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Comparação entre técnicas de higiene brônquica em pacientes mecanicamente ventilados: ensaio clínico randomizado

RESUMO

Objetivo:

Comparar a eficiência das técnicas de vibrocompressão e hiperinsuflação com ventilador mecânico de forma isolada e a associação das duas técnicas (hiperinsuflação com ventilador mecânico + vibrocompressão), na quantidade de secreção aspirada e na alteração de parâmetros hemodinâmicos e pulmonares.

Métodos:

Ensaio clínico randomizado com pacientes críticos em ventilação mecânica, realizado na unidade de terapia intensiva de um hospital universitário. Os pacientes foram randomizados para receber uma das técnicas de higiene brônquica por 10 minutos (vibrocompressão, ou hiperinsuflação com ventilador mecânico, ou hiperinsuflação com ventilador mecânico + vibrocompressão). Após, foram novamente randomizados para receber inicialmente a técnica (previamente randomizada) ou apenas a aspiração isolada. Foram analisados o peso de secreção aspirada (em gramas), dados de mecânica ventilatória e cardiopulmonares, antes e após a aplicação das técnicas. A frequência de reintubação traqueal, o tempo de ventilação mecânica e a mortalidade, também foram avaliados.

Resultados:

Foram incluídos 93 pacientes (29 vibrocompressão, 32 hiperinsuflação com ventilador mecânico e 32 hiperinsuflação com ventilador mecânico + vibrocompressão) em ventilação mecânica por mais de 24 horas. O grupo hiperinsuflação com ventilador mecânico + vibrocompressão foi o único que apresentou aumento significativo da secreção aspirada, quando comparado a aspiração isolada 0,7g (0,1 - 2,5g) versus 0,2g (0,0 - 0,6g), com valor de p = 0,006.

Conclusão:

Quando comparada à aspiração isolada, a associação das técnicas hiperinsuflação com ventilador mecânico + vibrocompressão foi mais eficiente na quantidade de secreção aspirada.

Descritores:
Modalidades de fisioterapia; Insuflação; Ventiladores mecânicos; Lavagem broncoalveolar; Aspiração respiratória

ABSTRACT

Objective:

To compare the effects of vibrocompression and hyperinflation with mechanical ventilator techniques alone and in combination (hyperinflation with mechanical ventilator + vibrocompression) on the amount of aspirated secretion and the change in hemodynamic and pulmonary parameters.

Methods:

A randomized clinical trial with critically ill patients on mechanical ventilation conducted in the intensive care unit of a university hospital. The patients were randomly allocated to receive one of the bronchial hygiene techniques for 10 minutes (vibrocompression or hyperinflation with mechanical ventilator or hyperinflation with mechanical ventilator + vibrocompression). Afterwards, the patients were again randomly allocated to receive either the previous randomly allocated technique or only tracheal aspiration. The weight of aspirated secretions (in grams), ventilatory mechanics and cardiopulmonary data before and after the application of the techniques were analyzed. The tracheal reintubation frequency and time and mortality on mechanical ventilation were also evaluated.

Results:

A total of 93 patients (29 vibrocompression, 32 hyperinflation with mechanical ventilator and 32 hyperinflation with mechanical ventilator + vibrocompression) on mechanical ventilation for more than 24 hours were included. The hyperinflation with mechanical ventilator + vibrocompression group was the only one that presented a significant increase in aspirated secretions compared to tracheal aspiration alone [0.7g (0.1 - 2.5g) versus 0.2g (0.0 - 0.6g), p value = 0.006].

Conclusion:

Compared to tracheal aspiration alone, the combination of hyperinflation with mechanical ventilator + vibrocompression techniques was most efficient for increasing the amount of aspirated secretions.

Keywords:
Physical therapy modalities; Insufflation; Ventilators, mechanical; Hygiene; Bronchoalveolar lavage; Respiratory aspiration

INTRODUÇÃO

Os pacientes internados nas unidades de terapia intensiva (UTIs) apresentam alterações na depuração e na produção de secreção pulmonar, com modificação no transporte mucociliar e hipersecreção brônquica. A hipersecretividade se dá pela ação de mediadores inflamatórios e pelo aumento do número e da excreção de glândulas mucosas(11 Nakagawa NK, Franchini ML, Driusso P, de Oliveira LR, Saldiva PH, Lorenzi-Filho G. Mucociliary clearance is impaired in acutely ill patients. Chest. 2005;128(4):2772-7.

