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Indicadores de sarcopenia e sua relação com fatores intrínsecos e extrínsecos às quedas em idosas ativas

Resumo

Introdução:

O envelhecimento musculoesquelético pode prejudicar o desempenho funcional aumentando o risco de quedas.

Objetivo:

Analisar a correlação entre indicadores de sarcopenia e fatores extrínsecos e intrínsecos às quedas em idosas da comunidade.

Método:

Estudo transversal, 85 idosas ativas da comunidade foram questionadas sobre número de quedas no último ano e divididas em dois grupos: não caidoras (n=61) e caidoras (n=24). Indicadores de sarcopenia verificados: velocidade da marcha (VM, 10m); força de preensão manual (FPM); circunferência panturrilha; índice de massa muscular apendicular (DXA). Fatores intrínsecos: estado mental (MEEM); acuidade visual; depressão (GDS-30); dor/função quadril, joelho (Lequesne) e tornozelo/pé (FAOS); função vestibular (teste Fukuda); mobilidade funcional e risco de quedas (TUG); potência (teste sentar e levantar cinco vezes); marcha (esteira); medo de cair (FES-I-Brasil). Fatores extrínsecos: riscos/recursos de segurança nas residências. Teste t independente para comparações entre grupos e correlação de Pearson e Spearman (p<0,05).

Resultados:

Correlação moderada entre FPM e VM para não caidoras (r=0,47; p=0,001) e caidoras (r=0,54; p=0,03). Correlação moderada negativa (r=-0,52; p=0,03) entre medo de cair e cadência da marcha de caidoras. Maior presença de escadas (p=0,001); tapetes soltos (p=0,03) nas residências das caidoras comparados com não caidoras.

Conclusão:

As idosas não apresentaram sarcopenia. Idosas caidoras apresentaram pior cadência da marcha e maior medo de cair. Riscos residenciais foram determinantes para cair, indicando maior relevância do que fatores intrínsecos na avaliação de quedas em idosas ativas da comunidade.

Palavras-chave:
Sarcopenia; Acidentes por Quedas; Marcha; Músculo Esquelético

Abstract

Introduction:

Musculoskeletal aging can impair functional performance increasing the risk of falls.

Objective:

To analyze the correlation between sarcopenia and the intrinsic and extrinsic factors involved in falls among community-dwelling elderly women.

Method:

A cross-sectional study evaluated the number of falls of 85 active community-dwelling elderly women in the previous year and then divided them into two groups: non-fallers (n=61) and fallers (n=24). The sarcopenia indicators assessed were gait speed (GS, 10m); handgrip strength (HS); calf circumference; appendicular muscle mass index (DXA). Intrinsic factors: Mental State Examination (MSE); visual acuity; depression (GDS-30); hip , knee (Lequesne) and ankle/foot (FAOS) pain/function; vestibular function (Fukuda test); functional mobility and risk of falls (TUG); power (sitting and standing five times); gait (treadmill); fear of falling (FES-I-Brazil). Extrinsic factors: risk/security features in homes. The independent t test was applied for comparisons between groups and the Pearson and Spearman tests were used for correlations (p<0.05).

Results:

There was a moderate correlation between HS and GS in non-fallers (r=0.47; p=0.001) and fallers (r= 0.54; p=0.03). There was a moderate negative correlation (r= -0.52; p=0.03) between FES-I-Brazil and gait cadence in fallers. There was a greater presence of stairs (p=0.001) and throw rugs (p=0.03) in the homes of fallers than non-fallers.

Conclusion:

The elderly women were not sarcopenic. Elderly fallers presented inferior gait cadence and a greater fear of falling. Residential risks were determining factors for falls, and were more relevant than intrinsic factors in the evaluation of falls among active community-dwelling elders.

Key words:
Sarcopenia; Accidental Falls; Gait; Muscle, Skeletal

INTRODUÇÃO

A queda é considerada um dos maiores problemas de saúde da população idosa,11. Camargos FF, Dias RC, Dias JF, Freire MT. Cross-cultural adaptation and evaluation of the psychometric properties of the Falls Efficacy Scale-International Among Elderly Brazilians (FES-I-BRAZIL). Rev Bras Fisioter 2010;14(3):237-43. tem etiologia multifatorial, incluindo fatores intrínsecos e extrínsecos.22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71. Dentre os fatores intrínsecos, destacam-se a redução da força e potência muscular; modificações no padrão de marcha; deficit visual, funcional e cognitivo; alterações de equilíbrio, função vestibular; tempo de reação muscular; redução de amplitude de movimento; dor e fatores psicológicos como medo de cair e depressão.33. Callisaya ML, Blizzard L, Schmidt MD, McGinley JL, Lord SR, Srikanth VK. A population-based study of sensorimotor factors affecting gait in older people. Age Ageing 2009;38(3):290-5.

4. Reelick MF, Van Iersel MB, Kessels RP, Rikkert MG. The influence of fear of falling on gait and balance in older people. Age Ageing 2009;38(4):435-40.

5. Delbaere K, Sturnieks DL, Crombez G, Lord SR. Concern about falls elicits changes in gait parameters in conditions of postural threat in older people. J Gerontol Ser A Biol Sci Med Sci 2009;64(2):237-42.

