Acessibilidade / Reportar erro

Efeito da exposição à fumaça de cigarro durante a prenhez e a lactação de ratas e sua prole sobre parâmetros séricos e morfométricos

Effect of cigarette smoke exposure during pregnancy and lactation of rats and the offspring on the serum and morphometric parameters

Resumos

OBJETIVO: investigar o efeito da exposição à fumaça de cigarro durante os períodos de prenhez e lactação de ratas sobre o ganho de peso corpóreo e tecidual, parâmetros séricos e produção láctea, bem como a repercussão na prole, desde o nascimento até o período jovem adulto. MÉTODOS: 40 ratas Wistar prenhes foram divididas em quatro grupos: CG - não expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da gestação; CL - não expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da lactação; FG - expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da gestação; FL - expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da lactação. As proles foram separadas por sexo e dividas conforme o grupo de suas mães, sendo sacrificadas na fase jovem adulto. Nas ratas e nas proles foram avaliados peso tecidual, peso corpóreo e parâmetros séricos. Foi também analisada a produção láctea por filhote. RESULTADOS: o peso corpóreo de ratas estava diminuído no grupo FL durante a lactação (CL=267,0±7,2; FL=235,5±7,2 g*,*p<0,05). Não foi detectado tecido adiposo nos grupos CL e FL, porém, em FG, esse tecido estava reduzido comparado ao CG (CG=3,3±0,3; FG=2,4±0,3 g*, *p<0,05). As ratas expostas à fumaça de cigarro apresentaram maiores valores de glicemia (CG=113±17, CL=86±16, FG=177±21*, FL=178±23 mg/dL*, *p<0,05 CG versus FG e CL versus FL). Os grupos CL e FL apresentaram menor valor de colesterol-HDL, sem alteração no colesterol total. Por fim, as ratas expostas à fumaça de cigarro tiveram a produção láctea inferior comparadas às não expostas (CL=6,7±0,4, FL=5,4±0,3 g*, *p<0,05). Nas proles das ratas FG e FL observou-se diminuição do PC desde o nascimento até a fase jovem adulto, porém não houve alteração nos pesos de gastrocnêmio, fígado e coração de todos os grupos, e o tecido adiposo não foi detectado em proles fêmeas. Houve aumento na glicemia da prole de ratas expostas à fumaça de cigarro em ambos os sexos (machos: Pcg=107±10,5, Pcl=115±8,6, Pfg=148±16,8*, Pfl=172±11,2**; fêmeas: Pcg=109±27,2, Pcl=104±9,7, Pfg=134±20,0*, Pfl=126±13,3**; p<0,05 Pcg versus Pfg e Pcl versus Pfl). CONCLUSÕES: a exposição à fumaça de cigarro durante a prenhez e a lactação acarretou prejuízos morfométricos e séricos tanto nas mães como nas proles, o que persistiu até a fase jovem adulta.

