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Perfil do diagnóstico inicial em pacientes com glaucoma

Profile of initial diagnosis in patients with glaucoma

RESUMO

Objetivo

Avaliar o estágio do glaucoma no momento de seu diagnóstico.

Métodos

Estudo transversal e descritivo, usando dados obtidos por meio de consultas ao banco de dados de pacientes glaucomatosos atendidos em sua primeira consulta, antes da instituição de quaisquer tratamentos.

Resultados

Foram incluídos 101 pacientes (177 olhos). Apenas 31 (30,69%) deles referiam história familiar positiva para glaucoma. Encontraram-se 26% dos olhos avaliados com alterações perimétricas avançadas, dez olhos (5,8%) com visão pior que 20/400 e, destes, três pacientes apresentavam cegueira legal em ambos os olhos. Os fatores associados à gravidade do glaucoma foram idade avançada e pressão intraocular elevada.

Conclusão

O conhecimento da situação no diagnóstico inicial retrata a realidade do glaucoma em nosso meio e prediz ações visando à prevenção da cegueira.

Glaucoma; Cegueira; Fatores de risco; Glaucoma/epidemiologia

ABSTRACT

Objective

To assess the stage of the disease at the time of diagnosis.

Methods

Cross-sectional and descriptive study, using data obtained by searching the database of glaucoma patients in their first consultation, before the starting any treatment.

Results

101 patients (177 eyes) were included. Only 31 (30.69%) patients reported a positive family history of glaucoma. We found 26% of the evaluated eyes with advanced perimetric alterations, ten eyes (5.8%) with vision worse than 20/400, of these, three patients had legal blindness in both eyes. Factors associated with glaucoma severity were advanced age and high IOP.

Conclusion

Knowledge of the situation in the initial diagnosis portrays the reality of glaucoma in our environment and predicts actions aimed at preventing blindness.

Glaucoma; Blindness; Risk factors; Glaucoma/epidemiology

INTRODUÇÃO

O glaucoma é uma neuropatia óptica progressiva que cursa com danos estruturais no nervo óptico e diminuição na camada de fibras nervosas da retina (CFNR), promovendo alterações funcionais irreversíveis no campo visual.(11. Salai AF, Souza TT, Netto LS, Oliveira LS, Shimono CT, Cunha RD. Perfil clínico epidemiológico de pacientes com glaucoma encaminhados ao serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. Arq Catarinenenses Med. 2011;40(3):37-42.) Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença é a principal causa de cegueira irreversível, respondendo por aproximadamente 13% a 20% da cegueira global.(22. Ramalho CM, Ribeiro LN, Olivieri LS, Silva JA, Vale TC, Duque WP. Perfil socioeconômico dos portadores de glaucoma no serviço de oftalmologia do hospital universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora - Minas Gerais - Brasil. Arq Bras Oftalmol. 2007;70(5):809-13.,33. Demarco AL, Rodrigues ML, Demarco LA. Perfil oftalmológico de pacientes ingressantes no setor de glaucoma de um serviço universitário. Med (Ribeirao Preto Online). 2002;35(4):478.)

