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Avaliação do fluxo na artéria renal fetal entre a 22ª e a 38ª semana em gestações normais

Evaluation of blood flow in the fetal renal artery between the 22nd and 38th week in normal pregnancies

Resumos

OBJETIVO: descrever os valores encontrados para o índice de resistência (IR), índice de pulsatilidade (IP) e relação sístole/diástole (S/D) das artérias renais fetais em gestações sem complicações entre a 22ª e a 38ª semana de gestação e avaliar se estes valores variam durante esse período. MÉTODOS: estudo observacional, no qual 45 fetos de gestações não-complicadas foram avaliados na 22ª, 26ª, 30ª, 34ª e 38ª semanas gestacional. Os exames ultra-sonográficos com Doppler foram feitos por um único observador que utilizou aparelho com transdutor de 4 a 7 MHz. Para a aquisição do traçado de velocidade das artérias renais, uma amostra, com tamanho entre 1 e 2 mm, foi posicionada no terço médio da artéria renal para avaliação através da ultra-sonografia com Doppler pulsado, sempre por um único observador. A avaliação do IR, do IP e da relação S/D das artérias renais (direita e esquerda) foi realizada a partir de três ondas consecutivas utilizando-se o modo automático. Para demonstrar diferença nos valores dos índices com a variação da idade gestacional, comparamos os valores obtidos nas diferentes idades gestacionais através do teste ANOVA com medidas repetidas no tempo (repeated measures ANOVA) com pós-teste de Tukey. RESULTADOS: Não houve diferença significativa entre a artéria renal direita e a esquerda quando se compararam o IR, o IP e a relação S/D. Entretanto, observou-se modificação dos valores destes parâmetros entre a 22ª semana (IR=0,9 ± 0,02; IP=2,44 ± 0,2; relação S/D=11,6 ± 2,2; média ± desvio padrão do valor médio da artéria renal direita e esquerda) e a 38ª semana (IR=0,8 ± 0,03; IP=2,1 ± 0,2; relação S/D=8,7 ± 2,3) de idade gestacional. CONCLUSÕES: os parâmetros avaliados (IR, IP e relação S/D) apresentam valores decrescentes entre a 22ª e a 38ª semana, sem diferença entre os lados direito e esquerdo do feto.

Artéria renal; Fluxometria por laser-doppler; Ultra-sonografia pré-natal; Velocidade do fluxo sanguíneo; Gravidez


PURPOSE: to describe values found for the resistance index (RI), pulsatility index (PI) and the systole/diastole (S/D) ratio of fetal renal arteries in non-complicated gestations between the 22nd and the 38th week, and to evaluate whether those values vary along that period. METHODS: observational study, where 45 fetuses from non-complicated gestations have been evaluated in the 22nd, 26th, 30th and 38th weeks of gestational age. Doppler ultrasonography has been performed by the same observer, using a device with 4 to 7 MHz transducer. For the acquisition of the renal arteries velocity record, a 1 mm to 2 mm probe has been placed in the mean third of the renal artery for the evaluation through pulsed Doppler ultrasonography. The measurement of RI, PI and S/D ratio from three consecutive waves was performed with the automatic mode. To detect significant differences in the indexes' values along gestation, we have compared values obtained at the different gestational ages, through repeated measures ANOVA, followed by Tukey's post-hoc test. RESULTS: There were no significant differences between the right and left renal arteries, when the RI, IP and S/D ratio were compared. Nevertheless, a change in the values of these parameters has been observed between the 22nd week (RI=0.9 ± 0.02; PI=2.4 ± 0.02; S/D ratio=11.6 ± 2.2; mean ± standard deviation of the combined mean values of the right and left renal artery) and the 38th week (RI=0.8 ± 0.03; PI=2.1 ± 0.2; S/D ratio=8.7 ± 2.3) of gestation. CONCLUSIONS: the parameters evaluated (RI, PI and S/D ratio) have presented decreasing values between the 22nd and 38th, with no difference between the fetus's right and left sides.