Tabagismo; Prenhez; Lactação; Animais recém-nascidos; Homeostase


PURPOSE: to investigate the effect of cigarette smoke exposure on body and tissue weight gain, serum parameters and milk yield during pregnancy and lactation in rats, and the impact on offspring from birth toil young adulthood. METHODS: 40 Wistar pregnant rats were randomly divided into: CG - not exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of pregnancy; CL - not exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of lactation; FG - exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of pregnancy; FL - exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of lactation. The offspring were separated by gender and divided according to their mothers' groups. Tissue weight, body weight and serum parameters were evaluated in rats and offspring. Milk yield per pup was calculated. RESULTS: body weight was decreased in FL during lactation (CL=267.0±7.2; FL=235.5±7.2 g*,*p<0.05). Adipose tissue was not detected in the CL and FL groups, and was reduced in FG compared to CG (CG=3.3±0.3; FG=2.4±0.3 g*, *p<0.05). Rats exposed to cigarette smoke had higher blood glucose levels (CG=113±17, CL=86±16, FG=177±21*, FL=178±23 mg/dL*, *p<0.05 CG versus FG e CL versus FL), CL and FL groups presented lower HDL-cholesterol with no change in total cholesterol. Finally, rats exposed to cigarette smoke had lower milk yield compared to unexposed rats (CL=6.7±0.4, FL=5.4±0.3 g*, *p<0.05). In offspring from the FG and FL groups, there was a decrease of body weight from birth to young adulthood, with no changes in gastrocnemius, liver or heart weights in any group, and adipose tissue was no detected in female offspring. There was an increase in blood glucose in offspring of both sexes from rats exposed to cigarette smoke (males: Pcg=107±10.5, Pcl=115±8.6, Pfg=148±16.8*, Pfl=172±11.2**; females: Pcg=109±27.2, Pcl=104±9.7, Pfg=134±20.0*, Pfl=126±13.3**; p<0.05 *Pcg versus Pfg and **Pcl versus Pfl). CONCLUSIONS: exposure to cigarette smoke provokes impairment of morphometric and serum parameters during pregnancy and lactation both in mothers and offspring, which is maintained during young adulthood.

Smoking; Pregnancy, animal; Lactation; Animals, newborn; Homeostasis


ARTIGO ORIGINAL

Efeito da exposição à fumaça de cigarro durante a prenhez e a lactação de ratas e sua prole sobre parâmetros séricos e morfométricos

Effect of cigarette smoke exposure during pregnancy and lactation of rats and the offspring on the serum and morphometric parameters

Patrícia Rodrigues Lourenço GomesI; Patricia Monteiro SeraphimII

IPós-graduanda (Mestrado) em Fisioterapia pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquista Filho" – UNESP – Presidente Prudente (SP), Brasil

IIProfessora Doutora do Departamento de Fisioterapia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquista Filho" – UNESP – Presidente Prudente (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Patricia Monteiro Seraphim Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquista Filho" – UNESP Rua Roberto Simonsen, 305 CEP: 19060-900 – Presidente Prudente (SP), Brasil. E-mail: patricia@fct.unesp.br

RESUMO

OBJETIVO: investigar o efeito da exposição à fumaça de cigarro durante os períodos de prenhez e lactação de ratas sobre o ganho de peso corpóreo e tecidual, parâmetros séricos e produção láctea, bem como a repercussão na prole, desde o nascimento até o período jovem adulto.

MÉTODOS: 40 ratas Wistar prenhes foram divididas em quatro grupos: CG – não expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da gestação; CL – não expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da lactação; FG – expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da gestação; FL – expostas à fumaça de cigarro e sacrificadas ao término da lactação. As proles foram separadas por sexo e dividas conforme o grupo de suas mães, sendo sacrificadas na fase jovem adulto. Nas ratas e nas proles foram avaliados peso tecidual, peso corpóreo e parâmetros séricos. Foi também analisada a produção láctea por filhote.

RESULTADOS: o peso corpóreo de ratas estava diminuído no grupo FL durante a lactação (CL=267,0±7,2; FL=235,5±7,2 g*, *p<0,05). Não foi detectado tecido adiposo nos grupos CL e FL, porém, em FG, esse tecido estava reduzido comparado ao CG (CG=3,3±0,3; FG=2,4±0,3 g*, *p<0,05). As ratas expostas à fumaça de cigarro apresentaram maiores valores de glicemia (CG=113±17, CL=86±16, FG=177±21*, FL=178±23 mg/dL*, *p<0,05 CG versus FG e CL versus FL). Os grupos CL e FL apresentaram menor valor de colesterol-HDL, sem alteração no colesterol total. Por fim, as ratas expostas à fumaça de cigarro tiveram a produção láctea inferior comparadas às não expostas (CL=6,7±0,4, FL=5,4±0,3 g*, *p<0,05). Nas proles das ratas FG e FL observou-se diminuição do PC desde o nascimento até a fase jovem adulto, porém não houve alteração nos pesos de gastrocnêmio, fígado e coração de todos os grupos, e o tecido adiposo não foi detectado em proles fêmeas. Houve aumento na glicemia da prole de ratas expostas à fumaça de cigarro em ambos os sexos (machos: Pcg=107±10,5, Pcl=115±8,6, Pfg=148±16,8*, Pfl=172±11,2**; fêmeas: Pcg=109±27,2, Pcl=104±9,7, Pfg=134±20,0*, Pfl=126±13,3**; p<0,05 Pcg versus Pfg e Pcl versus Pfl).