A doença apresenta como principais fatores de risco história familiar positiva, afrodescendência, alta miopia, espessura corneana fina, idade acima de 40 anos e aumento da pressão intraocular (PIO).(11. Salai AF, Souza TT, Netto LS, Oliveira LS, Shimono CT, Cunha RD. Perfil clínico epidemiológico de pacientes com glaucoma encaminhados ao serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. Arq Catarinenenses Med. 2011;40(3):37-42.,44. Santiago MB, VillasBoas FS, Pimentel RL, Rocha JC, Pinheiro RH, Fraife AC. Projeto glaucoma: perfil dos pacientes atendidos em um serviço de referência, Salvador-Ba. 2019 Jun 11 [cited 2021 Dec 23]; Available from: https://repositorio.bahiana.edu.br:8443/jspui/handle/bahiana/3915
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) A principal estratégia de tratamento é a redução da PIO.(11. Salai AF, Souza TT, Netto LS, Oliveira LS, Shimono CT, Cunha RD. Perfil clínico epidemiológico de pacientes com glaucoma encaminhados ao serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. Arq Catarinenenses Med. 2011;40(3):37-42.,44. Santiago MB, VillasBoas FS, Pimentel RL, Rocha JC, Pinheiro RH, Fraife AC. Projeto glaucoma: perfil dos pacientes atendidos em um serviço de referência, Salvador-Ba. 2019 Jun 11 [cited 2021 Dec 23]; Available from: https://repositorio.bahiana.edu.br:8443/jspui/handle/bahiana/3915
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,55. Osaki TH, Kasahara N. Qual a gravidade com que pacientes portadores de glaucoma se apresentam em um serviço terciário? Universo Visual: Glaucoma. 2010;13:5-8.) Porém, por ser assintomática nos casos iniciais, o paciente somente procura auxílio médico após a instalação dos sintomas, ou seja, no estágio avançado.(66. Fraser S, Bunce C, Wormald R, Brunner E. Deprivation and late presentation of glaucoma: case-control study. BMJ. 2001;322(7287):639-43.) Dessa forma, o glaucoma continua sendo uma das doenças mais subdiagnosticadas do mundo.(77. Tan NY, Friedman DS, Stalmans I, Ahmed II, Sng CC. Glaucoma screening: Where are we and where do we need to go? Curr Opin Ophthalmol. 2020;31(2):91-100.)

Nos países em desenvolvimento, a cegueira poderia ser evitada em até 80% dos casos, se detectada precocemente,(88. Vuori ML, Nikoskelainen E. Evaluation of glaucoma patients referred to a university clinic during one year. Acta Ophthalmol Scand. 1997;75(6):692-4.) porém, a escassez de serviço na rede pública acarreta grande demanda e aumento da fila, atrasando o início do tratamento e acompanhamento e piorando o prognóstico visual final.(66. Fraser S, Bunce C, Wormald R, Brunner E. Deprivation and late presentation of glaucoma: case-control study. BMJ. 2001;322(7287):639-43.)

A prevalência da doença em nosso país é próxima de 3,4%,(99. Sakata K, Sakata LM, Sakata VM, Santini C, Hopker LM, Bernardes R, et al. Prevalence of glaucoma in a South Brazilian population: Projeto Glaucoma. Investig Ophthalmol Vis Sci. 2007;48(11):4974-9.) mas o Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) estima que existam 1 milhão de pacientes portadores, e, destes, 70% permanecem sem diagnóstico.(33. Demarco AL, Rodrigues ML, Demarco LA. Perfil oftalmológico de pacientes ingressantes no setor de glaucoma de um serviço universitário. Med (Ribeirao Preto Online). 2002;35(4):478.,1010. Chua J, Baskaran M, Ong PG, Zheng Y, Wong TY, Aung T, et al. Prevalence, risk factors, and visual features of undiagnosed glaucoma: The Singapore Epidemiology of Eye Diseases Study. JAMA Ophthalmol. 2015;133(8):938-46.) Diante da carência de dados no Brasil e a multifatoriedade da doença, este estudo objetivou avaliar o estágio do glaucoma no momento de seu diagnóstico.

MÉTODOS

Trata-se de estudo transversal e descritivo, usando dados obtidos de prontuários dos pacientes portadores de glaucoma atendidos por três glaucomatólogos em sua primeira consulta, quando diagnosticado. Eles foram atendidos após encaminhamento ou livre demanda no Hospital de Olhos Leiria de Andrade, em Fortaleza (CE). Pacientes com diagnóstico prévio de glaucoma ou hipertensos oculares em uso de hipotensores ou submetidos a procedimentos fistulizantes foram excluídos. Adicionalmente, os portadores de patologias associadas que causassem danos na perimetria automática ou que não mantiveram o acompanhamento regular com os especialistas não foram incluídos.

Os pacientes com diagnóstico de glaucoma primário de ângulo aberto (GPAA) foram incluídos com proporção escavação/disco (E/D) vertical ≥0,7 avaliada pela biomicroscopia de fundo em lâmpada de fenda, com a presença de, pelo menos, dois sinais relacionados ao glaucoma (Hoyt, Notch, assimetria de E/D maior que 0,2 entre os olhos e alteração da regra Inferior, Superior, Nasal e Temporal – ISNT), associados a alterações correlacionadas na tomografia de coerência óptica (OCT), quando realizada. Os critérios de lesão perimétrica foram segundo Anderson (três ou mais pontos adjacentes com p<5%, no gráfico pattern deviation, sendo pelo menos um ponto com p<1%; teste de hemicampo para glaucoma – GHT – com descrição outside normal limits ou borderline; índice PSD com nível menor que 5%), sendo correlacionados à lesão estrutural.

