Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação dos fatores prognósticos e sobrevida de pacientes com Osteossarcoma atendidos em um Hospital Filantrópico de Teresina (PI), Brasil

Resumos

OBJETIVO:

Avaliar os fatores prognósticos e a sobrevida de pacientes com osteossarcoma atendidos em um hospital filantrópico de Teresina (PI).

MÉTODOS:

Foram analisados 32 prontuários de pacientes diagnosticados com osteossarcoma de janeiro de 2005 a dezembro de 2010.

RESULTADOS:

A faixa etária foi entre 6 e 73, sendo 56,2% homens e 43,7% mulheres. A cor prevalente foi a negra, com 62,5% dos casos. Com relação ao subtipo histológico, a maioria era do tipo osteoblástico (71,8%). O local anatômico do tumor prevalente foi a região do joelho (fêmur distal e tíbia proximal). Quanto ao tamanho do tumor, 43,8% tinham tumores maiores do que 15 cm. O grau de necrose Huvos concentrou-se basicamente entre os tipos I e II, com 53,1% e 25% respectivamente. A sobrevida global em dois e quatro anos foi de 45,5% e 39%, respectivamente; e a sobrevida livre de eventos em dois e quatro anos foi de 39,8% e 19,9% respectivamente.

CONCLUSÃO:

Foram considerados fatores de pior prognóstico a presença de metástase ao diagnóstico e tumores maiores do que 15 cm. Os critérios de Huvos não atingiram significância estatística para o prognóstico dos pacientes.

Osteossarcoma; Prognóstico; Análise de sobrevida


OBJECTIVE:

Make an analysis of the factors that influence their survival and prognosis of patients with osteosarcoma treated at a Charity Hospital in Teresina-PI.

METHODS:

We analyzed medical records of 32 patients diagnosed with osteosarcoma in the period January 2005 to December 2010.

RESULTS:

Patients were aged between 6 and 73 years, with 56.2% men and 43.7% women. The prevailing color was black, with 62.5% of cases. With regard to histological subtype, the majority were osteoblastic type (71.8%). The anatomical location of the tumor was prevalent region of the knee (distal femur and proximal tibia). Regarding the size of the tumor, tumors were 43.8% bigger than 15 cm. Degree of necrosis Huvos concentrated primarily among the types I and II, 53.1% and 25% respectively. The overall survival at two and four years was 45.5% and 39% respectively and event- free survival at two and four years was 39.8% and 19.9% respectively.

CONCLUSION:

We considered the worst prognosis, the presence of metastases at diagnosis and tumors larger than 15 cm. And the criteria of Huvos did not reach statistical significance for the prognosis of patients.

Osteosarcoma; Prognosis; Survival Analysis


Introdução

As neoplasias ocupam o segundo lugar no Índice Mortalidade Brasil, atrás apenas das doenças circulatórias, o que faz com que passem a ser um problema de saúde pública.1

Dentre todas as neoplasias em geral, os tumores ósseos primários constituem 3% a 4% dessas. Há ainda, em nosso meio, uma demora para o diagnóstico definitivo de um tumor ósseo primário. É de fundamental importância o diagnóstico precoce dessas neoplasias, principalmente com relação aos malignos, nos quais são necessários o controle local e a conduta terapêutica no sentido de aumentar a taxa de sobrevida dos pacientes.1

O osteossarcoma é o tumor ósseo com matriz óssea maligno primário mais frequente, representando 0,2% das neoplasias malignas humanas. Descrito pela primeira vez em 1805 por Dupuytren, sua principal característica é a produção de matriz osteoide pelas células neoplásicas. Acomete principalmente crianças e adolescentes nas duas primeiras décadas de vida e tem predileção anatômica pelas metáfises dos ossos longos. O fêmur distal e a tíbia proximal são os locais mais frequentemente afetados pelo osteossarcoma, seguidos pelo úmero proximal.1

Hoje se pode afirmar que o prognóstico do paciente com osteossarcoma depende do tamanho do tumor, das margens cirúrgicas conseguidas na cirurgia e da presença de metástases pulmonares.2

Sabe-se também, que fatores como sexo e localização anatômica da lesão não estão associados à recidiva local ou ao prognóstico, enquanto a porcentagem de indução de necrose pela quimioterapia e as margens cirúrgicas são fatores associados ao controle local.2

Este estudo teve como finalidade analisar os fatores que influenciaram no prognóstico e sobrevida dos pacientes com osteossarcoma atendidos em um hospital filantrópico de Teresina (PI), além de fazer uma caracterização epidemiológica e clínica da casuística. Cada fator foi avaliado isoladamente e em conjunto, visando a encontrar uma melhor forma de abordagem diagnóstica e terapêutica dos pacientes acometidos pela doença.

