Acessibilidade / Reportar erro

Prática de atividade física entre pacientes da Coorte Brasília de artrite reumatoide inicial

Resumos

INTRODUÇÃO: O Consenso 2012 da Sociedade Brasileira de Reumatologia para Tratamento da Artrite Reumatoide (AR) recomenda que os pacientes realizem exercícios físicos de forma regular. Não há estudos no Brasil sobre a prática de atividade física entre pacientes com AR inicial. OBJETIVO: Investigar a prática de atividade física entre pacientes com AR inicial e a possível relação entre atividade física, atividade da doença e incapacidade funcional. MÉTODOS: Estudo transversal incluindo pacientes da Coorte Brasília de AR inicial. Foram analisados dados demográficos (sexo, idade e escolaridade), prática de atividade física, índice de atividade da doença (Disease Activity Score 28 - DAS 28), incapacidade funcional (Health Assessment Questionnaire - HAQ), além de dados sobre tabagismo, etilismo, presença de comorbidades e tratamento da AR. RESULTADOS: Foram avaliados 72 pacientes, sendo 90,27% do sexo feminino, com média de idade de 50,2 ± 13,3 anos, média do DAS 28: 3,66 e a do HAQ: 0,69. Estavam regularmente ativos 43,05%, sendo que a caminhada foi o exercício mais praticado (80,64%). A média de tempo de exercício físico foi de 48,22 ± 27,18 min, periodicidade de 3,7 ± 1,64 vezes na semana. Não houve associação entre atividade física com sexo, idade, escolaridade, atividade da doença, incapacidade funcional, tabagismo ou etilismo, presença de comorbidades e tratamento com drogas modificadoras do curso da doença. CONCLUSÃO: Dada a importância da prática regular de atividade física, há necessidade de orientação dos pacientes, em especial quanto à prática de atividades resistidas, pouco frequente entre os pacientes do nosso estudo.

Artrite reumatoide; Atividade física; Exercícios físicos; Sedentarismo


INTRODUCTION: The 2012 Consensus of the Brazilian Society of Rheumatology (SBR) for the treatment of Rheumatoid Arthritis (RA) recommends that patients should regularly perform physical exercises. There have been no studies in Brazil on physical activity among patients with early RA. OBJECTIVE: To investigate the physical activity practice among patients with early RA and the possible association between physical activity, disease activity and functional disability. METHODS: Cross-sectional study of patients from the Brasilia cohort of early RA. Demographic data (sex, age and level of schooling), physical activity practice, Disease Activity Score 28 (DAS 28), functional disability (Health Assessment Questionnaire - HAQ), as well as data on smoking status, alcohol consumption, comorbidities and RA treatment were analyzed. RESULTS: A total of 72 patients were evaluated, 90.27% females, mean age 50.2 ± 13.3 years, mean DAS 28: 3.66 and HAQ: 0.69. Of them, 43.05% were regularly active, with walking being the most often practiced exercise (80.64%). The mean duration of exercise was 48.22 ± 27.18 min, with a frequency of 3.7 ± 1.64 times per week. There was no association between physical activity and gender, age, educational level, disease activity, functional disability, alcoholism or smoking, presence of comorbidities and treatment with drugs that alter the course of disease. CONCLUSION: Given the importance of regular physical activity practice, it is necessary to recommend it to patients, especially resistance physical activities, which are not frequent among the patients in our study.

Rheumatoid arthritis; Physical activity; Physical exercises; Sedentary life style


ARTIGO ORIGINAL

Prática de atividade física entre pacientes da Coorte Brasília de artrite reumatoide inicial

Carolina Rocha SilvaI,* * Autor para correspondência. E-mail: carolrocha_med@yahoo.com.br (C.R. Silva). ; Thaís Ferreira CostaI; Tatiane Teixeira Vaz de OliveiraII; Luciana Feitosa MunizIII; Licia Maria Henrique da MotaIV

IServiço de Residência em Reumatologia, Hospital Universitário de Brasília, Brasília, DF, Brasil

IIDepartamento de Fisioterapia, Universidade Estadual da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil

IIIServiço de Reumatologia, Hospital Universitário de Brasília, Brasília, DF, Brasil

IVPrograma de Pós-graduação em Ciências Médicas, Faculdade de Medicina, Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil

RESUMO

INTRODUÇÃO: O Consenso 2012 da Sociedade Brasileira de Reumatologia para Tratamento da Artrite Reumatoide (AR) recomenda que os pacientes realizem exercícios físicos de forma regular. Não há estudos no Brasil sobre a prática de atividade física entre pacientes com AR inicial.

