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Avaliação da relação entre síndrome pré-menstrual e dismenorreia primária em mulheres com fibromialgia

RESUMO

Objetivo

Investigar a presença de síndrome pré-menstrual (SPM), dismenorreia primária (DP) e depressão em mulheres com fibromialgia (FM) e mulheres saudáveis e determinar possíveis fatores relacionados com a SPM e a DP na FM.

Método

Este estudo foi feito com 98 pacientes do sexo feminino com diagnóstico de FM e 102 controles saudáveis pareados por idade e sexo. Todas as pacientes foram avaliadas à procura de síndrome pré-menstrual (SPM) e dismenorreia primária (DP). A síndrome pré-menstrual foi determinada pela presença de um ou mais sintomas afetivos ou somáticos nos cinco dias anteriores à menstruação. O diagnóstico de dismenorreia primária foi definido como a presença de dor abdominal ou lombar com duração mínima de dois dias durante o período menstrual. A dismenorreia foi avaliada pela escala visual analógica. A dismenorreia foi classificada pelo Sistema de Pontuação Multidimensional. A Escala de Depressão de Hamilton foi aplicada a todas as pacientes.

Resultados

A dismenorreia primária foi encontrada em 41% das pacientes com FM e 28% do grupo controle. Encontrou-se diferença estatisticamente significativa na DP entre os dois grupos (p = 0,03). A SPM foi detectada em 42% das pacientes com FM e 25% do grupo controle. Houve diferença estatisticamente significativa na SPM entre os dois grupos (p = 0,03).

Conclusão

Há um aumento na frequência de síndrome pré-menstrual e dismenorreia em pacientes com FM. Aquelas com escore de gravidade dos sintomas elevado e altas pontuações de depressão entre as pacientes com FM estão em risco de SPM e DP.

Palavras-chave:
Fibromialgia; Síndrome pré-menstrual; Dismenorreia primária; Depressão

ABSTRACT

Objective

In this study, we aimed to investigate the presence of premenstrual syndrome (PMS), primary dysmenorrhea (PD) and depression among women with fibromyalgia (FM) and healthy females and to determine possible factors related with PMS and PD in FM.

Method

The present study was conducted on 98 female patients diagnosed with FM and 102 age and sex-matched healthy controls. All patients were evaluated for premenstrual syndrome (PMS) and primary dysmenorrhea (PD). Premenstrual syndrome was assessed among the patients for the presence of one or more affective or somatic symptoms within the five days preceding menses. The diagnosis of primary dysmenorrhea was defined as having abdominal pain or lower back pain lasting at least two days during a menstrual period. Dysmenorrhea was assessed via visual analog scale. Dysmenorrhea was rated via Multidimensional Scoring System. The Hamilton depression scale was applied to all patients.

Results

Primary dysmenorrhea was established in 41% of FM patients and 28% of the control group. A statistically significant difference was found in PD between the two groups (p = 0.03). PMS was established in 42% of the FM patients and 25% of the control group. A statistically significant difference was found in PMS between the two groups (p = 0.03).

Conclusion

There is an increased frequency of premenstrual syndrome and dysmenorrhea in FM patients. The patients with high symptom severity scores and high depression scores among the FM patients are at risk of PMS and PD.

Keywords:
Fibromyalgia; Premenstrual syndrome; Primary dysmenorrhea; Depression

Introdução

A fibromialgia (FM) é uma condição caracterizada por dor musculoesquelética generalizada, tender points, fadiga e ausência de outra doença que explique todos esses sintomas.11 Arnold LM, Clauw DJ, Wohlreich MM, Wang F, Ahl J, Gaynor PJ, et al. Efficacy of duloxetine in patients with fibromyalgia: pooled analysis of 4 placebo-controlled clinical trials. Prim Care Companion J Clin Psychiatry. 2009;11:237–44. Trata-se de uma condição que afeta cerca de 5% da população mundial e é particularmente encontrada em mulheres.22 White KP, Harth M. Classification, epidemiology and natural history of fibromyalgia. Curr Pain Headache Rep. 2001;5:320–9. Além da dor generalizada, podem-se encontrar sintomas psicossomáticos, distúrbios do sono, disfunções cognitivas, queixas ginecológicas e disfunções sexuais na fibromialgia.33 Bigatti SM, Hernandez AM, Cronan TA, Rand KL. Sleep disturbances in fibromyalgia syndrome: relationship to pain and depression. Arthritis Rheum Arthritis Care Res. 2008;59:961–7.,44 Batmaz I, Sariyildiz MA, Dilek B, Inanir A, Demircan Z, Hatipoglu N, et al. Sexuality of men with fibromyalgia: what are the factors that cause sexual dysfunction? Rheumatol Int. 2013;33:1265–70.

