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Estudo etnofarmacológico e etnobotânico de Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel (janaguba)

Ethnopharmacological and ethnobotanical study of Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel (janaguba).

RESUMO

Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel, janaguba, produz um látex em seu caule que é usado para o tratamento de alguns tipos de câncer, vermes intestinais, febre, menstruações irregulares, infertilidade feminina e úlceras gástricas. Estudos fitoquímicos revelaram a presença de acetato de lupeol e proteínas; e estudos farmacológicos, os efeitos antiúlcera, antitumoral, imunomodulador, analgésico e anti-inflamatório. O presente trabalho objetivou realizar levantamento etnobotânico e etnofarmacológico sobre H. drasticus como contribuição ao conhecimento científico da referida espécie. Foi elaborado um questionário, que foi aplicado em entrevista a 21 raizeiros nos mercados das cidades de Crato, Fortaleza e Pacajus do estado do Ceará (CE). Observou-se que 38,1% dos raizeiros têm mais de 10 anos de serviço e 47,6%, estão na faixa etária de 40 a 59 anos, o que representa um fator positivo quanto à experiência com plantas medicinais. Aproximadamente 85,7% dos raizeiros relataram o uso do látex da H. drasticus para tratamento de úlcera; 66,7% para inflamação; 66,7% para câncer. Verificou-se que as principais indicações terapêuticas relatadas pelos raizeiros sobre esta espécie estão de acordo com as informações científicas. Os levantamentos etnobotânicos e etnofarmacológicos exercem um papel primordial no resgate do conhecimento tradicional, nos meios rurais e urbanos, tanto por seu valor histórico-cultural, como também pela necessidade de confirmação das indicações de uso.

Palavras-chave
Himatanthus drasticus; etnofarmacologia; etnobotânica

ABSTRACT

The Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel, janaguba, produces a latex whose stem is used to treat some types of cancer, intestinal worms, fever, irregular menses, female infertility and gastric ulcers. Phytochemical studies revealed the presence of lupeol acetate and proteins in the latex; and pharmacological studies indicated antiulcer, anti-tumor, immunomodulating, analgesic and anti-inflammatory effects. This study aimed to conduct surveys on ethnopharmacological and ethnobotanical species H. drasticus as a contribution to the scientific knowledge about the species. A questionnaire and interviews were made with 21 healers in the markets of the cities of Crato, Fortaleza and Pacajús, in state of Ceara (CE). It was observed that 38.1% of the healers have more than 10 years of service, and 47.6% are between 40-59 years old, which is a positive factor about the experience with medicinal plants. Approximately 85.7% of the healers reported to apply latex H. drasticus for the treatment of ulcers, 66.7% for inflammation, and 66.7% for cancer. It was found that the main therapeutic indications mentioned by the healers about this species are consistent with the scientific information available. The ethnobotanical and ethnopharmacological surveys play an essential role on keeping the traditional knowledge in rural and urban areas, both for its historical and cultural value, but also for the need of confirmation of the intended use.

Keywords
Himatanthus drasticus; ethnopharmacological; ethnobotanical

INTRODUÇÃO

O resgate dos conhecimentos de plantas medicinais é feito através dos levantamentos etnofarmacológicos e etnobotânicos (Elisabetsky, 2001ELISABETSKY, E. Etnofarmacologia como ferramenta na busca de substâncias ativas. In: SIMÕES, C.M.O. et al. Farmacognosia: da planta ao medicamento. 3.ed. Porto Alegre: UFRGS, 2001. p. 87-99.). De acordo com Di Stasi, et al. (2002)DI STASI, L.C. et al. Medicinal plants popularly used in the Brazilian Tropical Atlantic Forest. Fitoterapia, v. 73, p. 69-91, 2002., as pesquisas etnofarmacológicas possuem importantes ferramentas de registros e documentação dos usos empíricos de plantas medicinais em comunidades tradicionais, tendo a finalidade de gerar o conhecimento útil para levar ao desenvolvimento de novos medicamentos, da conservação da biodiversidade e a valorização do saber e da cultura local.

A abordagem etnofarmacológica na investigação de plantas medicinais consiste em combinar informações adquiridas junto a usuários da flora medicinal, com estudos químicos e farmacológicos existentes na literatura. Tal fato permite a formulação de hipóteses quanto à(s) atividade(s) farmacológica(s) e à(s) substância(s) ativa(s) responsável (eis) pelas ações terapêuticas relatadas (Elisabetsky, 2003ELISABETSKY, E. Etnofarmacologia. Ciência e Cultura, v. 55, n. 3, p. 35-36, 2003.).