OBJETIVO: Investigar a prática de atividade física entre pacientes com AR inicial e a possível relação entre atividade física, atividade da doença e incapacidade funcional.

MÉTODOS: Estudo transversal incluindo pacientes da Coorte Brasília de AR inicial. Foram analisados dados demográficos (sexo, idade e escolaridade), prática de atividade física, índice de atividade da doença (Disease Activity Score 28 - DAS 28), incapacidade funcional (Health Assessment Questionnaire - HAQ), além de dados sobre tabagismo, etilismo, presença de comorbidades e tratamento da AR.

RESULTADOS: Foram avaliados 72 pacientes, sendo 90,27% do sexo feminino, com média de idade de 50,2 ± 13,3 anos, média do DAS 28: 3,66 e a do HAQ: 0,69. Estavam regularmente ativos 43,05%, sendo que a caminhada foi o exercício mais praticado (80,64%). A média de tempo de exercício físico foi de 48,22 ± 27,18 min, periodicidade de 3,7 ± 1,64 vezes na semana. Não houve associação entre atividade física com sexo, idade, escolaridade, atividade da doença, incapacidade funcional, tabagismo ou etilismo, presença de comorbidades e tratamento com drogas modificadoras do curso da doença.

CONCLUSÃO: Dada a importância da prática regular de atividade física, há necessidade de orientação dos pacientes, em especial quanto à prática de atividades resistidas, pouco frequente entre os pacientes do nosso estudo.

Palavras-chave: Artrite reumatoide; Atividade física; Exercícios físicos; Sedentarismo

Introdução

A artrite reumatoide (AR) é uma doença sistêmica, crônica e inflamatória, que acomete preferencialmente a sinóvia das articulações periféricas, com grande impacto na qualidade de vida, nos aspectos social, econômico e psicológico.1 A denominação AR inicial compreende as primeiras semanas ou meses de sinais ou sintomas articulares (em geral, menos de 12 meses), destacando-se como período crítico as primeiras doze semanas de manifestações.2 Na última década, além do desenvolvimento de novas medicações e estratégias terapêuticas,3 a atividade física passou a ser um componente importante no tratamento.4

A maior parte dos programas de exercícios dinâmicos para pacientes com AR segue as recomendações do Americam College of Medicine Sports (ACMS).5 Recomenda-se para indivíduos saudáveis, inclusive para pacientes com AR que o exercício tenha duração de 20 minutos ou mais, que seja realizado no mínimo duas vezes por semana e leve a um aumento de 60% da frequência cardíaca prevista para a idade, para apresentar efeitos clínicos positivos e sem detrimento à doença, ou seja, sem piora da atividade da AR e sem causar dor.3 Quando comparado o exercício dinâmico ao programa de reabilitação articular convencional, observa-se melhora significativa da qualidade de vida dos pacientes com AR.6,7

Atividades aeróbicas como; caminhada, corrida, bicicleta, hidroginástica e natação possibilitam melhor condicionamento cardiovascular e podem auxiliar na prevenção da limitação relacionada à AR.8

Entre os pacientes com diagnóstico de AR, de acordo com Stenström et al., 20-30% têm capacidade aeróbica reduzida e consequente redução dos índices de força e massa muscular pela dor, fadiga e limitação funcional das articulações ocasionada pela doença.4 As limitações físicas apresentadas pelos pacientes com AR podem levar a uma redução na prática de exercícios e risco elevado de eventos cardiovasculares.9 Embora a prática de atividade física seja um importante fator no tratamento dos pacientes com AR, não há estudos brasileiros sobre a prevalência de atividade física entre pacientes com AR inicial.

