biophys 18: 32-35.
  • Rajesh R, NatarajuA, Gowda CD, Frey BM, Frey FJ, Vishwanath BS 2006. Purification and characterization of a 34kDa, heat stable glycoprotein from Synadenium grantii latex: action on human fibrinogen and fibrin clot. Biochimie 88: 1313-1322.
  • Raza M, Al-Shabanah AO, El-Hadiyah TM, Al-Majed AA 2002. Effect of prolonged vigabatrin treatment on haematological and biochemical parameters in plasma, liver and kidney of Swiss albino mice. Sci Pharm 70: 135-145.
  • Santos JCA, Riet-Correa F, Simoes SVD, Barros CSL 2008. Patogênese, sinais clínicos e patologia das doenças causadas por plantas hepatotóxicas em ruminantes e eqüinos no Brasil. Pesq Vet Bras 28: 1-14 .
  • Silveira PF, Bandeira MAM, Arrais PSD 2008. Farmacovigilância e reações adversas às plantas medicinais e fitoterápicos: uma realidade. Rev Bras Farmacogn 18: 618-626.
  • Souza MA, Amancio-Pereira F, Cardoso CRB 2005. Isolation and partial characterization of a D-galactose binding lectin from the látex of Synadenium carinatum. Braz Arch Biol Technol 48: 705-716.
  • Spoerke DG, Montanio CD, Rumack BH 1985. Pediatric exposure to the houseplant Synadenium grantii. Vet Hum Toxicol 27: 283-284.
  • Teo S, Stirling D, Thomas S, Hoberman A, Kiorpes A, Khetani V 2002. A 90-day oral gavage toxicity study of p-methylphenidate and d,l-methylphenidate in Sprague-Dawley rats. Toxicology 179: 183-196.
  • Tofovic SP, Jackson EK 1999. Effects of long-term caffeine consumption on renal function in spontancously hipertensive heart failure prone rats. J Cariovasc Pharmacol 33: 360-366.
  • Turolla MSR, Nascimento ES 2006. Informações toxicológicas de alguns fitoterápicos utilizados no Brasil. Rev Bras Cien Farm 42: 189-306.
  • Uzabakiliho BC, Largeau C, Casadevall E 1987. Latex constituents of Euphorbia candelabrum, Euphorbia grantii, Euphorbia tirucalli and Synadenium grantii. Phytochemistry 26: 3041-3046.
  • WHO 1993. World Health Organization Regional Office for the Western Pacific. Research Guidelines for Evaluating the Safety and Efficacy of Herbal Medicines Manila: WHO.
  • *
    E-mail:
    lucacunha@gmail.com, Tel. +55-62-3209-6329
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Set 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Recebido
      15 Dez 2008
    • Aceito
      17 Mar 2009
    Sociedade Brasileira de Farmacognosia Universidade Federal do Paraná, Laboratório de Farmacognosia, Rua Pref. Lothario Meissner, 632 - Jd. Botânico, 80210-170, Curitiba, PR, Brasil, Tel/FAX (41) 3360-4062 - Curitiba - PR - Brazil
    E-mail: revista@sbfgnosia.org.br