CONCLUSÕES: a exposição à fumaça de cigarro durante a prenhez e a lactação acarretou prejuízos morfométricos e séricos tanto nas mães como nas proles, o que persistiu até a fase jovem adulta.

Palavras-chave: Tabagismo/efeitos adversos; Prenhez; Lactação; Animais recém-nascidos; Homeostase.

ABSTRACT

PURPOSE: to investigate the effect of cigarette smoke exposure on body and tissue weight gain, serum parameters and milk yield during pregnancy and lactation in rats, and the impact on offspring from birth toil young adulthood.

METHODS: 40 Wistar pregnant rats were randomly divided into: CG – not exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of pregnancy; CL – not exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of lactation; FG – exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of pregnancy; FL – exposed to cigarette smoke and sacrificed at the end of lactation. The offspring were separated by gender and divided according to their mothers' groups. Tissue weight, body weight and serum parameters were evaluated in rats and offspring. Milk yield per pup was calculated.

RESULTS: body weight was decreased in FL during lactation (CL=267.0±7.2; FL=235.5±7.2 g*, *p<0.05). Adipose tissue was not detected in the CL and FL groups, and was reduced in FG compared to CG (CG=3.3±0.3; FG=2.4±0.3 g*, *p<0.05). Rats exposed to cigarette smoke had higher blood glucose levels (CG=113±17, CL=86±16, FG=177±21*, FL=178±23 mg/dL*, *p<0.05 CG versus FG e CL versus FL), CL and FL groups presented lower HDL-cholesterol with no change in total cholesterol. Finally, rats exposed to cigarette smoke had lower milk yield compared to unexposed rats (CL=6.7±0.4, FL=5.4±0.3 g*, *p<0.05). In offspring from the FG and FL groups, there was a decrease of body weight from birth to young adulthood, with no changes in gastrocnemius, liver or heart weights in any group, and adipose tissue was no detected in female offspring. There was an increase in blood glucose in offspring of both sexes from rats exposed to cigarette smoke (males: Pcg=107±10.5, Pcl=115±8.6, Pfg=148±16.8*, Pfl=172±11.2**; females: Pcg=109±27.2, Pcl=104±9.7, Pfg=134±20.0*, Pfl=126±13.3**; p<0.05 *Pcg versus Pfg and **Pcl versus Pfl).

CONCLUSIONS: exposure to cigarette smoke provokes impairment of morphometric and serum parameters during pregnancy and lactation both in mothers and offspring, which is maintained during young adulthood.

Keywords: Smoking/adverse effects; Pregnancy, animal; Lactation; Animals, newborn; Homeostasis.

Introdução

A exposição à fumaça de cigarro durante a gravidez é um dos mais importantes fatores de risco modificáveis para o desenvolvimento fetal. Estudos epidemiológicos demonstram que a exposição materna à fumaça de cigarro dobra a chance de ocorrência de baixo peso ao nascer no concepto, é responsável por 8% dos partos prematuros, 5% de todas as mortes perinatais, pode contribuir para a síndrome da morte súbita do bebê, alterações no desenvolvimento do sistema nervoso fetal e predispor o aparecimento de diabetes tipo 2, hiperinsulinemia e disipidemias1,2.

