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Estudo anatômico dos ramos motores do nervo radial no antebraço* * Trabalho desenvolvido no Departamento de Cirurgia, Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Sorocaba, SP, Brasil.

Resumo

Objetivo

Analisar as variações anatômicas dos ramos motores do nervo radial na região do cotovelo. Foram avaliadas a origem, curso, comprimento, ramificações, pontos motores e relações com estruturas vizinhas.

Materiais e Métodos

Foram dissecados 30 membros de 15 cadáveres adultos, preparados por injeção intra-arterial de uma solução de glicerina e formol a 10%.

Resultados

O primeiro ramo do nervo radial no antebraço foi para o músculo braquiorradial (BR), que se origina proximalmente à divisão do nervo radial em ramo superficial do nervo radial (RSNR) e nervo interósseo posterior (NIP) em todos os membros. Os ramos para o músculo extensor radial longo do carpo (ERLC) se desprenderam do nervo radial proximalmente à sua divisão em 26 membros, em 2, nos pontos de divisão, em outros 2, do NIP. Em seis, os ramos para os músculos BR e ERLC originavam-se de um tronco comum. Identificamos a origem do ramo para o músculo extensor radial curto do carpo (ERCC) no NIP em 14 membros, no RSNR em 12, e no nervo radial em apenas 4. O ramo para o músculo supinador originou-se do NIP em todos os membros.

Conclusão

O conhecimento da anatomia dos ramos motores do nervo radial é importante quando se realizam procedimentos cirúrgicos na região, como a abordagem do terço proximal e da cabeça do rádio, a liberação das síndromes compressivas do nervo interósseo posterior e do túnel radial, as transferências nervosas distais, e para entender a ordem de recuperação da função muscular após uma lesão nervosa.

Palavras-chave
traumatismos do antebraço; nervo mediano; nervo radial; variação anatômica; transferência de nervo

Abstract

Objective

To analyze the anatomical variations of the motor branches of the radial nerve in the elbow region. The origin, course, length, branches, motor points and relationships with neighboring structures were evaluated.

Materials and Methods

Thirty limbs from15 adult cadavers were dissected and prepared by intra-arterial injection of a 10% glycerin and formaldehyde solution.

Results

The first branch of the radial nerve in the forearm went to the brachioradialis muscle (BR), originating proximally to the division of the radial nerve into superficial branch of the radial nerve (SBRN) and posterior interosseous nerve (PIN) in all limbs. The branches to the extensor carpi radialis longus muscle (ECRL) detached from the proximal radial nerve to its division into 26 limbs, in 2, at the dividing points, in other 2, from the PIN. In six limbs, the branches to the BR and ECRL muscles originated from a common trunk. We identified the origin of the branch to the extensor carpi radialis brevis muscle (ECRB) in the PIN in 14 limbs, in the SBRN in 12, and in the radial nerve in only 4. The branch to the supinator muscle originated from the PIN in all limbs.

Conclusion

Knowledge of the anatomy of the motor branches of the radial nerve is important when performing surgical procedures in the region (such as the approach of the proximal third and the head of the radius, release of compressive syndromes of the posterior interosseous nerve and radial tunnel, and distal nerve transfers) in order to understand the order of recovery of muscle function after a nerve injury.

Keywords
forearm injuries; median nerve; radial nerve; anatomical variation; nerve transfer