As variáveis pesquisadas e cadastradas foram idade, sexo, histórico familiar de glaucoma, olho acometido, tipo de glaucoma, melhor acuidade visual corrigida (MAVC), PIO, espessura corneana medida por paquimetria ultrassônica, mean deviation (MD) da perimetria automática Humphrey com índices aceitáveis de confiabilidade, na estratégia SITA Standard e programa 24-2 e as classes dos hipotensores prescritos.

A MAVC foi agrupada em 20/20 a 20/100, 20/150 a 20/400 e pior que 20/400. A gravidade do glaucoma foi classificada pela MD, seguindo a seguinte escala: MD menor que -6dB (glaucoma inicial), MD entre -6dB e -12dB (glaucoma moderado) e MD pior que -12dB (glaucoma avançado) em qualquer um dos olhos avaliados.

Análise dos dados e estatística

Os dados foram consolidados em números absolutos e percentuais. As variáveis contínuas com distribuição normal utilizadas foram medidas de tendência central (média) e dispersão (desvio-padrão), sendo apresentadas sob a forma de gráficos e tabelas. A análise foi realizada com auxílio do software BioEstat® 5.019 e, para a tomada de decisão, adotou-se nível de significância p<5%, sinalizando com asterisco os valores significantes.

RESULTADOS

Foram incluídos 101 pacientes, dos quais 82 tinham ambos os olhos acometidos pelo glaucoma e 13 apresentavam a doença em apenas um dos olhos, totalizando 177 olhos. A média de idade dos pacientes avaliados neste estudo foi de 59,9±13,56 anos com leve predomínio de pacientes do sexo feminino (54,4%). Pacientes com pelo menos um dos olhos com glaucoma avançado apresentaram a média de idade de 64±13 anos, enquanto aqueles com glaucoma moderado e leve apresentaram 63±9 e 54±13 anos, respectivamente.

Os tipos de glaucomas encontrados estão caracterizados na Tabela 1 (baseado na classificação de Foster).(1111. Foster PJ, Buhrmann R, Quigley HA, Johnson GJ. The definition and classification of glaucoma in prevalence surveys. Br J Ophthalmol. 2002;86(2):238-42.)

Tabela 1
Classificação do glaucoma encontrado nos pacientes

Apenas 31 pacientes (30,69%) refeririam história familiar positiva para glaucoma, porém 19,3% dos pacientes com glaucoma avançado referiram positividade, enquanto os portadores moderados e leves apresentaram, respectivamente, 36,0% e 35,0% relatos de história familiar.

Sobre a MAVC, dos 177 olhos avaliados, observaram-se 155 olhos (87,5%) entre 20/20 e 20/100, 12 olhos (6,7%) entre 20/150 e 20/400 e dez olhos (5,8%) com visão pior que 20/400; destes, cinco olhos tinham visão de vultos e dois não tinham percepção luminosa (Tabela 2). Também verificou-se que três pacientes apresentavam MAVC pior que 20/400 em ambos os olhos. Os demais dados da avalição oftalmológica dos olhos avaliados estão na tabela 3. Na tabela 4 correlaciona-se o tipo de glaucoma com os tipos de glaucoma levantados no estudo. Dentre os fatores de risco avaliados, a idade e o valor da PIO na consulta inicial foram associados à gravidade da doença.