A síndrome pré-menstrual (SPM), que ocorre repetidamente durante a fase lútea do ciclo menstrual, é caracterizada pela presença de sintomas físicos e afetivos que interferem nas atividades de vida diária.55 Johnson SR. Premenstrual syndrome, premenstrual dysphoric disorder, and beyond: a clinical primer for practitioners. Obstet Gynecol. 2004;104:845–59. Embora a sua etiologia seja desconhecida, a susceptibilidade genética, a sensibilidade às alterações hormonais e uma alteração nos processos cerebrais são considerados responsáveis.66 Halbreich U. The etiology, biology, and evolving pathology of premenstrual syndromes. Psychoneuroendocrinology. 2003;28:55–99.,77 Kendler KS, Karkowski LM, Corey LA, Neale MC. Longitudinal population-based twin study of retrospectively reported premenstrual symptoms and lifetime major depression. Am J Psychiatry. 1998;155:1234–40. Além disso, os hormônios sexuais são também conhecidos por modificar as atividades dos neurotransmissores centrais, como a serotonina e o ácido gama-aminobutírico (Gaba); por conseguinte, essas alterações podem estar envolvidas na patogênese subjacente da doença.88 Reame NE, Marshall JC, Kelch RP, Pulsatile LH. Secretion in women with premenstrual syndrome (PMS): evidence for normal neuroregulation of the menstrual cycle. Psychoneuroendocrinology. 1992;17:205–13.,99 Bäckström T, Andersson A, Andreé L, Birzniece V, Bixo M, Björn I, et al. Pathogenesis in menstrual cycle-linked CNS disorders. Ann N Y Acad Sci. 2003;1007:42–53.

Pode ocorrer dismenorreia primária (DP), que aumenta os níveis ou a sensibilidade às prostaglandinas, o que resulta em contração do miométrio, isquemia, sensibilidade nas fibrilas de dor e, por fim, em dor pélvica.1010 Tseng YF, Chen CH, Yang YH. Rose tea for relief of primary dysmenorrhea in adolescents: a randomized controlled trial in Taiwan. J Midwifery Women Health. 2005;50:e51.

A SPM e a DP são condições ginecológicas comuns em mulheres sexualmente ativas. Vários fatores psicológicos e um aumento na sensibilização central são os responsáveis pela etiopatogenia da SPM e da DP, como ocorre na fibromialgia.1111 Halbreich U, Borenstein J, Pearlstein T, Kahn LS. The prevalence, impairment, impact, and burden of premenstrual dysphoric disorder (PMS/PMDD). Psychoneuroendocrinology. 2003;28:1–23.

12 Yunus MB, Masi AT, Aldag JC. A controlled study of primary fibromyalgia syndrome: clinical features and association with other functional syndromes. J Rheumatol Suppl. 1989;19:62–71.

13 Bajaj P, Madsen H, Arendt-Nielsen L. A comparison of modality-specific somatosensory changes during menstruation in dysmenorrheic and nondysmenorrheic women. Clin J Pain. 2002;18:180–90.

14 Granot M, Yarnitsky D, Itskovitz-Eldor J, Granovsky Y, Peer E, Zimmmer EZ. Pain perception in women with dysmenorrhea. Obstet Gynecol. 2001;98:407–11.

15 Amital D, Herskovitz C, Fostick L, Silberman A, Doron Y, Zohar J, et al. The premenstrual syndromeand fibromyalgia – similarities and common features. Clin Rev Allergy Immunol. 2010;38:107–15.
-1616 Yunus MB. Fibromyalgia and overlapping disorders: the unifying concept of central sensitivity syndromes. Semin Arthritis Rheum. 2007;36:339–56.