2 Savian C, Paratz J, Davies A. Comparison of the effectiveness of manual and ventilator hyperinflation at different levels of positive end-expiratory pressure in artificially ventilated and intubated intensive care patients. Heart Lung. 2006;35(5):334-41.

3 Rittayamai N, Katsios CM, Beloncle F, Friedrich JO, Mancebo J, Brochard L. Pressure-controlled vs volume-controlled ventilation in acute respiratory failure: a physiology-based narrative and systematic review. Chest. 2015;148(2):340-55.
-44 Moreira FC, Teixeira C, Savi A, Xavier R. Changes in respiratory mechanics during respiratory physiotherapy in mechanically ventilated patients. Rev Bras Ter Intensiva. 2015;27(2):155-60.) Já a alteração no transporte mucociliar pode ocorrer por presença do tubo orotraqueal, períodos de hipoxemia, desidratação, umidificação inadequada do ar ventilado e imobilidade no leito - situações estas comuns aos pacientes críticos em ventilação mecânica (VM).(22 Savian C, Paratz J, Davies A. Comparison of the effectiveness of manual and ventilator hyperinflation at different levels of positive end-expiratory pressure in artificially ventilated and intubated intensive care patients. Heart Lung. 2006;35(5):334-41.,55 Naue WS, Forgiarini Junior LA, Dias AS, Vieira SR. Chest compression with a higher level of pressure support ventilation: effects on secretion removal, hemodynamics, and respiratory mechanics in patients on mechanical ventilation. J Bras Pneumol. 2014;40(1):55-60.)

A VM visa reduzir o trabalho ventilatório e manter as trocas gasosas,(33 Rittayamai N, Katsios CM, Beloncle F, Friedrich JO, Mancebo J, Brochard L. Pressure-controlled vs volume-controlled ventilation in acute respiratory failure: a physiology-based narrative and systematic review. Chest. 2015;148(2):340-55.,44 Moreira FC, Teixeira C, Savi A, Xavier R. Changes in respiratory mechanics during respiratory physiotherapy in mechanically ventilated patients. Rev Bras Ter Intensiva. 2015;27(2):155-60.) porém gera também efeitos deletérios sobre o transporte mucociliar e a capacidade de tosse.(11 Nakagawa NK, Franchini ML, Driusso P, de Oliveira LR, Saldiva PH, Lorenzi-Filho G. Mucociliary clearance is impaired in acutely ill patients. Chest. 2005;128(4):2772-7.,22 Savian C, Paratz J, Davies A. Comparison of the effectiveness of manual and ventilator hyperinflation at different levels of positive end-expiratory pressure in artificially ventilated and intubated intensive care patients. Heart Lung. 2006;35(5):334-41.) Estes efeitos provocam estase de secreções nas vias aéreas e obstrução brônquica,(33 Rittayamai N, Katsios CM, Beloncle F, Friedrich JO, Mancebo J, Brochard L. Pressure-controlled vs volume-controlled ventilation in acute respiratory failure: a physiology-based narrative and systematic review. Chest. 2015;148(2):340-55.,55 Naue WS, Forgiarini Junior LA, Dias AS, Vieira SR. Chest compression with a higher level of pressure support ventilation: effects on secretion removal, hemodynamics, and respiratory mechanics in patients on mechanical ventilation. J Bras Pneumol. 2014;40(1):55-60.) com hipoventilação, formação de atelectasias e consequente hipoxemia. Este conjunto de fatores favorece ainda a multiplicação de microrganismos e, assim, o aumento da incidência de pneumonia associada à VM (PAV).(66 Naue WS, da Silva AC, Güntzel AM, Condessa RL, de Oliveira RP, Rios Vieira SR. Increasing pressure support does not enhance secretion clearance if applied during manual chest wall vibration in intubated patients: a randomised trial. J Physiother. 2011;57(1):21-6.,77 American Thoracic Society; Infectious Diseases Society of America. Guidelines for the management of adults with hospital-acquired, ventilator-associated, and healthcare-associated pneumonia. Am J Respir Crit Care Med. 2005;171(4):388-416.)