Além de alterações sobre o concepto, a exposição à fumaça de cigarro durante a gestação pode acarretar danos à saúde materna. Experimentos em animais demonstraram que a exposição à nicotina, a níveis representativos para mulheres que fumam ou usam terapia de reposição de nicotina, resulta em prejuízos na homeostasia glicídica, associados à hiperinsulinemia e à dislipidemia3,4. Assim, considerando que o tabagismo é hoje um dos principais problemas de saúde pública, com notória participação no aumento ou agravamento de diversas doenças, o presente estudo investigou o efeito da exposição à fumaça de cigarro sobre o ganho de peso corporal e tecidual, parâmetros séricos e produção láctea em ratas durante os períodos de prenhez e lactação, bem como a repercussão na prole, do nascimento até o período de jovem adulto.

Métodos

Animais

Realizou-se um estudo experimental utilizando 40 ratas Wistar, virgens, com dois meses de idade, alocadas em gaiolas coletivas na proporção de duas ratas e um rato, durante cinco dias para o acasalamento, de modo que todos os animais passassem pelo período estro. Posteriormente, as ratas foram alocadas individualmente, de acordo com a separação dos grupos experimentais, até o momento do sacrifício.

Todos os animais permaneceram no biotério da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquista Filho" (UNESP) de Presidente Prudente, em sala com temperatura de 22±2ºC e ciclo claro-escuro (12 horas claro: 12 horas escuro) controlados; foram fornecidas água ad libitum e ração padrão (Supra Lab, Alisul Ind. Alimentos. Ltda., RS). O procedimento experimental foi aprovado pelo Comitê de Ética para Pesquisa Animal da instituição (protocolo nº 296/2008) e está de acordo com as normas do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA).

Desenho experimental

As ratas prenhes foram separadas em quatro grupos: CG – grupo não exposto à fumaça de cigarro e sacrificado no fim da prenhez com sua prole adotada pelo grupo CL; CL: grupo não exposto à fumaça de cigarro e sacrificado ao final da lactação; FG: grupo exposto à fumaça de cigarro e sacrificado ao fim da prenhez com sua prole adotada pelo grupo FL; FL: grupo exposto à fumaça de cigarro e sacrificado ao final da lactação.

As proles foram separadas por sexo e divididas em: Pcg: prole das ratas não expostas à fumaça de cigarro sacrificadas no fim da prenhez; Pcl: prole das ratas não expostas à fumaça de cigarro sacrificadas no fim da lactação; Pfg: prole das ratas expostas à fumaça de cigarro sacrificadas no fim da prenhez; e Pfl: prole das ratas expostas à fumaça de cigarro sacrificadas no fim da lactação.

Protocolo de exposição à fumaça

As ratas dos grupos FG e FL foram submetidas a um protocolo de exposição à fumaça de 4 cigarros, por 30 minutos, 2 vezes ao dia, 5 dias por semana durante 3 períodos: pré prenhez (15 dias, grupo FG e FL), prenhez (21 a 25 dias, grupo FG e FL) e lactação (21 dias, grupo FL). Essa dose, totalizando um cigarro por dia, por animal, foi determinada por estudos prévios e relatada como a dose equivalente consumida por humanos fumantes crônicos, que é de 10 a 20 cigarros por dia5.