Há diversos estudos na literatura que investigam uma possível relação entre a fibromialgia e a SPM e a DP.1515 Amital D, Herskovitz C, Fostick L, Silberman A, Doron Y, Zohar J, et al. The premenstrual syndromeand fibromyalgia – similarities and common features. Clin Rev Allergy Immunol. 2010;38:107–15.,1717 Soyupek F, Guney M, Kaplan O, Kumbul Doguc D. Is fibromyalgia syndrome common in the patients with primary dysmenorrhea? J Muskuloskeletal Pain. 2013;21:156–60. O objetivo deste estudo foi investigar a presença de SPM, DP e depressão entre mulheres com FM e mulheres saudáveis, além de determinar possíveis fatores relacionados com a SPM e a DP na FM.

Material e métodos

Este estudo foi feito em 98 pacientes do sexo feminino com diagnóstico de FM e 102 controles saudáveis pareados por idade e sexo. O desenho do estudo foi um caso-controle prospectivo. O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição. O estudo incluiu pacientes do sexo feminino, entre 20 e 45 anos, com períodos menstruais regulares. Foram excluídas gestantes ou mulheres na menopausa, pacientes com uma condição psiquiátrica ou ginecológica conhecida ou cirurgia prévia e mulheres com doença que impedisse a comunicação (atraso intelectual), que estivessem usando contraceptivos orais e que tivessem uma doença sistêmica grave. Foi coletada uma história clínica detalhada e foi feito um exame físico em todas as pacientes. Registraram-se dados demográficos, hábitos, medicamentos usados, antecedentes ginecológicos (idade da menarca, duração do ciclo menstrual, duração e quantidade da menstruação e paridade) de todas as pacientes. Os exames físicos e as investigações foram feitos durante os três primeiros dias da menstruação.

Diagnóstico da fibromialgia

O diagnóstico de FM foi baseado nos critérios diagnósticos do American College of Rheumatology (ACR) de 2010 (2010 ACR FDC). O escore de gravidade dos sintomas das pacientes foi registrado com base nos critérios de 2010 do ACR.1818 Wolfe F, Clauw DJ, Fitzcharles MA, Goldenberg DL, Katz RS, Mease P, et al. The American College of Rheumatology preliminary diagnostic criteria for fibromyalgia and measurement of symptoms severity. Arthritis Care Res. 2010;62:600–10. O exame dos tender points (18 no total) foi feito por meio da palpação, de acordo com os critérios de 1990 do ACR.1919 Wolfe F, Smythe HA, Yunus MB, Bennett RM, Bombardier C, Goldenberg DL, et al. The American College of Rheumatology 1990 criteria for the classification of fibromyalgia: Report of the multicenter criteria committee. Arthritis Rheum. 1990;33:160–72. A palpação digital foi feita com uma força aproximada de 4 kg. Foi registrada a contagem de tender points. Foram incluídas no estudo pacientes diagnosticadas com FM havia pelo menos seis meses.

Avaliação da síndrome pré-menstrual

A síndrome pré-menstrual foi determinada pela presença de um ou mais sintomas afetivos (como isolamento social, confusão mental, ansiedade, irritabilidade, explosões de raiva ou depressão) ou somáticos (como inchaço dos membros, cefaleia, inchaço abdominal ou mastalgia) nos cinco dias que antecedem a menstruação. Também foi avaliado se os sintomas retornaram entre os dias 4 e 13 do ciclo e levaram a prejuízo nas atividades de vida diária. Os sintomas foram confirmados de acordo com a classificação prospectiva dos sintomas em dois ciclos. Também foram investigadas outras doenças subjacentes, a fim de evitar erros diagnósticos.2020 American College of Obstetrics and Gynecology. In: ACOG practice bulletin: premenstrual syndrome. Washington: ACOG; April 2000. p. 15.,2121 Ellen W, Freeman, Mary D, Sammel, Hui Lin, Rickels K, Sondheimer SJ. Clinical subtypes of premenstrual syndrome and responses to sertraline treatment. Obstet Gynecol. 2011;118:1293–300.

