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Tempo de internação pré-operatório: um fator de risco para reduzir a infecção cirúrgica em fraturas de fêmur

RESUMO

OBJETIVO:

Analisar as infecções de sítio cirúrgico em pacientes submetidos a cirurgias limpas para correção de fraturas de fêmur.

MÉTODOS:

Estudo tipo coorte histórica desenvolvido em um hospital de grande porte de Belo Horizonte. A coleta dos dados foi feita nos registros dos prontuários eletrônicos, de julho de 2007 a julho de 2009. Foram coletados dados referentes às características dos pacientes, dos procedimentos cirúrgicos e das infecções cirúrgicas. Os fatores de risco para infecção foram identificados por meio de testes estatísticos de hipóteses bilaterais, considerando nível de significância de 5%. As variáveis contínuas foram avaliadas por teste tde Student. As variáveis categóricas foram analisadas por meio de teste de qui-quadrado ou exato de Fisher, quando necessário. Para cada fator sob análise, foi obtida uma estimativa pontual e por intervalos de confiança de 95% para o risco relativo. Na última etapa do trabalho, foi feita uma análise multivariada (regressão logística).

RESULTADOS:

Foram incluídos neste estudo 432 pacientes submetidos a cirurgias limpas de correção de fratura de fêmur. A taxa de incidência de ISC foi de 4,9% e os fatores de risco identificados foram a presença de acidente vascular cerebral (razão das chances - OR = 5) e período de internação até a cirurgia acima de quatro dias (OR = 3,3).

CONCLUSÃO:

Para a prevenção das infecções de sítio cirúrgico (ISC) das cirurgias de fraturas de fêmur serão necessárias medidas que envolvam a equipe multiprofissional na avaliação das condições clínicas dos pacientes, redução do tempo de internação até a cirurgia e prevenção das complicações decorrentes das infecções.

Palavras-chave:
Infecção da ferida operatória; Fraturas do fêmur; Fatores de risco

ABSTRACT

OBJECTIVE:

To analyze infections of the surgical site among patients undergoing clean-wound surgery for correction of femoral fractures.

METHODS:

This was a historical cohort study developed in a large-sized hospital in Belo Horizonte. Data covering the period from July 2007 to July 2009 were gathered from the records in electronic medical files, relating to the characteristics of the patients, surgical procedures and surgical infections. The risk factors for infection were identified by means of statistical tests on bilateral hypotheses, taking the significance level to be 5%. Continuous variables were evaluated using Student'sttest. Categorical variables were evaluated using the chi-square test, or Fisher's exact test, when necessary. For each factor under analysis, a point estimate and the 95% confidence interval for the relative risk were obtained. In the final stage of the study, multivariate logistic regression analysis was performed.

RESULTS:

432 patients who underwent clean-wound surgery for correcting femoral fractures were included in this study. The rate of incidence of surgical site infections was 4.9% and the risk factors identified were the presence of stroke (odds ratio, OR = 5.0) and length of preoperative hospital stay greater than four days (OR = 3.3).

CONCLUSION:

To prevent surgical site infections in operations for treating femoral fractures, measures involving assessment of patients' clinical conditions by a multiprofessional team, reduction of the length of preoperative hospital stay and prevention of complications resulting from infections will be necessary.