Casuística e métodos

Após aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFPI, com registro CAAE nº 0399.0.045.000-11, e aprovação pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), com registro 045, iniciou-se um estudo retrospectivo, transversal e descritivo-analítico quantitativo, do período de janeiro de 2005 a dezembro de 2010. Foram analisados 32 prontuários de pacientes diagnosticados com osteossarcoma em um hospital filantrópico de Teresina (PI).

Na avaliação dos prontuários, os seguintes dados foram coletados: idade, sexo, cor, ocupação, data do diagnóstico do osteossarcoma, critério de Huvos (Tabela 1), tamanho e localização anatômica do tumor, subtipo histológico, presença de invasão linfática e/ou sanguínea, tratamento cirúrgico usado, limites cirúrgicos verificados no histopatológico, presença ou não de metástase no decorrer do estudo, localização da mesma e a data do seu surgimento, estadiamento do tumor no diagnóstico, presença ou não de recidiva local após o tratamento cirúrgico e data do óbito do paciente, caso tenha ocorrido no período de estudo.

Tabela 1
Incidência de queixas por categoria.

Os pacientes do presente estudo foram tratados com base nos protocolos brasileiros de tratamento quimioterápico para osteossarcomas, tanto o não metastático como o metastático.

As análises estatísticas foram feitas no programa estatístico SPSS (versão 9.0). Inicialmente, foram calculadas as frequências simples de todas as variáveis estudadas. Posteriormente, as probabilidades de sobrevida acumuladas foram calculadas a partir da técnica de Kaplan-Meier. Todas as variáveis foram analisadas quanto à sua importância em relação ao prognóstico para sobrevida livre de eventos (porcentagem de pacientes que, até uma determinada data, permaneceram livres de manifestações locais e/ou sistêmicas) e para sobrevida global (porcentagem de pacientes que ainda estavam vivos até uma determinada data). O grau de Huvos (I, II, III e IV), o tamanho do tumor (< 15 e > 15 cm), a presença de metástase ao diagnóstico e o tratamento cirúrgico usado (radical e salvador) foram avaliados como variáveis para determinação de seu valor prognóstico, em relação às sobrevidas, usando-se o teste Log-Rank.

Resultados

A idade dos pacientes variou entre 6 e 73 anos, com uma mediana de 15 anos, sendo que 56,2% tinham idade menor do que ou igual a 15 anos e 43,7% tinham idade maior do que 15 anos. Com relação ao sexo, 56,2% eram homens e 43,7% mulheres. A cor prevalente foi a negra, com 62,5% dos casos, seguida pela parda (21,8%) e branca (15,6%). Na variável ocupação, 90,6% dos pacientes eram estudantes.

Com relação ao subtipo histológico, 71,8% eram do tipo osteoblástico, 21,8% condroblástico e 6,2% rico em células gigantes.

O local anatômico do tumor teve a seguinte distribuição: 50% fêmur distal, 21,8% tíbia proximal, 9,4% fêmur proximal, 9,4% úmero proximal. Tíbia distal, fíbula proximal e distal tiveram cada uma percentagem de 3,1%.

Os tamanhos dos tumores foram divididos em: menores do que ou iguais a 15 cm (56,2%) e maiores do que 15 cm (43,8%). Com relação ao grau de necrose Huvos, 17 pacientes (53,1%) tinham Huvos I, 8 (25%) tinham Huvos II, 7 (21,8%) tinham Huvos III e nenhum caso de Huvos IV foi registrado.

Quanto às metástases, 20 pacientes (62,5%) desenvolveram-na em algum momento do curso da doença; desses, sete (21,8%) já tinham metástase ao diagnóstico. Dentre os locais de metástase, foram observados: pulmão (100%), osso (25%), fígado (5%) e outros locais (15%).

Em se tratando de tratamento cirúrgico, 65,6% dos pacientes foram submetidos à cirurgia radical (amputação) e 34,4% se beneficiaram de cirurgia salvadora de membro. Dentre aqueles que continham os maiores tamanhos de tumores (>15 cm), 85,7% fizeram cirurgia radical.