Diagnóstico de dismenorreia primária

Examinou-se a presença de dismenorreia em todas as pacientes. Determinou-se o diagnóstico de dismenorreia primária pela presença de dor abdominal ou lombar com duração mínima de dois dias durante um período menstrual. As pacientes com dismenorreia durante seis meses foram consideradas positivas. A dismenorreia foi avaliada pela Escala Visual Analógica (EVA). E também por meio do Sistema de Pontuação Multidimensional, previamente desenvolvido por Andersch e Milsom,2222 Andersch B, Milsom I. An epidemiological study of young women with dysmenorrhea. Am J Obstet Gynecol. 1982;144:655–60. que foi usado para avaliar a intensidade da dor entre as pacientes. Com base nesse sistema, os níveis de dor são definidos de acordo com os critérios listados a seguir:

  1. Dismenorreia leve: menstruação dolorosa que não limita nem dificulta as atividades de vida diária normais e que resulta em pouco ou nenhum sintoma sistêmico e/ou não exige analgésicos.

  2. Dismenorreia moderada: menstruação dolorosa que limita ou dificulta ligeiramente as atividades de vida diária normais e que resulta em sintomas sistêmicos moderados e/ou necessidade moderada de analgésicos.

  3. Dismenorreia grave: menstruação dolorosa que limita gravemente ou impede as atividades de vida diária normais e que resulta em sintomas evidentes (como desmaios, vômitos etc.) e que respondem mal aos analgésicos.

Depressão

A Escala de Depressão de Hamilton foi aplicada em todas as pacientes. A Escala de Depressão de Hamilton (EDH), desenvolvida por Hamilton et al.,2323 Hamilton M. The assessment of anxiety states byrating. Br J Med Psychol. 1959;32:505. avalia o nível de depressão do paciente. Akdemir et al.2424 Akdemir A, Turkcapar MH, Orsel SD, Demirergi N, Dag I, Ozbay MH. Reliability and validity of the Turkish version of the Hamilton Depression Rating Scale. Compr Psychiatry. 2001;42:1615. fizeram previamente o estudo da validade e confiabilidade da versão turca da EDH. A EDH inclui 17 perguntas e a pontuação mais alta que pode ser obtida é 53. Nessa escala, uma pontuação de 7 ou menos é indicativa da ausência de quaisquer sinais relacionados com a depressão; uma pontuação entre 8 e 16 é indicativa de depressão leve ou moderada; e uma pontuação de 17 ou acima é indicativa de depressão grave.

Análise estatística

Os dados foram expressos como a média ± desvio padrão. Os dados paramétricos das pacientes foram comparados por meio do teste t, enquanto os dados não paramétricos foram comparados pelo teste de qui-quadrado. Um valor de p ≤ 0,05 foi considerado estatisticamente significativo.

Resultados

A média de idade das pacientes incluídas no estudo foi de 35,9 ± 5,2 anos, versus 36,01 ± 4,8 no grupo controle. Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre os grupos em termos de idade, IMC, atividades habituais, nível de escolaridade, estado civil, situação ocupacional e exercícios físicos (p > 0,05) (tabela 1). Tinham história de tabagismo 49% das pacientes com FM e 51% do grupo controle. Nenhuma das participantes de qualquer grupo era alcoólica. A duração da FM foi de 12 ± 3,2 meses. A pontuação média na EDH foi de 16,1 ± 7,12 em pacientes com FM, em comparação com 8,2 ± 3,9 no grupo controle, o que indica uma diferença estatisticamente significativa (p < 0,05). A contagem dos tender points foi de 13,15 ± 2,2 nas pacientes com FM, em comparação com 3,57 ± 1,6 no grupo controle. Essa diferença foi estatisticamente significativa (p < 0,05). No entanto, não houve diferença significativa entre os dois grupos em termos de volume menstrual, duração da menstruação, método de parto, paridade e idade da menarca (p > 0,05) (tabela 2).