Introdução

O nervo radial (NR) é o principal entre os nervos que se originam do fascículo posterior do plexo braquial. Ele inerva todos os músculos do compartimento posterior do braço e do antebraço. Passa do compartimento posterior para anterior, contornando o sulco do NR no úmero. Passa pelo septo intermuscular, entre os músculos braquial (MB) medialmente e braquiorradial (BR) lateralmente. Segue distalmente, emergindo entre os músculos BR e extensor radial longo do carpo (ERLC). Divide-se em ramo superficial do nervo radial (RSNR) e nervo interósseo posterior (NIP), também chamado ramo profundo do nervo radial (RPNR). O túnel radial é uma estrutura musculoaponeurótica pela qual cursa o NIP, e se estende desde o epicôndilo lateral do úmero até a borda distal do músculo supinador (MS).11 Vergara-Amador E, Ramírez A. Anatomic study of the extensor carpi radialis brevis in its relation with the motor branch of the radial nerve. Orthop Traumatol Surg Res 2015;101(08):909-912,22 Spinner M. The arcade of Frohse and its relationship to posterior interosseous nerve paralysis. J Bone Joint Surg Br 1968;50(04):809-812 O conhecimento da anatomia dos ramos motores do NR no antebraço é importante quando se realizam procedimentos cirúrgicos na região (como a abordagem do terço proximal e da cabeça do rádio, e a liberação das síndromes compressivas do NIP e do túnel radial), e para entender a ordem de recuperação da função muscular após uma lesão nervosa.11 Vergara-Amador E, Ramírez A. Anatomic study of the extensor carpi radialis brevis in its relation with the motor branch of the radial nerve. Orthop Traumatol Surg Res 2015;101(08):909-912,22 Spinner M. The arcade of Frohse and its relationship to posterior interosseous nerve paralysis. J Bone Joint Surg Br 1968;50(04):809-812 As informações do presente estudo também podem ser aplicadas em procedimentos de denervação seletiva para equilibrar músculos em membros superiores espásticos.33 SafwatMD, Abdel-Meguid EM. Distribution of terminal nerve entry points to the flexor and extensor groups of forearm muscles: an anatomical study. Folia Morphol (Warsz) 2007;66(02):83-93,44 Liu J, Pho RW, Pereira BP, Lau HK, Kumar VP. Distribution of primarymotor nerve branches and terminal nerve entry points to the forearm muscles. Anat Rec 1997;248(03):456-463 Os ramos do NR podem ser transferidos para restaurar a flexão digital em casos de lesão proximal do nervo mediano (NM) ou de lesões de plexo braquial envolvendo predominantemente os cordões lateral e medial, com preservação do cordão posterior.55 García-López A, Fernández E, Martínez F. Transfer of brachioradialis motor branch to the anterior interosseous nerve in C8-T1 brachial plexus palsy.Ananatomicstudy.Microsurgery 2013;33(04):297-300,66 Bertelli JA,GhizoniMF.Nervetransfers for restorationoffingerflexion in patients with tetraplegia. J Neurosurg Spine 2017;26(01):55-61 Os pontos motores dos músculos do antebraço são definidos como o local de entrada de cada ramo nervoso no corpo muscular.33 SafwatMD, Abdel-Meguid EM. Distribution of terminal nerve entry points to the flexor and extensor groups of forearm muscles: an anatomical study. Folia Morphol (Warsz) 2007;66(02):83-93 Os trabalhos consultados mostram que a ordem de inervação motora, o número de ramos, os pontos motores e as variações anatômicas dos ramos do NR apresentam controvérsias.33 SafwatMD, Abdel-Meguid EM. Distribution of terminal nerve entry points to the flexor and extensor groups of forearm muscles: an anatomical study. Folia Morphol (Warsz) 2007;66(02):83-93

4 Liu J, Pho RW, Pereira BP, Lau HK, Kumar VP. Distribution of primarymotor nerve branches and terminal nerve entry points to the forearm muscles. Anat Rec 1997;248(03):456-463

5 García-López A, Fernández E, Martínez F. Transfer of brachioradialis motor branch to the anterior interosseous nerve in C8-T1 brachial plexus palsy.Ananatomicstudy.Microsurgery 2013;33(04):297-300

6 Bertelli JA,GhizoniMF.Nervetransfers for restorationoffingerflexion in patients with tetraplegia. J Neurosurg Spine 2017;26(01):55-61

7 Sunderland S.Metrical and non-metrical features of the muscular branches of the radial nerve. J Comp Neurol 1946;85:93-111

8 Abrams RA, Ziets RJ, Lieber RL, Botte MJ. Anatomy of the radial nerve motor branches in the forearm. J Hand Surg Am 1997;22(02):232-237