Obtenção das amostras

No dia do sacrifício, todos os animais foram anestesiados com xilazina (40 mg/kg, i.p. nas ratas; 20 mg/kg, i.p. nas proles) e ketamina (40 mg/kg, i.p. nas ratas; 20 mg/kg, i.p. nas proles). Foi coletado sangue da veia cava inferior para análise plasmática de glicemia, colesterol total e colesterol-HDL, por colorimetria, seguindo instruções do manufaturante (Bioclin, Quibasa, Brasil). Foram extraídos tecido adiposo branco, músculo esquelético gastrocnêmio, fígado e coração para pesagem e comparação entre os grupos. Todos os animais foram sacrificados entre 14h00 e 16h00, em mesmo estado metabólico, após seis a oito horas de jejum. A mensuração do peso corpóreo nas ratas foi realizada por meio da média de cada período reprodutivo: pré-prenhez, prenhez e lactação; nas proles, os pesos foram medidos por meio da média de cada período analisado: nascimento, primeiro e segundo mês de vida. A produção láctea foi calculada usando a fórmula estabelecida por Sampson e Jansen6, (yieldpup= 0,0322+0,0667 (weight)+0,877 (gain); onde yieldpup é a produção de leite por filhote por dia (g/filhote/dia), weight é o peso do filhote (g/dia) e gain é o ganho de peso diário por filhote (g/dia).

Análise dos dados

As análises morfométricas, séricas e da produção láctea foram feitas de modo que os grupos CG e CL foram padronizados como controles dos grupos FG e FL, respectivamente. Para isso, foi utilizado ANOVA one way, com pós-teste Bonferroni, usando GraphPad InStat Version 3.01 (GraphPad Software, San Diego, CA, USA). Todos os valores foram expressos em média±erro padrão da média (EPM) e as diferenças entre os grupos foram consideradas significantes quando o valor de p fosse menor que 0,05.

Resultados

A Tabela 1 apresenta os dados de peso corpóreo das ratas, que foi analisado nos períodos reprodutivos (pré-prenhez, prenhez e lactação) e a produção láctea por filhote. A partir dos resultados obtidos, foi possível observar diferença no peso corpóreo somente no período da lactação, com diminuição de 9,5% no grupo FL e a produção de leite por filhote, durante os 21 dias de amamentação, foi menor no grupo exposto à fumaça de cigarro quando comparado ao seu controle.

Quanto ao peso tecidual, houve diferença no peso do tecido adiposo branco periuterino, com diminuição de 25,75% no grupo FG quando comparado ao seu controle (CG), enquanto que nos grupos sacrificados após o término da lactação (CL e FL) esse tecido não foi detectado. Por fim, a análise dos parâmetros séricos evidenciou aumento na glicemia de jejum nos grupos FG e FL quando comparados aos grupos CG e FL (Tabela 1).

A Figura 1 apresenta o peso corpóreo das proles, que foi analisado em três momentos: ao nascer, no primeiro mês e no segundo mês de vida. Nessa análise, os animais não foram separados por sexo devido à impossibilidade da distinção, sendo, então, divididos em prole de ratas não expostas à fumaça de cigarro (Pnf) e em prole de ratas expostas à fumaça de cigarro (Pf). Os dados evidenciam diminuição no peso corpóreo do grupo Pf em relação ao grupo Pnf durante todo o período de desenvolvimento, sendo 15,5% menor ao nascer, 29,18% menor durante o primeiro mês de vida e 21,4% menor durante o segundo mês de vida.


O peso dos tecidos (Tabela 2), de maneira geral, em prole fêmea apresentou menores valores comparados à prole macho, e as proles de ratas expostas à fumaça de cigarro também apresentaram redução nos pesos dos tecidos comparados às proles de ratas não expostas. Em fêmeas, não houve depósito de tecido adiposo. A análise dos parâmetros séricos evidenciou aumento na glicemia de jejum em proles de ambos os sexos de ratas expostas à fumaça de cigarro em relação aos seus controles, sem alteração significante nos demais parâmetros.

Discussão

A literatura tem evidenciado os malefícios da exposição ao cigarro durante a gestação. Esses prejuízos compreendem descolamento prematuro da placenta, gravidez tubária, desenvolvimento de diabetes gestacional, diminuição na produção láctea, baixo peso ao nascer, icterícia neonatal e malformações congênitas7,8.