Renal artery; Laser-doppler flowmetry; Ultrasonography prenatal; Blood flow velocity; Pregnancy


ARTIGOS ORIGINAIS

Avaliação do fluxo na artéria renal fetal entre a 22ª e a 38ª semana em gestações normais

Evaluation of blood flow in the fetal renal artery between the 22nd and 38th week in normal pregnancies

Francisco Maximiliano Pancich GallarretaI; Wellington de Paula MartinsII; Edson Nunes de MoraisIII; Adilson da Cunha FerreiraIV; Luis Guilherme NicolauI; Daniela de Abreu BarraI; Francisco Mauad FilhoV

IPós-graduando do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil

IIMédico Assistente do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil

IIIProfessor Titular do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade Federal da Santa Maria - UFSM - Santa Maria (RS), Brasil

IVProfessor da Escola de Ultra-sonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto - EURP - Ribeirão Preto (SP), Brasil

VProfessor-associado do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil

Correspondência Correspondência: Francisco Maximiliano Pancich Gallarreta Rua Camilo de Mattos, 1.903, apto. 53 - Jardim Paulista CEP 14090-210 - Ribeirão Preto/SP Fone: (16) 9781-7803 E-mail: fmgallarreta@msn.com

RESUMO

OBJETIVO: descrever os valores encontrados para o índice de resistência (IR), índice de pulsatilidade (IP) e relação sístole/diástole (S/D) das artérias renais fetais em gestações sem complicações entre a 22ª e a 38ª semana de gestação e avaliar se estes valores variam durante esse período.

MÉTODOS: estudo observacional, no qual 45 fetos de gestações não-complicadas foram avaliados na 22ª, 26ª, 30ª, 34ª e 38ª semanas gestacional. Os exames ultra-sonográficos com Doppler foram feitos por um único observador que utilizou aparelho com transdutor de 4 a 7 MHz. Para a aquisição do traçado de velocidade das artérias renais, uma amostra, com tamanho entre 1 e 2 mm, foi posicionada no terço médio da artéria renal para avaliação através da ultra-sonografia com Doppler pulsado, sempre por um único observador. A avaliação do IR, do IP e da relação S/D das artérias renais (direita e esquerda) foi realizada a partir de três ondas consecutivas utilizando-se o modo automático. Para demonstrar diferença nos valores dos índices com a variação da idade gestacional, comparamos os valores obtidos nas diferentes idades gestacionais através do teste ANOVA com medidas repetidas no tempo (repeated measures ANOVA) com pós-teste de Tukey.

RESULTADOS: Não houve diferença significativa entre a artéria renal direita e a esquerda quando se compararam o IR, o IP e a relação S/D. Entretanto, observou-se modificação dos valores destes parâmetros entre a 22ª semana (IR=0,9 ± 0,02; IP=2,44 ± 0,2; relação S/D=11,6 ± 2,2; média ± desvio padrão do valor médio da artéria renal direita e esquerda) e a 38ª semana (IR=0,8 ± 0,03; IP=2,1 ± 0,2; relação S/D=8,7 ± 2,3) de idade gestacional.

CONCLUSÕES: os parâmetros avaliados (IR, IP e relação S/D) apresentam valores decrescentes entre a 22ª e a 38ª semana, sem diferença entre os lados direito e esquerdo do feto.

Palavras-chave: Artéria renal/ultra-sonografia, Fluxometria por laser-doppler/métodos, Ultra-sonografia pré-natal/métodos, Velocidade do fluxo sanguíneo, Gravidez

ABSTRACT

PURPOSE: to describe values found for the resistance index (RI), pulsatility index (PI) and the systole/diastole (S/D) ratio of fetal renal arteries in non-complicated gestations between the 22nd and the 38th week, and to evaluate whether those values vary along that period.

METHODS: observational study, where 45 fetuses from non-complicated gestations have been evaluated in the 22nd, 26th, 30th and 38th weeks of gestational age. Doppler ultrasonography has been performed by the same observer, using a device with 4 to 7 MHz transducer. For the acquisition of the renal arteries velocity record, a 1 mm to 2 mm probe has been placed in the mean third of the renal artery for the evaluation through pulsed Doppler ultrasonography. The measurement of RI, PI and S/D ratio from three consecutive waves was performed with the automatic mode. To detect significant differences in the indexes' values along gestation, we have compared values obtained at the different gestational ages, through repeated measures ANOVA, followed by Tukey's post-hoc test.