9 Linell EA. The distribution of nerves in the upper limb, with reference to variabilities and their clinical significance. J Anat 1921;55(Pt 2-3):79-112

10 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747
-1111 Branovacki G, Hanson M, Cash R, Gonzalez M. The innervation pattern of the radial nerve at the elbowand in the forearm. J Hand Surg [Br] 1998;23(02):167-169 O objetivo do presente estudo foi analisar as variações anatômicas dos ramos motores do NR na região do cotovelo, considerando origem, curso, comprimento, ramificações, pontos motores e relações com estruturas vizinhas.

Materiais e Métodos

Foram dissecados 30 membros de 15 cadáveres, todos adultos e do sexo masculino, preparados por injeção intra-arterial de uma solução de glicerina e formol a 10%. Cada antebraço foi dissecado com o cotovelo em extensão, o punho em posição neutra, e o antebraço em pronação. Os cadáveres não apresentaram evidências de deformidades, procedimentos cirúrgicos anteriores, ou lesões traumáticas evidentes na área estudada. Removemos a pele e a fáscia do terço distal do braço, do antebraço e do punho. O NR foi identificado no braço entre o MB e o BR, e dissecado de proximal para distal. Os tendões dos músculos BR, ERLC e extensor radial curto do carpo (ERCC) foram seccionados em seu terço distal, e separados das conexões fibrosas que os uniam, para facilitar a identificação dos ramos nervosos. A divisão do NR em seus ramos RSNR e NIP foi identificada e relacionada com a linha intercondilar do úmero (LIU). Os ramos destinados aos músculos BR, ERLC, ERCC, MS e NIP foram dissecados. As estruturas vasculares não foram preservadas para facilitar a dissecção dos nervos. Utilizamos em certas fases da dissecção uma lupa de 2,5 vezes de aumento. Foram analisadas a distância entre a LIU tanto com o ponto de divisão do NR quanto com o ponto de emergência do NR no braço, entre o MB e o BR. A ordem de inervação de cada músculo, o número de ramos e o número de pontos motores foram registrados. Com paquímetro digital e uma régua milimetrada, medimos o diâmetro e o comprimento dos ramos para os músculos BR, ERLC, ERCC, NIP e MS. Este trabalho foi aprovado pela Comissão de Ética sob o parecer número 3.339.423.

Resultados

O NR atravessou o septo intermuscular lateral, entre o MB e o BR, em média 9,2 cm (8,5 cm a 10,3 cm) proximalmente à LIU. A divisão em RSNR e NIP ocorreu em média 1,2 cm (0 cm a 2,3 cm) proximalmente à LIU. Em nenhum membro registramos a divisão do NR distalmente à LIU.

Ramos para o MB: identificamos em três membros um ramo do NR para o MB, dois ramos em um membro, e todos acima da LIU e proximalmente à origem dos ramos para o músculo BR (Figura 1A).

Fig. 1
(A) Ramo para MB (a); ramo para BR (b); ramos para ERLC (c); ramo para ERCC (d); RSNR (e); NIP (f). (B) Nervo radial (a); ramo para MB (b); ramos para BR (c ); ramo para ERLC (d); ramo para ERCC (e); NIP (f); RSNR (g); ramo para MS (h).

Ramos para o músculo BR: desprenderam-se proximalmente em relação aos ramos para os outros músculos do antebraço em todos os membros. A presença de apenas 1 ramo para o músculo BR foi registrada em 23 membros (76,5%) (Figura 1A), e em 7 (23,5%), identificamos 2 ramos (Figura 1B). Não identificamos mais do que dois ramos para o BR em nenhum membro. O comprimento do ramo para o BR foi de 3,2 ± 0,8 cm, e a média do número de pontos motores foi 2,4 ± 0,8.