De acordo com os dados apresentados, pode-se observar que, durante os períodos reprodutivos, somente na lactação houve diminuição do peso corporal das ratas expostas à fumaça de cigarro. Quando analisados os pesos teciduais, o mesmo acontece com o tecido adiposo branco nos grupos sacrificados ao final da prenhez, havendo diminuição de 25,75% no grupo FG em relação ao grupo CG, e sendo ausente nos grupos CL e FL. Esses dados sugerem que a lactação associada à exposição à fumaça de cigarro pode alterar tanto o peso corpóreo como a distribuição de tecido adiposo branco. Tal evidência deve estar relacionada à ação da nicotina, pois sua inalação promove a elevação aguda da concentração de alguns neurotransmissores, como dopamina e serotonina, substâncias inibidoras da ingestão de alimentos9. Outro aspecto a ser considerado é o efeito direto dessa substância composto sobre o metabolismo do tecido adiposo, ocorrendo maior oxidação de lipídeos10,11.

Neste estudo, o período de prenhez ocasionou menor acúmulo de tecido adiposo nas ratas expostas à fumaça de cigarro, enquanto que o período de lactação foi acompanhado da ausência desse tecido, tanto em ratas expostas como em ratas não expostas. Esse achado deve-se, pois, ao tecido adiposo, que é armazenado na gestação e mobilizado durante a lactação para produção de leite12. Tal mecanismo também pode estar relacionado à diminuição nas concentrações do colesterol HDL nos grupos lactantes CL e FL quando comparados aos grupos não lactantes.

A exposição à fumaça de cigarro também exerce um efeito tóxico sobre o tecido pancreático, prejudicando o transporte de glicose13, o que explica a hiperglicemia das ratas prenhes submetidas ao protocolo de exposição. Foi demonstrado, em estudo recente, que ratas diabéticas expostas à fumaça de cigarro apresentavam hiperglicemia quando comparadas a ratas diabéticas não expostas, sugerindo que tal variável contribui para o prejuízo da homeostasia glicídica mesmo quando o diabetes já está instalado14.

Como demonstrado, o protocolo de exposição durante a prenhez e a lactação ocasionou alterações no organismo materno; porém também foram observadas repercussões na prole. Como esperado, os filhotes de ratas expostas apresentaram menor peso ao nascer e, durante todo o período de desenvolvimento analisado, não tiveram diminuição significativa em tecidos. Esses dados assemelham-se aos de um estudo pioneiro que associou o efeito da exposição materna à fumaça de cigarro ao baixo peso ao nascer dos filhotes15. Posteriormente foi observado que, além do peso ao nascer, membros como braços, pernas, cauda e coluna espinal estavam diminuídos, entretanto em nenhum desses estudos a prole foi analisada durante o seu desenvolvimento16.

Os mecanismos fisiopatológicos que podem ocasionar retardo no desenvolvimento desses animais já estão bem estabelecidos na literatura. Provavelmente são os mesmos aventados para humanos, ou seja, hipóxia fetal originada por duas vias independentes, porém, aditivas: o efeito agudo da liberação de catecolaminas induzido pela nicotina que resulta em hipóxia fetal episódica e que ocorre devido à vasoconstrição materna e perfusão uterina reduzida, e o aumento prolongado dos níveis de carboxiemoglobina fetal, resultando em hipoxemia fetal persistente17. Além disso, modificações morfológicas maternas e placentárias poderiam resultar em efeitos hormonais e tróficos sobre o feto18.

O menor peso ao nascer e o desenvolvimento inferior nas semanas subsequentes também podem estar relacionados à menor produção de leite das ratas expostas à fumaça. Tal dado é semelhante ao de estudos experimentais que reportam a melhor produção láctea em ratas expostas à fumaça de cigarro6,7. Os mecanismos envolvidos podem ser decorrentes de ativação do sistema simpático adrenal periférico pela nicotina, ocasionando redução do número de pulsos de oxitocina, provocando aumento do tônus ductal mamário e influenciando a dinâmica das pressões intramamárias7. Neste estudo, como não foi observado isoladamente cada um desses períodos reprodutivos, os efeitos observados na lactação podem refletir alterações maternas e fetais decorrentes da exposição que ocorreu durante a prenhez.