Keywords:
Infection of the operative wound; Femoral fractures; Risk factors

Introdução

Como um evento adverso, infecção de sítio cirúrgico (ISC) é um desastre para ambos, paciente e cirurgião, especialmente em cirurgias limpas com redução aberta de fratura de fêmur e quadril. Na América Latina, os custos financeiros envolvidos com fraturas do fêmur proximal foram avaliados entre 1980-2003 e variaram de US$ 4.500 a US$ 6.000 por paciente. No Brasil esses valores podem chegar a US$ 5.500 por paciente. 11. Sakaki MH, Oliveira RA, Coelho FF, Garcez ELL, Suzuki I, Amatuzzi MM. Estudo da mortalidade na fratura do fêmur proximal em idosos. Acta Ortop Bras. 2004;12(4):242-9.A cada ano, o Sistema Único de Saúde (SUS) passou a aumentar tratamentos em fraturas do fêmur em idosos. Em 2009, gastamos aproximadamente R$ 57,61 milhões em admissões para R$ 24,77 milhões em medicamentos para tratamento da osteoporose, uma importante causa de fratura de fêmur. Em 2006, essas despesas foram de R$ 49 milhões e R$ 20 milhões, respectivamente. Hannan et al. 22. Hannan EL, Magaziner J, Wang JJ, Eastwood EA, Silberzweig SB, Gilbert M, et al. Mortality and locomotion 6 months after hospitalization for hip fracture: risk factors and risk-adjusted hospital outcomes. JAMA. 2001;285(21):2736-42.afirmam que o custo social e econômico das fraturas de fêmur aumenta ainda mais pelo fato de que após um período de internação o paciente idoso enfrenta altas taxas de mortalidade, precisa de cuidados médicos intensivos e longos períodos de reabilitação. O tratamento da maioria das fraturas de fêmur é cirúrgico. O uso de novos materiais para a substituição da prótese procura menor taxa de complicações devido a sua tecnologia e desenho. As cirurgias de acordo com o potencial de contaminação da ferida podem ser classificadas como limpa, potencialmente contaminadas, contaminadas e infectadas. Arrowsmith 33. Arrowsmith M. Surgical site infection. In: Emmerson AM, Arrowsmith M, editors. Infection control practices. Germany: 3 M Medical Markets Laboratory; 1998. p. 60-9.aponta que as cirurgias limpas devem ter uma menor incidência de infecção do sítio cirúrgico (ISC), porque eles têm um menor risco de contaminação em comparação com outras categorias. São considerados marcadores de qualidade de serviço e apresentam uma melhor execução (eletiva, não traumática, tecidos de fácil descontaminação e pele íntegra). A taxa de incidência deve ser inferior a 2%.

Vários fatores de risco relacionados ao paciente e à cirurgia têm sido associados à incidência de ISC em fraturas do fêmur. Os fatores intrínsecos relacionados aos pacientes idosos são estado nutricional inadequado, diabetes mellitus(DM), uso do tabaco, obesidade, infecção de sítio cirúrgico, colonização da pele, resposta imune e período de hospitalização pré-operatório prolongado. 11. Sakaki MH, Oliveira RA, Coelho FF, Garcez ELL, Suzuki I, Amatuzzi MM. Estudo da mortalidade na fratura do fêmur proximal em idosos. Acta Ortop Bras. 2004;12(4):242-9.Os fatores extrínsecos associados ao ato operatório e aos pacientes estão relacionados com preparação da pele, vestuário adequado, preparo das mãos do pessoal, tempo e técnica cirúrgica, processamento de materiais e artigos, preparação de antibiótico e do ambiente cirúrgico. O controle desses fatores é essencial para minimizar a contaminação do sítio cirúrgico. 44. Anderson DJ, Kaye KS, Classen D, Arias KM, Podgorny K, Burstin H, et al. Strategies to prevent surgical site infections in acute care hospitals. Infect Control Hosp Epidemiol. 2008;29 Suppl 1:S51-61.Estudos reforçam a necessidade de priorizar o atendimento de pacientes com fratura de fêmur, principalmente em relação ao tempo decorrido entre a fratura e o procedimento cirúrgico. 55. Moran CG, Wenn RT, Sikand M, Taylor AM. Early mortality after hip fracture: is delay before surgery important? J Bone Joint Surg Am. 2005;87(3):483-9.