Tabela 2
Acuidade visual dos olhos incluídos no estudo
Tabela 3
Avaliação oftalmológica dos olhos inclusos no estudo
Tabela 4
Comparação entre olhos com tipos de glaucoma

Sobre a terapia instituída nos olhos com glaucoma inicial, foram administrados em monoterapia com maior frequência os análogos de prostaglandina (APG) em 52 olhos, seguidos por betabloqueadores em 33 olhos e alfa-adrenérgico em seis olhos. Em quatro olhos, foi usada associação entre APG e betabloqueador e, em dez olhos, foi indicada iridotomia associada ao tratamento clínico. Para apenas um olho foi indicada trabeculoplastia seletiva a laser (SLT) antes de se iniciarem colírios. Nos olhos com glaucoma intermediário, as prescrições em monoterapia foram os APG em 18 olhos, betabloqueadores em seis, alfa-adrenérgico em três e oito olhos em uso de APG associado ao betabloqueador. Por fim, nos glaucomas avançados, o tratamento com as APG em monoterapia foi feito em 13 olhos, betabloqueador em cinco e, em 28 olhos, foi necessário associar outras classes. Também foi indicada iridotomia em um olho com glaucoma avançado.

DISCUSSÃO

O glaucoma é uma das principais causas de cegueira prevenível na população adulta, porém há escassez de dados na literatura referente à prevalência e ao perfil epidemiológico da doença em nosso país. Este estudo verificou que a maioria de pacientes era portadora de GPAA (80%) se comparado ao glaucoma primário de ângulo fechado (GPAF) (12%). Essa proporção pode variar de acordo com a etnia estudada, porém, em estudo envolvendo pacientes da Região Sul do país, a prevalência de GPAF foi maior (21%).(99. Sakata K, Sakata LM, Sakata VM, Santini C, Hopker LM, Bernardes R, et al. Prevalence of glaucoma in a South Brazilian population: Projeto Glaucoma. Investig Ophthalmol Vis Sci. 2007;48(11):4974-9.)

Referente à faixa etária, não se verificaram grandes divergências com a literatura. A prevalência do glaucoma aumenta consideravelmente com o envelhecimento, e a idade ao diagnóstico mostrou-se ser proporcional à sua gravidade.(1212. Varma R, Ying-Lai M, Francis BA, Nguyen BB, Deneen J, Wilson MR, et al. Prevalence of open-angle glaucoma and ocular hypertension in Latinos: The Los Angeles Latino Eye Study. Ophthalmology. 2004;111(8):1439-48.) Os dados apresentados por outros estudos mostraram que a população acima da sexta década de vida é a mais acometida.(11. Salai AF, Souza TT, Netto LS, Oliveira LS, Shimono CT, Cunha RD. Perfil clínico epidemiológico de pacientes com glaucoma encaminhados ao serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. Arq Catarinenenses Med. 2011;40(3):37-42.,1313. Vaidergorn PG, Oliveira CL, Tanaka LK, Elias IR, Nascimento LT, Treveza M. Condições clínicas de pacientes glaucomatosos por ocasião de suas consultas iniciais: o que mudou nas últimas décadas? Rev Bras Oftalmol. 2005;64(5):311-8.) Nossos dados mostram que pacientes com glaucoma avançado apresentaram idade média de 64±13 anos, enquanto aqueles com quadro inicial possuíam idade média de 54±13 anos. O sexo é uma questão controversa. Encontrou-se prevalência do sexo feminino, embora discreta, de 54,4%. Outros autores sugerem, igualmente, predomínio do sexo feminino,(11. Salai AF, Souza TT, Netto LS, Oliveira LS, Shimono CT, Cunha RD. Perfil clínico epidemiológico de pacientes com glaucoma encaminhados ao serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. Arq Catarinenenses Med. 2011;40(3):37-42.,1414. Diniz ER, Filipe G, Ferreira M, Stefane B, Cotta S, Luiz V, et al. Perfil clínico epidemiológico de pacientes com glaucoma atendidos em um serviço de referência em oftalmologia do estado de Minas Gerais. Rev Méd Minas Gerais. 2021;31:31103.,1515. Silva LM, Vasconcellos JP, Temporini ER, Costa VP, Kara-José N. Tratamento clínico do glaucoma em um hospital universitário: custo mensal e impacto na renda familiar. Arq Bras Oftalmol. 2002;65(3):299-303.) porém Rudnicka et al., em revisão sistemática, demonstraram prevalência maior em homens.(1616. Rudnicka AR, Mt-Isa S, Owen CG, Cook DG, Ashby D. Variations in primary open-angle glaucoma prevalence by age, gender, and race: a Bayesian meta-analysis. Invest Ophthalmol Vis Sci. 2006;47(10):4254-61)

