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Espessura central da córnea: catarata congênita, pseudofacia e afacia

Central corneal thickness: congenital cataracts, pseudophakia and aphakia

Resumos

OBJETIVO: Comparação da espessura central da córnea entre crianças com cristalino transparente (controle), catarata, pseudofácicas e afácicas. Estudo prospectivo, observacional. MÉTODOS: Noventa e quatro olhos de 47 crianças foram submetidos à medida da espessura central corneana (ECC) e comparou-se o grupo controle (cristalino transparente) aos pacientes que apresentavam catarata, afacia ou pseudofacia. Pacientes com Síndrome de Down, aniridia, Síndrome de Marfan, glaucoma, anormalidades do segmento anterior ou pressão intraocular maior que 30 mmHg foram excluídos do estudo. RESULTADOS: Dos 94 olhos estudados, 52 faziam parte do grupo controle com ECC média 533,6 µm. No grupo com catarata (n=27) a ECC média foi de 532,3 µm, enquanto no grupo de afácicos (n=8) e pseudofácicos (n=12) de 585,63 µ e 585,7 µ, respectivamente. CONCLUSÃO: A espessura central da córnea é semelhante em olhos com catarata congênita e olhos fácicos, sendo mais espessa após a cirurgia de catarata com ou sem implante de lente intraocular.

Córnea; Topografia da córnea; Catarata; Pseudofacia; Afacia


PURPOSE: To evaluate central corneal thickness (CCT) in phakic children (controls) and in those with cataracts, pseudophakia and aphakia. Study prospective, observational METHODS: Central corneal thickness was measured in 94 eyes of 47 children. Subjects with Down Syndrome, aniridia, Marfan Syndrome, glaucoma, anterior segment abnormalities or intraocular pressure over 30 mmHg were excluded. Groups were compared for controls and for eyes with pediatric cataracts, pseudophakia and aphakia. RESULTS: Twenty-nine patients were male and eighteen female and the mean age was 5. 5 years (range, 1 month to 15 years). Of the 94 eyes, 52 were part of the control group and the CCT average was 533. 6 µm. The average measurement of the CCT for all patients with cataract was 532. 3 µm (n = 27). The average CCT aphakia the group was 585. 63 µm (n = 8) and pseudophakic was 585. 7 µm (n = 12). CONCLUSION: In the absence of factors known to affect CCT (Down syndrome, aniridia, and Marfan syndrome), CCT is similar in eyes with pediatric cataracts and normal controls and increases after cataracts surgery.

Cornea; Corneal topography; Cataract; Pseudophakia; Aphakia


ARTIGO ORIGINAL

Espessura central da córnea: catarata congênita, pseudofacia e afacia

Central corneal thickness: congenital cataracts, pseudophakia and aphakia

Weika Eulálio de Moura SantosI; José Joarez de Siqueira JuniorII; Gustavo SalomãoIII; José Ricardo Carvalho Lima RehderIV

IEstagiário do 3º ano do Setor de Oftalmopediatria da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC - Santo André (SP), Brasil

IIEstagiário do 3º ano do Setor de Córnea e Patologia Externa da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC - Santo Andre (SP),Brasil

IIIChefe do Setor de Oftalmopediatria da Disciplina de Oftalmologia da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC - Santo André (SP), Brasil

IVProfessor Titular da Disciplina de Oftalmologia da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC - Santo André (SP), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Weika Eulalio de Moura Santos Rua Dr. Eduardo Amaro, nº 99, Apto 1814 - Paraíso CEP 04104-080 - São Paulo (SP), Brasil Tel: (11) 8343-3843 E-mail: weika80@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Comparação da espessura central da córnea entre crianças com cristalino transparente (controle), catarata, pseudofácicas e afácicas. Estudo prospectivo, observacional.

MÉTODOS: Noventa e quatro olhos de 47 crianças foram submetidos à medida da espessura central corneana (ECC) e comparou-se o grupo controle (cristalino transparente) aos pacientes que apresentavam catarata, afacia ou pseudofacia. Pacientes com Síndrome de Down, aniridia, Síndrome de Marfan, glaucoma, anormalidades do segmento anterior ou pressão intraocular maior que 30 mmHg foram excluídos do estudo.

RESULTADOS: Dos 94 olhos estudados, 52 faziam parte do grupo controle com ECC média 533,6 µm. No grupo com catarata (n=27) a ECC média foi de 532,3 µm, enquanto no grupo de afácicos (n=8) e pseudofácicos (n=12) de 585,63 µ e 585,7 µ, respectivamente.