6. Melzer I, Benjuya B, Kaplanski J. Postural stability in the elderly: a comparison between fallers and non-fallers. Age Ageing 2004;33(6):602-7.
-77. Iinattiniemi S, Jokelainen J, Luukinen H. Falls risk among a very old home-dwelling population. Scand J Prim Health Care 2009;27(1):25-30. Dentre os fatores extrínsecos podem-se destacar as condições sociais e os fatores ambientais, tais como: iluminação; superfícies irregulares; tapetes; objetos espalhados pelo chão; escadas sem corrimão e animais soltos.22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71. O risco de cair aumenta de acordo com o número de fatores de risco presente e com a idade.77. Iinattiniemi S, Jokelainen J, Luukinen H. Falls risk among a very old home-dwelling population. Scand J Prim Health Care 2009;27(1):25-30.

A redução na massa muscular decorrente do processo de envelhecimento também é um aspecto que deve ser considerado. A sarcopenia é conhecida como uma síndrome geriátrica caracterizada por diminuição de massa muscular e da função muscular (força ou desempenho físico) que pode afetar o equilíbrio e a marcha no idoso.88. Krause KE, Mcintosh EI, Vallis LA. Sarcopenia and predictors of the fat free mass index in community-dwelling and assisted-living older men and women. Gait Posture 2012;35(2):180-5.

Dentre os métodos disponíveis para avaliação da massa muscular, os mais comumente adotados na literatura são estimativas indiretas para avaliar a composição corporal com dados antropométricos, como índice de massa corporal (IMC) e a bioimpedância.99. Shaw KA, Srikanth VK, Fryer JL, Blizzard L, Dwyer T, Venn AJ. Dual energy X-ray absorptiometry body composition and aging in a population-based older cohort. Int J Obes 2007;31(2):279-84.,1010. Bijlsma AY, Pasma JH, Lambers D, Stijntjes M, Blauw GJ, Meskers CGM, et al. Muscle strength rather than muscle mass is associated with standing balance in elderly outpatients. JAMDA 2013;4(7):493-98. Entretanto, a Dual Energy X-Ray Absorptiometry (DXA) é um método mais preciso e apresenta-se como novo padrão ouro para avaliação da composição corporal, o qual pode quantificar de forma mais acurada o conteúdo de gordura, massa muscular e massa óssea corporal, especialmente na população de idosos.99. Shaw KA, Srikanth VK, Fryer JL, Blizzard L, Dwyer T, Venn AJ. Dual energy X-ray absorptiometry body composition and aging in a population-based older cohort. Int J Obes 2007;31(2):279-84.,1111. Coin A, Sarti S, Ruggiero E, Giannini S, Pedrazzoni M, Minisola S, et al. Prevalence of sarcopenia based on different diagnostic criteria using DEXA and appendicular skeletal muscle mass reference values in an italian population aged 20 to 80. J Am Med Dir Assoc 2013;14(7):507-12.

Além disso, tem sido investigada a relação entre sarcopenia e o equilíbrio em idosos. Estudos verificaram que a força muscular interferiu no equilíbrio estático (pés juntos, tandem, semi tandem, olhos abertos e com olhos fechados) e na marcha em idosos da comunidade. Já a massa muscular, avaliada por bioimpedância e pletismografia, indicou relação apenas com o equilíbrio na posição tandem nos idosos de ambos os sexos.88. Krause KE, Mcintosh EI, Vallis LA. Sarcopenia and predictors of the fat free mass index in community-dwelling and assisted-living older men and women. Gait Posture 2012;35(2):180-5.,1010. Bijlsma AY, Pasma JH, Lambers D, Stijntjes M, Blauw GJ, Meskers CGM, et al. Muscle strength rather than muscle mass is associated with standing balance in elderly outpatients. JAMDA 2013;4(7):493-98. Assim, ainda não se sabe se a massa muscular avaliada com DXA e/ou sarcopenia interfere em fatores envolvidos com o risco de quedas em idosas.

Também não foi encontrado nenhum estudo que tenha investigado os principais fatores intrínsecos e extrínsecos relacionados às quedas em idosas e suas correlações com a sarcopenia.1212. Barbosa-Silva TG, Bielemann RM, Gonzalez MC, Menezes AMB. Prevalence of sarcopenia among community-dwelling elderly of a medium-sized South American city: results of the COMO VAI? Study. J Cachexia Sarcopenia Muscle 2015;6(4):1-8.

Deste modo, o presente estudo teve como objetivo avaliar os indicadores de sarcopenia e correlacioná-los com os fatores intrínsecos e extrínsecos envolvidos com o risco de quedas em idosas ativas caidoras e não caidoras da comunidade.

MÉTODO

Este estudo teve delineamento transversal e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná (CAAE: 25239713.3.0000.0102).

Foi realizado o cálculo amostral por meio do programa G*Power 3.1, considerando tamanho do efeito de 0,80; erro α de 0,05 e poder (1-β) de 0,88%, totalizando uma amostra de 83 idosas.