O objetivo do presente estudo foi investigar o percentual de pacientes com AR inicial que praticam algum tipo de atividade física estruturada de forma regular, bem como determinar o tipo de atividade física mais praticada. Secundariamente, objetivou-se avaliar a possível associação entre a prática de atividade física e parâmetros demográficos (sexo, idade, nível de escolaridade), atividade da doença, incapacidade funcional, dados clínicos (tabagismo, etilismo, presença de comorbidades) e tratamento medicamentoso da AR, incluindo o uso de drogas modificadoras do curso da doença (DMCD) sintéticas e biológicas.

Pacientes e métodos

Foram avaliados pacientes da Coorte Brasília de AR Inicial,10,11 que é uma coorte incidente de pacientes com diagnóstico de AR inicial, acompanhada no ambulatório de Reumatologia do Hospital Universitário de Brasília, Universidade de Brasília. Para a inclusão nessa coorte, AR inicial é definida como a ocorrência de sintomas articulares compatíveis com dor e edema articular de padrão inflamatório, com ou sem rigidez matinal ou outras manifestações sugestivas de doença inflamatória articular, avaliadas por um único observador12,13 com duração superior a 6 semanas e inferior a 12 meses, independente de satisfazer os critérios do American College of Rheumatology (ACR).14 Todos os pacientes selecionados preenchiam restrospectivamente os critérios EULAR/ACR 2010.15

Os pacientes receberam o esquema terapêutico padrão utilizado no serviço, incluindo as DMCD sintéticas ou biológicas, de acordo com a necessidade. O estudo foi realizado no período de março a maio de 2012, com entrevista direta e revisão de prontuário. A cada paciente foi aplicado um questionário estruturado, obtendo-se informações sobre sexo, idade, anos de educação formal, prática de atividade física, índice de atividade da doença (Disease Activity Score 28 - DAS28),16 questionário de incapacidade funcional (Health Assessment Questionnaire - HAQ),17 hábitos de vida como tabagismo ou etilismo, presença de comorbidades e tratamento medicamentoso.

Para a identificação do tipo de exercício, regularidade e duração da atividade física, foi aplicado um questionário adaptado do estudo de Valkeinen et al., que consiste em três perguntas18:

1) Nos últimos seis meses, que tipo de exercício físico você faz regularmente, durante uma semana?

2) Com que frequência semanal você realiza este exercício mencionado previamente?

3) Qual a duração média, em minutos, de uma única sessão de exercício físico?

Os pacientes selecionados de forma consecutiva na Coorte participaram voluntariamente do estudo, após esclarecimentos sobre o teor da pesquisa e depois de assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília (CEP-FM 074/2005).

A análise estatística descritiva foi utilizada para avaliação das características gerais da população em estudo. Os testes t de Student ou Mann-Whitney foram usados para a análise das variáveis contínuas. Para avaliar a relação entre atividade física e escolaridade, tabagismo, etilismo, presença de comorbidades e tratamento foram utilizados os testes do qui-quadrado ou exato de Fischer quando apropriado. O nível de significância de 5% (P < 0,05) foi utilizado em todos os testes estatísticos.

Resultados

No período de março a maio de 2012 foram entrevistados no HUB 72 pacientes da Coorte Brasília de AR inicial, sendo 90,27% do sexo feminino (n = 65). A média de idade foi de 50,2 ± 13,3 anos, o período médio de acompanhamento (após o diagnóstico da AR) foi de 4,2 ± 2,7 anos, a média do DAS28 foi de 3,66 e a do HAQ foi de 0,69. As características gerais da população avaliada, com relação aos dados demográficos (sexo, idade e escolaridade), hábitos de vida como tabagismo e etilismo e tratamento medicamentoso estão descritas na tabela 1. A tabela 2 mostra as características comparativas entre o grupos fisicamente ativo e os sedentários com relação a atividade da doença, incapacidade funcional, comorbidades e o tratamento medicamentoso das drogas sintéticas e biológicas.

Do total de pacientes, 43,05% (31/72) estavam regularmente ativos, segundo a resposta ao questionário. Entre os pacientes que realizam exercícios regularmente, 25 indivíduos (80,64%) praticavam caminhadas, sendo essa a atividade física mais frequente neste estudo. A prática de outras modalidades de atividade física foi menos frequente, incluindo a de pilates (2/31-6,4%), a de hidroginástica (3/31- 9,6%) e a de ginástica localizada e de musculação (1/31- 3,22%) foram semelhantes.