CONCLUSÃO: A espessura central da córnea é semelhante em olhos com catarata congênita e olhos fácicos, sendo mais espessa após a cirurgia de catarata com ou sem implante de lente intraocular.

Descritores: Córnea/anatomia & histologia;Topografia da córnea; Catarata/congênito; Pseudofacia; Afacia.

ABSTRACT

PURPOSE: To evaluate central corneal thickness (CCT) in phakic children (controls) and in those with cataracts, pseudophakia and aphakia. Study prospective, observational

METHODS: Central corneal thickness was measured in 94 eyes of 47 children. Subjects with Down Syndrome, aniridia, Marfan Syndrome, glaucoma, anterior segment abnormalities or intraocular pressure over 30 mmHg were excluded. Groups were compared for controls and for eyes with pediatric cataracts, pseudophakia and aphakia.

RESULTS: Twenty-nine patients were male and eighteen female and the mean age was 5. 5 years (range, 1 month to 15 years). Of the 94 eyes, 52 were part of the control group and the CCT average was 533. 6 µm. The average measurement of the CCT for all patients with cataract was 532. 3 µm (n = 27). The average CCT aphakia the group was 585. 63 µm (n = 8) and pseudophakic was 585. 7 µm (n = 12).

CONCLUSION: In the absence of factors known to affect CCT (Down syndrome, aniridia, and Marfan syndrome), CCT is similar in eyes with pediatric cataracts and normal controls and increases after cataracts surgery.

Keywords: Cornea/anatomy & histology; Corneal topography; Cataract/congenital; Pseudophakia; Aphakia

INTRODUÇÃO

Atonometria de aplanação de Goldmann tem sido o padrão ouro para a medida da pressão intraocular desde sua introdução em 1956(1) e pode ser falseada pela variação da espessura central corneana (ECC) em adultos (2,4) e crianças.(4,6)

A medida da ECC através do paquímetro óptico foi descrita pela primeira vez em 1951 por Maurice e Giardini. O primeiro paquímetro ultrassônico foi descrito por Kremer em 1980.(7)

A ECC é menor na área central, aumentando em direção à periferia. A córnea da criança prematura e recém-nascida é mais espessa que a córnea do adulto; após 48 horas do nascimento, a córnea já está menos espessa e próximo aos 3 anos atinge o valor definitivo.(7)

Crianças com história de catarata congênita que são afácicas ou pseudofácicas possuem ECC maior que crianças com cristalino transparente(8,9), mas é desconhecido se o aumento da espessura central da córnea ocorre antes da cirurgia ou se desenvolve após a mesma. O glaucoma é uma consequência comum em cirurgia de catarata congênita(10), e uma espessura corneana fora dos limites normais talvez seja um fator importante no diagnóstico e conduta de crianças pseudofácicas e afácicas com glaucoma, pois o efeito da ECC pode falsear a medida da pressão intraocular (PIO).

MÉTODOS

Crianças atendidas no ambulatório de Oftalmopediatria do Instituto de Olhos da Faculdade de Medicina do ABC entre agosto de 2006 a setembro 2008 participaram do estudo, sendo incluídas aquelas com história de catarata congênita, afácicas, pseudofácicas e com cristalino transparente.

Pacientes com história de cirurgia de glaucoma ou com diagnóstico conhecido de glaucoma, idade acima de 15 anos, anormalidades do segmento anterior, pressão intraocular maior que 30 mmHg, incapacidade de cooperar com a mensuração da ECC, bem como pacientes com Síndrome de Down (11), Aniridia (12) e Síndrome de Marfan (13), que estão associados com uma espessura central da córnea alterada, foram excluídos do estudo.

A coleta de dados incluiu: idade, sexo, história de cirurgia, diagnóstico ocular, ECC e tonometria de aplanação de Perkins. A mensuração padrão da ECC foi realizada previamente em alguns dos pacientes do estudo. Para anestesia da córnea, cloridrato de proximetacaína 0,5% tópico foi instilado e com a sonda do paquímetro ultrassônico no centro da córnea, dez medidas foram anotadas para cada olho. O paquímetro utilizado para mensuração foi OcuScan (Alcon)®, fórmula Herndon e a mensuração foi realizada por um único examinador.