As participantes deveriam atender aos seguintes critérios de inclusão: mulheres; idade igual ou superior a 65 anos; hígidas; independentes funcionalmente e capazes de realizar os testes propostos. Os critérios de exclusão foram: idosas que apresentassem doenças neurológicas e/ou traumato-ortopédicas; que tivessem próteses com implantes metálicos ou não metálicos que impedissem a realização das avaliações propostas; doenças descompensadas e/ou pressão arterial elevada no dia da avaliação. Desta forma, 85 idosas participaram do presente estudo e todas assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

A coleta de dados ocorreu no período de agosto a dezembro de 2014. Primeiramente, as participantes foram avaliadas por um médico geriatra que realizava anamnese e exame físico dirigidos, sendo coletados dados sobre doenças previamente diagnosticadas, consumo de medicamentos, continência urinária e fecal, acuidade auditiva, prática atual de atividade física (e frequência semanal) e dados psicossociais (categorias de escolaridade: analfabeto, 1-4 anos, 5-8 anos, >8 anos); situação conjugal; ocupação; local de residência; participação em atividades sociais. O exame físico foi composto por coleta de sinais vitais e exame segmentar, incluindo teste de acuidade visual com cartão de Snellen. Em seguida, foram realizadas avaliações físicas, de composição corporal e dos fatores extrínsecos e intrínsecos relacionados às quedas.

A massa corporal foi aferida por meio de balança (Filizola) e estatura mensurada com estadiômetro de parede (Sanny). O IMC foi calculado pela razão massa corporal e estatura elevada ao quadrado, sendo considerada a classificação da Organização Pan-Americana de Saúde.1313. Lebrão ML, Duarte YAO. Saúde, Bem-estar e Envelhecimento: o Projeto Sabe no município de São Paulo: uma abordagem inicial. Brasília, DF: Organização Pan- Americana da Saúde; 2003.

As participantes foram questionadas quanto ao número de quedas nos 12 meses precedentes à pesquisa e foram classificadas como caidoras aquelas que relataram ter uma ou mais quedas no período investigado.

Indicadores de sarcopenia

Para a triagem de sarcopenia foram utilizados os valores obtidos nos testes descritos a seguir: velocidade da marcha (VM); força de preensão manual (FPM) e circunferência da panturrilha (CP), de acordo com o proposto por Cruz-Jentoft et al.1414. Cruz-jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing 2010;39(4):412-23. e os valores de índice de massa muscular apendicular (IMMA) obtidos por meio da DXA.

A VM foi avaliada em percurso retilíneo e plano de 10 metros. Os dois primeiros e os dois últimos metros foram excluídos da análise, respeitando as fases de aceleração e desaceleração. O tempo para percorrer o percurso de seis metros foi registrado (s). Considerou-se velocidade adequada, sem risco de quedas, >1 m/s.15

A FPM foi aferida com dinamômetro manual (SH), no membro dominante da idosa, sendo realizados três movimentos máximos com um minuto de descanso entre eles e o resultado (Kgf) a média das três tentativas.14

A CP foi mensurada com fita métrica contornando a maior curvatura da panturrilha e considerou-se valores menores que 31 cm como indicativo de depleção de massa muscular e associação com incapacidade.16

As avaliações da composição corporal e IMMA foram realizadas por meio da absorciometria de raio X de dupla energia (DXA, modelo Discovery A, Hologic) no Laboratório Bioquímico e Densitométrico (LABDEN) da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. As idosas foram posicionadas em decúbito dorsal, com membros inferiores rodados medialmente e braços estendidos ao longo do corpo, os dedos permaneceram unidos e a cabeça alinhada ao corpo. Obtiveram-se valores absolutos e percentual corporal e de segmentos dos parâmetros gordura corporal; massa muscular; IMMA; massa muscular membros superiores (MMSS); massa muscular membros inferiores (MMII) e conteúdo mineral ósseo.99. Shaw KA, Srikanth VK, Fryer JL, Blizzard L, Dwyer T, Venn AJ. Dual energy X-ray absorptiometry body composition and aging in a population-based older cohort. Int J Obes 2007;31(2):279-84. O exame foi realizado por um técnico com formação pelo International Society for Clinical Densitometry (ISCD) e o equipamento utilizado foi calibrado segundo as normas do ISCD 2013-2015.

Para o cálculo do IMMA foi considerada a soma da massa muscular e do conteúdo mineral ósseo dos quatro membros dividida pela estatura ao quadrado.1111. Coin A, Sarti S, Ruggiero E, Giannini S, Pedrazzoni M, Minisola S, et al. Prevalence of sarcopenia based on different diagnostic criteria using DEXA and appendicular skeletal muscle mass reference values in an italian population aged 20 to 80. J Am Med Dir Assoc 2013;14(7):507-12.

Fatores intrínsecos relacionados às quedas

Uma série de testes foram realizados buscando investigar os principais fatores intrínsecos relacionados às quedas, conforme descrito a seguir.