Buscando reverter ou diminuir estes efeitos deletérios, são utilizadas técnicas de higiene brônquica por fisioterapeutas em várias UTIs pelo mundo. Dentre estas técnicas, recebem destaque, por sua utilização, a aspiração traqueal, a vibrocompressão (VB) e a hiperinsuflação com ventilador mecânico (HVM). Estas podem ser utilizadas em separado ou associadas, conforme a patologia e o estado clínico dos pacientes.(88 Ciesla ND. Chest physical therapy for patients in the intensive care unit. Phys Ther. 1996;76(6):609-25.

9 Singer M, Vermaat J, Hall G, Latter G, Patel M. Hemodynamic effects of manual hyperinflation in critically ill mechanically ventilated patients. Chest. 1994;106(4):1182-7.
-1010 Hodgson C, Carroll S, Denehy L. A survey of manual hyperinflation in Australian hospitals. Aust J Physiother. 1999;45(3):185-93.) Entretanto, o efeito destas técnicas em pacientes em VM continua obscuro, já que ainda não se conseguiu comprovar a hipótese do aumento da quantidade de secreção pulmonar aspirada após a aplicação delas.(1111 Unoki T, Kawasaki Y, Mizutani T, Fujino Y, Yanagisawa Y, Ishimatsu S, et al. Effects of expiratory rib-cage compression on oxygenation, ventilation, and airway-secretion removal in patients receiving mechanical ventilation. Respir Care. 2005;50(11):1430-7.,1212 Mauroy B, Flaud P, Pelca D, Fausser C, Merckx J, Mitchell BR. Toward the modeling of mucus draining from human lung: role of airways deformation on air-mucus interaction. Front Physiol. 2015;6:214.) Além disso, as diferentes metodologias dos estudos e a aplicação de técnicas associadas inviabilizam a correta avaliação do efeito de cada uma delas sobre a quantidade de secreção pulmonar aspirada.(1313 Strickland SL, Rubin BK, Drescher GS, Haas CF, O'Malley CA, Volsko TA, Branson RD, Hess DR; American Association for Respiratory Care, Irving, Texas. AARC clinical practice guideline: effectiveness of nonpharmacologic airway clearance therapies in hospitalized patients. Respir Care. 2013;58(12):2187-93.)

Este estudo objetiva avaliar a quantidade de secreção pulmonar aspirada nos pacientes críticos em VM antes e após a aplicação de três diferentes técnicas de higiene brônquica de forma individualizada: VB, HVM e VB associada à HVM (VB + HVM). Também objetivou-se compará-las à aspiração traqueal isolada, avaliando os efeitos hemodinâmicos e pulmonares, à frequência de reintubação traqueal, ao tempo e à mortalidade em VM.

MÉTODOS

Estudo randomizado controlado e cegado, realizado em UTI de nível quaternário de atenção geral, de um hospital universitário localizado na cidade de Porto Alegre (RS), conforme clinicaltrials.gov: NCT 02604082. O estudo foi reportado de acordo com o protocolo CONSORT(1414 Schulz KF, Altman DG, Moher D; CONSORT Group. CONSORT 2010 statement: updated guidelines for reporting parallel group randomised trials. Int J Surg. 2011;9(8):672-7.) (Figura 1). Participantes e assessores de coleta, exceto fisioterapeutas treinados (com 5 a 12 anos de experiência em terapia intensiva), foram cegados para os grupos de aplicação das técnicas e resultado das coletas realizadas.

Figura 1
Fluxograma e desenho do estudo.

VM - ventilação mecânica; PEEP - pressão positiva expiratória final; VB - vibrocompressão; ASP - aspiração pulmonar isolada; HVM - hiperinsuflação com ventilador mecânico; PIP - pico de pressão expiratória.


Foram incluídos no estudo pacientes internados na UTI, com mais de 18 anos, que estavam em VM) com prazo máximo de 72 horas, e que apresentassem os seguintes critérios de inclusão: pressão positiva expiratória final (PEEP) ≤ 10cmH2O e hemodinamicamente estáveis, com pressão arterial média (PAM) ≥ 60mmHg e doses de noradrenalina ≤ 0,5µg/kg/minuto. Foram excluídos do estudo pacientes que apresentaram contraindicações ao incremento da pressão positiva (enfisema subcutâneo, pneumotórax e hemotórax não drenados,), fraturas de arcos costais, obesos (índice de massa corporal - IMC ≥ 35), que necessitavam de VM com pressões de pico ≥ 40cmH2O, além de pacientes com diagnóstico de osteoporose e síndrome da angústia respiratória aguda. O Termo de Consentimento Informado foi aplicado e respondido por responsáveis pelos pacientes. O estudo foi desenvolvido conforme definido pelo Comitê de Ética responsável por estudos em humanos do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) 11-0367, de acordo com a Declaração de Helsinki de 1975, revisada em 2000.