Ramos para ERLC: tiveram origem no NR antes de sua divisão em 26 membros (Figura 2A). Em dois membros, originou-se no ponto de divisão do NR, e, em outros dois, no do NIP. Em 21 membros (70%), identificamos um ramo para o ERLC (Figura 2A), e, em 9 membros, 2 ramos (30%) (Figura 1A). Não identificamos mais de dois ramos para o ERLC. Em 6 membros (20%), os ramos para os músculos BR e ERLC originavam se de um tronco comum (Figura 1B). Em um membro, se originavam de um tronco comum com o BR e ERCC (Figura 2B). O comprimento do ramo para o músculo ERLC foi de 3,2 ± 1,0 cm, e a média do número de pontos motores foi 2,9 ± 1,0.

Fig. 2
(A) Nervo radial (a); ramo para BR (b); ramo para ERLC (c); ramo para ERCC (d); NIP (e); RSNR (f); ramo para MS (g). (B) Nervo radial (a); ramo para BR (b); ramo para ERLC (c); ramo para ERCC (d); RSNR (e); NIP (f); ramos para MS (g).

Ramos para o ERCC: identificamos, em todos os membros, apenas um ramo para o ERCC. Este se originou no NIP em 14 membros (46,5%) (Fig. 2A), no RSNR em 12 (40%) (Figura 3A), e no NR em apenas 4 (13,5%): em 3 destes, no mesmo ponto de divisão do NR em RSNR e NIP (Figura 3B), e somente 1 proximal à divisão. O ramo para o ERCC se dividia, penetrando na superfície anterior do corpo muscular em pelo menos dois pontos motores. Em 15 membros, registramos distância entre os pontos motores proximal e distal superior a 3 cm (Figura 4A). O comprimento do ramo para o músculo ERCC foi de 4,5 ± 2,5 cm, e a média do número de pontos motores foi de 2,7 ± 1,2.

Fig. 3
(A) Nervo radial (a); ramo para BR (b); ramo para ERLC (c); ramo para ERCC (d); RSNR (e); NIP (f); ramos para MS (g). (B) Nervo radial (a); ramo para ERLC (b); ramo para ERCC (c); RSNR (d); NIP (e).

Fig. 4
(A) Nervo radial (a); ramos para BR (b); ramo para ERLC (c); ramo para ERCC (d); RSNR (e); pontos motores do ERCC (f); NIP (g); ramo para MS (h). (B) Nervo radial (a); ramos para BR (b ); ramos para ERLC (c); pontos motores do ERLC (d); ramo para ERCC(e); NIP (f); ramos para MS (g); RSNR (h).

Ramos para o MS: os ramos para o MS apresentaram grande variabilidade. Identificamos de 2 a 5 ramos, todos oriundos do NIP, sendo pelo menos 1 ramo destinado a cada uma das cabeças superficial e profunda (Figura 4A e 4B). Identificamos, proximalmente à arcada de Frohse, ramos para o MS em 6 membros, 2 ramos para o MS em 11 membros, e 3 ramos em 4 membros (Figura 5A e 5B). Em sete membros, não identificamos ramos para o MS proximalmente à arcada de Frohse; nestes, o NIP emitiu ramos para o MS enquanto passava pelo músculo (Figura 6A e 6B). Em dois membros, apenas um ramo desprendia-se do NIP, mas se duplicava proximalmente à arcada de Frohse. O comprimento dos ramos para o MS foi de 1,0 ± 0,8 cm, e a média do número de pontos motores foi de 2,7 ± 1,2. O número de pontos motores dos músculos inervados pelo radial nos terços proximal, médio e distal do antebraço estão descritos na Tabela 1.

Fig. 5
(A) Ramos para MS (a); NIP (b); arcada de Froshe (c); ramo par ERCC (d); RSNR (e); nervo mediano (f); ramos do nervo mediano com seus pontos motores (g). (B) Nervo radial (a); ramo para BR (b); ramo para ERLC (c ); ramo para ERCC aparentemente com origem no RSNR (e) quando a origem real é no NIP (f); ramo para MS (g); arcada de Froshe (h).

