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Efeitos da diatermia por ondas curtas no torque do músculo quadríceps femoral durante a estimulação elétrica neuromuscular e contração voluntária em indivíduos saudáveis

Resumos

INTRODUÇÃO: A influência dos efeitos do calor no torque em indivíduos de ambos os gêneros é desconhecida, principalmente quando associado à estimulação elétrica. OBJETIVOS: Analisar o efeito da diatermia por ondas curtas no torque do músculo quadríceps femoral gerado pela contração voluntária e eletricamente induzida em indivíduos assintomáticos de ambos os gêneros e avaliar o desconforto gerado pela corrente elétrica. MÉTODOS: Participaram do estudo 26 voluntários, onde foi avaliada a capacidade de produção de torque em um dinamômetro isocinético através de contrações isométricas voluntárias máximas (CIVM) e eletricamente induzida (TEI). Os voluntários foram submetidos a quatro momentos: mensuração do torque através de contração voluntária, contração voluntária após aplicação do calor, contração eletricamente induzida e contração eletricamente induzida após aplicação do calor. O desconforto sensorial durante a estimulação elétrica foi avaliado com a escala visual analógica (EVA). RESULTADOS: O torque no sexo masculino foi maior quando submetido à aplicação da corrente elétrica associado ao calor (p = 0,030). Em relação ao desconforto gerado pela corrente elétrica, foi observado aumento no sexo feminino quando associado ao calor (p = 0,044) comparado ao sexo masculino. CONCLUSÃO: A diatermia por ondas curtas não influenciou o torque produzido pela contração voluntária, porém houve aumento do torque eletricamente induzido (TEI) após aplicação de calor em indivíduos do sexo masculino e aumento do desconforto sensorial gerado pela corrente apenas nos sujeitos do sexo feminino.

estimulação elétrica; modalidades de fisioterapia; contração muscular


INTRODUCTION: The influence of the heat effects on muscle torque in males and females is still unknown, especially when associated with electrical stimulation. OBJECTIVES: To assess the effects of shortwave diathermy on voluntary and electrically induced torque in healthy males and females, and to assess the discomfort produced by electrical stimulation. METHODS: Twenty-six subjects participated in the study. Voluntary and electrically induced torque was assessed using an isokinetic dynamometer. The subjects were asked to attend 4 different sessions: measurement of maximal voluntary contraction (MVC); MVC after SWD; maximal electrically induced torque (MEIT); MEIT after SWD. Discomfort during MEIT was measured using a visual analogue scale. RESULTS: MEIT was higher in males after SWD (p = 0.030) Females presented more discomfort during MEIT after SWD application (p = 0.044) when compared to males. CONCLUSION: SWD did not affect the MVC; however, there was increase in MEIT after SWD in males and discomfort increase in females.

electric stimulation; physical therapy modalities; muscle contraction


ARTIGO ORIGINAL

APARELHO LOCOMOTOR NO EXERCÍCIO E NO ESPORTE

Efeitos da diatermia por ondas curtas no torque do músculo quadríceps femoral durante a estimulação elétrica neuromuscular e contração voluntária em indivíduos saudáveis

Fábio Chittero BoldriniI; Alexandre Dias LopesI; Richard Eloin LiebanoI

IUniversidade Cidade de São Paulo (UNICID) – São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência Correspondência: Richard Eloin Liebano Programa de Mestrado e Doutorado em Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID). Rua Cesário Galeno, 448/475 03071-000 – São Paulo, SP, Brasil. liebano@gmail.com

RESUMO

INTRODUÇÃO: A influência dos efeitos do calor no torque em indivíduos de ambos os gêneros é desconhecida, principalmente quando associado à estimulação elétrica.

OBJETIVOS: Analisar o efeito da diatermia por ondas curtas no torque do músculo quadríceps femoral gerado pela contração voluntária e eletricamente induzida em indivíduos assintomáticos de ambos os gêneros e avaliar o desconforto gerado pela corrente elétrica.