A história familiar tem sido considerada fator de risco importante e pode variar de acordo com o nível de parentesco do paciente com o familiar afetado. Acredita-se que a chance possa dobrar ou ser até nove vezes maior quando há familiares com a doença.(1717. Paranhos Júnior A, Omi CA, Prata Júnior J. III Consenso Brasileiro de Glaucoma primário de ângulo aberto. Point B, editor. São Paulo; 2009.,1818. McMonnies CW. Historial de glaucoma y factores de riesgo. J Optom. 2017;10(2):71-8.) Estudos populacionais de Osaki et al. e Salai et al. encontraram 21% e 13% de antecedentes familiares positivos para a doença, respectivamente.(11. Salai AF, Souza TT, Netto LS, Oliveira LS, Shimono CT, Cunha RD. Perfil clínico epidemiológico de pacientes com glaucoma encaminhados ao serviço de oftalmologia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina. Arq Catarinenenses Med. 2011;40(3):37-42.,55. Osaki TH, Kasahara N. Qual a gravidade com que pacientes portadores de glaucoma se apresentam em um serviço terciário? Universo Visual: Glaucoma. 2010;13:5-8.) Esses dados apontam que 31,3% dos pacientes relatavam parentes com a enfermidade. É válido ressaltar que o histórico familiar positivo evita o diagnóstico tardio, uma vez que os familiares de pacientes procuram o médico antes dos que desconhecem a doença ou não têm essa condição na família. Neste estudo, pacientes com estágios iniciais ou moderados relatavam maior história familiar em comparação aos pacientes em estágio avançado.

A PIO é o principal fator de risco, pois a ocorrência da doença aumenta conforme os níveis e a flutuação se elevem. Além disso, sua redução diminui o risco de progressão da doença.(1919. Francis BA, Varma R, Chopra V, Lai MY, Shtir C, Azen SP. Intraocular pressure, central corneal thickness, and prevalence of open-angle glaucoma: The Los Angeles Latino Eye Study. Am J Ophthalmol. 2008;146(5):741-6.,2020. Gordon MO, Torri V, Miglior S, Beiser JA, Floriani I, Miller JP, et al. Validated prediction model for the development of primary open-angle glaucoma in individuals with ocular hypertension. Ophthalmology. 2007;114(1).) Este estudo mostra que pacientes com olhos em estágio avançado chegaram ao primeiro atendimento com média de 26±10mmHg, enquanto no estágio inicial a média foi mais baixa (19±5mmHg). Não se correlacionou a acuidade visual com níveis pressóricos, pois, mesmo em glaucomas mais graves, a MAVC pode estar mantida. Porém, estudos mostram que níveis elevados de PIO apresentam relação com baixa MAVC.(2121. Rodrigues AC, Silva MR, Schellini SA. Número de olhos cegos por glaucoma detectados em primeira consulta num hospital universitário. Arq Bras Oftalmol. 1998;61(5):4-8.) Neste estudo, dez olhos tiveram baixa visão; destes, dois sem percepção luminosa, e três pacientes foram considerados cegos bilateralmente. Esses pacientes tinham idade média de 61±13,2 anos. Sakata et al., em sua avaliação com amostra de 1.636 pessoas, identificaram dez casos de cegueira unilateral, mas ninguém era cego bilateralmente.(99. Sakata K, Sakata LM, Sakata VM, Santini C, Hopker LM, Bernardes R, et al. Prevalence of glaucoma in a South Brazilian population: Projeto Glaucoma. Investig Ophthalmol Vis Sci. 2007;48(11):4974-9.)

A espessura central da córnea também é fator para o desenvolvimento do glaucoma, principalmente o GPAA.(1919. Francis BA, Varma R, Chopra V, Lai MY, Shtir C, Azen SP. Intraocular pressure, central corneal thickness, and prevalence of open-angle glaucoma: The Los Angeles Latino Eye Study. Am J Ophthalmol. 2008;146(5):741-6.,2222. Medeiros FA, Sample PA, Zangwill LM, Bowd C, Aihara M, Weinreb RN. Corneal thickness as a risk factor for visual field loss in patients with preperimetric glaucomatous optic neuropathy. Am J Ophthalmol. 2003;136(5):805-13.)Este estudo aponta média de 518,8±35,2µm. Os olhos em estágio avançado apresentaram córneas mais finas (511±42µm) comparado aos estágios intermediário (513±31µm ) e inicial (520±32µm), porém sem diferença estatística.