Fig. 6
(A) NIP (a); arcada de Froshe (b); RSNR (c); ramo para o ERCC (d). (B) Ramos para o MS (a); NIP (b); arcada de Frohse (c).

Tabela 1
Sumário do número de pontos motores dos músculos inervados pelo radial nos terços proximal médio e distal do antebraço

Discussão

Nossos resultados estão de acordo com os de alguns autores,77 Sunderland S.Metrical and non-metrical features of the muscular branches of the radial nerve. J Comp Neurol 1946;85:93-111

8 Abrams RA, Ziets RJ, Lieber RL, Botte MJ. Anatomy of the radial nerve motor branches in the forearm. J Hand Surg Am 1997;22(02):232-237

9 Linell EA. The distribution of nerves in the upper limb, with reference to variabilities and their clinical significance. J Anat 1921;55(Pt 2-3):79-112

10 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747
-1111 Branovacki G, Hanson M, Cash R, Gonzalez M. The innervation pattern of the radial nerve at the elbowand in the forearm. J Hand Surg [Br] 1998;23(02):167-169 os quais informam que a ordem de inervação dos músculos do antebraço pelo NR é muito variável. No presente estudo, observamos que o ramo do NR para o BR desprendeu-se do NR proximalmente à sua divisão em RSNR e NIP. Os ramos para o ERLC se desprenderam do NR proximalmente à sua divisão em 26 membros, em 2, no ponto de divisão, em outros 2, do NIP. Não identificamos a divisão do NR distalmente à LIU.

Abrams et al.88 Abrams RA, Ziets RJ, Lieber RL, Botte MJ. Anatomy of the radial nerve motor branches in the forearm. J Hand Surg Am 1997;22(02):232-237 relatam que estudaram 20 membros de cadáveres, e em 10 deles identificaram mais do que 1 ramo para o MB. Em 8 desses 10 membros, a inervação do MB ocorria proximalmente em relação ao BR. Sunderland77 Sunderland S.Metrical and non-metrical features of the muscular branches of the radial nerve. J Comp Neurol 1946;85:93-111 observou que, em 18 de 20 membros estudados, o MB recebia inervação do radial. Nossos achados foram diferentes: identificamos que, em apenas 4 de 30 membros, havia 1 ramo do NR para o MB, todos proximais aos ramos destinados ao músculo BR. Essa discrepância pode ter ocorrido porque dissecamos o NR a partir do septo intermuscular entre o MB e o BR, e é possível que outros ramos para o MB tenham se originado proximalmente.

Fuss e Wurzl1010 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747 estudaram 50 membros de cadáveres, e registraram que o músculo BR recebia 1 ramo em 22 membros, 2 ramos em 12 membros, e 3 ramos em 16 membros. No presente estudo, o primeiro ramo do NR para os músculos do antebraço foi para o músculo BR em todos os membros. Identificamos apenas 1 ramo em 23 membros, 2 ramos em 7, e não identificamos mais do que 2 ramos para o BR. A razão da discrepância deve ter ocorrido pela forma de interpretar. Nós consideramos o número de ramos que se desprendiam do NR: os que se ramificavam após sua origem, formando vários pontos motores, consideramos como sendo um ramo (Figura 4B). Fuss e Wurzl1010 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747 informam também que algumas vezes ramos para o BR desprendiam-se do NR de um tronco comum com ramos para o MB ou o ERLC.

Branovacki et al.1111 Branovacki G, Hanson M, Cash R, Gonzalez M. The innervation pattern of the radial nerve at the elbowand in the forearm. J Hand Surg [Br] 1998;23(02):167-169 dissecaram 60 membros de cadáveres, e relatam que o BR foi o primeiro músculo do antebraço a ser inervado em 42 membros (70%); em 12 (20%), a inervação do BR e do ERLC se originou no mesmo ponto; e, em 6 (10%), o ramo para o ERLC se originou proximalmente ao do BR. No presente estudo, identificamos em 6 membros (20%) que o BR e ERLC originaram-se de um tronco comum; não identificamos, no entanto, em nenhum membro o ERLC ser inervado antes do BR. Fuss e Wurzl1010 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747 relatam um caso, extremamente raro, em que um ramo para o BR portava fibras motoras e sensoriais, as motoras penetravam no BR, e as sensoriais juntavam-se ao RSNR.