No grupo fisicamente ativo, a média de tempo de exercício físico foi de 48,22 ± 27,18 minutos, com uma frequência de 3,7 ± 1,64 dias/semana. A média da idade no grupo que realiza exercício físico foi de 49,12 anos, a média do DAS 28 foi de 3,51 e a média do HAQ de 0,60.

Nos indivíduos sedentários, a média de idade foi de 51 anos, a média do DAS foi de 3,78 e a do HAQ de 0,75.

Não houve associação entre a prática de atividade física e dados demográficos (sexo, idade, classe social e escolaridade), tempo de acompanhamento (após o diagnóstico da AR), atividade da doença, incapacidade funcional e outros hábitos de vida, como tabagismo e etilismo (P > 0,05). Da mesma forma, não se observou diferença entre os grupos com relação à frequência de comorbidades, incluindo aquelas que pudessem influenciar a realização de exercícios, como hipertensão arterial, diabetes mellitus, osteoatrose e osteoporose. Entretanto, houve uma tendência a maior prática de atividade física entre os pacientes com fibromialgia (32% vs. 48%, P = 0,06). Também não houve associação entre a prática de atividade física e o tratamento medicamentoso (DMCD sintéticas e biológicas).

Discussão

A atividade física pode ser considerada um dos componentes de reabilitação no tratamento da AR inicial.3,4

Em nosso estudo, 43% dos pacientes da Coorte Brasília de AR Inicial pode ser definida como fisicamente ativa, porcentagem essa superior a observada em outros estudos envolvendo pacientes com AR19 ou até mesmo em levantamentos epidemiológicos realizados na população saudável.20,21

Em um estudo internacional de pacientes com diagnóstico de AR realizado no período de janeiro de 2005 a abril de 2007, em 28 cidades de 21 países com um total de 5235 pacientes, apenas 13,8% praticam atividade física mais de três vezes na semana.19 Nessa avaliação, segundo Sokka et al., mais de 80% dos indivíduos em sete países e entre 60% e 80% em outros 12 países não praticavam atividade física regular, demonstrando uma elevada prevalência de indivíduos sedentários, de forma diversa ao que encontramos em nossa população.

A prática de atividade física entre os pacientes de nossa Coorte também parece ser superior ao relatado na população saudável. O sedentarismo foi verificado num levantamento epidemiológico da prática de atividade física na cidade de São Paulo em que foram entrevistados mil indivíduos, e somente 31,3% dos entrevistados estavam engajados em algum tipo de atividade física.20

Dados do IBGE mostram que a prática de atividade física entre os brasileiros é variável de acordo com a faixa etária, região demográfica e o nível socioeconômico da população.21 Em 2008, o convênio firmado entre o IBGE e o Ministério da Saúde, abordado pela PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), realizou um levantamento suplementar de saúde. Essa avaliação consistiu em 163 questões, de diversos aspectos, entre os quais a prática de atividade física foi analisada em indivíduos maiores que 14 anos e nos seguintes domínios: deslocamento para o trabalho, atividade laboral, realização de faxina no ambiente doméstico e atividades físicas no lazer. O número de indivíduos correspondeu a 142.533.480. A prevalência de indivíduos classificados como ativos no lazer foi exatamente a mesma daqueles considerados ativos no deslocamento, correspondendo a 10,5% da população. Aproximadamente um quinto da população (20,2%) relatou não praticar nenhuma atividade física no trabalho, lazer, deslocamento ou domicílio.21

Embora a metodologia utilizada na pesquisa do IBGE tenha sido diferente da empregada em nosso estudo, as diferenças entre os resultados sugerem que a população com AR inicial acompanhada em nossa Coorte seja fisicamente mais ativa do que a população brasileira como um todo, fato que possivelmente decorre da orientação médica repetida sobre a importância da prática de exercícios físicos para redução de morbimortalidade da doença.