A função cognitiva foi avaliada por meio do teste Miniexame do Estado Mental (MEEM). Os escores considerados para o teste foram: 13 para analfabetos; 18 para indivíduos com um a sete anos de escolaridade; 26 para oito anos ou mais de escolaridade.17 Os sintomas depressivos foram avaliados pela Escala de Depressão Geriátrica (GDS-30), adotando-se o ponto de corte de até 10 pontos para ausência de sintomas depressivos.18 O medo de cair foi avaliado pela Falls Efficacy Scale-International, Brasil (FES-I-Brasil), o escore final poderia variar de 16 (ausência de preocupação) a 64 (preocupação extrema). Os escores >23 foram identificados como associação com histórico de queda esporádica e >31 pontos com associação de queda recorrente.11. Camargos FF, Dias RC, Dias JF, Freire MT. Cross-cultural adaptation and evaluation of the psychometric properties of the Falls Efficacy Scale-International Among Elderly Brazilians (FES-I-BRAZIL). Rev Bras Fisioter 2010;14(3):237-43. E para a avaliação individual da saúde foi perguntado: "Em geral você diria que sua saúde é: Excelente; Muito Boa; Boa; Ruim; Muito Ruim". 15

A dor/função do joelho e do quadril foram avaliadas pelo questionário algofuncional de Lequesne,19 sendo considerados os escores: 0 nenhum acometimento; 1-4 pouco acometimento; 5-7 acometimento moderado; 8-10 acometimento grave. A função e sintomas do pé e tornozelo foram avaliados pela escala Foot and Ankle Outcome Score (FAOS) com pontuação >75 pontos indicando boa função.20

Para verificar o nível de atividade física foi utilizado o Perfil de Atividade Humana (PAH), considerando: Ativo quando escore ajustado de atividades (EAA)>74; Moderadamente ativo quando 53<EAA<74 e Inativo quando EAA<53.21 O desempenho nas atividades da vida diária (AVD) foi avaliado com a Escala de Independência em Atividades da Vida Diária (Escala de Katz),2222. Lino VTS, Pereira SEM, Camacho LAB, Ribeiro Filho ST, Buksman S. Adaptação transcultural da Escala de Independência em Atividades da Vida Diária (Escala de Katz). Cad Saúde Pública 2008;24(1):103-12. considerando 6 pontos como independente; 4 pontos dependência moderada; 2 ou menos pontos muito dependente. As atividades instrumentais da vida diária (AIVD) foram avaliadas pela escala de Lawton, com escores que poderiam variar de 7 a 21, sendo que quanto maior o escore, melhor é o desempenho.23

A sensibilidade tátil foi avaliada na região do primeiro metacarpo e metatarso do membro dominante por meio de estesiômetro (Semmes-Weinstein(r)) com pressão feita lentamente até atingir força suficiente para curvar o filamento, seguindo parâmetros de referência do fabricante. Iniciou-se com filamento menos espesso (0,05 g), e a avaliada, com os olhos fechados, foi instruída a responder "sim" quando sentisse a pressão na pele, além de indicar o local em que sentiu a pressão do filamento.2424. Menz HB, Morris ME, Lord SR. Foot and ankle risk factors for falls in older people: a prospective study. J Gerontol Ser A Biol Sci Med Sci 2006;61(8):866-70.

Para analisar a força e potência muscular dos membros inferiores, a participante deveria levantar e sentar em uma cadeira, o mais rápido possível, com braços cruzados em frente ao corpo, repetindo cinco vezes. O tempo em segundos (s) que a idosa levou a partir da instrução verbal 'já' até finalizar o último movimento. Foram considerados como pontos de corte: 60 a 69 anos, 11,4 s; 70 a 79 anos, 12,6 s; 80 a 89, 12,7 s.25

A mobilidade funcional e risco de quedas foram avaliados por meio do timed up and go (TUG), que consistiu em levantar-se de uma cadeira sem a ajuda dos braços e andar em ritmo confortável e seguro a uma distância de três metros, dar a volta, retornar e sentar.26 Ao iniciar o teste a participante permaneceu com dorso no encosto da cadeira, devendo retornar a esta posição ao final do teste. O tempo (s) foi cronometrado e considerados os escores: 60-69 anos, 8,1 s; 70-79 anos, 9,2 s; 80-99 anos, 11,3 s.2626. Bohannon RW. Reference values for the timed up and go test: a descriptive meta-analysis. J Geriatr Phys Ther 2006;29(2):64-8.

O teste dos passos de Fukuda foi realizado para investigação de disfunção vestibular.27 A idosa ficou em pé, com olhos fechados e deu 50 passos, em local demarcado no chão. Se a participante apresentasse deslocamento maior que 0,5 m, medido com fita métrica, e/ou ângulo de rotação lateral maior que 30 graus, mensurado com goniômetro (CARCI(r)), após a realização do teste, haveria indicativo de desequilíbrio do sistema vestibular.27

Foi utilizada esteira (Gait Trainer 2- BIODEX) para avaliação da velocidade da marcha (m/s), comprimento da passada (m) e cadência (passos/minuto). As participantes foram instruídas a deambular na esteira por três minutos, com a velocidade calculada a partir do resultado do teste de VM em 10 m, realizado anteriormente. Foram realizadas duas tentativas com intervalo de dois minutos entre elas: a primeira foi de familiarização e a segunda os valores foram utilizados para análise.28

Na análise da avaliação individual de saúde, cada alternativa recebeu um valor numérico de forma decrescente (excelente 4, muito boa 3, boa 2, ruim 1, muito ruim 0) e avaliados por frequência absoluta e relativa. Para análise, considerou-se: escolaridade (analfabeto: 0; 1-4 anos: 1; 5-8 anos: 2; >8 anos: 3); situação conjugal (casado 1, desquitado 2, divorciado 4, viúvo 5, solteiro 6); ocupação (aposentado com outra ocupação 1, aposentado sem outra ocupação 2; trabalhos domésticos 3, trabalhos fora do domicilio 4); renda [até dois salários mínimos (SM) 1, até cinco SM 2, até 10 SM 3, até 20 SM 4]; local de residência (casa térrea 1, casa duplex 2, apartamento 3); atividades sociais (sim 1, não 0); acuidade auditiva (normal 1, déficit auditivo 2, usa corretores 3); continência fecal e urinária (sim 1, não 0); sono (normal 0, distúrbio de sono 1).