Tabela 1
Dados demográficos, número de tender points e presença de depressão em ambos os grupos
Tabela 2
Presença de dismenorreia, síndrome pré‐menstrual e antecedentes ginecológicos em ambos os grupos

Das pacientes com FM, 41% foram diagnosticadas com DP, que foi classificada como leve em 18 (45%) pacientes, moderada em 19 (47%) pacientes e grave em três (8%) pacientes. A DP foi encontrada em 28% dos controles; foi classificada como leve em 15 (52%) pacientes, moderada em 10 (34%) pacientes e grave em quatro (14%) pacientes do grupo controle. Foi encontrada diferença estatisticamente significativa na DP entre os dois grupos (p = 0,03). O valor do VAS para a dismenorreia foi de 7,2 ± 2,3 no grupo FM, em comparação com 5,1 ± 2,8 no grupo controle, o que levou a uma diferença estatisticamente significativa (p < 0,05) (tabela 3).

Tabela 3
Presença ou ausência de dismenorreia primária nas pacientes com fibromialgia

Entre as pacientes com FM e controles saudáveis, a SPM foi encontrada em 42% e 25%, respectivamente. Detectou-se uma diferença estatisticamente significativa na SPM entre os dois grupos (p = 0,03). O grupo com FM foi dividido em dois grupos de acordo com a presença de DP e SPM. A pontuação da gravidade dos sintomas no grupo FM e DP (+) foi de 8,7 ± 2,2, em comparação com 4,5 ± 1,8 no grupo FM e DP (-). A contagem dos tender points foi de 14,8 ± 3,5 no grupo FM e DP (+), em comparação com 11,8 ± 2,4 no grupo DP (-). O escore de depressão de Hamilton foi de 19,0 ± 4,5 no grupo FM e DP (+), em comparação com 14 ± 3,5 no grupo DP (-). Foi encontrada diferença estatisticamente significativa na pontuação de gravidade dos sintomas, contagem de tender points e escore de depressão de Hamilton entre os dois grupos, ao passo que não houve diferença estatisticamente significativa em termos de idade, IMC, tabagismo e tempo de diagnóstico de FM (tabela 3).

A pontuação da gravidade dos sintomas do grupo FM e SPM (+) foi de 9,9 ± 5,2, em comparação com 5,2 ± 2,3 no grupo FM e SPM (-). A contagem dos tender points foi de 13,6 ± 3,6 no grupo FM e SPM (+), em comparação com 12,7 ± 4,3 no grupo SPM (-). O escore de depressão de Hamilton foi de 19 ± 7,4 no grupo FM e SPM (+), em comparação com 12,9 ± 4,3 no grupo SPM (-). Foi encontrada diferença estatisticamente significativa no escore de gravidade dos sintomas e escore de depressão de Hamilton entre os dois grupos, ao passo que não houve diferença estatisticamente significativa na contagem de tender points, idade, IMC, tabagismo e tempo de diagnóstico de FM (tabela 4).

Tabela 4
Presença ou ausência de síndrome pré‐menstrual em pacientes com fibromialgia