Segundo Beck & Ortiz (1997)BECK, H.T.; ORTIZ, A. Proyecto etnobotánico de la comunidad Awá en El Ecuador. In: RIOS, M.; PEDERSEN, H.B (eds). Uso e manejo de recursos vegetales. Memorias Del II Simpósio Ecuatoriano de Etnobotánica y Botánica Economica, Quito, p. 159-76, 1997., a etnobotânica compreende o estudo das sociedades humanas, passadas e presentes, e suas interações ecológicas, genéticas, evolutivas, simbólicas e culturais com as plantas. Vem defender a manutenção de espécies vegetais, como também, a perpetuação da cultura humana integrada a estes cultivos e recursos. As pesquisas nesta área tendem a facilitar o modo correto de manejo da vegetação com finalidade utilitária, pois empregam os conhecimentos tradicionais obtidos para solucionar problemas de saúde ou para fins conservacionistas.

A etnobotânica e a etnofarmacologia têm demonstrado ser poderosas ferramentas na busca por substâncias naturais de ação terapêutica (Albuquerque & Hanaki, 2006ALBUQUERQUE, U.P.; HANAZAKI, N. As pesquisas etnodirigidas na descoberta de novos fármacos de interesse médico e farmacêutico: fragilidades e perspectivas. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 16 (supl.), p. 678-89, 2006.), onde estudos comparativos entre o método etnodirigido e o randômico tem revelado a superioridade do primeiro em relação ao segundo (Slish et al., 1999SLISH, D.F. et al. Ethnobotany in the search for the vasoactive herbal medicines. Journal of Ethnopharmacology, v. 66, p. 159-165, 1999.; Khafagi & Dewedar, 2000KHAFAGI, I.K.; DEWEDAR, A. The efficiency of random versus ethno-directed research in the evaluation of Sinai medicinal plants of bioactive compounds. Journal of Ethnopharmacology, v. 71, p. 365-376, 2000.; Oliveira et al., 2011OLIVEIRA, D.R. et al. Ethnopharmacological versus random plant selection methods for the evaluation of the antimycrobacterial activity. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 21, n. 5; p. 793-806, 2011.). Oliveira et al. (2011)OLIVEIRA, D.R. et al. Ethnopharmacological versus random plant selection methods for the evaluation of the antimycrobacterial activity. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 21, n. 5; p. 793-806, 2011., por exemplo, em trabalho sobre seleção de métodos de abordagem (etnofarmacológica versus randômica) para avaliação de atividade antimicrobiana de plantas, obtiveram os melhores resultados para a referida atividade com a abordagem etnofarmacológica (50%), contra 16,7%, para a abordagem randômica.

O estudo de plantas medicinais, a partir de seu emprego pelas comunidades, pode fornecer informações úteis para a elaboração de estudos farmacológicos, fitoquímicos e agronômicos sobre estas plantas, com grande economia de tempo e dinheiro. Desta forma, pode-se planejar a pesquisa a partir de conhecimento empírico já existente, muitas vezes consagrado pelo uso contínuo, que deverá ser testado em bases científicas (Simões et al., 2001SIMÕES, C.O. et al. Farmacognosia: da planta ao medicamento. 3. ed. Porto Alegre: UFRGS, 2001.).

Os raizeiros têm um importante papel na divulgação e manutenção da medicina popular, através da comercialização de plantas medicinais e a orientação de como utilizá-las. Comercializam plantas medicinais e preparados líquidos denominados “garrafadas” e “leites”, orientando como usá-las e prepará-las para curar as mais diversas doenças, apesar de não terem, em geral, um conhecimento profundo sobre os verdadeiros usos dos vegetais que comercializam, seus efeitos adversos e interações medicamentosas (Dourado et al., 2005DOURADO, E.R.; DOCA, K.N.P.; ARAUJO, T.C.C. Comercialização de Plantas Medicinais por “Raizeiros” na Cidade de Anápolis-GO. Revista Eletrônica de Farmácia, v. 2, p. 67-69, 2005.). Assim, levantamentos etnobotânico e etnofarmacológico são necessários, pois permitem a realização de estudos comparativos entre os dados coletados e dados científicos, para uma posterior devolução à comunidade de informações para um uso seguro e racional de plantas medicinais (Albuquerque & Hanazaki, 2006ALBUQUERQUE, U.P.; HANAZAKI, N. As pesquisas etnodirigidas na descoberta de novos fármacos de interesse médico e farmacêutico: fragilidades e perspectivas. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 16 (supl.), p. 678-89, 2006.).