Aqui, investigamos o pré-operatório e os parâmetros operacionais que estão associados à infecção de sítio cirúrgico após a redução aberta de fratura de fêmur. O objetivo do nosso estudo é responder a cinco perguntas: 1) Qual é o risco de infecção da ferida operatória para pacientes submetidos à redução aberta de fratura de fêmur? 2) Quais são os principais agentes etiológicos de infecção de sítio cirúrgico após a redução aberta de fratura de fêmur? 3) ISC aumenta o risco de morte do paciente após a cirurgia? 4) ISC aumenta tempo de permanência do paciente? 5) Quais são os fatores de risco associados à ISC, após a redução aberta de fratura de fêmur?

Materiais e métodos

Estudo de coorte prospectivo feito para analisar a ISC e os fatores de risco de pacientes submetidos à correção de fraturas de quadril e fêmur, entre julho de 2007 e julho de 2009. O estudo foi feito em um hospital de grande porte, com capacidade para cerca de 350 leitos, referência em urgência, emergência e trauma para o Estado de Minas Gerais, Brasil. A amostra foi composta de 432 pacientes submetidos à cirurgia eletiva para correção de fratura de fêmur. As variáveis respostas foram infecção de sítio cirúrgico e óbito hospitalar. Parâmetros pré-operatórios e operacionais foram divididos em variáveis categóricas e contínuas. As variáveis contínuas estudadas foram: idade, tempo de internação pré-operatório, duração da cirurgia. As variáveis categóricas foram: sexo, tipo de cirurgia, turno quando a cirurgia foi feita (manhã, tarde e noite), tipo de anestesia, escore de avaliação pré-operatória da Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA), Nosocomial Infections Surveillance (índice de risco NNIS), classificação da fratura, tipo de lesão e tipo de osteossíntese, tipo de cirurgia (eletiva ou de emergência). Comorbidades estudadas: diabetes mellitus(DM), insuficiência cardíaca congestiva (ICC), hipertensão arterial sistêmica (HAS), doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), doenças cardíacas, hipercolesterolemia, abuso de álcool, transtorno psiquiátrico, câncer de doença metabólica (CA), acidente vascular cerebral (AVC) e anemia. O tipo de anestesia foi classificado pela combinação de dois ou mais procedimentos com e sem sedação. A hospitalização por cirurgia antes do período definido até quatro dias e acima quatro dias. 66. Ercole FF, Franco CML, Macieira RGT, Wenceslau CCL, Resende NIH, Chianca MCT. Risco para infecc¸ão de sítio cirúrgico em pacientes submetidos a cirurgias ortopédicas. Rev Latino-Am Enfermagem. 2011;19(6):1362-8.A duração da cirurgia foi estratificada em menor ou igual a 138 minutos e acima desse valor. Pontuação ASA foi categorizada em níveis (I, II, III e IV), ASA (I para pacientes saudáveis, II para os pacientes com doença sistêmica moderada, III para pacientes com doenças sistêmicas pré-existentes graves, mas não incapacitantes e IV para os pacientes com doença sistêmica com risco de vida). Na categoria V-5, para aqueles com uma expectativa de vida no máximo de 24 horas, nenhum paciente foi identificado no estudo. Para o índice de cirurgia risco de infecção (IRIC) foi usado escore 0 e pontuação agrupada (1 ou 2) são as cirurgias só limpas. O antibiótico profilático foi testado para uso antes ou durante a cirurgia.

A classificação da fratura de fêmur foi baseada nas regiões do fêmur, fratura do colo do fêmur, 77. Garden RS. The structure and function of the proximal end of the femur. J Bone Joint Surg Br. 1961;43(3):576-89.fratura trocantérica, 88. Tronzo RG. Symposium on fractures of the hip. Special considerations in management. Orthop Clin North Am. 1974;5(3):571-83.fraturas subtrocanterianas. 99. Seinsheimer F. Fraturas subtrocantéricas do fêmur. J Bone Joint Surg Am. 1978;60(3):300-6.Para fraturas da diáfise foi usada a classificação AO 1010. Müller ME. AO Muller Eletronic Long Bone Fracture Classification. 2003. Disponível em: <http://www.aopublishing.org>. (Acesso em: 25 feb. 2012).
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e algumas cirurgias não mostraram classificação. Usamos o CID-10 para codificação e agrupamento dessa variável. 1111. Organizac¸ão Mundial da Saúde/OMS. CID-10. Classificac¸ão estatística internacional de doenc¸as e problemas relacionados à saúde. 3 ed. São Paulo: OMS; 1996.Foram usados cinco tipos de osteossíntese: placa, haste, parafuso, cimento e outros. Foram incluídos pacientes internados no hospital, submetidos à correção cirurgia limpa de fraturas de fêmur de julho de 2007 a julho de 2009.