Foram observadas duas recidivas locais (6,2%) e o óbito decorrente do osteossarcoma foi de 62,5% dos casos.

A curva de sobrevida global (SG) está representada na Fig. 1 e apresentou taxas de 45,5% e 39% em dois e quatro anos, respectivamente. A curva de sobrevida livre de eventos (SLE) está representada na Fig. 2 e apresentou taxas de 39,8% e 19,9% em dois e quatro anos, respectivamente.

Fig. 1
Curva de Sobrevida Global (SG).

Fig. 2
Curva de Sobrevida Livre de Eventos (SLE).

O fator que influenciou significativamente a sobrevida global na análise univariada foi o tratamento cirúrgico (p = 0,0002), conforme está ilustrado na Fig. 3. O tratamento cirúrgico radical foi considerado fator adverso, quando comparado com o tratamento salvador, por apresentar maior índice de óbito. Outros fatores, como sexo, idade, local do tumor, subtipo histológico, tamanho do tumor, metástase ao diagnóstico e limites cirúrgicos, não atingiram níveis de significância estatística para valores de p < 0,05.

Fig. 3
Curva de Sobrevida Global de acordo com o tratamento cirúrgico.

Já aqueles que tiveram influência sobre o risco de algum evento (metástase e/ou recidiva local) na análise univariada foram os seguintes: tratamento cirúrgico (p = 0,0037; Fig. 4), metástase ao diagnóstico (p = 0,0016; Fig. 5) e tamanho do tumor (p = 0,0502; Fig. 6). O tratamento cirúrgico radical foi considerado fator adverso para o surgimento de eventos (metástase e/ou recidiva local) quando comparado com o tratamento salvador; a presença de metástase ao diagnóstico revelou um maior índice de eventos (metástase e/ou recidiva local) comparados com sua ausência; e tumor maior do que 15 cm em seu maior eixo foi considerado fator adverso para a SLE. Os outros fatores estudados não apresentaram níveis de significância para valores de p < 0,05 (sexo, idade, local do tumor, subtipo histológico e limites cirúrgicos).

Fig. 4
Curva de Sobrevida Livre de Eventos de acordo com o tratamento cirúrgico.

Fig. 5
Curva de Sobrevida Livre de Eventos de acordo com metástase ao diagnóstico.

Fig. 6
Curva de Sobrevida Livre de Eventos de acordo com o tamanho do tumor.

Os graus de necrose tumoral pós-quimioterapia (Huvos) não atingiram níveis de significância estatística para as duas sobrevidas - SG (p = 0,2903) e SLE (0,5327), conforme as Figs. 7 e 8 e não foram considerados fatores prognósticos para SG nem para SLE.

Fig. 7
Curva de Sobrevida Global de acordo com o grau de necrose Huvos.

Fig. 8
Curva de Sobrevida Livre de Eventos de acordo com o grau de necrose Huvos.

Discussão

A caracterização epidemiológica e clínica do presente estudo está de acordo com a literatura.1-3

Os fatores prognósticos desfavoráveis foram metástase ao diagnóstico, tamanho do tumor maior do que 15 cm e tratamento cirúrgico radical. O seguimento dos pacientes identificou metástases em 62,5% desses, dentre os quais 21,8% já apresentavam metástase ao diagnóstico. Essa porcentagem está, por sua vez, acima dos valores internacionais (15% a 20%); no entanto, está dentro dos dados encontrados nacionalmente, que relatam até 38%.4 Ao avaliarmos sua significância para a sobrevida livre de eventos (SLE), encontramos que ela está relacionada com um pior prognóstico. Rech et al.,5 em seu estudo, também concluíram fato similar, ao demonstrar que menos de 20% desses pacientes têm sobrevida livre de doença em cinco anos.5 Esses pacientes provavelmente demonstraram piores resultados em sua sobrevida, em virtude de terem possuído tamanhos maiores de tumores nos estágios iniciais da doença e por terem sido diagnosticados tardiamente.4,5

Em nosso estudo, 43,8% dos pacientes apresentavam tamanho do tumor maior do que 15 cm e os mesmos tiveram piores resultados na SLE, corroborando com os dados de Bispo Júnior6, em sua tese de doutorado, e de Castro et al.4

A sobrevida global (SG) dos pacientes em dois e quatro anos foi de 45,5% e 39%, respectivamente. Outros estudos4,6 relataram taxas de SG superiores às encontradas em nosso estudo.