Discussão

Neste estudo, a SPM e a DP foram significativamente mais frequentes nas pacientes com FM em comparação com o grupo controle. As pontuações na EDH também foram significativamente mais elevadas nas pacientes com FM em comparação com o grupo controle. Entre as pacientes com FM, a pontuação na EDH e os escores de gravidade dos sintomas foram significativamente mais elevados nas pacientes diagnosticadas com DP e SPM em comparação com aquelas sem esses diagnósticos. Foi encontrada presença de SPM em 42% das pacientes com FM. Na literatura, relata-se que 15% a 20% das mulheres em idade fértil têm SPM.2525 Lete I, Duenas JL, Serrano I, Doval JL, Martinez-salmean J, Coll C, et al. Attitudes of Spanish women toward premenstrual symptoms, premenstrual syndrome, and premenstrula dysphoric disorder: results of a nationwide survey. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2011;159:115–8. Além disso, a SPM é uma condição avaliada no âmbito das síndromes de sensibilidade centrais.2626 Yunus MB. Central sensitivity syndromes: a new paradigm and group nosology for fibromyalgia and overlapping conditions, and the related issue of disease versus illness. Semin Arthritis Rheum. 2008;37:339–52. Chae e Younbyoung et al.2727 Chae, Younbyoung, Kim, Hee-Young, Lee, Hwa-Jin Park, et al. The alteration of pain sensitivity at disease-specific acupuncture points in premenstrual syndrome. Journal of Physiological Sciences. 2000;57:115–9.encontraram uma redução no limiar de dor à pressão nos pontos de acupuntura em mulheres com altos escores de gravidade dos sintomas na síndrome pré-menstrual, em comparação com aquelas com baixos escores. Amital et al.1515 Amital D, Herskovitz C, Fostick L, Silberman A, Doron Y, Zohar J, et al. The premenstrual syndromeand fibromyalgia – similarities and common features. Clin Rev Allergy Immunol. 2010;38:107–15.investigaram as semelhanças entre o transtorno disfórico pré-menstrual e a síndrome de FM e encontraram níveis mais elevados de tender points e maiores taxas de comorbidades psiquiátricas em pacientes com SPM. Cinco das 30 pacientes com transtorno disfórico pré-menstrual foram diagnosticadas com FM. Os escores de depressão foram significativamente mais elevados nas pacientes com FM com SPM, em comparação com aquelas sem SPM. Além disso, foi observada contagem de tender pointsmais elevada no grupo com FM e SPM em comparação com aquelas sem SPM; no entanto, não foi encontrada diferença estatisticamente significativa. Yunus analisou dois estudos e indicou uma prevalência de dismenorreia primária de 48% em 103 pacientes com FMS desses dois estudos.1212 Yunus MB, Masi AT, Aldag JC. A controlled study of primary fibromyalgia syndrome: clinical features and association with other functional syndromes. J Rheumatol Suppl. 1989;19:62–71.,2828 Choudhury AK, Yunus MB, Haq SA, Alam MN, Sebrina F, Aldag JC. Clinical features of fibromyalgia in a Bangladeshi population. J Muskuloske Pain. 2001;9:25–33. No presente estudo, a dismenorreia pré-menstrual primária foi encontrada em 41% das pacientes com FM. Há hipersensibilidade central a estímulos nocivos e não nocivos na FM.1818 Wolfe F, Clauw DJ, Fitzcharles MA, Goldenberg DL, Katz RS, Mease P, et al. The American College of Rheumatology preliminary diagnostic criteria for fibromyalgia and measurement of symptoms severity. Arthritis Care Res. 2010;62:600–10. Na dismenorreia primária, foi demonstrada hiperalgesia durante o ciclo menstrual – especialmente nos tecidos profundos – como evidência da presença de sensibilização central.1313 Bajaj P, Madsen H, Arendt-Nielsen L. A comparison of modality-specific somatosensory changes during menstruation in dysmenorrheic and nondysmenorrheic women. Clin J Pain. 2002;18:180–90.,2929 Giamberardino MA, Berkley KJ, Iezzi S, De Bigontina P, Vecchiet L. Pain threshold variations in somatic wall tissues as a function of menstrual cycle, segmental site and tissue depth in non-dysmenorrheic women, dysmenorrheic women and men. Pain. 1997;71:187–97. Fizeram-se vários testes sensitivos quantitativos para avaliar a presença de sensibilização central em mulheres com dismenorreia primária. Nesses estudos, avaliou-se a sensibilidade dolorosa a vários estímulos em diferentes fases do ciclo menstrual em mulheres com e sem dismenorreia. O limiar de dor à pressão,1313 Bajaj P, Madsen H, Arendt-Nielsen L. A comparison of modality-specific somatosensory changes during menstruation in dysmenorrheic and nondysmenorrheic women. Clin J Pain. 2002;18:180–90. calor1414 Granot M, Yarnitsky D, Itskovitz-Eldor J, Granovsky Y, Peer E, Zimmmer EZ. Pain perception in women with dysmenorrhea. Obstet Gynecol. 