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Estudos Psiquiátricos

Livros

Estudos Psiquiátricos

Por Isaias Paim. 1998. Campo Grande: Solivros. 134 páginas.

ISBN 85-86566-04-7

O autor reúne nesta obra trabalhos seus publicados em revistas da especialidade, de modo a torná-los mais acessíveis. Embora o livro manifeste, já no prefácio, um desencanto com psiquiatras, a leitura evidencia dedicação e esmero para com a psiquiatria.

É difícil rotular o autor, a partir desses trabalhos, em alguma linhagem ou lugar comum da especialidade: psicopatólogo-fenomenológico, clínico, forense, psiquiatra social ou antipsiquiatra. Isso decerto contribui para seu embate com os colegas.

Estudos Psiquiátricos nos mostra um jasperiano ortodoxo com acordes antipsiquiátricos, munido de apreço pela história da psiquiatria e envolvido com a psiquiatria forense. Trata-se de uma obra de valor e coragem por romper com lugares comuns, em que, muitas vezes, vemo-nos impingidos.

O livro reúne dez artigos publicados. Os dois primeiros versam sobre a psicopatologia jasperiana: "Contribuições da Psicopatologia ao Desenvolvimento da Psiquiatria Clínica" e "O Compreender e o Explicar". O autor procura conceituar a própria psicopatologia e discorre sobre conceitos importantes como o delírio primário e as idéias deliróides; reação; desenvolvimento e processo; o compreender e o explicar.

Os três capítulos seguintes trazem contribuições no campo da psiquiatria forense, a partir de dados históricos relevantes em "Desenvolvimento da Psiquiatria Forense no Brasil", capítulo mais extenso do livro, com 30 páginas.

A partir de um apanhado do que ocorria no mundo no século passado nesse campo, o autor remete às obras de Teixeira Brandão, José de Oliveira Ferreira e Afrânio Peixoto (a quem aponta como legítimo fundador da psiquiatria forense no Brasil), Franco da Rocha, Heitor Carrilho (o maior representante da especialidade), e Oswaldo Domingues de Moraes, de quem anota a interessante observação: "a periculosidade dos anormais está na razão direta com que funções e possibilidades normais de execução possam ser colocadas a serviço de realidades mórbidas ideativas, volitivas ou afetivas". Paim descreve ainda os motivos técnicos e os trâmites políticos que resultaram no Manicômio Judiciário do Rio de Janeiro, de 1921, primeiro do país a propiciar assistência adequada aos doentes mentais submetidos a condições jurídicas especiais, como também o desenvolvimento científico da psiquiatria forense.

Nos capítulos "Meio Século de Medida de Segurança" e "A Crueldade da Medida de Segurança", o autor tece sérias críticas ao papel do psiquiatra em certas circunstâncias. Fala ainda também sobre as dificuldades do sistema penitenciário, que decorreria de seu conflitante papel de punir e recuperar. Não nega, porém, a existência de psicopatas perigosos, casos excepcionais a serem eliminados do meio social. E completa dizendo que nem todos os psicopatas cometem crimes de morte. "De modo geral, são muito inteligentes e chegam a ocupar lugares de destaque no meio social. Entre os políticos de influência existe um número considerável de psicopatas. Aliás, em todas as classes sociais se encontram um número apreciável de psicopatas. Entre médicos, advogados, engenheiros, psicólogos, encontram-se psicopatas ocupando postos importantes na vida pública. A criminalidade desses indivíduos, em sua grande maioria, consiste em estelionato, corrupção, furtos, tráficos de drogas, organização de quadrilhas, desfalques nas instituições governamentais. Tais indivíduos são tão poderosos que se tornam inalcançáveis pelas leis punitivas...".

O capítulo "Identidade e Perda da Identidade" assume conotações abertamente antipsiquiátricas. Compara o emprego de meios de tortura para melhorar a qualidade de vida após a morte – outrora preconizados pela igreja e considerados caridade – à internação involuntária e meios de tratamento impessoais e violentos da psiquiatria. O psiquiatra realizaria uma verdadeira dissociação entre teoria e prática. O autor chega a falar de "carcereiros de jaleco branco" e do número impressionante de psicopatia, além de outros transtornos, entre os psiquiatras. Diante de tal quadro assistencial e profissional, os pacientes perdem suas próprias identidades.

"Precursores da Psicoterapia" é um capítulo que faz interessante apanhado histórico da psiquiatria desde a antiguidade greco-romana. Relata que doenças mentais estariam impregnadas de concepções corporais desde seus primórdios. Concepções psicogenéticas teriam surgido nos últimos dois séculos, com Daquin e os românticos alemães, entre outros. Encerra com uma referência especial a Pierre Janet.

"Alcoolismo Feminino" chama a atenção para esse distúrbio e suas conseqüências na mulher. "Comentários Sobre o CID-10" traz contribuições para a precisão dos termos empregados, além de posicionamento crítico a essa nosografia (classificação de diagnósticos), e não nosologia (estudo classificatório e sistemático das enfermidades). O último capítulo, "Assistência Psiquiátrica no Brasil", é um relato histórico com dados importantes sobre a assistência psiquiátrica e sua reforma no Brasil.

Mauricio Viotti Daker

Professor Adjunto

Departamento de Psiquiatria e Neurologia

Faculdade de Medicina da UFMG

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jun 2000
  • Data do Fascículo
    Dez 1999
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