A prática de atividade física na Coorte Brasília de AR inicial foi igualmente prevalente entre os dois sexos, resultado semelhante ao de Brodim et al. que também analisou pacientes com AR inicial.22 Entretanto, no estudo internacional em pacientes com AR realizado por Sokka et al.,19 o sexo feminino estava mais associado ao sedentarismo. Considerando a população brasileira em geral, os estudos de prevalência de atividade física nos indivíduos saudáveis demonstram que a prática de atividade física no deslocamento e no lazer é mais prevalente no sexo masculino, segundo os dados do IBGE.22

A idade média dos pacientes da Coorte Brasília que praticam atividade física foi de 49,2 anos, sendo um pouco inferior à media de idade do estudo de AR estabelecida realizado por Sokka et al. (média de idade de 57 anos)19 e do estudo de AR inicial realizado por Brodin et al. (média de idade de 55 anos).22

Segundos os dados do IBGE, os indivíduos com maior escolaridade tendem a praticar mais atividade física, observação essa que remete a um aspecto social e econômico, em que atividade física no lazer, por muitas vezes, encontra-se ligada a entidades privadas e classes sociais mais altas.21 Em nosso estudo, não observamos associação entre a prática de atividade física e a classificação social ou nível de escolaridade, o que pode ter sido decorrente do limitado número de indivíduos avaliados, sobretudo quando consideramos aqueles pertencentes aos estratos sociais mais elevados em nossa amostra.

De acordo com o Americam Heart Association (AHA), recomenda-se para a população geral saudável entre 18 e 65 anos de idade, a prática de no mínimo 30 minutos de atividade física moderada pelo menos cinco vezes na semana ou 20 minutos de atividade mais vigorosa pelo menos três vezes na semana ou combinação das duas modalidades.23 As recomendações da ACMS já foram citadas anteriormente e está indicada para a população saudável e para os pacientes com diagnóstico de AR. Em nosso estudo, no grupo fisicamente ativo, a média de tempo de exercício físico foi de 48,22 ± 27,18 minutos, com uma frequência de 3,7 ± 1,64 dias/semana.

Entre os pacientes da Coorte Brasília de AR inicial, a atividade física mais relatada foi a caminhada, dado semelhante ao observado no levantamento epidemiológico realizado pela VIGITEL (Vigilância e Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico),24 talvez pela praticidade e fácil exequibilidade dessa modalidade de atividade física. A caminhada é uma atividade aeróbica que pode proporcionar condicionamento físico e cardiovascular,25 entretanto, nos pacientes com AR e com inflamação ativa nas articulações de membros inferiores, ou com comorbidades como osteoartrite de joelhos, pode haver contraindicações relativas a essa prática.26 Assim, a prática de atividade física, incluindo a caminhada, deve ser orientada individualmente e de acordo com a condição física, atividade de doença e presença de comorbidades de cada paciente.26

Na nossa coorte não observamos associação significativa entre a prática de atividade física com atividade da doença (DAS-28) ou incapacidade funcional (HAQ), resultado semelhante ao estudo de Brodim et al. em pacientes com AR inicial. Entretanto, Hakkinen et al.27 observaram resultado diferente em um estudo randomizado prospectivo com 62 pacientes com diagnóstico de AR inicial.27 Nesse estudo, os pacientes foram divididos em dois grupos. Um grupo realizou treinamento de força com enfoque em todos os grupos musculares, com 50-70% de repetição máxima e o outro foi treinado somente para amplitude de movimento sem resistência muscular, com uma frequência de 2-3 vezes por semana. Foi observada uma melhora significativa no DAS-28 e no HAQ no grupo que foi submetido a um aumento da resistência muscular em relação ao grupo de amplitude de movimento.27

Segundo Ende et al.,28 o treinamento dinâmico intenso controlado é mais efetivo em aumentar a capacidade aeróbica, mobilidade articular e força muscular em pacientes com AR bem controlada, porém, na Coorte Brasília de AR inicial foi verificada uma baixa prevalência da prática de exercícios resistidos, incluindo musculação ou qualquer outra atividade de treino de força, como pilates (apenas três pacientes). Uma hipótese para explicar esse fato é o custo implicado na prática de exercícios resistidos (usualmente realizados em academias ou centros e estúdios privados) e a ausência de um programa de reabilitação formal no HUB, onde os pacientes poderiam ser orientados em relação aos exercícios de resistência muscular.