Além de alterações no peso corpóreo dos animais estudados também se observou alteração nos parâmetros de glicemia de jejum. A glicemia de jejum das proles cujas ratas foram expostas à fumaça de cigarro estava aumentada, dado que se assemelha aos da literatura, pois se sabe que, nesse modelo experimental, há prejuízo na homeostasia glicídica19.

A exposição à fumaça de cigarro altera o metabolismo celular em vários aspectos, podendo resultar em resistência à insulina20; assim, as alterações nos níveis séricos de glicemia podem acontecer em função da nicotina atingir o concepto através da placenta e se concentrar no sangue fetal com níveis 15% maiores que os níveis maternos21. Além disso, a nicotina também é eliminada no leite22 causando hipoxemia fetal17, diminuindo ou retardando a absorção da insulina e provocando aumento na secreção de cortisol e hormônio do crescimento, ambos hiperglicemiantes23.

Assim, este estudo evidenciou que a exposição à fumaça de cigarro durante a prenhez e a lactação reduziu o peso corpóreo das ratas, alterou o perfil lipídico e glicêmico, bem como diminuiu a produção láctea. Mais marcantes ainda foram os resultados encontrados em filhotes na idade de jovem adulto, pois apresentaram pesos corporal e tecidual reduzidos e aumento nos níveis de glicemia de jejum, sugerindo que tal exposição durante a prenhez e a lactação é responsável por respostas orgânicas no feto que irão refletir em alterações em sua vida adulta.

Recebido 25/11/10

Aceito com modificações 21/12/10

Laboratório do Grupo de Pesquisa em Fisiologia do Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquista Filho" – UNESP – Presidente Prudente (SP), Brasil.