A E/D e outros sinais relacionados ao glaucoma neste estudo não foram usados para classificar a gravidade da doença, por mais que tenham sido fundamentais no diagnóstico. Também não foram usados os danos estruturais na OCT, uma vez que somente parcela dos pacientes (16 pacientes) a realizou. Para classificação, usou-se o índice da MD da perimetria automática, que é uma média ponderada na qual as lesões centrais têm mais peso que os periféricos, fazendo parte do estadiamento da gravidade. Dessa maneira, pacientes com menores escavações podem ser classificados em estágio avançado caso tenham lesão próximo à região central, e piores MD indicam pacientes com escavações maiores, porém com lesões periféricas. A média da MD ficou -21±6,5dB no estágio avançado, no estágio intermediário foi de -8±1,7dB e de -2±1,7dB no estágio inicial. Considerando o glaucoma responsável por danos irreversíveis, verifica-se que 46 olhos (26%) chegam na primeira consulta com graves lesões na perimetria automática. Isso reflete a realidade da demora do diagnóstico e do início do tratamento adequado.

Dentre os medicamentos utilizados, os mais receitados pelos glaucomatólogos foram os APG, prescritos em 50% dos olhos tratados. Apesar de ser uma medicação com maior custo entre os hipotensores oculares, eles promovem maior redução da PIO que os demais.(1717. Paranhos Júnior A, Omi CA, Prata Júnior J. III Consenso Brasileiro de Glaucoma primário de ângulo aberto. Point B, editor. São Paulo; 2009.) Diversos consensos mundiais preconizam a monoterapia inicial com APG, devido à sua posologia e eficácia.(2323. European Glaucoma Society (EGS). Terminología pautas para. EGS; 2014. Available from: www.eugs.org
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,2424. Canadian Ophthalmological Society Glaucoma Clinical Practice Guideline Expert Committee; Canadian Ophthalmological Society. Canadian Ophthalmological Society evidence-based clinical practice guidelines for the management of glaucoma in the adult eye. Can J Ophthalmol. 2009;44 Suppl 1:S7-93. Erratum in: Can J Ophthalmol. 2009;44(4):477.) O tratamento com betabloqueador foi a segunda classe de medicação mais prescrita (em 24,5% dos olhos) como monoterapia inicial, provavelmente pelo baixo custo e pela maior acessibilidade aos pacientes.

Neste estudo, inferiu-se a crítica de os pacientes serem selecionados entre especialistas. Dessa forma, por mais que não tinham sido tratados, existe a possibilidade de maior quantidade de pacientes em estágio mais avançado. Também existe a tendência de maior prescrição de APG fundamentada nas diretrizes específicas.

CONCLUSÃO

Em nosso país, o glaucoma ainda tem diagnóstico tardio. Por tal motivo, os pacientes apresentam danos graves na primeira consulta. A história familiar da doença foi mais relatada entre os pacientes com estágio inicial. Esse dado sugere a importância da educação e a iniciativa da busca do diagnóstico precoce.

Os olhos avaliados no estudo apresentavam alterações perimétricas avançadas no momento do diagnóstico do glaucoma. Idade avançada e pressão intraocular elevada foram fatores associados à gravidade da doença. Os especialistas indicaram como monoterapia inicial análogos de prostaglandina seguida do betabloqueador.

O conhecimento dos dados relativos à situação do diagnóstico inicial retrata a realidade relacionada ao glaucoma no nosso meio e prediz ações viáveis visando ao diagnóstico e ao tratamento precoce, além de demonstrar a importância do exame oftalmológico de rotina.

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  • Instituição de realização do trabalho: Hospital de Olhos Leiria de Andrade, Fortaleza, CE, Brasil.
  • Fonte de auxílio à pesquisa: trabalho não financiado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2022
  • Aceito
    29 Jul 2022
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