De uma forma geral, na AR, é possível obter capacidade aeróbica e força muscular sem efeitos negativos sobre o quadro de dor e atividade da doença.29 Em alguns estudos, também se observa melhora do quadro de força e mobilidade das articulações.30

Em nosso estudo, não evidenciamos associação entre os hábitos de tabagismo ou etilismo com a prática de atividade física, mas é importante ressaltar que a prevalência de tabagistas e etilistas em nossa coorte foi consideravelmente baixa.

O exercício físico está bem indicado para pacientes com aumento do risco cardiovascular, como hipertensos e diabéticos.31 Nos pacientes com AR e alguma destas comorbidades, a atividade física ganha maior importância, pois o risco cardiovascular pode ser ainda maior nesse subgrupo de pacientes. Entretanto, em nosso estudo, não observamos que os pacientes com diagnóstico de comorbidades (como hipertensão e diabetes mellitus) pratiquem mais atividade física.

A atividade física também é indicada em pacientes com outras doenças reumáticas como osteoartrite e osteoporose, visando, entre outros fatores, o fortalecimento muscular e a proteção articular.26 Por outro lado, estas condições podem dificultar a realização dos exercícios, pois determinadas atividades e modalidade podem acarretar dor articular nos pacientes com osteoartrite, e maior risco de fraturas, naqueles com osteoporose. No nosso estudo, não observamos influência dessas condições na realização de atividade física em pacientes com AR inicial. A tendência de maior prática de atividade física nos pacientes com fibromialgia pode ser consequência da maior orientação dada a estes pacientes, pois a atividade física tem papel importante no tratamento da fibromialgia.32

O tratamento medicamentoso na AR inicial tem grande importância em controlar o processo inflamatório presente nas articulações, com o objetivo de reduzir o quadro de dor, inflamação e consequente deformidades.33 Segundo Reid et al., o tratamento medicamentoso na AR com biológicos, quando associado com a atividade física proporciona melhor qualidade de vida para o paciente.33 No nosso estudo, não foi verificado associação entre a prática de atividade física com o tratamento medicamentoso (DMCD sintéticas e biológicas), o que pode ter sido decorrente do pequeno número de pacientes avaliados.

Nosso estudo apresenta algumas limitações: 1) esse foi um estudo descritivo transversal, ou seja, não viabiliza a hipotetização de relação de causa e efeito; 2) o estudo foi realizado em apenas um centro hospitalar; portanto, a generalização dos nossos resultados para a população geral de indivíduos com AR inicial deve ser feita com a devida cautela. Apesar das limitações metodológicas, no entanto, esse é o primeiro estudo sobre prática de atividade física entre pacientes com AR inicial, e os resultados observados podem embasar futuros estudos e intervenções na área.

Conclusão

Na Coorte Brasília de AR inicial, há maior prevalência de indivíduos sedentários em relação aos que praticam algum tipo de atividade física regular. Entretanto, comparativamente aos estudos internacionais e os dados do IBGE, a prevalência de atividade física nesse estudo foi considerada alta (43%); a prática de caminhada foi a atividade física mais frequente. Nesse estudo, não houve associação entre a prática de atividade física e atividade de doença e/ou incapacidade funcional.

Considerando os resultados observados, sugerimos que o incentivo à prática regular de atividade física por parte dos pacientes com diagnóstico de AR inicial (incluindo atividades resistidas) deva fazer parte dos cuidados de rotina do reumatologista, dentro das limitações e peculiaridades de cada caso, com a finalidade de reduzir a morbi-mortalidade cardiovascular e melhorar a qualidade de vida desses pacientes.