  • 1. Bruin JE, Kellenberger LD, Gerstein HC, Morrison KM, Holloway AC. Fetal and neonatal nicotine exposure and postnatal glucose homeostasis: identifying critical windows of exposure. J Endocrinol. 2007;194(1):171-8.
  • 2. Jeyabalan A, Powers RW, Clifton RG, Van Dorsten P, Hauth JC, Klebanoff MA, Lindheimer MD, Sibai B, Landon M, Miodovnik M; Eunice Kennedy Shriver National Institute of Child Health and Human Development Maternal-Fetal Medicine Units Network. Effect of smoking on circulating angiogenic factors in high risk pregnancies. PLoS One. 2010;5(10):e13270.
  • 3. Gao YJ, Holloway AC, Zeng ZH, Lim GE, Petrik JJ, Foster WG, et al. Prenatal exposure to nicotine causes postnatal obesity and altered perivascular adipose tissue function. Obes Res. 2005;13(4):687-92.
  • 4. Holloway AC, Lim GE, Petrik JJ, Foster WG, Morrison KM, Gerstein HC. Fetal and neonatal exposure to nicotine in Wistar rats results in increased beta cell apoptosis at birth and postnatal endocrine and metabolic changes associated with type 2 diabetes. Diabetologia. 2005;48(12):2661-6.
  • 5. Mello PRB, Okay TS, Dores EFGC, Botelho C. Marcadores de exposição tabágica em ratas lactantes utilizando um modelo de exposição passiva desde o início da gestação. Pulmão RJ. 2005;14(4):289-93.
  • 6. Sampson DA, Jansen GR. Measurement of milk yield in the lactation rat from pup weight and weight gain. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 1984;3(4):613-7.
  • 7. Mello PR, Okay TS, Botelho C. The effects of exposing rats to cigarette smoke on milk production and growth of offspring. J Pediatr (Rio J). 2007;83(3):267-73.
  • 8. Roelands J, Jamison MG, Lyerly AD, James AH. Consequences of smoking during pregnancy on maternal health. J Womens Health (Larchmt). 2009;18(6):867-72.
  • 9. Klein LC, Corwin EJ, Ceballos RM. Leptin, hunger, and body weight: influence of gender, tobacco smoking, and smoking abstinence. Addict Behav. 2004;29(5):921-7.
  • 10. Filozof C, Fernández Pinilla MC, Fernández-Cruz A. Smoking cessation and weight gain. Obes Rev. 2004;5(2):95-103.
  • 11. Ferrara CM, Kumar M, Nicklas B, McCrone S, Goldberg AP. Weight gain and adipose tissue metabolism after smoking cessation in women. Int J Obes Relat Metab Disord. 2001;25(9):1322-6.
  • 12. Stuebe AM, Rich-Edwards JW. The reset hypothesis: lactation and maternal metabolism. Am J Perinatol. 2009;26(1):81-8.
  • 13. Shepherd PR, Kahn BB. Glucose transporters and insulin action--implications for insulin resistance and diabetes mellitus. N Engl J Med. 1999;341(4):248-57.
  • 14. Sinzato YK, Lima PHO, Santos CE, Campos KE, Rudge MVC, Damasceno DC. Association of diabetes and cigarette smoke exposure on the glycemia and liver glycogen of pregnant Wistar rats. Acta Cir Bras. 2008;23(6):481-5.
  • 15. Simpson WJ. A preliminary report on cigarette smoking and the incidence of prematurity. Am J Obstet Gynecol. 1957;73(4):807-15.
  • 16. Ng SP, Conklin DJ, Bhatnagar A, Bolanowski DD, Lyon J, Zelikoff JT. Prenatal exposure to cigarette smoke induces diet- and sex-dependent dyslipidemia and weight gain in adult murine offspring. Environ Health Perspect. 2009;117(7):1042-8.
  • 17. Collet M, Beillard C. [Consequences of smoking on fetal development and risk of intra-uterine growth retardation or in utero fetal death]. J Gynecol Obstet Biol Reprod (Paris). 2005;34 Spec No 1:3S135-45.
  • 18. Czekaj P, Pałasz A, Lebda-Wyborny T, Nowaczyk-Dura G, Karczewska W, Florek E, et al. Morphological changes in lungs, placenta, liver and kidneys of pregnant rats exposed to cigarette smoke. Int Arch Occup Environ Health. 2005;75 Suppl:S27-35.
  • 19. Bruin JE, Kellenberger LD, Gerstein HC, Morrison KM, Holloway AC. Fetal and neonatal nicotine exposure and postnatal glucose homeostasis: identifying critical windows of exposure. J Endocrinol. 2007;194(1):171-8.
  • 20. Weitzman M, Cook S, Auinger P, Florin TA, Daniels S, Nguyen M, et al. Tobacco smoke exposure is associated with the metabolic syndrome in adolescents. Circulation. 2005;112(6):862-9.
  • 21. Shah NR, Bracken MB. A systematic review and meta-analysis of prospective studies on the association between maternal cigarette smoking and preterm delivery. Am J Obstet Gynecol. 2000;182(2):465-72.
  • 22. Mascola MA, Van Vunakis H, Tager IB, Speizer FE, Hanrahan JP. Exposure of young infants to environmental tobacco smoke: breast-feeding among smoking mothers. Am J Public Health. 1998;88(6):893-6.
  • 23. Mülhauser I. Smoking and diabetes. Diabet Med. 1990;7(1):10-5.
  • Correspondência:
    Patricia Monteiro Seraphim
    Departamento de Fisioterapia da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquista Filho" – UNESP
    Rua Roberto Simonsen, 305
    CEP: 19060-900 – Presidente Prudente (SP), Brasil.
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Abr 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      25 Nov 2010
    • Aceito
      21 Dez 2010
    Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: editorial.office@febrasgo.org.br