MÉTODOS: Participaram do estudo 26 voluntários, onde foi avaliada a capacidade de produção de torque em um dinamômetro isocinético através de contrações isométricas voluntárias máximas (CIVM) e eletricamente induzida (TEI). Os voluntários foram submetidos a quatro momentos: mensuração do torque através de contração voluntária, contração voluntária após aplicação do calor, contração eletricamente induzida e contração eletricamente induzida após aplicação do calor. O desconforto sensorial durante a estimulação elétrica foi avaliado com a escala visual analógica (EVA).

RESULTADOS: O torque no sexo masculino foi maior quando submetido à aplicação da corrente elétrica associado ao calor (p = 0,030). Em relação ao desconforto gerado pela corrente elétrica, foi observado aumento no sexo feminino quando associado ao calor (p = 0,044) comparado ao sexo masculino.

CONCLUSÃO: A diatermia por ondas curtas não influenciou o torque produzido pela contração voluntária, porém houve aumento do torque eletricamente induzido (TEI) após aplicação de calor em indivíduos do sexo masculino e aumento do desconforto sensorial gerado pela corrente apenas nos sujeitos do sexo feminino.

Palavras-chave: estimulação elétrica, modalidades de fisioterapia, contração muscular.

INTRODUÇÃO

O aumento da temperatura no músculo tem mostrado efeito em propriedades que contribuem na determinação da força muscular como fluxo sanguíneo, creatina fosfato, aporte de oxigênio, aumento na velocidade de condução nervosa, liberação de cálcio e acetilcolina e atividade metabólica1-4, além de poder proporcionar potencialização da função muscular, como a força muscular3,5. Por outro lado, no sistema muscular, o aumento da temperatura promove diminuição na taxa de disparo das fibras aferentes do tipo II e gama eferentes6 e aumento na taxa de disparo das fibras Ib do órgão tendinoso de Golgi7,8. Essas alterações poderiam levar a uma redução na capacidade de gerar tensão muscular, contrariando a hipótese sugerida pelos pesquisadores citados anteriormente.

Na utilização do turbilhão com água aquecida em membros inferiores de atletas de variados esportes como natação, basquetebol e ginástica, houve redução de força muscular, com recuperação da capacidade contrátil após duas horas seguintes à aplicação3,9. Já em ciclistas submetidos à imersão em água quente, foi observado aumento imediato de 11% no pico de torque10. Com esta mesma forma de aplicação de calor, porém no músculo tríceps sural, foi relatada melhora da performance dinâmica em ciclistas e saltadores11. Resultados do aumento de força também foram observados quando utilizada a diatermia por ondas curtas no músculo quadríceps femoral, sendo que após duas horas do término da aplicação a força muscular aumentava permanecendo acima do nível anterior à aplicação4.

A estimulação elétrica neuromuscular (EENM) é utilizada comumente na reabilitação pelos fisioterapeutas com o objetivo analgésico e também de melhorar as propriedades musculares relacionadas ao treino como a produção de torque do músculo quadríceps, fluxo sanguíneo intramuscular e também de forma preventiva12-14. A corrente excitomotora, mais popularmente conhecida para realização da EENM, é a chamada corrente russa, que se trata de uma corrente alternada de média frequência (2.500 Hz) modulada em bursts de 50 Hz com ciclo de trabalho de 50%. Essa corrente foi inicialmente descrita por Yakov Kots na década de 70, que relatou ganho de força em músculos saudáveis de atletas de elite15. Atualmente, essa corrente vem sendo amplamente utilizada em estudos que avaliam o torque máximo eletricamente induzido16.

Agentes físicos como o calor e a estimulação elétrica vêm sendo muito utilizados no tratamento fisioterapêutico para fins analgésicos, sendo observados benefícios na utilização associada desses recursos quando comparado com a aplicação individual das modalidades6. No entanto, estudos que apresentam os efeitos isolados do calor em relação à força muscular são escassos e apresentam resultados contraditórios3,4,9-11. Além disso, não foram encontrados estudos associando a estimulação elétrica neuromuscular com agentes térmicos para a produção de torque. Estudos sobre a influência do aquecimento na capacidade de geração de força, bem como a associação do calor com a estimulação elétrica neuromuscular, são de grande importância, pois poderiam contribuir para a otimização dos programas de ganho de força, que são comumente utilizados tanto na prática clínica como em pacientes com hipotrofia devido ao tempo prolongado de imobilização após intervenção cirúrgica.