Com relação ao músculo ERLC, Fuss e Wurzl1010 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747 informam que identificaram 1 ramo em 22 membros, 2 ramos em 14 membros, e 3 ramos em 12 membros. Nossos achados foram divergentes: identificamos 2 ramos em apenas 9 membros; nos 21 restantes, apenas 1 ramo para o ERLC. A causa de resultados tão diferentes deve ter sido a forma de interpretação, como ocorreu em relação aos ramos para o músculo BR. Existem conclusões amplamente divergentes em relação à origem do ramo para o ERCC. Tem sido descrita a origem no próprio NR, no RSNR, ou no NIP. As diferenças na incidência encontradas na literatura são significativas.88 Abrams RA, Ziets RJ, Lieber RL, Botte MJ. Anatomy of the radial nerve motor branches in the forearm. J Hand Surg Am 1997;22(02):232-237

Salsbury1212 Salsbury CR. The nerve to the extensor carpi radialis brevis. Br J Surg 1938;26(101):95-97 dissecou 50 membros, e afirmou que a inervação era oriunda do RSNR em 56%, do NIP em 36%, e do ponto onde o NIP e RSNR se ramificam em 8%. Cricenti et al.1313 Cricenti SV,DeangelisMA, Didio LJA, Ebraheim NA, Rupp RE,Didio AS. Innervation of the extensor carpi radialis brevis and supinator muscles: Levels of origin and penetration of these muscular branches fromthe posterior interosseous nerve. J Shoulder Elbow Surg 1994;3(06):390-394 dissecaram 30 membros, e encontraram a origem do ERCC no NIP em 28 (93%), e no RSNR em 2 (7%). Nayak et al.1414 Nayak SR, Ramanathan L, Krishnamurthy A, et al. Extensor carpi radialis brevis origin, nerve supply and its role in lateral epicondylitis. Surg Radiol Anat 2010;32(03):207-211 relatam que dissecaram 72 membros de cadáveres, e o ramo destinado ao ERCC originou-se no NR em 11 membros (15,2%), no NIP em 36 membros (50%), e no RSNR em 25 membros (34,7%). Abrams et al.88 Abrams RA, Ziets RJ, Lieber RL, Botte MJ. Anatomy of the radial nerve motor branches in the forearm. J Hand Surg Am 1997;22(02):232-237 registraram a origem do ERCC no NIP em 45%, no RSNR em 25%, e no NR em 30%. E Branovacki et al.1111 Branovacki G, Hanson M, Cash R, Gonzalez M. The innervation pattern of the radial nerve at the elbowand in the forearm. J Hand Surg [Br] 1998;23(02):167-169 registraram a origem do ERCC no NIP em 45%, no RSNR em 25%, e na bifurcação do RSNR e do NIP em 30%.

Concordamos com a explicação de Abrams et al.88 Abrams RA, Ziets RJ, Lieber RL, Botte MJ. Anatomy of the radial nerve motor branches in the forearm. J Hand Surg Am 1997;22(02):232-237 de que as discrepâncias entre estudos podem ser explicadas pela inconsistência das técnicas de dissecação e medição. O ramo do ERCC é frequentemente um conjunto de fascículos separados, porém aderentes ao RSNR ou NIP. A variação pode ocorrer dependendo de quanto o ramo nervoso seja dissecado proximalmente antes da medição88 Abrams RA, Ziets RJ, Lieber RL, Botte MJ. Anatomy of the radial nerve motor branches in the forearm. J Hand Surg Am 1997;22(02):232-237 (Figura 5B). Nós identificamos a origem do ERCC no NIP em 14 membros (46,5%), no ramo superficial do NR em 12 (40, %), e no NR em apenas 4 (13,5%), sendo que em 3 destes, no mesmo ponto da divisão do NR em NIP e RSNR; em outro, originava-se proximalmente à divisão do NR.