2001;98:407–11. e eletricidade1515 Amital D, Herskovitz C, Fostick L, Silberman A, Doron Y, Zohar J, et al. The premenstrual syndromeand fibromyalgia – similarities and common features. Clin Rev Allergy Immunol. 2010;38:107–15. estava reduzido no abdome, nas costas e nos membros na fase menstrual em pacientes dismenorreicas, enquanto aumentava ao frio. Em um estudo, o aumento na amplitude de laser de CO2 evocou um potencial cerebral nesses pacientes.1414 Granot M, Yarnitsky D, Itskovitz-Eldor J, Granovsky Y, Peer E, Zimmmer EZ. Pain perception in women with dysmenorrhea. Obstet Gynecol. 2001;98:407–11. No estudo de Soyupek et al.,1717 Soyupek F, Guney M, Kaplan O, Kumbul Doguc D. Is fibromyalgia syndrome common in the patients with primary dysmenorrhea? J Muskuloskeletal Pain. 2013;21:156–60. a frequência de FM na dismenorreia primária foi de 15,6%. Os autores observaram que os sintomas somáticos e os escores de gravidade dos sintomas foram maiores nas pacientes com dismenorreia primária e FM em comparação com as pacientes com DP sem FM. Do mesmo modo que o encontrado neste estudo, os escores de gravidade dos sintomas e pontuações de depressão foram maiores nas pacientes com DP e FM em comparação com aquelas sem DP. No presente estudo, o achado de taxas significativamente mais elevadas de DP e SPM e maiores escores de depressão no grupo FM do que no grupo controle apoia a hipótese de que essas condições podem ter alguns pontos comuns em sua etiopatogenia. Neste estudo, o escore de depressão foi estatisticamente maior no grupo FM em comparação com o grupo controle. A FM comórbida foi encontrada em muitas condições psiquiátricas, como a depressão, o transtorno do pânico, a ansiedade e o transtorno de estresse pós-traumático. Embora a relação entre a depressão e a FM não seja perfeitamente compreendida, acredita-se que a dor crônica possa causar a depressão e também que as síndromes de dor crônica possam ser variantes de depressão.3030 Buskila D, Cohen H. Comorbidity of fibromyalgia and psychiatric disorders Curr Pain Headache Rep. 2007;11:333–8. A relação entre a dor e a depressão é altamente complexa e está associada a diversos fatores. O modo de estímulo, o sexo, o estado emocional e os medicamentos usados estão envolvidos nessa interação.3131 Giesecke T, Gracely RH, Masilo AB, Grant A, Nachemson, Petzke F, Williams DA, et al. Evidence of augmented central pain processing in idiopathic chronic low back pain arthritis rheum. 2004;50:613–23. No presente estudo, a pontuação de depressão e os escores de gravidade dos sintomas foram maiores no grupo com síndrome pré-menstrual e dismenorreia entre as pacientes com FM. Como a coexistência de outras condições dolorosas com a FM pode aumentar os escores de depressão, a ocorrência de outros sintomas também pode ser decorrente do aumento na sensibilização central nas pacientes com escores de gravidade de sintomas elevados. São necessários mais estudos bem desenhados que envolvam esse assunto. Os estudos demonstraram que estímulos sensoriais que causam dor foram menores nas pacientes deprimidas em comparação com o grupo controle.3232 Dickens C, McGowan L, Dale S. Impact of depression on experimental pain perception: a systematic review of the literature with meta-analysis. Psychosom Med. 2003;65:369–75. Os maiores escores de depressão e também as pontuações mais elevadas na EVA, especialmente em pacientes com FM, sugeriram que poderia haver uma redução no limiar de dor nesse grupo de pacientes.

Este estudo se limita por seu desenho transversal, com uma amostra limitada de pacientes. Não foi investigado se as doenças analisadas no estudo estavam presentes antes do diagnóstico de FM.

Conclusão

Há um aumento na frequência de síndrome pré-menstrual e dismenorreia em pacientes com FM. As pacientes com elevação nos escores de gravidade dos sintomas e pontuação de depressão entre as pacientes com FM estão em risco de SPM e DP. Consequentemente, isso sugere que podem existir mecanismos etiopatológicos comuns entre essas condições clínicas. No entanto, são necessários mais estudos de larga escala para confirmar esses achados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    13 Out 2014
  • Aceito
    24 Dez 2014
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