Os dados coletados foram idade, sexo, diagnóstico clínico na admissão, Acute Physiological and Chronic Health Evalutation (APACHE II), frequência cardíaca (FC), frequência respiratória (FR), PAM e saturação arterial periférica de oxigênio (SpO2) medidos no monitor multiparamétrico da marca Philiphs® (IntelliVue MP60, Philips Medical Systems São Paulo Brasil); pico de pressão expiratória (PIP), PEEP, auto-PEEP e o volume corrente (VC) medidos no ventilador mecânico (Servo-s® ou Servo-i Maquet®); e complacência dinâmica (Cdyn, calculada pela formula VCE/PIP-PEEP). Com objetivo de realizar comparações entre os momentos e entre os grupos, foram consideradas as variações dos respectivos parâmetros em cada momento (∆=valor final menos valor inicial). Também, foram registrados o tempo de VM, a mortalidade durante a VM, e a necessidade de reintubação traqueal em 48 horas.

A alocação dos pacientes nos diferentes grupos do estudo, bem como a técnica inicial a ser utilizada (aspiração isolada ou técnica referente ao grupo) foram randomizadas pelo programa de computador Randomization (http://www.randomization.com) em formato de blocos de oito sujeitos por grupo. Após a randomização, os pacientes eram incluídos nos grupos, seguindo a lista gerada por um colaborador cegado.

Após a randomização, os pacientes foram alocados em três grupos: Grupo VB, submetido à VB isolada; Grupo HVM, submetido à HVM isolada; e Grupo VB + HVM, submetido à VB associada à HVM. Além disso, os pacientes foram novamente randomizados para aplicação inicial de aspiração pulmonar isolada (ASP) ou técnica referente ao grupo em estudo (VB ou HVM ou VB + HVM). A VM dos pacientes dos três grupos durante a aplicação das técnicas foi ajustada para o modo ventilatório assisto-controlado (A/C) ciclado à pressão (PCV), com FR de 12 incursões por minuto e relação inspiração expiração de 1:2. A VB foi realizada por contração isométrica excêntrica dos membros superiores pelo fisioterapeuta produzindo vibração associada à compressão do tórax do paciente na fase expiratória. Já a HVM foi realizada no modo ventilatório PCV com acréscimo na pressão inspiratória positiva inicial, até atingir pressão de pico de 40cmH2O.(99 Singer M, Vermaat J, Hall G, Latter G, Patel M. Hemodynamic effects of manual hyperinflation in critically ill mechanically ventilated patients. Chest. 1994;106(4):1182-7.,1010 Hodgson C, Carroll S, Denehy L. A survey of manual hyperinflation in Australian hospitals. Aust J Physiother. 1999;45(3):185-93.) O tempo de aplicação das técnicas nos três grupos foi de 10 minutos, duas vezes ao dia, durante o tempo que os pacientes permaneceram em VM.

Após serem alocados nos grupos e a técnica inicial ser randomizada, todos os pacientes foram posicionados em decúbito dorsal (DD) com a cabeceira elevada em 30°. Foram, então, aspirados uma única vez, com sonda número 12 (MarkMed® indústria e comércio LTDA, São Paulo, Brasil) e vácuo de -40cmH2O - este momento sendo considerado de aspiração basal, para equiparar os grupos quanto ao volume de secreção pulmonar. Depois de 2 horas, foram coletados e registrados os parâmetros hemodinâmicos e pulmonares. Em seguida, conforme a randomização, esses pacientes receberam uma das técnicas em estudo ou ASP. O momento de coleta da secreção foi caracterizado pela aspiração com sistema aberto três vezes durante 12 segundos, com intervalo de 30 segundos, com sonda do mesmo número e valor de vácuo, igualmente realizada nos três grupos. A secreção aspirada foi armazenada em um frasco coletor (Intermedical®; Intermedical - Setmed, São Paulo, Brasil). Os parâmetros hemodinâmicos e pulmonares foram coletados novamente após 1 minuto da aplicação das aspirações.