A produção de calor local no músculo poderia ter efeitos benéficos à EENM devido às alterações hemodinâmicas e neuromusculares como aumento do fluxo sanguíneo, melhor aporte de oxigênio, provimento de ATP, otimização da velocidade de condução nervosa e dos componentes contráteis, produzindo assim melhores condições para o uso da estimulação elétrica e, consequentemente, melhora da performance muscular8. Além disso, o efeito analgésico produzido pelo aquecimento17 poderia reduzir o desconforto causado pela estimulação elétrica, fazendo com que ela seja melhor aceita pelos pacientes e permitindo o uso de intensidades de corrente mais elevadas. Desta forma, os objetivos deste trabalho foram o de analisar o efeito da diatermia por ondas curtas no torque do músculo quadríceps femoral gerado pela contração voluntária e no torque eletricamente induzido em indivíduos saudáveis, além de avaliar o efeito da diatermia por ondas curtas sobre o desconforto sensorial gerado pela estimulação elétrica neuromuscular durante a produção do torque eletricamente induzido.

MÉTODOS

Participantes

Foram selecionados para participação deste estudo 28 voluntários, sendo 13 do sexo masculino e 15 do feminino, com idade entre 18 e 25 anos, IMC entre 19 e 25 kg/m², que não apresentavam histórico de intervenção cirúrgica, lesões ou doenças musculoesqueléticas e neuromusculares no membro inferior dominante. Foram excluídos deste estudo duas voluntárias que relataram desconforto severo durante a aplicação da corrente elétrica. Antes da realização do estudo, todos os voluntários foram esclarecidos sobre os procedimentos a serem realizados, e assinaram um termo de consentimento aceitando a participação. O presente estudo foi provado pela pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Cidade de São Paulo sob o protocolo n° 13.323.922.

Instrumentos

Para a determinação do torque utilizou-se um dinamômetro isocinético (Cybex® Norm 6000), previamente calibrado. Para a aplicação do calor profundo foi utilizado o aparelho de ondas curtas Diatermax 350P (KLD® – Biosistemas Equipamentos Eletrônicos Ltda). Já para a determinação do ponto motor do músculo reto femoral e vasto medial foi utilizado o aparelho Nemesys941P (Quark® – Produtos Médicos), enquanto que para a estimulação elétrica neuromuscular foi utilizado o aparelho Endophasys (KLD® – Biosistemas Equipamentos Eletrônicos Ltda). Para a mensuração do desconforto gerado pela corrente elétrica foi aplicada a escala visual analógica (EVA).

Procedimentos

Todos os indivíduos foram analisados em quatro momentos, alocados de forma aleatória através de um sorteio de envelope opaco e lacrado, em dias diferentes da semana, respeitando um intervalo de dois a sete dias entre os testes, sempre realizado entre as 13 e 18 horas (figura 1). Além disso, para determinação do torque voluntário e eletricamente induzido (TEI), foram realizadas três mensurações, sendo que o maior valor dos três encontrados foi utilizado para as análises18,19.


Para a determinação do torque os voluntários foram posicionados na cadeira do dinamômetro com os quadris dos sujeitos imobilizados com um cinto, a 85° de flexão, e o membro não dominante foi imobilizado com uma dupla almofada no terço distal da tíbia, 3 cm próximo da articulação do tornozelo20. O tronco também foi estabilizado por meio de cintas, para evitar possíveis compensações musculares. O dinamômetro foi programado a uma velocidade angular de 0° por segundo (modo isométrico), e a articulação do joelho da perna dominante foi posicionada a 60º de flexão, sendo que o apoio do braço do dinamômetro foi fixado na região distal da perna do voluntário, permitindo um arco completo de dorsiflexão12,21-23.