Agradecimentos

Agradecemos às residentes que nos ajudaram na coleta de dados: Meliane Cardoso e Gabriela Jardim.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Recebido em 30 de agosto de 2012

Aprovado em 18 de março de 2013

  • 1
    da Mota LMH, Cruz BA, Brenol CV, Pereira IA, Rezende-Fronza LS, Bertolo MB, et al. Consenso 2011 da Sociedade Brasileira de Reumatologia para o diagnóstico e avaliação inicial da artrite reumatoide. Rev Reumatol. 2011;51(3):207-19.
  • 2
    da Mota LM, Laurindo IMM, Santos-Neto LL. Artrite reumatoide inicial-conceitos. Rev Assoc Med Bras. 2010;56(2):227-9.
  • 3
    da Mota LMH, Cruz BA,Brenol CV, Pereira IA, Rezende-Fronza LS, Bertolo MB, et al. Consenso 2012 da Sociedade Brasileira de Reumatologia para o tratamento da artrite reumatoide. Rev Bras Reumatol. 2012;52(2):135-74.
  • 4
    Stenström CH, Minor MA. Evidence for the benefit of aerobic and strengthening exercise in rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2003;49(3):428-34.
  • 5
    Garber CE, Blissmer B, Deschenes MR, Franklin BA, Lamonte MJ, Lee IM, et al. American College of Sports Medicine. American College of Sports Medicine position stand. Quantity and quality of exercise for developing and maintaining cardiorespiratory, musculoskeletal, and neuromotor fitness in apparently healthy adults: guidance for prescribing exercise. Med Sci Sport Exerc. 2011;43(7):1334-59.
  • 6
    Baillet A, Payraud E, Niderprim V-A, Nissen MJ, Allenet B, François P, et al. A dynamic exercise program to improve patients disability in rheumatoid arthritis: a prospective randomized controlled trial. Rheumatology. 2009;48:410-5.
  • 7
    Munneke M, de Jong Z, Zwinderman AH, Ronday HK, van Schaardenburg D, Dijkmans BA, et al. Effect of a high-intensity weight-bearing exercise program on radiologic damage progression of the large joints in subgroups of patients with rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2005;53(3):410-7.
  • 8
    Viet Vieland TPM. Rehabilitation of people with rheumatoid arthritis. Best Pract Res Clin Rheumatol. 2003;17:847-61.
  • 9
    Solomon DH, Curhan GC, Rimm EB, Cannucio CC, Karlson EW. Cardiovascular risk factors in women with and without rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2004;59(12):3444-9.
  • 10
    da Mota LMH, Santos-Neto LL, Pereira IA, Burlingame R, Ménard HA, Laurindo IM. Autoantibodies in early rheumatoid arthritis: Brasília cohort: results of at three-year serial analysis. Rev Bras Reumatol. 2011;51(6):564-71.
  • 11
    da Mota LMH, dos Santos Neto LL, Burlingame R, Ménard HA, Laurindo IM. Laboratory characteristics of a cohort of patients with early rheumatoid arthritis. Rev Bras Reumatol. 2010;50(4):375-88.
  • 12
    da Mota LMH, Laurindo IM, dos Santos Neto LL. Prospective evaluation of the quality of life in a cohort of patients with early rheumatoid arthritis. Rev Bras Reumatol. 2010;50(3):249-61.
  • 13
    da Mota LMH, Laurindo IM, dos Santos Neto LL. Demographic and clinical characteristics of a cohort of patients with early rheumatoid arthritis. Rev Bras Reumato.l 2010;50(3):235-48.
  • 14
    Funovits J, Aletaha D, Bykerk V, Combe B, Dougados M, Emery P, et al. The 2010 American College of Rheumatoloy European League against arthritis: methodological report phase I. Ann Rheum Dis. 2010;69:1589-95.
  • 15
    Aletaha D, Neogi T, Silman AJ, Funovits J, Felson DT, Bingham III CO, et al. 2010 Rheumatoid arthritis classification criteria: an Americam College of Rheumatology/European League Against Rheumatism collaborative initiative. Ann Rheum Dis. 2010;69:1580-8.
  • 16
    Pinheiro GDRC. Instrumentos de medidas da atividade da Artrite Reumatoide - Por que e como empregá-los? Rev Bras Reumatol. 2007;47(5):362-5.
  • 17