No Brasil há registro da ocorrência de treze espécies de Himatanthus(Apocynaceae), sendo que destas, H. drasticus Mart. (Plumel), popularmente conhecida como janaguba, é a única encontrada no Ceará (Plumel, 1990PLUMEL, M.M. Repartition geographique du genre Himatanthus em Amerique Tropicale. Comptes-Rendus de la Société de Biogéographie, v. 66, n. 3, p. 103-127, 1990.; Forzza et al., 2010FORZZA, R.C. (org.) Catálogo de plantas e fungos do Brasil. v. 1. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio/ Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, 2010. Disponível em: <http://reflora.jbrj.gov.br/downloads/vol1.pdf>. Acesso 28 fev. 2015.
http://reflora.jbrj.gov.br/downloads/vol...
). É predominante na Chapada do Araripe, região do Cariri (CE), sendo nativa desde as Guianas até a Bahia (Amaro et al., 2006AMARO, M.S. et al. Morfologia de frutos, sementes e de plântulas de janaguba (Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. – Apocynaceae). Revista Brasileira de Sementes, v. 28, n. 1, p. 63‑71, 2006.).

Trata-se de uma planta arbórea, atingindo cerca de sete metros de altura, que produz um látex, um tipo de suco leitoso, de cor branca, obtido do tronco e galhos, utilizado na medicina popular para o tratamento do câncer, vermes intestinais, febre, menstruações irregulares, infertilidade feminina, sintomas da menopausa e úlceras gástricas (Lorenzi & Matos, 2008LORENZI, H.F.; MATOS, F.J.A. Plantas medicinais do Brasil, nativas e exóticas. São Paulo: Plantarum, 2008.; Lucetti et al., 2010LUCETTI, D.L. et al. Anti-inflammatory effects and possible mechanism of action of lupeol acetate isolated from Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. Journal of Inflammation, v. 7, n. 60, p. 1-11, 2010.; Mousinho et al. 2011MOUSINHO, K.C. et al. Efeito antitumoral de proteínas laticíferos de Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel - Apocynaceae. Journal of Ethnopharmacology, v. 137, n. 1, p. 421-6, 2011.; Oliveira et al., 2012OLIVEIRA, D.R. et al. Ethnopharmacological usage of medicinal plants in genitourinary infections by residents of Chapada do Araripe, Crato, Ceará – Brazil. Revista Brasileira de Promoção à Saúde, v. 25, n. 3, p. 278-286, 2012.). Estudos fitoquímicos revelaram a presença de acetato de lupeol e proteínas (Lucetti et al., 2010LUCETTI, D.L. et al. Anti-inflammatory effects and possible mechanism of action of lupeol acetate isolated from Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. Journal of Inflammation, v. 7, n. 60, p. 1-11, 2010.; Mousinho et al., 2011MOUSINHO, K.C. et al. Efeito antitumoral de proteínas laticíferos de Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel - Apocynaceae. Journal of Ethnopharmacology, v. 137, n. 1, p. 421-6, 2011.); e estudos farmacológicos, os efeitos antiúlcera, antitumoral, imunomodulador, analgésico e anti-inflamatório (Colares et al., 2008aCOLARES, A.V. et al. Efeito gastroprotetor do látex de Himatanthus drasticus (Mart) Plumel (Janaguba). Infarma, v. 20, n. 11/12, 2008a.; Colares et al., 2008bCOLARES, A.V. et al. Phytochemical and biological preliminary study of Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel (janaguba). Pharmacognosy Network Worldwide, v. 4, p. 73-77. 2008b.; Leite et al., 2009LEITE et al. Gastroprotective effect of medicinal plants from Chapada do Araripe, Brazil. Journal of Young Pharmacology, v. 1, p. 54-56, 2009.; Sousa, 2009SOUSA, E.L. Atividade Anti-tumoral de Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel–Apocynaceae (Janaguba). 2009. 93p. Dissertação (Mestrado em Ciências Farmacêuticas) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife.; Lucetti et al., 2010LUCETTI, D.L. et al. Anti-inflammatory effects and possible mechanism of action of lupeol acetate isolated from Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. Journal of Inflammation, v. 7, n. 60, p. 1-11, 2010.; Mousinho et al., 2011MOUSINHO, K.C. et al. Efeito antitumoral de proteínas laticíferos de Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel - Apocynaceae. Journal of Ethnopharmacology, v. 137, n. 1, p. 421-6, 2011.).

O presente trabalho objetivou realizar levantamentos etnobotânico e etnofarmacológico sobre a espécie H. drasticus como contribuição ao conhecimento científico da referida espécie.

MATERIAL E MÉTODO

Este trabalho foi desenvolvido baseado em orientações sobre pesquisa etnodirigida descritas por Albuquerque & Hanazaki (2006)ALBUQUERQUE, U.P.; HANAZAKI, N. As pesquisas etnodirigidas na descoberta de novos fármacos de interesse médico e farmacêutico: fragilidades e perspectivas. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 16 (supl.), p. 678-89, 2006.. O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade de Fortaleza sob o parecer de número 355.532.