Durante os testes 1 e 2 os voluntários foram incentivados verbalmente pelo examinador para que fosse realizada a maior força possível. Previamente à realização dos testes 3 e 4 foram realizadas cinco provas de valores, nas quais a amplitude da corrente elétrica era aumentada gradualmente até a máxima suportada pelo indivíduo. Desta forma, o maior valor suportado foi utilizado em todas as mensurações que empregaram a estimulação elétrica neuromuscular, sendo que, neste caso, o voluntário permaneceu parado e com o membro avaliado relaxado para as mensurações.

Foi utilizado o percentual da contração isométrica voluntária máxima (CIVM) obtida no teste 1 para normalização dos dados obtidos nos testes 3 e 4. Em todos os testes, antes da mensuração e nos intervalos entre uma mensuração e outra, foi necessário um tempo de três minutos para o posicionamento dos indivíduos, tempo esse necessário para se evitar a fadiga entre as repetições. Nos intervalos entre as contrações eletricamente induzidas foi mostrada aos voluntários a escala visual analógica (EVA) para que o indivíduo identificasse o desconforto gerado pela corrente elétrica. A EVA era uma linha de 10 centímetros, sendo que na extremidade esquerda havia o termo "sem desconforto" e na extremidade direita o termo "máximo desconforto possível". Foram analisadas três medidas em cada teste que era composto por três repetições cada e utilizou-se para análise o índice de desconforto apresentado durante a produção do maior TEI observado entre as três repetições.

Teste 1 – Contração isométrica voluntária máxima (CIVM)

Anteriormente ao início do teste foi informado ao voluntário que, quando solicitado, o mesmo deveria executar a maior força possível para extensão do joelho, permitindo assim que fosse determinado o torque do músculo quadríceps femoral através da CIVM. Este procedimento foi realizado três vezes, com nove segundos de contração cada, com intervalo de três minutos de uma mensuração para outra, em que o indivíduo permanecia relaxado. Os voluntários foram incentivados verbalmente pelo examinador durante a realização dos testes24.

Teste 2 – Diatermia por ondas curtas (DOC) + contração isométrica voluntária máxima (CIVM)

Os voluntários foram submetidos à aplicação da diatermia por ondas curtas no modo contínuo antes da avaliação da CIVM, através da técnica coplanar durante um período de 20 minutos. Foram utilizados eletrodos do tipo placa, sendo que um dos eletrodos foi posicionado 3 cm abaixo da espinha ilíaca anterossuperior e o outro 3 cm acima da base da patela. Os voluntários foram instruídos a informar ao pesquisador quando a sensação térmica gerada pelo aparelho de ondas curtas fosse um calor moderado (dose III), sendo essa dose mantida durante os 20 minutos de aplicação.

Após este procedimento, o indivíduo foi posicionado no dinamômetro isocinético e informado que, quando solicitado, fosse feita a maior força possível para a determinação do torque do músculo quadríceps femoral (CIVM). Foram realizadas três contrações com nove segundos cada e com intervalo de três minutos entre elas. Durante a realização dos testes os voluntários foram incentivados verbalmente pelo examinador.

Teste 3 – Torque eletricamente induzido (TEI)

Antes do início do teste o indivíduo foi posicionado no dinamômetro isocinético, sendo solicitado ao voluntário que mantivesse o membro avaliado relaxado com intuito de evitar contrações voluntárias durante a estimulação elétrica até que fossem completados os três minutos de intervalo pré-teste. Os valores obtidos do torque foram normalizados utilizando o percentual da contração isométrica voluntária máxima obtido no teste 1. Para geração do TEI utilizou-se o equipamento Endophasys (KLD® Biosistemas Equipamentos Eletrônicos Ltda.) que emitia uma corrente alternada retangular, com frequência portadora de 2.500 Hz, modulada em bursts de 50 Hz e ciclo de trabalho de 20%. Os eletrodos autoadesivos (7,5 x 13 cm) (Axelgaard®, Valutrode) foram posicionados no ponto motor do músculo vasto medial oblíquo e no ponto motor do nervo femoral. Para a localização destes pontos motores foi utilizado um gerador universal de correntes (Nemesys941P). Cada contração eletricamente induzida teve duração de nove segundos, com três minutos de intervalo, sendo a amplitude (intensidade) aumentada até o valor previamente determinado.