Fatores extrínsecos relacionados às quedas

As participantes também foram questionadas quanto à presença de riscos e recursos de segurança em suas residências tais como: escadas; adesivo antiderrapante nas escadas; barras de apoio nas escadas (corrimão); rampas; adesivo antiderrapante nas rampas; barras de apoio nas rampas; desnível no chão (obstáculo que precise passar por cima); tapetes soltos no chão; apoio antiderrapante para tapetes; tacos de madeira soltos no chão; cabos, fios (extensões) pelo caminho; piso escorregadio; luzes fracas (que dificultam a visão); chão do banheiro escorregadio quando molhado; barras de apoio nos banheiros; cama mais alta; cadeira mais alta; vaso sanitário mais alto; animais domésticos soltos; objetos soltos no chão.22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.

Análise estatística

A normalidade dos dados foi avaliada pelo teste Shapiro-Wilk e os resultados apresentados em estatística descritiva (média, desvio-padrão, mediana, mínimo e máximo), de acordo com a natureza da variável.

Para comparações entre idosas caidoras e não caidoras foi realizado o teste t independente.

Foram consideradas variáveis dependentes a cadência; velocidade da marcha; comprimento do passo; força de preensão manual; potência (teste de sentar e levantar); mobilidade (TUG) e como independentes as características demográficas; antropométricas; clínicas; funcionais; o medo de cair; massa muscular e fatores residenciais.

Para analisar a relação entre as variáveis, foi utilizado o teste de Correlação de Pearson ou Spearman, para variáveis paramétricas e não paramétricas, respectivamente. Ainda, quando foi observada correlação moderada-alta (r>0,30) e/ou significativa (p<0,05) realizou-se regressão linear e múltipla.

As análises estatísticas foram realizadas nos programas Excel(r) e Statistica 12 (StastSoft) e considerou-se como nível de significância p<0,05.

RESULTADOS

Inicialmente, 99 idosas foram contatadas; entretanto, cinco não se interessaram em participar da pesquisa; três foram excluídas por hipertensão não controlada; cinco desistiram da pesquisa e uma iniciou tratamento de saúde. Desta forma, foram incluídas neste estudo 85 idosas, com idade média de 70 anos, classificadas com sobrepeso de acordo com os valores do IMC 28(±4,53) kg/m² e moderadamente ativas de acordo com o escore do PAH 62(±9,67) pontos. As participantes foram ainda estratificadas em caidoras (n=24; 28,23%) e não caidoras (n=61; 71,76%), de acordo com a ocorrência de quedas nos últimos 12 meses. As características demográficas, antropométricas, clínicas e funcionais estão descritas no quadro 1.

Quadro 1
Características demográficas, antropométricas, clínicas e funcionais das idosas caidoras e não caidoras. Curitiba-PR, 2015.

Dentre as características demográficas, antropométricas, clínicas e funcionais, foi encontrada diferença significativa entre idosas caidoras e não caidoras para as variáveis: ocupação (p=0,003), participação em atividades sociais (p=0,004) e incontinência urinária (p=0,02).

Não foi observada diferença significativa entre os grupos caidoras e não caidoras para nenhum dos fatores intrínsecos relacionados ao risco de quedas (potência muscular; FPM; mobilidade funcional; dor/função articular; função vestibular; habilidades sensório-motoras; acuidade visual; função cognitiva; parâmetros da marcha; medo de cair e depressão), como demonstrado na tabela 1.

Tabela 1
Mobilidade funcional, potência, risco de quedas, medo de cair e marcha das idosas caidoras e não caidoras. Curitiba-PR, 2015.

Triagem de sarcopenia

Foi observado que ambos os grupos não apresentaram indicativos de sarcopenia (quadro 2), uma vez que os valores dos testes de VM, FPM e CP estão dentro da normalidade.

Quadro 2
Triagem de sarcopenia das idosas caidoras e não caidoras. Curitiba-PR, 2015.

Entretanto, a massa muscular de MMSS e de MMII, bem como o IMMA de ambos os grupos apresentaram-se abaixo dos valores de referência, mas sem diferenças estatísticas entre as idosas caidoras e não caidoras.

Correlações musculoesqueléticas das idosas caidoras e não caidoras

Na análise entre massa muscular dos MMSS com a FPM foi encontrada baixa correlação significativa (r=0,26; p=0,04) entre as idosas não caidoras. No entanto, não houve correlação significativa (r=0,17; p=0,23) para as idosas caidoras. A análise de regressão linear apontou que apenas 0,6% da massa muscular pode explicar a FPM de idosas não caidoras (r22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.=0,006 e p=0,004).

Verificou-se correlação moderada e significativa entre a FPM e a VM, tanto das idosas não caidoras (r=0,47; p=0,001) como das idosas caidoras (r= 0,54; p=0,03), indicando que quanto melhor a FPM maior a velocidade da marcha. A regressão linear entre a FPM e a VM das idosas caidoras foi r22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.=0,29 e p=0,005 para as caidoras e r22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.=0,22 e p=0,0001 para as não caidoras. Esses valores demonstram que 29% da FPM pode influenciar a VM nas caidoras e 22% nas não caidoras.