A pesquisa foi realizada em três mercados do estado do Ceará: Mercado Público Municipal do Crato; Mercado Público do Município de Pacajus e Mercado São Sebastião do Município de Fortaleza. Os mercados de Fortaleza e Pacajus foram selecionados por serem de fácil acesso aos pesquisadores do presente trabalho, bem como por possuírem raizeiros que comercializam janaguba; e o mercado de Crato, porque a referida cidade é conhecida como produtora de “leite de janaguba” (Neres, 1990NERES, A. Janaguba, a planta milagrosa. Tribuna do Ceará, Fortaleza, CE, 21 de junho de 1990, p. 5.).

Caracterização do Local de Estudo

O Mercado São Sebastião localiza-se no Centro de Fortaleza, onde há maior concentração de raizeiros que comercializam janaguba. O município de Fortaleza, capital do estado, possui uma população de 2.447.409 habitantes (Brasil, 2010BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Disponível em: <http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.php?uf=23&dados=1>. Acesso 12 abr. 2013.
http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse...
). O município de Pacajus, por sua vez, faz parte da região metropolitana de Fortaleza, com distância de 51,1 km para a capital e com uma população de 61.838 habitantes (Brasil, 2010BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Disponível em: <http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.php?uf=23&dados=1>. Acesso 12 abr. 2013.
http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse...
). O município de Crato fica no interior do estado, no sopé da Chapada do Araripe no extremo-sul do estado, microrregião do Cariri, com distância de 567 km de Fortaleza e população de 121.428 habitantes (Brasil, 2010BRASIL. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Disponível em: <http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.php?uf=23&dados=1>. Acesso 12 abr. 2013.
http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse...
). A Floresta Nacional do Araripe, mais conhecida como FLONA Araripe, é uma unidade de conservação brasileira, que tem expressivo potencial ecológico. Nela encontram-se diversas espécies da flora nativa que originam produtos de uso popular e científico. Dentre as espécies vegetais, destaca-se a janaguba (Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel), cujo látex é largamente utilizado na medicina popular (Neres, 1990NERES, A. Janaguba, a planta milagrosa. Tribuna do Ceará, Fortaleza, CE, 21 de junho de 1990, p. 5.; Lorenzi & Matos, 2008LORENZI, H.F.; MATOS, F.J.A. Plantas medicinais do Brasil, nativas e exóticas. São Paulo: Plantarum, 2008.).

População do Estudo

A amostra foi constituída por 21 (vinte e um) raizeiros que se dispuseram a participar do estudo. A Tabela 1apresenta a distribuição do número de raizeiros por mercados e respectivos municípios.

TABELA 1
Distribuição do número de raizeiros entrevistados por mercados e respectivos municípios.

Foram considerados inclusos aqueles indivíduos que assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido segundo recomendações da Resolução nº 466/2012, da Comissão Nacional de Saúde, e que não se recusaram a prestar as devidas informações. Todos aqueles que não cumpriram as exigências citadas acima foram excluídos.

Coleta de dados

  • Os dados foram obtidos através de entrevista semiestruturada guiada por um questionário com 20 (vinte) questões, abordando os seguintes aspectos:

  • Perfil social dos informantes: gênero, idade, estado civil, tempo de profissão e escolaridade;

  • Aspectos etnobotânicos: fonte do conhecimento, locais de obtenção e partes da planta;

Aspectos etnofarmacológicos: indicação terapêutica, posologia e toxicidade.

O questionário foi aplicado em Fortaleza e Pacajus (CE) no período de agosto de 2013 e em Crato (CE), no período de setembro de 2013.

Adicionalmente foi realizado um levantamento no banco de dados do Herbário Prisco Bezerra da Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza, sobre os registros de H. drasticus, com o objetivo de observar a ocorrência da espécie no Ceará.

Processamento e análises dos dados

Os resultados dos questionários foram devidamente processados e interpretados, utilizando-se o programa Microsoft Word®. As indicações populares foram classificadas por categorias de doenças proposta pela Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, 10a Revisão (CID 10) (Brasil, 2008BRASIL, Ministério da Saúde. Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID). 10. ed. 2008. Disponível em: < http://www.datasus.gov.br/cid10/V2008/cid10.htm>. Acesso 10 set. 2013.
http://www.datasus.gov.br/cid10/V2008/ci...
).

Foi montado um banco de dados sobre as informações descritivas obtidas nas entrevistas para estabelecer a comparação entre as referidas informações e a literatura científica. As referências bibliográficas consultadas foram obtidas das bases de dados do Portal Periódicos Capes (período da consulta: agosto a setembro de 2013) e livros.

Os dados foram agrupados em tabelas, cuja frequência foi demonstrada em valores unitários e/ou percentuais.

RESULTADO E DISCUSSÃO

Perfil social dos informantes

Dos 21 raizeiros que responderam ao questionário, 71,4% são do gênero masculino. A idade variou entre 20 a 72 anos, sendo 61,9% com idade superior a 40 anos. Com relação ao estado civil, predominaram os casados (85,7%). Quanto à escolaridade, 42,9% não são alfabetizados; e 85,7% dos entrevistados já trabalham no ramo há mais de 10 anos, o que representa um fator positivo quanto à experiência com plantas medicinais. Esses dados estão sumarizados na Tabela 2.