Fatores de risco e fatores de proteção para a infecção foram identificados por meio de testes estatísticos de hipóteses bilateral, considerando um nível de significância de 5% (a = 0,05). Variáveis contínuas foram avaliadas com o testetde Student ou o teste não paramétrico e as variáveis categóricas foram analisadas com qui-quadrado ou teste exato de Fisher, quando necessário. Para cada fator em análise, obtiveram-se uma estimativa pontual e intervalo de confiança de 95% (IC 95%) para o risco relativo. Na última fase do estudo foi feita uma análise multivariada por regressão logística. Variáveis testadas no modelo logístico foram selecionadas quando a análise univariada gerou um valor de p ≤ 0,25.

Este estudo foi aprovado pelo hospital envolvido Parecer n° 18 e pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), parecer CAEE n° 0108.0.203.000-11, aprovado em 5 de maio de 2011, em conformidade com a resolução 196/96.

Resultados

O estudo incluiu 432 pacientes submetidos à redução aberta de fratura de fêmur entre julho/2007 e julho/2009. A queda da própria altura, da cama e de degraus de escada foi o tipo de trauma mais frequente nos pacientes avaliados com fratura de fêmur, totalizou 59% dos casos, seguido por acidentes de motocicleta (15,5%). O tempo de permanência dos pacientes no hospital variou de um a 139 dias, com mediana de oito. Até a cirurgia, o tempo médio de internação foi de cinco dias e 43% dos pacientes foram até quatro dias. O paciente permaneceu no centro cirúrgico, em média, seis horas, o tempo médio de cirurgia foi de uma hora e 50 minutos e mais de 70% das cirurgias duraram até 138 minutos. A maioria dos pacientes tinha mais de 60 anos, 36% entraram no hospital por uma unidade de emergência e 5% apresentam mais de dois diagnósticos na admissão hospitalar (Tabela 1, Tabela 2and Tabela 3).

Tabela 1 -
Cirurgia aberta para correção de fraturas de fêmur em um hospital terciário: características dos pacientes e cirurgias (julho/2007 a julho/2009)
Tabela 2 -
Análise univariada das variáveis categóricas: tempo de internação pré-operatório superior a quatro dias e acidente vascular cerebral (AVC) são fatores de risco para ISC, após a cirurgia para correção de fratura de fêmur em 5% nível de significância (p < 0,05) (julho/2007 a julho/2009)
Tabela 3 -
Análise univariada das variáveis contínuas: só o tempo de internação antes da cirurgia (dia) está associado a ISC após cirurgia para correção de fratura de fêmur (julho/2007 a julho/2009)

Foram registrados 21 pacientes com ISC entre 432 submetidos à cirurgia para correção de fraturas de fêmur limpas. O risco de infecção foi de 4,9%.

Acidente vascular cerebral (AVC) e tempo de permanência acima de quatro dias apresentaram associação estatisticamente significativa com ISC ( tabela 4).

Tabela 4 -
Análise de variância: no modelo final, o tempo de internação antes da cirurgia e acidente vascular cerebral são independentemente associados com infecção de sítio cirúrgico após cirurgia para correção de fratura de fêmur. Tempo de internação pré-operatório maior do que quatro dias aumenta em quase três vezes a chance de um paciente se infectar (OR = 3,3, p = 0,037) (julho/2007 a julho/2009)

Verifica-se que para os pacientes com AVC que permaneceram internados mais de quatro dias o risco esperado era quase três vezes maior de adquirir infecção do que aqueles que tiveram a doença e foram hospitalizados por até quatro dias. AVC e tempo de internação até a cirurgia foram as variáveis associadas com ISC (tabela 5).