Foi observada correlação moderada, negativa e significativa (r=-0,52; p=0,03) entre a FES-I-Brasil e a cadência da marcha de idosas caidoras, indicando que quanto maior a cadência da marcha menor foi o medo de cair. A regressão linear dessas variáveis resultou em r22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.=0,25 e p=0,004, indicando que 25% da cadência da marcha pode interferir no medo de cair em idosas caidoras.

Na regressão linear múltipla entre a FPM, FES-I-Brasil e VM verificou-se que 53% (r22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.= 0,53; p=0,0003) e 31% (r22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.=0,31; p=0,0001) da FPM e do medo de cair (FES-I-Brasil) explicam a VM nas idosas caidoras e não caidoras, respectivamente.

Os resultados das correlações musculoesqueléticas estão na tabela 2.

Tabela 2
Correlações musculoesqueléticas das idosas caidoras e não caidoras. Curitiba-PR, 2015.

Fatores extrínsecos/ambientais relacionados ao risco de quedas

A análise dos fatores extrínsecos relacionados ao risco de quedas mostrou as seguintes diferenças estatisticamente significativas, entre as residências de ambos os grupos: presença de escadas; presença de tapetes e presença de tacos de madeira soltos no chão. As idosas caidoras não relataram a presença de fios e extensões pelo caminho e 6,55% das não caidoras disseram ter esse item. As não caidoras relataram ter vasos sanitários altos em suas residências e as caidoras não reportaram esse item. Os resultados estão apresentados na tabela 3.

Tabela 3
Fatores extrínsecos relacionados ao risco de quedas em idosos. Curitiba-PR, 2015.

DISCUSSÃO

As idosas da comunidade avaliadas no presente estudo apresentavam média de idade de 71 anos, nível de escolaridade acima de oito anos, estado cognitivo preservado, aposentadas com outra ocupação, renda média de até dois salários mínimos, situação conjugal viúvas, acuidade visual e auditiva adequadas, independentes para as AVDs e AIVDs.

Considerando os métodos para triagem de sarcopenia propostos pelo Consenso Europeu de Sarcopenia,14 tanto as idosas caidoras quanto as não caidoras não apresentaram indicadores de risco. Entretanto, quando avaliadas por um método mais preciso como DXA, pôde-se observar que os valores de massa muscular estavam abaixo dos recomendados para a faixa etária,1111. Coin A, Sarti S, Ruggiero E, Giannini S, Pedrazzoni M, Minisola S, et al. Prevalence of sarcopenia based on different diagnostic criteria using DEXA and appendicular skeletal muscle mass reference values in an italian population aged 20 to 80. J Am Med Dir Assoc 2013;14(7):507-12.,1414. Cruz-jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing 2010;39(4):412-23. mesmo sem alteração na função musculoesquelética e desempenho físico.1414. Cruz-jentoft AJ, Baeyens JP, Bauer JM, Boirie Y, Cederholm T, Landi F, et al. Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis. Age Ageing 2010;39(4):412-23.,1515. Studenski S, Perera S, Patel K, Rosano C, Faulkner K, Inzitari M, et al. Gait speed and survival in older adults. JAMA 2011;305(1):50-8.,2626. Bohannon RW. Reference values for the timed up and go test: a descriptive meta-analysis. J Geriatr Phys Ther 2006;29(2):64-8. Desta forma, ressalta-se a importância da realização de avaliações mais acuradas para prevenção de sarcopenia.

Com relação às quedas, mesmo as participantes sendo classificadas como moderadamente ativas (frequência média de atividade física duas vezes na semana), encontrou-se ocorrência de quedas de 28%, semelhante ao encontrado em outro estudo brasileiro.3131. Cruz DT, Ribeiro LC, Vieira MT, Teixeira MTB, Bastos RR, Leite ICG. Prevalência de quedas e fatores associados em idosos. Rev Saúde Pública 2012;46(1):138-46. Quando foram investigados os fatores intrínsecos relacionados ao risco de quedas, tais como: potência; força muscular; mobilidade funcional; dor; função vestibular; habilidades sensório-motoras; acuidade visual; função cognitiva; marcha; medo de cair e depressão não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas, quando se comparou as idosas caidoras com as não caidoras.7,31

Entretanto, verificou-se que fatores extrínsecos como a presença de escadas, tapetes e tacos soltos pela casa estavam presentes nas casas das idosas caidoras quando comparadas às casas das não caidoras. Uma revisão com meta-análise sobre os efeitos de fatores ambientais sobre o risco de quedas em idosos concluiu que intervenções residenciais devem fazer parte do planejamento para prevenção de quedas. Além disso, quando as intervenções residenciais são bem compreendidas pelos idosos e adotadas como medidas de segurança, verificou-se redução significativa do número de quedas em idosos.22. Clemson L, Mackenzie L, Ballinger C, Close JC, Cumming RG. Environmental interventions to prevent falls in community-dwelling older people: A meta-analysis of randomized trials. J Aging Health 2008;20(8):954-71.