TABELA 2
Perfil social dos raizeiros que comercializam H. drasticus nos mercados cearenses de Pacajus, Crato e mercado São Sebastião de Fortaleza (período: agosto a setembro de 2013; N=21).

Percebeu-se então que a população predominante foi de homens com mais de 40 anos, casados, com pouca escolaridade, porém com um vasto conhecimento sobre os benefícios de H. drasticus através das informações populares. Em um estudo de caso realizado por Baldauf & Santos (2013)BALDAUF, C.; SANTOS, F.A.M. Ethnobotany, Traditional Knowledge, and Diachronic Changes in Non-Timber Forest Products Management: A Case Study of Himatanthusdrasticus (Apocynaceae) in the Brazilian Savanna. Economic Botany, v. 67, n. 2, p. 110-120, 2013. na FLONA Araripe foi constatado que o nível de conhecimento ecológico dos entrevistados como um todo era considerado intermediário; e que o conhecimento ecológico mais profundo estava restrito a indivíduos mais velhos e/ou para aqueles indivíduos com uma história mais longa na atividade de extração do látex de H. drasticus.

Aspectos Etnobotânicos

Com relação à origem dos conhecimentos sobre H. drasticus, 90,5% dos entrevistados o adquiriram com seus pais ou familiares, o restante através de livros e televisão. Baldauf & Santos (2013)BALDAUF, C.; SANTOS, F.A.M. Ethnobotany, Traditional Knowledge, and Diachronic Changes in Non-Timber Forest Products Management: A Case Study of Himatanthusdrasticus (Apocynaceae) in the Brazilian Savanna. Economic Botany, v. 67, n. 2, p. 110-120, 2013. também observaram como formas de transmissão de conhecimento associados à H. drasticus, a transmissão de pais para filhos, e entre indivíduos da mesma geração; assim, este tipo de transmissão constitui a principal forma de repasse de informações sobre a referida espécie.

A parte comercializada é o látex, sendo o mesmo diluído em água e acondicionado em garrafas de vidro transparente com vedações de plástico ou cortiça. No comércio, esta preparação é conhecida como “leite de janaguba”.

A maioria dos entrevistados não produzem as garrafas de látex de H. drasticus (90,5%), adquirindo-as de outras cidades cearenses (Quixadá, Juazeiro do Norte e Cascavel), mas principalmente da cidade do Crato. Somente um raizeiro do Crato e outro de Pacajus realizam a extração do látex da planta. (...) Já extraio o leite da janaguba há 15 anos, só tiro pela manhã cedinho, tiro a casca com uma faca com cuidado para não matar a planta, passo uma esponja na planta onde está o leite e espremo a esponja em um balde de plástico com água e deixo em repouso, depois coloco em uma garrafa de vidro, e é usada para câncer, gastrite, úlcera e inflamação (raizeiro de Pacajus, CE).

Segundo relato de raizeiro extrativista do Crato, o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) autoriza o extrativismo apenas nas sexta-feiras, sendo suspensa durante os meses de dezembro a fevereiro, por se tratar de período de floração da planta. Os horários recomendados para extração são de 5 às 10 h e 16 às 18 h, pois próximo de 12 h, a planta fornece pouco látex. Faz-se raspagem suave no caule da planta, colhe-se o látex com uma colher, e armazena-se em recipiente higienizado (látex bruto). Para comercializar, o látex bruto é diluído em água filtrada e fervida na proporção de 25 partes de látex para 75 de água (1:4, v/v). No comércio é determinada a validade de quatro meses, a contar da data de extração.

Matos & Lorenzi (2008)LORENZI, H.F.; MATOS, F.J.A. Plantas medicinais do Brasil, nativas e exóticas. São Paulo: Plantarum, 2008. descrevem a obtenção do látex também de forma artesanal, onde é retirada uma parte da casca do tronco, numa faixa de 10 x 30 cm, retirando-se o látex com auxílio de uma colher e água. A operação está concluída quando a mistura “leite” e água, colocada em uma garrafa plástica de um litro, deixa sedimentar um depósito esbranquiçado com cerca de um quarto ou um terço da garrafa cheia, com um sobrenadante levemente róseo.

TABELA 3
Levantamento das ocorrências de H. drasticus no Ceará conforme registros do Herbário Prisco Bezerra, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, Ceará.

A Tabela 3 expõe os resultados do levantamento das espécies de H. drasticus registradas no Herbário Prisco Bezerra da UFC. Verificou-se que a maior parte dos registros é de espécimes coletados na chapada do Araripe, Crato, coincidindo com as informações dos raizeiros quando relatam que o látex é proveniente principalmente desta cidade.