Tabela 5 -
Simulação do risco de ISC: tempo de internação antes da cirurgia e acidente vascular cerebral (AVC)

Em relação à mortalidade hospitalar após a cirurgia de correção de fratura de fêmur, a ISC não está associada com a chance de morte (p = 0,125) ( tabela 6).

Tabela 6 -
A mortalidade hospitalar após a cirurgia para correção de fratura de fêmur: infecção de sítio cirúrgico não está associada com a chance de morte (p = 0,125) (julho/2007 a julho/2009)

Em 10 das 21 infecções registradas não houve identificação do agente etiológico.Staphylococcus aureuse Acinetobacter baumanniiforam os microrganismos mais frequentemente identificados. Apenas 2% dos 432 pacientes apresentaram colonização pré-operatória, a maioria detectada por swab nasal e axilar ( tabela 7).

Tabela 7 -
A cirurgia aberta para correção de fraturas de fêmur em um hospital terciário: a colonização da pele e agentes etiológicos de infecção do sítio cirúrgico (julho/2007 a julho/2009)

Discussão

O risco de ISC de 4,9% registrado neste estudo para pacientes submetidos a fraturas de fêmur limpas foi superior ao citado por Camargo. 1212. Camargo FGC. Urgências clínicas e cirúrgicas. Rio de Janeiro: Atheneu; 2001.Vale ressaltar que as taxas de ISC em cirurgias limpas no hospital estudado foram de aproximadamente 2,2% em relação ao mesmo período de julho de 2007 a 2009, considerando todas as topografias e especialidades, como ortopedia, cirurgia plástica, cirurgia geral e neurocirurgia. É necessário investigar as taxas de ISC por cirurgião e monitorar os fatores de risco relacionados ao paciente e ao procedimento cirúrgico. Sistemas eficazes de vigilância e informação aos cirurgiões sobre suas taxas de infecção demonstraram uma melhor prevenção de ISC. As taxas de infecção podem ser reduzidas para mais de um terço em programas e pessoal treinado na vigilância e no controle de infecções. 1313. Astur CD, Arliani GG, Balbachevsky D, Fernandes AJH, Reis BF. Fraturas da extremidade proximal do fêmur tratadas no Hospital São Paulo/UNIFESP: estudo epidemiológico. RBM: Rev Bras Med. 2011;68:11-5 (número especial).

A população do estudo foi composta por pacientes em sua maioria do sexo masculino (adolescentes, jovens adultos e idosos acima de 60 anos), talvez por causa de ser um hospital de referência para atendimento de emergência. A mulher, no entanto, é considerada por muitos autores como o grupo mais sujeito a fratura do fêmur 11. Sakaki MH, Oliveira RA, Coelho FF, Garcez ELL, Suzuki I, Amatuzzi MM. Estudo da mortalidade na fratura do fêmur proximal em idosos. Acta Ortop Bras. 2004;12(4):242-9.e este estudo mostrou um maior risco de ISC. Pereira, 1414. Pereira SRM. Repercussões sociossanitárias da epidemia das fraturas do fêmur sobre a sobrevivência e a capacidade funcional do idoso. 2003 [tese]. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública; 2003.quando estudava grupos de idosos, encontrou uma taxa de incidência de 72,76% de fraturas de quadril em mulheres.

A classificação das fraturas de fêmur foi estabelecida de acordo com a região afetada: colo do fêmur, trocânter e diáfise subtrocantérica. Em um estudo Muniz et al. 1515. Muniz FC, Arnaut CA, Yoshida M, Trelha SC. Caracterizac¸ão dos idosos com fratura de fêmur proximal atendidos em hospital-escola público. Rev Espac¸o Saúde. 2007;8(2):33-8.mostraram que o principal tipo de fratura foi transtrocantérica (58,73%) e colo do fêmur (38,20%), considerados traumas de baixa energia. Neste estudo a fratura trocantérica teve uma frequência mais alta, mas as fraturas da diáfise apresentaram aumento de risco ISC sem significância estatística.