    Corbacho MI, Dapueto JJ. Avaliação da capacidade funcional e da qualidade de vida de pacientes com artrite reumatoide. Rev Bras Reumatol. 2010;50(1):31-43.
  • 18
    Valkeinen H, Hakkinen A, Alen M, Hannonen P, Kukkonen-Harjula K, Hakkinen K. Physical fitness in postmenopausal women with fibromyalgia. Int Journal Sports Med. 2008;29(5):408-13.
  • 19
    Sokka T, Hakkinen A, Kautainen H, Maillefert JF, Toloza S, Hansen TM, et al. Physical inactivity in patients with rheumatoid arthritis: Data from twenty-one countries in a cross sectional international study. Arthritis Rheum. 2008;59(1):42-59.
  • 20
    Mello MT, Fernandez AC, Tukif S. Levantamento Epidemiológico da prática de atividade física na cidade de São Paulo. Rev Bras Med Esporte. 2000;6(4):119-24.
  • 21
    Knuth AG, Malta DC, Dumith SC, Pereira CA, Neto OLM, Temporão JG, et al. Prática de atividade física e sedentarismo em brasileiros: resultados da pesquisa nacional por amostra de domicílios (PNAD)-2008. Ciência e Saúde Coletiva 2011;16(9):3697-705.
  • 22
    Brodin N, Eurenius E, Jensen I, Nisell R, Opava CH. Coaching patients with early rheumatoid arthritis to healthy physical activity: a multicenter, randomized, controlled study. Arthritis Rheum. 2008;59(3):325-31.
  • 23
    Dumith SC. Atividade física no Brasil: uma revisão sistemática. Cad Saúde Pública. 2009;25(3):415-26.
  • 24
    Neto OLMD, Monteiro CA, Castro AM, Cruz DKA. Padrão de atividade física em adultos brasileiros: resultados de um inquérito por entrevista telefônica, 2006. Epidemiol Serv Saúde. 2009;18(1):7-16.
  • 25
    Matsudo SM, Matsudo VKR, Neto TLB. Atividade física e envelhecimento: aspectos epidemiológicos. Rev Bras Med. 2003;60(3):133-6.
  • 26
    Biasoli MC, Izola LNT. Aspectos gerais da reabilitação física entre pacientes com osteoartrose. Rev Bras Med 2003;60(3):133-36.
  • 27
    Hakkinen A, Sokka T, Kotaniemi A, Hannonen P. Randomized two-year study of the effects of dynamic strength training on muscle strength, disease activity, functional capacity, and bone mineral density in early rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum. 2001;44(3):515-22.
  • 28
    Ende CHVD, Hazes JM, Cessie SL, Mulder WJ, Belfor DG, Breedveld FC, et al. Comparison of high and low intensity training in well controlled rheumatoid arthritis. Results of a randomized clinical trial. Ann Rheum. 2005;53(1):48-55.
  • 29
    Eurenius E, Stenstrom CH. Physical activitity, physical fitness, and general health perception among individuals with rheumatoid arthritis. Arthritis Rheum 2005;53(1):48-55.
  • 30
    Hakkinen A, Sokka T, Kautiainen H, Kotaniemi A, Hannonen P. Sustained maintenance of exercise induced muscle strength and normal bone mineral density in patients with early rheumatoid arthritis: a 5 year follow up. Ann Rheum Dis. 2004;63:910-6.
  • 31
    Knuth AG, Bielemann RM, da Silva SG, Borges TT, Del Duca GF, Kremer MM, et al. Conhecimento de adultos sobre o papel da atividade física na prevenção e tratamento de diabetes e hipertensão: estudo de base populacional. Cad Saúde Pública. 2009;25(3):513-20.
  • 32
    Valim V. Benefícios dos exercícios físicos na fibromialgia. Rev Bras Reumatol. 2006;46(1):49-55.
  • 33
    Reid A, Brady A, Blake C, Mongey AB, Veale DJ, FitzGerald O, et al. Randomized controlled trial examining the effect of exercise in people with rheumatoid arthritis taking anti-TNF therapy medication. BMC Musculoskelet Disord. 2011;12(11):1-10.
  • *
    Autor para correspondência. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 2013
    • Data do Fascículo
      Out 2013

    Histórico

    • Recebido
      30 Ago 2012
    • Aceito
      18 Mar 2013
    Sociedade Brasileira de Reumatologia Av Brigadeiro Luiz Antonio, 2466 - Cj 93., 01402-000 São Paulo - SP, Tel./Fax: 55 11 3289 7165 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: sbre@terra.com.br