No referido banco de dados, há alguns registros de espécimes coletados em outros estados, como Piauí (5), Maranhão (5), Rio Grande do Norte (2) e Bahia (1).

Na FLONA Araripe se encontram diversas espécies da flora nativa que originam produtos de uso popular e científico, sendo as espécies mais exploradas o pequi (Caryocar coriaceum), a faveira (Dimorphandra gardineriana) e a janaguba (H. drasticus) (Cavalcanti & Nunes, 2002CAVALCANTI, F.S.; NUNES, E.P. Reflorestamento de clareiras na floresta nacional do Araripe com Vanillosmopsis arborea Baker. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 12, supl., p. 94-96, 2002.; IBAMA, 2009IBAMA. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Nacionais Renováveis. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/recursosflorestais/ araripe.htm>. Acesso 20 out. 2009.
http://www.ibama.gov.br/recursosfloresta...
). Esta última já se encontra ameaçada de extinção no ambiente de cerrado da FLONA (MMA, 2014MMA - Ministério do Meio Ambiente. ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Plano de Manejo da Floresta Nacional do Araripe. Disponível em: < www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/.../flona_araripe_pm_diag2.pdf>. Acesso 3 nov. 2014.
www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/...
).

A recente comprovação farmacológica das propriedades medicinais da espécie vem aumentando a pressão de coleta deste recurso (Cavalcanti & Nunes, 2002CAVALCANTI, F.S.; NUNES, E.P. Reflorestamento de clareiras na floresta nacional do Araripe com Vanillosmopsis arborea Baker. Revista Brasileira de Farmacognosia, v. 12, supl., p. 94-96, 2002.; IBAMA, 2009IBAMA. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Nacionais Renováveis. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/recursosflorestais/ araripe.htm>. Acesso 20 out. 2009.
http://www.ibama.gov.br/recursosfloresta...
), já ameaçada de extinção no ambiente de cerrado da FLONA Araripe (MMA, 2014MMA - Ministério do Meio Ambiente. ICMBio – Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Plano de Manejo da Floresta Nacional do Araripe. Disponível em: < www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/.../flona_araripe_pm_diag2.pdf>. Acesso 3 nov. 2014.
www.icmbio.gov.br/portal/images/stories/...
). Baldauf & Santos (2013)BALDAUF, C.; SANTOS, F.A.M. Ethnobotany, Traditional Knowledge, and Diachronic Changes in Non-Timber Forest Products Management: A Case Study of Himatanthusdrasticus (Apocynaceae) in the Brazilian Savanna. Economic Botany, v. 67, n. 2, p. 110-120, 2013. realizaram uma caracterização etnobotânica dos sistemas de manejo de látex de H. drasticus e identificaram três sistemas de manejo empregados para coleta do látex: realização de vários cortes na casca, semelhante à do processo usado para obter o látex das seringueiras, com baixa exsudação de látex; remoção de maiores quantidades de casca, com intervalos de tempo mais curtos entre colheitas; e remoção de quantidades menores de casca de cada árvore e com intervalos mais longos entre colheitas.

Segundo os autores, estes sistemas de manejo podem ter impactos ecológicos distintos sobre as populações exploradas, uma vez que se diferenciam em função da quantidade de casca retirada e intervalos entre explorações; e a caracterização do conhecimento etnobotânico relacionada com a gestão dos sistemas de manejo representa um passo fundamental para a elaboração de estratégias de sustentabilidade para qualquer espécie de planta (Baldauf & Santos, 2013BALDAUF, C.; SANTOS, F.A.M. Ethnobotany, Traditional Knowledge, and Diachronic Changes in Non-Timber Forest Products Management: A Case Study of Himatanthusdrasticus (Apocynaceae) in the Brazilian Savanna. Economic Botany, v. 67, n. 2, p. 110-120, 2013.).

Aspectos Etnofarmacológicos

O látex de H. drasticus é utilizado pela grande maioria da população através de informações populares para fins curativos, preventivos e/ou paliativo. A Tabela 4 apresenta as diferentes posologias do látex de H. drasticus, com respectivos períodos de tratamentos, conforme relatados pelos entrevistados.

TABELA 4
Posologias e períodos de tratamento com látex de H. drasticus, tal como expressas pelos entrevistados.

Observou-se que a população faz o uso de forma bastante diversificada, variando entre uma colher de sopa duas vezes ao dia até melhora dos sintomas, e uma xícara de chá por dia durante três meses. Não há relatos na literatura sobre a forma de uso do látex de outras espécies de Himatanthus.