Com relação às características das participantes, observou-se que 76% das idosas apresentaram visão normal e 72% audição normal. Estes dados são contrários àqueles observados por outros autores que reportaram 61% dos idosos com acuidade visual ruim ou regular e 31% com acuidade auditiva ruim ou regular e frequência de quedas de 31%.31 Estes desfechos podem indicar que mesmo a acuidade visual e auditiva sendo consideradas como fatores intrínsecos relacionados ao risco de quedas, em idosas comunitárias moderadamente ativas, com acuidade visual e auditiva normais, observados neste estudo, a ocorrência de quedas foi semelhante as idosas da comunidade que apresentaram deficits.31 Portanto, pode-se sugerir que acuidade visual e auditiva não são fatores determinantes para o risco de quedas em idosas ativas da comunidade.

Apesar de a maioria das idosas terem apresentado continência urinária, encontrou-se diferença significativa entre não caidoras (90%) e caidoras (70%). Borges et al.,3232. Borges PLC, Bretas RP, Azevedo SF, Barbosa JMM. Perfil dos idosos frequentadores de grupos de convivência em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. Cad Saúde Pública 2008;24(12):2798-808. em estudo do perfil de 197 idosos participantes de grupos de convivência, encontraram frequência de 57% de incontinência urinária. Neste estudo, apenas 15% da amostra relatou incontinência urinária. Assim, pressupõe-se que a incontinência urinária não seja determinante para quedas em idosas comunitárias independentes ativas, já que se observou 28% de ocorrência de quedas na pesquisa atual e 36% no estudo citado anteriormente.32

A mobilidade funcional/risco de quedas, avaliada pelo TUG, não indicou diferença estatística entre os grupos. Este resultado também foi observado por estudo que avaliou idosas com idade entre 74 e 89 anos e que não encontrou diferenças significativas entre mulheres caidoras e não caidoras para o desempenho no TUG.33 Os autores indicaram que a ausência de diferença na faixa etária de 74-89 anos poderia ser explicada pelo baixo número de participantes com deficit de mobilidade, concordando com os desfechos do presente estudo.33 Portanto, sugere-se que o TUG não seja utilizado para triagem de risco de quedas em idosas comunitárias moderadamente ativas, já que os resultados do TUG entre os grupos ficaram muito próximos (7,64 s não caidoras e 7,94 s caidoras).

Quanto ao medo de cair, considerado um dos fatores psicológicos relacionados ao risco de quedas, as idosas apresentaram escore médio de 25, sendo identificada associação com histórico de queda esporádica.11. Camargos FF, Dias RC, Dias JF, Freire MT. Cross-cultural adaptation and evaluation of the psychometric properties of the Falls Efficacy Scale-International Among Elderly Brazilians (FES-I-BRAZIL). Rev Bras Fisioter 2010;14(3):237-43. Esse dado é interessante porque as idosas não caidoras apresentaram o mesmo escore médio das caidoras. De fato, em estudo recente, Kumar et al.34 apontam que uma a cada cinco pessoas, relativamente ativas e viventes na comunidade, relatam medo de cair e que este está associado a: baixo nível educacional; maior IMC; menor renda familiar; dificuldade em utilizar transportes públicos; fazer uso de recurso auxiliar (bengalas, andadores) para caminhar; baixa percepção de saúde física; problemas de equilíbrio autorrelatados e incapacidade de levantar de uma cadeira na altura dos joelhos.

Reelick et al.44. Reelick MF, Van Iersel MB, Kessels RP, Rikkert MG. The influence of fear of falling on gait and balance in older people. Age Ageing 2009;38(4):435-40. avaliaram o medo de cair, VM, comprimento e variabilidade da passada de idosos comunitários de ambos os sexos e observaram que idosos diagnosticados com medo de cair apresentaram desempenho semelhante em todas as variáveis supracitadas quando comparados aos idosos sem medo de cair. Os resultados do presente estudo, em parte, concordam com a pesquisa citada,4 quando foi avaliada a correlação entre o TUG e o medo de cair, não sendo encontrada associação significativa.

No presente estudo observou-se correlação moderada, negativa e significativa entre a FES-I-Brasil e a cadência da marcha nas idosas caidoras, indicando que quanto maior o medo de cair, pior a cadência da marcha. Em estudo recente também se verificou associação moderada negativa significativa entre o medo de cair, avaliado pela FES-I-Brasil e a velocidade da marcha em 4,6 m.30 Esses autores apontam que a VM lenta, com menor comprimento do passo, maior base de suporte e maior tempo de duplo apoio podem estar associadas com medo preexistente de queda. Outros autores também relataram que o medo de cair pode resultar em recrutamento simultâneo dos músculos agonistas e antagonistas, resultando em rigidez postural, marcha anormal, estratégias posturais inadequadas, insegurança, dependência de dispositivos que garantam estabilidades (como órteses) e aumento do risco de quedas.55. Delbaere K, Sturnieks DL, Crombez G, Lord SR. Concern about falls elicits changes in gait parameters in conditions of postural threat in older people. J Gerontol Ser A Biol Sci Med Sci 2009;64(2):237-42.