RESULTS: There were no significant differences between the right and left renal arteries, when the RI, IP and S/D ratio were compared. Nevertheless, a change in the values of these parameters has been observed between the 22nd week (RI=0.9 ± 0.02; PI=2.4 ± 0.02; S/D ratio=11.6 ± 2.2; mean ± standard deviation of the combined mean values of the right and left renal artery) and the 38th week (RI=0.8 ± 0.03; PI=2.1 ± 0.2; S/D ratio=8.7 ± 2.3) of gestation.

CONCLUSIONS: the parameters evaluated (RI, PI and S/D ratio) have presented decreasing values between the 22nd and 38th, with no difference between the fetus's right and left sides.

Keywords: Renal artery/ultrasonography, Laser-doppler flowmetry/mehods, Ultrasonography prenatal/methods, Blood flow velocity, Pregnancy

Introdução

Com o advento da doplervelocimetria, houve um notável avanço no estudo da hemodinâmica fetal1,2. Amplamente estudada em fetos, a avaliação da hemodinâmica fetal nos fornece informações a respeito da perfusão dos órgãos ainda no ambiente uterino, com particular interesse nos inúmeros processos adaptativos frente a injúrias agudas ou crônicas3.

O comportamento do fluxo nos diversos segmentos vasculares fetais (artéria cerebral média, aorta supra e infra-renal e artéria umbilical) é analisado utilizando-se como parâmetro os índices de resistência e pulsatilidade, velocidade sistólica máxima, velocidade diastólica final e o tempo de aceleração. Em um estudo no qual esses índices foram empregados a vários pontos da circulação fetal, demonstrou-se que tanto a velocidade sistólica máxima como a diastólica final aumentam nas artérias cerebral média e aorta supra e infra-renal ao longo da gestação4. No entanto, na artéria umbilical, a velocidade sistólica máxima é constante entre a 22ª e a 26ª semanas, bem como entre a 30ª e a 34ª semanas, diminuindo entre a 34ª e a 38ª semanas de gestação.

A avaliação por ultra-sonografia com Doppler das artérias renais fetais já foi feita em outros estudos que buscaram criar valores normativos5,6 ou mostrar a associação de alterações no fluxo das artérias renais fetais com malformações renais7 ou com restrições de crescimento intra-uterino8. O presente estudo visa descrever os valores dos índices de resistência (IR), índice de pulsatilidade (IP) e relação sístole-diástole (S/D) das artérias renais entre a 22ª e a 38ª semana em gestações não-complicadas. Buscamos, também, identificar se estes índices se modificam ao longo deste período.

Métodos

Sujeitos

Estudo observacional no qual 45 fetos de gestação única foram avaliados com idade gestacional calculada através da mensuração do comprimento cabeça-nádegas por avaliação ecográfica do primeiro trimestre (confirmada ou não pela data da última menstruação). Todas as gestantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, sendo que o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP).

Os critérios de inclusão eram: gestações únicas e gravidez sem intercorrência na primeira avaliação. Previa-se a exclusão das gestantes que desenvolvessem complicações na gravidez ou cujos fetos apresentassem malformação ou crescimento inadequado para a idade gestacional. Também seriam excluídos os fetos de gestantes que não comparecessem a uma ou mais avaliações. Não foram incluídas no estudo as usuárias de álcool e drogas ou fumantes.

Para o presente estudo foram selecionadas inicialmente 60 gestantes que preenchiam os critérios de inclusão. Destas, 15 foram excluídas: uma delas desenvolveu pré-eclâmpsia, um tipo de diabetes gestacional, e as 13 restantes tiveram parto antes da 38ª semana gestacional, não comparecendo ao último exame. Todos os recém-natos incluídos nesta pesquisa foram considerados adequados para a idade gestacional pelo índice de Capurro somático9 e não houve alterações nos exames físicos realizados durante o primeiro dia de vida neonatal.