Noventa e cinco vírgula dois por cento (95,2%) dos raizeiros afirmam haver eficácia no uso de H. drasticus através de informações de usuários. O látex é utilizado no tratamento de diversas patologias, desde Pitiriase versicolor (conhecido popularmente como pano branco) até câncer. A Tabela 5 expressa as indicações do látex de H. drasticus e respectivos percentuais de citação e classificação CID 10. As três indicações principais foram: tratamento de úlcera gástrica (85,7%), de inflamação (aparelho geniturinário, digestivo e resultante de infecções em geral) (66,7%) e câncer (66,7%). A literatura já mencionava o uso popular para o tratamento do câncer e úlceras gástricas, porém, o uso contra vermes intestinais, febre, menstruações irregulares e infertilidade feminina (Lorenzi & Matos, 2008LORENZI, H.F.; MATOS, F.J.A. Plantas medicinais do Brasil, nativas e exóticas. São Paulo: Plantarum, 2008.; Lucetti et al., 2010LUCETTI, D.L. et al. Anti-inflammatory effects and possible mechanism of action of lupeol acetate isolated from Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. Journal of Inflammation, v. 7, n. 60, p. 1-11, 2010.; Mousinho et al., 2011MOUSINHO, K.C. et al. Efeito antitumoral de proteínas laticíferos de Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel - Apocynaceae. Journal of Ethnopharmacology, v. 137, n. 1, p. 421-6, 2011.), não foi relatado por nenhum dos entrevistados.

TABELA 5
Indicações terapêuticas do látex de H. drasticus e respectivos percentuais de citação e classificação CID 10.

Apenas um raizeiro relatou que o uso do látex de H. drasticusapresenta efeitos indesejáveis, sendo o mais comum o vômito; e que em paciente com câncer em estado avançado, além de vômito, apresentam dores de cabeça. Este efeito difere do mencionado para o uso em excesso do látex de H. lancifolius, que causa cólicas menstruais e afecções gastrintestinais; e em crianças, diarreias e desidratação (Baratto, 2010BARATTO, L.C. Estudo químico e analitico e morfoanatômico de espécies medicinais brasileiras da família Apocynaceae: Himatanthus lancifolius. 2010. 157p. Dissertação (Mestrado em Ciências Farmacêuticas) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Universidade Federal do Paraná, Curitiba.).

Em levantamento sobre usos populares do látex de outras espécies do gênero Himatanthus, observou-se que, de uma forma geral, os usos mais comuns são como anti-inflamatório, antitumoral, antiúlcera gástrica e afecções de pele (Tabela 6), como relatados para H. drasticus.

TABELA 6
Usos populares do látex de outras espécies de Himatanthus.

Os raizeiros informaram que, no tratamento da úlcera gástrica com o látex de H. drasticus, há melhora dos sintomas (100%) e cura (90,5%). Segundo Colares et al. (2008a)COLARES, A.V. et al. Efeito gastroprotetor do látex de Himatanthus drasticus (Mart) Plumel (Janaguba). Infarma, v. 20, n. 11/12, 2008a., o látex previne a lesão gástrica causada por etanol e indometacina nos modelos experimentais mais comuns para avaliação da atividade antiulcerogênica.

Com relação ao emprego como anti-inflamatóriol, Lucetti et al. (2010)LUCETTI, D.L. et al. Anti-inflammatory effects and possible mechanism of action of lupeol acetate isolated from Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. Journal of Inflammation, v. 7, n. 60, p. 1-11, 2010. avaliaram a ação anti-inflamatória de uma fração orgânica obtida do látex de H. drasticus e concluíram que o referido efeito provavelmente envolve o sistema opioide, pois a fração teve sua ação completamente inibida pela naloxona (antagonista opioide). A participação do sistema opioide na ação da referida fração foi ainda confirmada pelo teste da placa quente, onde o seu efeito antinociceptivo foi, como no caso da morfina, também inibido pela naloxona (Lucetti et al., 2010LUCETTI, D.L. et al. Anti-inflammatory effects and possible mechanism of action of lupeol acetate isolated from Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. Journal of Inflammation, v. 7, n. 60, p. 1-11, 2010.).

H. drasticus tem uma longa história de emprego na cura do câncer no Nordeste brasileiro. A seguir, algumas transcrições de relatos dos raizeiros sobre a eficácia do látex contra o câncer: A esposa do meu tio e uma prima minha foram curadas com o uso do látex da janaguba (...), a esposa era portadora de CA no fígado e a minha prima, de leucemia (raizeiro A); Uma médica tinha três meses de vida e hoje tem 5 cinco anos de cura (raizeiro B); Conheço uma pessoa que tinha câncer na mama e ela se curou com dois litros do látex da janaguba (raizeiro C); A pessoa se curou com cinco litros tomado (raizeiro D). Estudo realizado por Mousinho et al. (2011)MOUSINHO, K.C. et al. Efeito antitumoral de proteínas laticíferos de Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel - Apocynaceae. Journal of Ethnopharmacology, v. 137, n. 1, p. 421-6, 2011. avaliou a atividade antitumoral das proteínas do látex usando dois modelos experimentais, Sarcoma 180 e carcinosarcoma de Walker 256, e demonstrou haver ação anticancerígena que pode estar associada com a as propriedades imunoestimulantes do látex.