Branovacki et al.1111 Branovacki G, Hanson M, Cash R, Gonzalez M. The innervation pattern of the radial nerve at the elbowand in the forearm. J Hand Surg [Br] 1998;23(02):167-169 identificaram mais do que um ramo para o MS em 73% dos membros, e Cricenti et al.,1313 Cricenti SV,DeangelisMA, Didio LJA, Ebraheim NA, Rupp RE,Didio AS. Innervation of the extensor carpi radialis brevis and supinator muscles: Levels of origin and penetration of these muscular branches fromthe posterior interosseous nerve. J Shoulder Elbow Surg 1994;3(06):390-394 em 87%. No presente estudo, identificamos de dois a cinco ramos para o MS, sendo pelo menos um ramo destinado a cada uma das cabeças superficial e profunda, todos com origem no NIP. Embora Sunderland77 Sunderland S.Metrical and non-metrical features of the muscular branches of the radial nerve. J Comp Neurol 1946;85:93-111 tenha relatado em sua série que 20% dos ramos para o MS tenham se originado do NR, isso não foi observado no presente estudo. Concordamos com Spinner22 Spinner M. The arcade of Frohse and its relationship to posterior interosseous nerve paralysis. J Bone Joint Surg Br 1968;50(04):809-812 e Liu et al.44 Liu J, Pho RW, Pereira BP, Lau HK, Kumar VP. Distribution of primarymotor nerve branches and terminal nerve entry points to the forearm muscles. Anat Rec 1997;248(03):456-463 que os ramos para o MS se originaram do NIP. Branovaki et al.1111 Branovacki G, Hanson M, Cash R, Gonzalez M. The innervation pattern of the radial nerve at the elbowand in the forearm. J Hand Surg [Br] 1998;23(02):167-169 observaram que em 12% dos membros os ramos do MS desprenderam-se do NIP no interior da massa muscular do MS, e informaram que essa variação, até onde se sabe, não havia sido relatada anteriormente. Nós identificamos essa variação em 7 (23%) membros (Figura 6A e 6B).

Analisamos o número de pontos motores dos músculos BR, ERLC, ERCC e MS, que são definidos como pontos de entrada dos ramos nervosos no corpo muscular. Registramos que a maioria dos pontos motores se situa no terço proximal dos músculos (Tabela 2).

Tabela 2
Sumário da média de distribuição de pontos motores na extensão do corpo muscular

Segal1515 Segal RL. Neuromuscular compartments in the human biceps brachii muscle. Neurosci Lett 1992;140(01):98-102 sugeririu a relação entre o número de pontos motores e compartimentos neuromusculares. Cada ponto motor corresponde a um compartimento neuromuscular com função independente de outros compartimentos. Isso explica porque músculos com função mais complexa, como os flexores e os extensores dos dedos, têm maior número de pontos motores em relação a outros músculos do antebraço.1616 Clara M. Das nervensystem des menschen. 3rd ed. Leipzig: Barth; 1959 O conhecimento da localização dos ramos nervosos e dos pontos motores facilita a inserção de eletrodos nos pontos motores dos músculos do antebraço para a estimulação elétrica funcional nas lesões do neurônio motor superior.33 SafwatMD, Abdel-Meguid EM. Distribution of terminal nerve entry points to the flexor and extensor groups of forearm muscles: an anatomical study. Folia Morphol (Warsz) 2007;66(02):83-93 As informações neste estudo também podem ser aplicadas de forma útil em procedimentos de denervação seletiva para equilibrar músculos espásticos.44 Liu J, Pho RW, Pereira BP, Lau HK, Kumar VP. Distribution of primarymotor nerve branches and terminal nerve entry points to the forearm muscles. Anat Rec 1997;248(03):456-463,1111 Branovacki G, Hanson M, Cash R, Gonzalez M. The innervation pattern of the radial nerve at the elbowand in the forearm. J Hand Surg [Br] 1998;23(02):167-169

Liu et al.44 Liu J, Pho RW, Pereira BP, Lau HK, Kumar VP. Distribution of primarymotor nerve branches and terminal nerve entry points to the forearm muscles. Anat Rec 1997;248(03):456-463 relataram que os ferimentos do antebraço, embora os principais troncos nervosos possam estar intactos, lesões segmentares por esmagamento irão danificar os músculos por dano muscular direto ou por danos em seus pontos motores.