Ultra-sonografia

O primeiro exame ultra-sonográfico foi efetuado no primeiro trimestre gestacional para a determinação da idade gestacional por meio de mensuração do comprimento cabeça-nádega. Os exames subseqüentes foram efetuados a partir da 22ª semana gestacional, com intervalo de quatro semanas até a idade gestacional de 38 semanas. Todos os fetos foram avaliados na 22ª, 26ª, 30ª, 34ª e 38ª semanas de gestação. Os exames foram efetuados por um único observador (FMPG), utilizando o aparelho ultra-sonográfico modelo Accuvix-XQ (Medison Co., Seul, Coréia do Sul) equipado com transdutor convexo, banda larga (4 a 7 MHz). Para a realização do exame ultra-sonográfico, as gestantes foram posicionadas em posição semi-sentada (ângulo de 15º a 30º entre a cabeceira e a mesa de exame), evitando-se assim a compressão da veia cava inferior4. A seguir procedia-se à formação das imagens e ao mapeamento pelo efeito Doppler. O estudo da artéria renal com Doppler foi efetuado sem movimentação perceptível dos fetos, na ausência de seus movimentos respiratórios e com freqüência cardíaca entre 120 e 160 batimentos por minuto.

Para avaliação da velocidade do sangue das artérias renais, buscamos inicialmente, através da avaliação em planos coronais do feto, identificar a aorta abdominal e as artérias ilíacas comuns. Após esta etapa, utilizamos o Doppler de amplitude para a identificação das artérias renais. Acionou-se, então, o Doppler pulsado (espectral) para se obterem as ondas de velocidade de sangue na artéria renal. O volume da amostra foi calibrado entre 1 e 2 mm e posicionado no centro da artéria renal, em seu terço médio. Para evitarmos artefatos dos espectros de velocidade, tentamos manter o ângulo entre o feixe de insonação e a trajetória do fluxo em valores abaixo de 60º10 (variaram de 0º a 52º). Em todos os casos o filtro Doppler foi ajustado entre 50 e 100 Hz, para evitar a perda do componente diastólico do fluxo11. Os cálculos dos parâmetros do Doppler foram obtidos pelo modo automático (com utilização do software próprio do aparelho), com a imagem congelada após a obtenção de pelo menos três ondas com aspecto semelhante, pela média aritmética de três ondas consecutivas12 (Figura 1). As fórmulas utilizadas foram: IR=(S-D) / D; IP=(S-D) / VM e relação S/D=S/D, onde S é o valor da velocidade máxima obtido no pico da sístole, D é o valor da velocidade obtido no final da diástole e VM é o valor médio das velocidades durante um ciclo cardíaco13.


Análise estatística

A análise estatística foi realizada com o software GraphPad Prism 5 (GraphPad Software Inc., La Jolla, CA, EUA). Em um primeiro momento, realizamos a comparação dos valores médios obtidos para as artérias renais direita e esquerda através do teste t pareado para todos os parâmetros avaliados: IP, IR e relação S/D. Como não houve diferença significativa entre os valores obtidos entre os lados direito e esquerdo, calculamos a média aritmética dos valores obtidos em cada feto para as outras avaliações. Calculamos, então, a mediana e os percentis 5 e 95 para os índices estudados em todos os períodos avaliados. Para demonstrar diferença nos valores dos índices com a variação da idade gestacional, comparamos os valores obtidos nas diferentes idades gestacionais através do teste ANOVA com medidas repetidas no tempo (repeated measures ANOVA) com pós-teste de Tukey. Utilizamos os testes paramétricos para amostras pareadas na comparação da artéria renal direita com a esquerda e, principalmente, ao longo da idade gestacional para haver maior poder de se detectar diferença. Isto foi possível devido ao fato de todos os fetos terem sido submetidos a todas as avaliações, sendo ambas as artérias renais (direita e esquerda) examinadas sempre. Consideramos como diferença significativa quando o valor de p era inferior a 0,05.

Resultados

A média de idade das gestantes no grupo estudado foi de 23,7 anos (±4,7) e 55,5% tiveram o parto por via vaginal. A idade gestacional no momento do nascimento foi de 39,8 semanas (±1,05), com peso médio de 3324 gramas (±317,9). Todos os recém-nascidos tiveram Apgar de primeiro e quinto minutos acima de sete. Não houve diferença significativa ao compararmos os valores obtidos para IR, IP e relação S/D entre as artérias renais esquerda e direita através do teste t pareado (Tabela 1).

Os valores obtidos para mediana, percentil 5 e percentil 95 dos valores obtidos para o IR, IP e relação S/D da artéria renal fetal (média aritmética dos valores obtidos da renal direita e esquerda), nas diferentes idades gestacionais, estão apresentados na Tabela 2.