O látex de várias espécies de Himatanthus possui substâncias de natureza triterpênica, tais como lupeol, α-amirina, β-amirina e seus derivados acetatos e cinamatos (Baratto, 2010BARATTO, L.C. Estudo químico e analitico e morfoanatômico de espécies medicinais brasileiras da família Apocynaceae: Himatanthus lancifolius. 2010. 157p. Dissertação (Mestrado em Ciências Farmacêuticas) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Farmacêuticas, Universidade Federal do Paraná, Curitiba.; Lima, 2005LIMA, V.B. Estudo fitoquímico de Himatanthus obovatus (Muell. Arg.) Woodson (Apocynaceae): isolamentos, elucidação estrutural e atividade biológica. 2005. 174p. Tese (Doutorado em Ciências) – Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas, Campinas.; Vanderlei et al., 1991VANDERLEI, M.F. et al. Iridoids and Triterpenes from Himatanthus phagedaenicus: The complete Assignement of the 1H and 13C NMR Spectra of Two Iridoid Glycosides. Journal of Brazilian Chemistry Society, v. 2, p. 51-58, 1991.; Silva et al., 1998SILVA, J.R.A. et al. Ésteres triterpênicos de Himatanthus sucuuba (Spruce) Woodson. Química Nova, v. 21, p. 702-704, 1998.; Miranda et al., 2000MIRANDA, A.L.P. et al. Anti-inflammatory and analgesic activities of the latex containing triterpenes from Himatanthus sucuuba. Planta Medica, v. 66, p. 284-286, 2000.). Lucetti et al. (2010)LUCETTI, D.L. et al. Anti-inflammatory effects and possible mechanism of action of lupeol acetate isolated from Himatanthus drasticus (Mart.) Plumel. Journal of Inflammation, v. 7, n. 60, p. 1-11, 2010. relatam a presença de acetato de lupeol no látex de H. drasticus; contudo, praticamente não há dados na literatura sobre a composição química do látex desta espécie.

O lupeol, em trabalho de revisão publicado por Saleem (2009)SALEEM, M. Lupeol, a novel anti-inflammatory and anti-cancer dietary triterpene. Cancer Letters, v. 285, n. 2, p. 109-15, 2009., exibe ações benéficas contra inflamação, câncer, diabetes, desordens cardíacas, toxicidade renal e hepática. Misturas de α e β-amirinas, por sua vez, têm demonstrado relevante atividade anti-inflamatória, gastroproterora, antipruriginosa, hepatoprotetora e analgésica (Vázquez et al., 2012VÁZQUEZ, L.H.; PALAZON, J.; NAVARRO-OCANÃ, A. The pentacyclic triterpenes, α and β-amyrins: a review of sources and biological activities, phytochemicals. A Global Perspective of Their Role in Nutrition and Health, v. 23, p. 487-502, 2012.). As atividades apresentadas por estes triterpenos justificariam os principais usos terapêuticos relatados para H. drasticus, incluindo tratamento de diabetes.

Não foram encontrados na literatura estudos farmacológicos referentes ao emprego do látex da planta e demais espécies do gênero Himatanthus, no tratamento de doenças endócrinas, do sistema circulatório e osteomuscular.

Através desta pesquisa, pode-se constatar que o látex de H. drasticus é indicado pelos raizeiros para tratamento de diversas patologias desde infecções de pele até o câncer. Pela consulta à literatura científica, constatou-se que as indicações referentes ao tratamento de inflamações, úlcera gástrica e câncer estão em concordância com os resultados de alguns estudos feitos com a espécie.

O saber popular, proveniente de gerações anteriores, deve ser conservado, sendo importante ressaltar que através deste estudo foi possível confirmar que os indivíduos com idade superior a 40 anos e nível de escolaridade mais baixo são os que detêm o conhecimento sobre esta espécie.

Assim, os levantamentos etnobotânicos e etnofarmacológicos exercem um papel primordial no resgate do conhecimento tradicional, nos meios rurais e urbanos, tanto por seu valor histórico-cultural, como também pela necessidade de confirmação das indicações de uso das plantas medicinais.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2015

Histórico

  • Recebido
    25 Jul 2014
  • Aceito
    09 Mar 2015
Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais Sociedade Brasileira de Plantas Medicinais, Revista Brasileira de Plantas Medicinais, Universidade Estadual de Maringá, Departamento de Farmácia, Bloco T22, Avenida Colombo, 5790, 87020-900 - Maringá - PR, Tel: +55-44-3011-4627 - Botucatu - SP - Brazil
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