Teste 4 – Diatermia por ondas curtas (DOC) + torque eletricamente induzido (TEI)

O indivíduo foi submetido à aplicação da diatermia por ondas curtas antes da realização do teste, durante um período de 20 minutos com os eletrodos posicionados conforme já informado no teste 2. Posteriormente à aplicação da DOC, o indivíduo foi posicionado no dinamômetro isocinético e instruído a manter o membro avaliado relaxado com intuito de evitar contrações voluntárias durante a estimulação elétrica. Os eletrodos do estimulador elétrico foram posicionados no ponto motor do músculo vasto medial e no ponto motor do nervo femoral, como já descrito anteriormente no teste 3. Cada contração eletricamente induzida teve duração de nove segundos, com três minutos de intervalo, sendo a amplitude da corrente aumentada até o valor previamente determinado.

Análise estatística

Todos os testes foram realizados considerando hipóteses bilaterais e assumindo um α = 0,05. Inicialmente foi utilizada a estatística descritiva para avaliar a frequência, média e desvio padrão quando os dados apresentaram distribuição normal verificada através do teste de Shapiro-Wilk, mediana e intervalo interquartil (IQ) para os dados sem distribuição normal. Para a comparação das médias dos valores do torque durante a CVIM e durante a EENM foi utilizado o teste t de Student quando os grupos que apresentaram distribuição normal e o teste de Wilcoxon para os grupos que não apresentaram distribuição normal dos dados. Para a análise do desconforto foi utilizado o teste de Wilcoxon. A análise dos dados foi feita com o pacote estatístico SPSS versão 12.

RESULTADOS

Não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes em nenhuma das variáveis avaliadas (CIVM, TEI (% da CIVM) e desconforto sensorial) comparadas com relação à aplicação prévia de calor ou não (tabela 1). No entanto, ao estratificarmos os sujeitos por gênero, observou-se maior desconforto nos indivíduos do sexo feminino durante a geração do TEI após a aplicação da DOC quando comparados aos indivíduos do sexo masculino (p = 0,044) (tabela 2). Houve um aumento do TEI apenas nos indivíduos do sexo masculino após a aplicação de calor (p = 0,030) (tabela 3).

DISCUSSÃO

No presente estudo foi avaliado o efeito da diatermia por ondas curtas na contração voluntária e na contração eletricamente, além de avaliamos o desconforto gerado pela corrente elétrica. Ao analisarmos os dados considerando os indivíduos de ambos os sexos não foram encontradas diferenças em nenhuma das variáveis avaliadas. Ao estratificarmos os sujeitos para realizar uma análise separada por sexo, foi observado aumento do TEI após a aplicação da DOC nos indivíduos do sexo masculino, fato este não observado nas mulheres. Além disso, as mulheres apresentaram aumento do desconforto sensorial durante a produção de TEI após a aplicação de calor.

A não alteração do torque durante a contração isométrica voluntária máxima associada ao calor produzido pela DOC pode ser explicada devido a não necessidade de um maior aporte sanguíneo, além de nutrientes, ATP e oxigênio, já que se trata de uma contração muscular fásica voluntária de alta intensidade e curta duração, em que o intervalo proposto é suficiente para recuperação total das reservas energéticas24. Sabe-se que o calor diminui a taxa de disparo das fibras aferentes tipo II do fuso muscular e aumenta a taxa de disparo das fibras Ib dos órgãos tendinosos de Golgi, levando a uma redução do disparo dos motoneurônios alfa e gama diminuindo a atividade contrátil7,8,25.