Ao avaliarmos a SLE, observamos taxas de 39,8% e 19,9% em dois e quatro anos, respectivamente. Estudos semelhantes revelaram taxas superiores.4-6

O tratamento cirúrgico (amputação ou preservação de membro) foi escolhido para os pacientes de acordo com as condições adjacentes a que esse estava submetido, ou seja, a decisão quase sempre estava associada ao grau com que a doença já havia evoluído; pacientes diagnosticados tardiamente, com doença metastática e/ou com tumores de grandes volumes, quase sempre foram submetidos à cirurgia radical. Dessa forma, tivemos 65,6% dos pacientes submetidos à amputação.

Os pacientes com indicação de cirurgia salvadora de membro, apesar de terem maior chance de apresentar recidivas locais, a depender da técnica cirúrgica e curva de aprendizado, apresentaram SG e SLE superiores em relação aos que foram submetidos à amputação.7,8 Isso se deve ao fato de que os pacientes com tumores volumosos, nos quais não existem condições de preservação do membro, apresentam, mesmo ao diagnóstico, um prognóstico pior.8,9

Avaliamos os critérios de Huvos, encontramos a sua não significância perante o prognóstico dos pacientes. Bispo Júnior6 relatou, em sua tese de doutorado, que a estratificação em grupos I e II não se mostrava necessária, em virtude do comportamento similar apresentado por ambos os grupos; demonstrou também que existe um comportamento prognóstico similar entre os mesmos.

Outros critérios de avaliação prognóstica e de estadiamento já foram propostos na literatura mundial.10,11 A imagem por ressonância magnética poderá ser, no futuro, usada para avaliar o grau de necrose tumoral pós-quimioterapia neoadjuvante.

Conclusão

De acordo com este estudo, são fatores de pior prognóstico: presença de metástase ao diagnóstico e tumores maiores que do 15 cm. Além disso, os critérios de Huvos não atingiram significância estatística para o prognóstico dos pacientes.

REFERENCES

  • 1
    Camargo OP, Baptista AM, Caiero MT, Camargo AFF. Afecções tumorais: avaliação, epidemiologia e diagnóstico. In: Barros Filho TEP, Camargo OP, Camanho GL. Clínica ortopédica - Medicina USP. Barueri: Manole; 2012. p. 506-10.
  • 2
    Garcia Filho RJ. Diagnóstico e tratamento de tumores ósseos. Rio de Janeiro: Elsevier; 2005.
  • 3
    Lewis VO. What's new in musculoskeletal oncology. J Bone Joint Surg. 2009;91(6):1546-56.
  • 4
    Castro HC, Ribeiro KCB, Bruniera P. Osteossarcoma: experiência do Serviço de Oncologia Pediátrica da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Rev Bras Ortop. 2008;43(4):108-15.
  • 5
    Rech A, Castro CG Jr, Mattei J, Gregianin L, Di Leone L, David A, et al. Características clínicas do osteossarcoma na infância e sua influência no prognóstico. J Pediatr. 2004;80(1):65-70.
  • 6
    Bispo Júnior RZ. Fatores prognósticos da sobrevida no osteossarcoma primário: grau I versus II de Huvos [tesse]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo; 2009.
  • 7
    Simon MA. Current concepts review: limb salvage for osteosarcoma. J Bone Joint Surg Am. 1988;70(2):307-10.
  • 8
    Rougraff BT, Simon MA, Kneisl JS, Greenberg DB, Mankin HJ. Limb salvage compared with amputation for osteosarcoma of the distal end of the femur. J Bone Joint Surg Am. 1994;76(5):649-56.
  • 9
    Curcelli EC. Prognóstico em osteossarcoma: análise clínica, epidemiológica, histopatológica e imuno-histoquímica [tese]. Botucatu: Universidade Estadual Paulista; 2008.
  • 10
    Wuisman P, Enneking WF. Prognosis for patients who have osteosarcoma with skip metastasis. J Bone Joint Surg Am. 1990;72(1):60-8.
  • 11
    Peabody TD, Gibbs CP, Simon MA. Current concepts review: evaluation and staging of musculoskeletal neoplasms. J Bone Joint Surg Am. 1998;80(8):1204-18.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2013

Histórico

  • Recebido
    06 Mar 2012
  • Aceito
    23 Maio 2012
Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Al. Lorena, 427 14º andar, 01424-000 São Paulo - SP - Brasil, Tel.: 55 11 2137-5400 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbo@sbot.org.br