Foi observada correlação significativa moderada entre a FPM e a VM, tanto para idosas não caidoras como para idosas caidoras, indicando que quanto maior a FPM melhor a velocidade da marcha. Esse achado corrobora o estudo de Stevens et al.,3535. Stevens P, Syddall HE, Patel HP, Martin HJ, Cooper C, Aihie Sayer A. Is grip strength a good marker of physical performance among community-dwelling older people? J Nutr Health Aging 2012;16(9):769-74. que avaliou 349 homens e 280 mulheres com idade entre 63 e 73 anos e identificaram associações entre maior FPM e melhor desempenho no teste de caminhada de três metros. Esses autores apontam que a FPM é um bom marcador de desempenho físico nessa faixa etária e pode ser mais viável do que completar uma bateria de testes de desempenho físico em algumas situações clínicas.35 No entanto, neste estudo não foram observadas diferenças entre caidoras e não caidoras, indicando que apesar da correlação entre FPM e VM ter sido significativa, esta não foi sensível para identificar caidoras.

Os resultados da análise da marcha pela esteira não mostraram diferença estatisticamente significativa entre ambos os grupos. Estudo prospectivo de Moreira et al.,30 para determinar se os parâmetros espaço-temporais da marcha poderiam prever quedas recorrentes em 148 mulheres idosas de 65 a 85 anos, mostraram que nem a VM e nem os outros parâmetros da marcha (cadência, comprimento do passo, tempo de balanço e tempo de apoio) analisados predisseram significativamente quedas recorrentes. Esses autores sugerem que estudos futuros devem investigar a capacidade de parâmetros da marcha prever quedas recorrentes em idosos saudáveis sem deficiência de mobilidade em situações de "vida real", como caminhar por cima de obstáculos ou execução de tarefas cognitivas e motoras (por exemplo, falar, fazer cálculos ou carregar objetos). É possível que tarefas mais desafiadoras possam colocar maior pressão sobre os sistemas fisiológicos e cognitivos sendo mais informativo sobre quedas recorrentes e risco. Desta forma, para estudos futuros sugerem-se avaliações da marcha com desafios, para idosas moderadamente ativas da comunidade, de maneira a investigar as diferenças da marcha de caidoras e não caidoras.

Ainda, uma possível limitação sobre a análise da marcha neste estudo foi a caminhada em esteira motorizada. Segundo Kang & Dingwell,28 a avaliação em esteira pode reduzir artificialmente a variabilidade natural da marcha, comparada com caminhar no solo, porque a velocidade de caminhada é rigorosamente aplicada, não podendo haver ajustes. No presente estudo, algumas (n=8) participantes não conseguiram caminhar na velocidade proposta para a avaliação da marcha em esteira e pediram para cancelar o teste, alegando que "a velocidade estava muito rápida" e 13 idosas não puderam comparecer no dia da avaliação. Por estes motivos o número de idosas avaliadas na esteira foi inferior as 85 incluídas neste estudo.

Os desfechos apontam que, para avaliar os fatores intrínsecos relacionados às quedas em idosas moderadamente ativas da comunidade, tais métodos não apresentaram especificidade para diferenciar caidoras de não caidoras, indicando a necessidade do uso de métodos mais precisos para este tipo de investigação. Além disso, no presente estudo não foram avaliados alguns fatores intrínsecos, como a amplitude de movimento, equilíbrio e tempo de reação muscular. Portanto, sugere-se que esses fatores sejam investigados de maneira mais aprofundada, para melhor caracterização de idosas da comunidade ativas caidoras e não caidoras. Por outro lado, ressaltam-se as diferenças significativas encontradas entre as residências de idosas caidoras e não caidoras. Assim, os fatores extrínsecos parecem ter importante influência para quedas e devem ser considerados em futuros estudos.

Outras limitações devem ser consideradas, como o delineamento transversal do estudo, que impossibilita estabelecer relação de causalidade. O fato do número de quedas ter sido subestimado, devido as dificuldades de idosos lembrarem-se de um episódio de queda nos últimos 12 meses. Além disso, as circunstâncias das quedas não foram investigadas, por exemplo: onde ocorreu a queda, dentro ou fora de casa? Por que caiu? Conseguiu apoiar ou caiu direto no chão? Sugere-se que futuros estudos investiguem tais fatores.

CONCLUSÃO

A massa muscular apendicular apresentou-se abaixo dos pontos de corte, porém, com a função muscular e desempenho físico normais, caracterizando as idosas como não sarcopênicas. Maior força muscular indicou melhor velocidade da marcha. Idosas caidoras apresentaram pior cadência da marcha e maior medo de cair em relação as não caidoras. Os fatores residenciais relacionados aos riscos e recursos de segurança foram determinantes para as quedas, indicando relevância para avaliação do risco de cair em idosas da comunidade moderadamente ativas.

AGRADECIMENTOS

Ao prof. Oslei de Mattos da Universidade Tecnológica Federal do Paraná; ao CNPq pela bolsa produtividade da profa. Anna Raquel Silveira Gomes (processo nº 308696/2012-3); ao Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná, especialmente ao Serviço de Prevenção e Reabilitação Funcional e Unidade Metabólica; à Universidade Aberta da Maturidade da Universidade Federal do Paraná e ao Instituto Federal do Paraná pelo auxílio financeiro à pesquisa disponibilizado à profa. Elisângela Valevein Rodrigues.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    02 Mar 2015
  • Revisado
    16 Nov 2015
  • Aceito
    01 Mar 2016
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