Cada olho de cada grupo foi avaliado individualmente. Os grupos avaliados foram comparados separadamente com o grupo controle. Foi utilizado o Teste de Correlação de Spearman e o Teste de Kruskal-Wallis.

RESULTADOS

Noventa e quatro olhos de quarenta e sete pacientes foram incluídos no estudo, sendo vinte e nove pacientes do sexo masculino e dezoito do feminino, com a média de idade de 5,5 anos (variando de 1 mês a 15 anos). Os participantes foram separados em 4 grupos: controle (Tabela 1), catarata (Tabela 2), afácicos (Tabela 3) e pseudofácicos (Tabela 4) e avaliados em relação a ECC, idade e pressão intraocular.

Dos 94 olhos, 52 faziam parte do grupo controle e a média da ECC foi 533,6 µm. A média da ECC dos pacientes com catarata foi 532,3 µm, enquanto no grupo afácico e pseudofácico foi de 585,63 µm e 585,7 µm, respectivamente (Tabela 5). No grupo controle e no grupo pseudofácico, com média de idade de 7 anos, não houve correlação significativa entre os valores de ECC, PIO e idade. Em contrapartida, nos grupos com catarata e afácicos, observamos um aumento da pressão intraocular com o aumento da idade, com média de 5 e 2,8 anos, respectivamente.

Dez olhos possuíam catarata congênita unilateral e a média da ECC do olho com catarata antes da cirurgia era maior que o olho contralateral (controle): 527,3 µm e 514 µm, respectivamente (Tabela 6).

DISCUSSÃO

No nosso estudo, os vinte pacientes submetidos à cirurgia de catarata não desenvolveram glaucoma até o presente momento. Sabe-se que olhos afácicos de crianças possuem uma espessura central da córnea maior que olhos fácicos (8,9). Kelly et al. recentemente relataram um aumento de 45% de crianças afácicas (maior ECC) que desenvolveram glaucoma (14). Se o aumento da ECC é um fator protetor contra o desenvolvimento do glaucoma como sugeriu Ocular Hypertension Treatment Study (15), por que estas crianças evoluíram com glaucoma? Esses autores relataram também que um maior tempo de afacia se correlacionou com uma maior média na espessura central da córnea(14). Nilforushan e associados relataram em um estudo semelhante, um aumento na ECC em crianças afácicas comparadas com crianças fácicas de idade e contagem celular endotelial semelhante.(16) Porém, não observamos no presente estudo correlação entre duração do estado de afacia e aumento da ECC durante um ano de acompanhamento.

Verificamos que olhos pseudofácicos (585,7µm [n= 12]) e olhos afácicos (585,63 µm [n=8]) possuíam maior ECC que olhos fácicos (533,6 µm [n=52]) e olhos com catarata (532,3 µm [n=27]).

A influência da idade na ECC não é clara. Day e Gunderson (17) não encontraram diferença na ECC entre um grupo de crianças mais jovens com 2 anos de idade e um grupo com 18 anos de idade. Neste estudo, no grupo controle e no grupo pseudofácico (média de idade de 7 anos) não houve correlação significativa entre os valores de ECC, PIO e idade. Entretanto, nos grupos com catarata e afácicos, observamos um aumento da pressão intraocular com o aumento da idade (5 e 2,8 anos respectivamente). Nesses dois grupos (catarata e afácicos) a média de idade era menor, sendo necessário avaliação sob sedação inalatória em alguns casos, podendo ter ocorrido influência do anestésico na aferição da PIO.

A diferença na ECC entre os grupos sugere que o aumento da espessura central da córnea ocorre após cirurgia. Porém, a razão deste aumento da ECC ser devido aos danos causados às células endoteliais durante a remoção da catarata ou ser consequência do estado de afacia ou pseudofacia permanece desconhecido. Uma avaliação, a longo prazo, mais detalhada da ECC antes e após a extração da catarata seria necessária para elucidar esta questão; e assim avaliar seu papel no desenvolvimento de glaucoma nessas crianças.

Recebido para publicação em: 22/9/2009

Aceito para publicação em 5/5/2010

Disciplina de Oftalmologia da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC - Santo André (SP), Brasil

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  • Endereço para correspondência:
    Weika Eulalio de Moura Santos
    Rua Dr. Eduardo Amaro, nº 99, Apto 1814 - Paraíso
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Set 2010
    • Data do Fascículo
      Ago 2010

    Histórico

    • Recebido
      22 Set 2009
    • Aceito
      05 Maio 2010
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