Depois de 6 horas (wash-out), todos os pacientes foram igualmente posicionados e aspirados uma única vez, da mesma maneira precedente (aspiração basal). Após 2 horas, foram coletados e registrados os parâmetros hemodinâmicos e pulmonares, antes de receberem as técnicas em estudo, sendo que os pacientes randomizados no primeiro momento para receberem as técnicas dos grupos de estudo (VB, HVM ou VB + HVM), neste momento, receberiam apenas ASP ou o contrário; se receberam somente ASP no primeiro momento, neste momento receberiam alguma das técnicas dos grupos (VB, HVM, VB + HVM). A secreção foi novamente aspirada três vezes com sistema aberto durante 12 segundos, com intervalo de 30 segundos cada, com sonda do mesmo número e valor de vácuo, sendo, então, igualmente coletada e armazenada. Os parâmetros hemodinâmicos e pulmonares foram coletados novamente e registrados após 1 minuto da aplicação das técnicas estudadas.

As secreções aspiradas para os frascos coletores nos diferentes momentos (ASP, VB, HVM e HVM + VB) foram pesadas em balança de precisão (Sartoriu Cubis®, Frankfurt, Alemanha, modelo MSA 524P-000-DA), no laboratório de microbiologia do HCPA por um colaborador cegado ao estudo. No momento da coleta, a secreção remanescente na sonda era desprezada, sendo pesado apenas o conteúdo de secreção de dentro do frasco coletor. O protocolo do estudo segue descrito na figura 2.

Figura 2
Protocolo de aplicação do estudo.

ASP - aspiração pulmonar isolada; VB - vibrocompressão; HVM - hiperinsuflação com ventilador mecânico.


O tamanho amostral foi calculado levando-se em consideração valores demonstrados em publicações prévias de média e desvio padrão da quantidade de secreção pulmonar aspirada,(66 Naue WS, da Silva AC, Güntzel AM, Condessa RL, de Oliveira RP, Rios Vieira SR. Increasing pressure support does not enhance secretion clearance if applied during manual chest wall vibration in intubated patients: a randomised trial. J Physiother. 2011;57(1):21-6.) bem como valores mínimos clinicamente significativos. A média foi de 0,75 ± 1,0g ou mais de secreção aspirada entre e intragrupos para um valor de p < 0,05 e poder de 80%. Determinou-se necessidade de mínima de 29 pacientes por grupo, totalizando 87 pacientes (VB, HVM e VB + HVM) associados ao acréscimo de 10% para prever potencias perdas na alocação do estudo.

Análise estatística

Os dados foram analisados com intenção de tratar, pelo programa estatístico Statistical Package for the Social Sciences, versão 20.0 (SPSS Inc. Chicago, IL, EUA). As variáveis quantitativas com distribuição normal foram descritas por média e desvio padrão; as quantitativas com distribuição não paramétrica por mediana e intervalo interquartil; e as categóricas por frequência absoluta e proporção. A confirmação da distribuição normal das variáveis foi realizada pelo teste Shapiro-Wilk. Para comparar a distribuição das médias das variáveis quantitativas normais entre os grupos, foi utilizada a análise de variância (ANOVA) oneway; para as medianas das não paramétricas, utilizou-se Kruskal-Wallis; e, para as categóricas, o qui-quadrado. Para comparação intragrupos das medianas das variáveis não paramétricas, utilizou-se o teste Wilcoxon. Para correção das múltiplas comparações, foi utilizado o teste de Tukey, e o nível de significância considerado foi p < 0,05.

RESULTADOS

Foram incluídos no estudo 93 pacientes (contemplando perdas na alocação), 29 no Grupo VB, 32 no HVM e 32 no VB + HVM, no período de fevereiro de 2012 até novembro de 2014. A caracterização da amostra é demonstrada na tabela 1. Para as características clínicas e sociodemográficas estudadas, não houve diferença significativa entre os grupos.