Fuss e Wurzl1010 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747 relataram que a tentativa de correlacionar sinais e sintomas clínicos com a anatomia cirúrgica pode causar alguma confusão pelas controvérsias em relação à sequência de inervação registrada na literatura. Por exemplo, as sequências descritas por Clara1616 Clara M. Das nervensystem des menschen. 3rd ed. Leipzig: Barth; 1959 (MB; BR; ERLC; ERCC; RS; e ERLC) e por Roseinstein1717 Rosenstein A. Anatomie der peripheren nerven. In: Bumke O, Foerster O, editors Handbuch der neurologie. Berlin: Springer; 1935 (BR; ERLC; RS; extensor comum dos dedos (ECD); e ERCC) podem sofrer críticas porque sugerem que cada músculo não recebe mais do que um único ramo, e também porque sugerem que há uma sequência lógica de ramificações. Registramos que, na maioria dos nossos casos, a sequência de ramos motores foi: MB; BR; ERLC; ERCC; NIP; e ramos para o MS. No entanto, em dois membros o ramo para o ERLC originava-se do NIP; em quatro, o ramo para o ERCC originava-se do NR: em três destes, no mesmo ponto de divisão do NR em RSNR e NIPe, em apenas um, proximal à divisão. Em seis membros, os ramos para o BR e o ERLC tinham origem em um tronco comum; em sete membros, identificamos mais do que um ramo para o BR; e em nove, mais do que um ramo para o ERLC. Concordamos com Fuss e Wurzl1010 Fuss FK, Wurzl GH. Radial nerve entrapment at the elbow: surgical anatomy. J Hand Surg Am 1991;16(04):742-747 que a sequência relatada por Rosenstein1717 Rosenstein A. Anatomie der peripheren nerven. In: Bumke O, Foerster O, editors Handbuch der neurologie. Berlin: Springer; 1935 é muito difícil de ocorrer.

Sugerimos que abordagem cirúrgica dos ramos do NR na região do cotovelo pode ser feita com o antebraço em pronação e o cotovelo em extensão, com uma incisão de aproximadamente 13 cm de comprimento, partindo de um ponto 3 cm proximal ao epicôndilo lateral, acompanhando o eixo do rádio. Incisa-se a fáscia na região distal do braço e do antebraço, e identifica-se o espaço entre o MB e o BR. Aprofundar a dissecção nesse espaço permite a identificação do NR com os ramos para o MB, BR, ERLC e ERCC. Mais distalmente, identifica-se o espaço entre o ERCC e o ECD. A dissecção é aprofundada neste espaço, identificando-se o MS e a arcada de Frohse. O NIP, proximalmente à arcada de Frohse, pode ser identificado pela palpação contra a diáfise do rádio. A cabeça superficial do supinador deve ser seccionada acompanhando o trajeto do NIP, expondo-se, desta forma, a porção intramuscular do NIP posterior e os ramos destinados ao MS.

Conclusão

O conhecimento da anatomia dos ramos do NR para os músculos do antebraço é importante quando se realizam procedimentos cirúrgicos na região (como a abordagem do terço proximal e da cabeça do rádio, a liberação das síndromes compressivas do túnel radial e do NIP, e as transferências nervosas distais) para entender a ordem de recuperação da função muscular após uma lesão nervosa. Nossos dados mostram a variabilidade nessa região.

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    Trabalho desenvolvido no Departamento de Cirurgia, Faculdade de Ciências Médicas e da Saúde, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Sorocaba, SP, Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    Nov-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    16 Jul 2019
  • Aceito
    10 Mar 2020
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