Houve diferença significativa entre as diferentes idades gestacionais (p<0,0001; repeated measures ANOVA) quando comparamos os valores de IR obtidos. Os valores obtidos para o IR foram mais baixos no final do período avaliado, havendo diferença significativa ao compararmos o IR obtido na 22ª e 38ª semanas (0,9±0,02 versus 0,8±0,03, média±desvio padrão; p<0,001 obtido pelo pós-teste de Tukey), entre a 26ª e a 34ª semana (0,9±0,01 versus 0,90±0,02; p<0,01), entre a 26ª e a 38ª semana (0,92±0,01 versus 0,8±0,03; p<0,001), entre a 30ª e a 34ª semana (0,92±0,02 versus 0,90±0,02; p<0,01), entre a 30ª e a 38ª semana (0,92±0,02 versus 0,88±0,03; p<0,001) e entre a 34ª e a 38ª semana (0,90±0,02 versus 0,88±0,03; p<0,001).

Resultados semelhantes foram observados quando analisamos os valores obtidos para o IP, com diferença significativa quando comparamos as diferentes idades gestacionais (p<0,0001; repeated measures ANOVA). Os valores obtidos para o IP foram mais baixos no final do período avaliado, sendo que houve diferença significativa quando comparamos o IP obtido na 22ª com o obtido na 34ª semana (2,44±0,21 versus 2,25±0,24; média ± desvio padrão; p<0,001 obtido pelo pós-teste de Tukey), entre a 22ª e a 38ª semana (2,44±0,21 versus 2,14±0,22; p<0,001), entre a 26ª e a 34ª semana (2,42±0,20 versus 2,25±0,24; p<0,01); entre a 26ª e a 38ª semana (2,42±0,20 versus 2,14±0,22; p<0,001); entre a 30ª e a 34ª semana (2,41±0,19 versus 2,25±0,24; p<0,01) e entre a 30ª e a 38ª semana (2,41±0,19 versus 2,14±0,22; p<0,001).

Os resultados para a relação S/D também foram muito semelhantes, havendo, contudo, diferença significativa quando comparamos os valores obtidos nas diferentes idades gestacionais (p<0,0001; repeated measures ANOVA). As comparações que apresentaram significativa pelo pós-teste de Tukey foram as mesmas verificadas para o IR. Esse fato não é surpreendente, já que suas fórmulas são muito semelhantes. Observamos diferença significativa quando comparamos a relação S/D obtida na 22ª com o da 38ª semana (11,6±2,2 versus 8,7±2,3, média±desvio padrão; p<0,001 obtido pelo pós-teste de Tukey), entre a 26ª e a 34ª semana (12,5±2,2 versus 10,7±2,5; p<0,01); entre a 26ª e a 38ª semana (12,5±2,2 versus 8,7±2,3; p<0,001); entre a 30ª e a 34ª semana (12,6±2,6 versus 10,7±2,5; p<0,01); entre a 30ª e a 38ª semana (12,6±2,6 versus 8,7±2,3; p<0,001) e entre a 34ª e a 38ª semana (10,7±2,54 versus 8,7±2,3; p<0,01). Em todas essas comparações com diferença significativa, o valor mais baixo sempre foi observado na idade gestacional mais tardia.

Discussão

Nesta amostra, os índices de resistividade representados pela relação S/D, IR e IP demonstraram decréscimo progressivo ao longo do segundo e terceiro trimestres gestacionais. Um estudo realizado com 81 fetos com crescimento adequado, entre a 24ª e a 38ª semanas, mostrou um aumento no fluxo da artéria cerebral média, aorta ascendente e descendente e na artéria renal4. Uma avaliação de 70 fetos com características semelhantes, no mesmo período gestacional, demonstrou redução significante em todos os índices de resistividade, em diversos territórios vasculares estudados: artéria cerebral média, artéria umbilical, aorta ascendente e descendente e artérias renais6. Outro estudo com fetos saudáveis, no qual se avaliaram a velocidade sistólica máxima, a velocidade média, a velocidade diastólica final, o IR e o IP, demonstrou elevação de todos os parâmetros do Doppler, com exceção do IR e do IP, que decresceram ao longo da gestação15.