O tempo de internação após a cirurgia, durante quatro dias, na análise univariada foi estatisticamente significativo no estudo (p = 0,018). Essa associação foi mantida na multivariada e confirmou a presença desse fator de risco para ISC. Período de internação pré-operatório prolongado tem sido associado com o risco para ISC. 66. Ercole FF, Franco CML, Macieira RGT, Wenceslau CCL, Resende NIH, Chianca MCT. Risco para infecc¸ão de sítio cirúrgico em pacientes submetidos a cirurgias ortopédicas. Rev Latino-Am Enfermagem. 2011;19(6):1362-8.Duração cirúrgica foi baseada no corte ( cut point) da metodologia de NHSN/CDC,1616. Centers For Disease Control And Prevention/CDC. The National Healthcare Safety Network (NHSN) manual: patient safety component protocol. Atlanta: Division of Healthcare Quality Promotion, National Center for Preparedness, Detection and Control of Infectious Diseases, 2009. 210 p. Disponível em: &lt;http://www.cdc.gov/nhsn/library.html#psc&gt;. (Acesso em: 20 set. 2009).
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em que o número de minutos definido para esse tipo de operação foi de 138. Apesar de ser uma variável clássica relacionada à ISC, neste estudo não foi associada com a infecção cirúrgica. A longa duração da cirurgia em um ambiente contaminado é propícia para a contaminação e, consequentemente, o desenvolvimento de infecção.1717. Lew DP, Pittet D, Waldvogel FA. Infections that complicate the insertion of prosthetic devices. In: Mayhall CG, editor. Hospital epidemiology and infection control. 3 ed. Philadelphia: Lippincott Willians & Wikins; 2004. p. 1181-205.

A variável ASA, que avalia o estado clínico do paciente no pré-operatório, não foi considerada neste estudo como fator de risco para ISC. Embora os pacientes tivessem predomínio do ASA I, aqueles com ASA IV tinham risco de ISC quatro vezes maior. A pontuação ASA tem sido considerada por muitos autores como um fator de risco para ISC, está diretamente relacionada com a gravidade do paciente e ao risco de infecção. 1818. Oliveira AC, Braz NJ, Ribeiro MM. Incidência da infecc¸ão do sítio cirúrgico em um hospital universitário. Cienc Cuid Saúde. 2007;6(4):486-93.A placa foi a síntese de material mais usada, 224 casos, ou 51%. Sakaki et al.11. Sakaki MH, Oliveira RA, Coelho FF, Garcez ELL, Suzuki I, Amatuzzi MM. Estudo da mortalidade na fratura do fêmur proximal em idosos. Acta Ortop Bras. 2004;12(4):242-9.afirmaram que o tratamento da maioria das fraturas de fêmur é cirúrgico. O tratamento conservador deve ser reservado apenas para algumas fraturas incompletas ou sem desvio. A cirurgia visa à redução e fixação estável da fratura, com o uso de vários métodos de osteossíntese. Raquianestesia com sedação foi o procedimento anestésico mais usado e o risco de infecção foi de 1,9% em relação às que não usaram. Estudo de Ercole e Chianca 1919. Ercole FF, Chianca TCM. Infecc¸ão de sítio cirúrgico em pacientes submetidos a artroplastias de quadril. Rev Latino-Am Enfermagem. 2002;10(2):157-65.mostrou que pacientes submetidos à anestesia associada tiveram 3,4 vezes o risco de infecção em comparação com aqueles submetidos a bloqueios. Os dados encontrados no estudo não foram suficientes para caracterizar o antibiótico como fator de proteção, embora sinalizando que há pacientes que usaram cefazolina e que apresentaram risco de ISC cerca de quatro vezes menor. Em uma metanálise, observou-se que na cirurgia para fixação da fratura fechada a profilaxia com uma única dose de antibióticos reduziu a infecção ferida profunda, infecções de feridas superficiais, infecções do trato urinário e infecções do trato respiratório. Ainda de acordo com o estudo, a prevenção de dose múltipla tinha um efeito semelhante sobre o tamanho da infecção da ferida profunda, mas um efeito significativo sobre as infecções urinárias e respiratórias não foi confirmado.2020. Gillespie WJ, Walenkamp G. Antibiotic prophylaxis for surgery for proximal femoral and other closed long bone fractures. Cochrane Database Syst Rev. 2010;3:CD000244.