Essas alterações poderiam teoricamente reduzir o torque voluntário, porém os demais efeitos fisiológicos do calor, como aumento de metabolismo e da velocidade de condução nervosa, devem ser considerados em conjunto. Os resultados do presente estudo corroboram pesquisas previamente realizadas, que apesar de utilizarem métodos de aquecimento diferentes11,18, também não encontraram diferenças estatisticamente significantes na força produzida voluntariamente com a aplicação prévia de calor, sendo possível observar que a atividade muscular não sofreu grande influência do aquecimento tecidual. Apenas um estudo utilizando a mesma modalidade de calor empregada no presente estudo (DOC) foi encontrado na literatura4. Neste trabalho observou-se uma diminuição do torque voluntário imediatamente após a aplicação do calor. Após 50 minutos os níveis de força atingiram os valores basais e após duas horas, atingiram um valor maior do que o mensurado inicialmente, ou seja, antes da aplicação do calor. Uma possível falha metodológica foi o fato de os autores terem realizado todas as mensurações de força no mesmo dia. Nesse caso, a ocorrência de fadiga ou facilitação neuromuscular pode ter interferido nos resultados.

A elevação do limiar de ativação do sistema neuromuscular devido ao aumento de fluxo sanguíneo no tecido adiposo pode explicar o maior desconforto relatado pelas mulheres durante o TEI após a aplicação de calor quando comparado com os homens26-28. O índice de desconforto entre homens e mulheres durante o TEI sem a aplicação prévia de calor foi semelhante, o que está de acordo com estudos prévios que verificaram maior desconforto no sexo feminino quando a estimulação elétrica era realizada no limiar motor, porém o desconforto entre os gênero foi semelhante quando a estimulação foi realizada no limiar supramotor29.

Ao analisarmos os dados agrupados não observamos alteração no TEI com a aplicação de calor. No entanto, ao estratificarmos os indivíduos por gênero foi observado um aumento do TEI após aplicação da DOC nos indivíduos do sexo masculino, fato este não observado nas mulheres. O aumento do TEI nos indivíduos do sexo masculino após a aplicação de calor pode estar relacionado ao aumento de metabolismo local e aumento na velocidade de condução nervosa. Uma hipótese para o TEI não ter sofrido alteração nas mulheres após a aplicação da DOC pode ser atribuída ao fato de que os homens são considerados mais excitáveis eletricamente, justamente por apresentarem uma maior quantidade de massa muscular e menor quantidade de tecido adiposo na região gluteofemoral em relação às mulheres30.

Acreditamos que a utilização da DOC com um equipamento de ondas curtas capacitivo pode ter gerado maior carga térmica no tecido adiposo em comparação ao tecido muscular, especialmente nas mulheres8. Esse maior aquecimento da gordura pode ter acarretado um aumento de fluxo sanguíneo e da condutividade elétrica neste tecido, fazendo com que a corrente elétrica se concentrasse ainda mais nessa região, aumentando assim o limiar de ativação do sistema neuromuscular28.

A principal limitação apresentada neste estudo foi a não mensuração da composição corporal dos participantes. Estudos futuros investigando a associação entre composição corporal e capacidade de geração de torque induzido eletricamente após a aplicação de calor devem ser realizados. Além disso, estudos que investiguem se o aumento do TEI após a aplicação de calor irá gerar um aumento de força clinicamente significante nesses indivíduos são necessários.

CONCLUSÃO

A diatermia por ondas curtas não influenciou o torque gerado pela contração voluntária. Porém, a aplicação prévia do calor profundo produziu um aumento do torque eletricamente induzido nos indivíduos do sexo masculino. Além disso, o desconforto produzido durante a estimulação elétrica foi maior nos indivíduos do sexo feminino após a aplicação do calor.

Todos os autores declararam não haver qualquer potencial conflito de interesses referente a este artigo.

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  • Correspondência:

    Richard Eloin Liebano
    Programa de Mestrado e Doutorado em Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID).
    Rua Cesário Galeno, 448/475
    03071-000 – São Paulo, SP, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Set 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 2013
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