O desempenho do IP das artérias cerebrais médias, umbilicais e renais para predição de resultados perinatais adversos foi avaliado em 293 fetos com suspeita de restrição do crescimento intra-uterino, entre a 24ª e a 39ª semana gestacional16. Cerca de 60% dos recém-nascidos tiveram pelo menos uma complicação maior ou menor (maiores: óbito perinatal, encefalopatia hipóxico-isquêmica, hemorragia periventricular graus 3 ou 4, leucomalácia e enterocolite necrotizante; menores: cesariana por sofrimento fetal, pH da artéria umbilical menor que 7,1, índice de Apgar abaixo de 7 no quinto minuto). Com este estudo, concluiu-se que em fetos com suspeita de restrição de crescimento intra-uterino o IP da artéria umbilical foi melhor que o IP da artéria cerebral média e da artéria renal como preceptor de resultados adversos perinatais, e que o IP da artéria cerebral média poderia ajudar a identificar aqueles fetos sem risco aumentado de resultados perinatais adversos, especialmente antes da 32ª semana gestacional.

Também sobre o desempenho do IP da artéria renal como avaliador da vitalidade fetal, não demonstrou-se correlação entre o IP da artéria renal e o pH dos vasos do cordão umbilical, peso ao nascimento e índice de líquido amniótico corrigido para a idade gestacional ao se avaliarem 16 fetos entre a 26ª e a 35ª semanas gestacionais, com severa restrição do crescimento intra-uterino8, mas devemos levar em consideração que a amostra avaliada foi muito pequeno. Mesmo com essa pequena amostra pôde-se observar que a velocidade sistólica máxima do sangue na artéria renal apresentou uma redução com o tempo da gestação e significante associação com o peso fetal ao nascimento e pH venoso do cordão umbilical; conclui-se que uma redistribuição progressiva da circulação ocorre com a deterioração das condições dos fetos pré-termo restritos e que no Doppler espectral isso pode ser demonstrado de maneira mais evidente graças às mudanças no pico da velocidade sistólica.

Comparando-se 36 gestações nas quais foi observada oligodramnia isolada em 28 gestações que apresentavam volume de líquido amniótico normal, entre a 24ª e a 40ª semanas gestacionais, não foram detectadas diferenças significativas entre os dois grupos ao se compararem o IR e a velocidade sistólica máxima das artérias renais. Nesse mesmo estudo também não houve correlação significante entre o índice de líquido amniótico e o IR ou a velocidade sistólica máxima das artérias renais, o que nos sugere que a redução isolada do líquido amniótico provavelmente não se deve a alterações na perfusão renal16.

Por outro lado, em análise dos índices de resistência das artérias renais de 50 fetos em trabalho de parto pré-termo, entre a 22ª e a 34ª semana gestacional, não foi possível demonstrar influência do processo inflamatório sobre os índices de resistência das artérias renais17.

Inúmeros estudos, portanto, têm demonstrado a importância do fluxo arterial renal frente às agressões ocorridas intra-útero. Esse estudo não permite inferir quais alterações nos índices do Doppler das artérias renais podem ser indicativas de alterações fetais, uma vez que nos limitamos à avaliação de gestações não-complicadas. Entretanto, a presente pesquisa apresenta valores obtidos em uma amostra de fetos de gestantes brasileiras que poderiam ser empregados como referência. Haveria uma possibilidade de, também, ser utilizado como grupo padrão em pesquisas que avaliem a vascularização renal fetal frente a situações como a restrição de crescimento intra-uterino, oligodramnia e malformações renais diversas.

Recebido: 4/10/07

Aceito com modificações: 23/9/08

Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da FMRP-USP - Ribeirão Preto/SP - Brasil e Escola de Ultra-sonografia e Reciclagem Médica de Ribeirão Preto - Ribeirão Preto (SP), Brasil.

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  • Correspondência:

    Francisco Maximiliano Pancich Gallarreta
    Rua Camilo de Mattos, 1.903, apto. 53 - Jardim Paulista
    CEP 14090-210 - Ribeirão Preto/SP
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Nov 2008
    • Data do Fascículo
      Out 2008

    Histórico

    • Recebido
      04 Out 2007
    • Aceito
      23 Set 2008
    Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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