Os agentes etiológicos identificados na ISC foram Staphylococcus aureus, Acinetobacter baumannii e Enterococcus sp.Alguns tinham mais do que um microrganismo identificado em cultura. É preciso notar que em apenas 11 dos 21 que apresentaram ISC foram identificados agentes etiológicos. Esse fato, que é o baixo percentual de culturas feitas, explica a ausência de tratamentos orientados por resultados laboratoriais.

A análise multivariada confirmou que o AVC antes da cirurgia de correção limpa de fraturas de fêmur foi caracterizado como um fator de risco para ISC. Fenget al., 2121. Feng M, Zhang J, Shen H, Hu H, Cao L. Predictors of prognosis for elderly patients with poststroke hemiplegia experiencing hip fractures. Clin Orthop Relat Res. 2009;467(11):2970-8.em estudo de coorte que envolveu 1.379 vítimas de fraturas do fêmur proximal, relatou que a maior pontuação ASA encontrada com hemiplegia significa que os pacientes serão mais propensos a ter três ou mais comorbidades, capacidade cognitiva menor, status mais fraco pré-fratura ambulatorial, mais dias de hospitalização e aumento da taxa de mortalidade.

Neste estudo, os pacientes com acidente vascular cerebral prévio apresentaram quatro vezes maior risco de desenvolver ISC. Estudo prospectivo para avaliar o efeito da passagem anterior após a fratura do colo do fêmur ou fratura intertrocantérica mostrou que pacientes com história de AVC eram mais propensos a ser do sexo masculino, ter pontuação ASA III ou IV, três ou mais comorbidades, vagar em casa e ser dependente nas atividades de vida diária (AVD) e base instrumental antes da fratura. O tempo de permanência hospitalar foi significativamente maior para esses pacientes. 2222. Youm T, Aharonoff G, Zuckerman JD, Koval KJ. Effect of previous cerebrovascular accident on outcome after hip fracture. J Orthop Trauma. 2000;14(5):329-34.

A limitação deste estudo é o fato de que ser retrospectivo, a falta de informações sobre o registro de evolução ao longo da administração de antibióticos profiláticos, melhor definição e critérios de adesão para avaliação clínica e histórico detalhado.

Conclusão

Fatores de risco para ISC em correção de fraturas do fêmur em cirurgias limpas identificadas no estudo foram a presença de acidente vascular cerebral antes da cirurgia e tempo de internação até a cirurgia ao longo de quatro dias. A ação conjunta do acidente vascular cerebral e tempo de internação até a cirurgia de mais de quatro dias contribuíram para elevar a taxa de ISC em pacientes submetidos à cirurgia para até três vezes o risco esperado. O controle dos fatores de risco e o tempo de intervenção pré-operatória são altamente desejáveis para reduzir o risco de infecções nesses pacientes. A incidência de ISC identificada em cirurgias limpas de fratura de fêmur apresentou níveis acima da taxa de infecção registrados no hospital. As cirurgias limpas de fêmur devem ser monitoradas e mantidas sob vigilância porque são marcadores de infecções associadas aos cuidados de controle de qualidade nos serviços de saúde.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    23 Set 2014
  • Aceito
    14 Nov 2014
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