Tabela 1
Características clínicas e demográficas dos 93 pacientes estudados

Conforme comparação intragrupo (ASP versus técnica) da amostra estudada, foi encontrado aumento significativo dos seguintes parâmetros: FC nos três grupos; FR e PAM no Grupo VB; PAM no Grupo HVM e VC no Grupo VB + HVM, após a aplicação das técnicas, porém sem relevância clínica devido à pequena diferença encontrada nos parâmetros. Os demais resultados das comparações intra e entre os grupos está demonstrado na tabela 2. Já a quantidade de secreção aspirada em gramas foi maior no Grupo VB + HVM, quando comparado à ASP, 0,7g (0,1 - 2,5g) versus 0,2g (0 - 0,6g), com p = 0,006. Porém, quando feita a comparação da diferença de secreção pulmonar (ASP-técnica) entre os grupos (Grupo VB versus Grupo HVM versus Grupo VB + HVM), este resultado não foi estatisticamente significativo, conforme o gráfico da figura 3.

Tabela 2
Comparação da variação dos parâmetros hemodinâmicos e pulmonares intragrupos dos 93 pacientes estudados
Figura 3
Quantidade de secreção aspirada, em gramas nos momentos aspiração pulmonar isolada, técnica (vibrocompressão, hiperinsuflação com ventilador mecânico, hiperinsuflação com ventilador mecânico associada à vibrocompressão) e diferença da quantidade de secreção pulmonar aspirada (técnica menos aspiração pulmonar isolada) nos três grupos estudados. Valor de p obtido pelo teste do qui-quadrado.

IC95% - intervalo de confiança 95%; ASP - aspiração pulmonar isolada; TEC - técnica; ∆SEC - diferença da quantidade de secreção pulmonar aspirada (técnica menos a menos aspiração pulmonar isolada); VB - vibrocompressão; HVM - hiperinsuflação com ventilador mecânico.


Quanto à avaliação do tempo e da mortalidade na VM, os três grupos não apresentaram diferença significativa. Já quanto à frequência de reintubação traqueal, o Grupo HVM apresentou aumento quando comparado ao Grupo VB e Grupo VB + HVM (22,1% versus 4,2% versus 7,3%), porém sem ser estatisticamente significativo (p = 0,083), como demonstrado na tabela 3.

Tabela 3
Comparação entre o tempo de ventilação mecânica, incidência de óbito e reintubação em 48 horas nos 93 pacientes estudados

DISCUSSÃO

Neste estudo, a utilização da HVM + VB aumentou a quantidade de secreção pulmonar aspirada, achado este não encontrado na aplicação das demais técnicas. Além disso, não foram demonstradas alterações clínicas relevantes nos parâmetros hemodinâmicos e pulmonares nos três grupos estudados. Destaca-se também possível efeito protetor da HVM + VB e da VB na necessidade de reintubação traqueal em 48 horas.

Estudos prévios já demonstraram que as técnicas de hiperinsuflação pulmonar podem melhorar a oxigenação e a complacência pulmonar, e reverter colapsos pulmonares e atelectasias.(22 Savian C, Paratz J, Davies A. Comparison of the effectiveness of manual and ventilator hyperinflation at different levels of positive end-expiratory pressure in artificially ventilated and intubated intensive care patients. Heart Lung. 2006;35(5):334-41.,77 American Thoracic Society; Infectious Diseases Society of America. Guidelines for the management of adults with hospital-acquired, ventilator-associated, and healthcare-associated pneumonia. Am J Respir Crit Care Med. 2005;171(4):388-416.

8 Ciesla ND. Chest physical therapy for patients in the intensive care unit. Phys Ther. 1996;76(6):609-25.

9 Singer M, Vermaat J, Hall G, Latter G, Patel M. Hemodynamic effects of manual hyperinflation in critically ill mechanically ventilated patients. Chest. 1994;106(4):1182-7.
-1010 Hodgson C, Carroll S, Denehy L. A survey of manual hyperinflation in Australian hospitals. Aust J Physiother. 1999;45(3):185-93.,1515 Assmann CB, Vieira PJ, Kutchak F, Rieder MM, Forgiarin SG, Forgiarini Júnior LA. Lung hyperinflation by mechanical ventilation versus isolated tracheal aspiration in the bronchial hygiene of patients undergoing mechanical ventilation. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(1):27-32.) Isso se deve à capacidade da hiperinsuflação causar aumento do VC, levando à expansão tanto dos alvéolos ventilados quanto dos alvéolos colapsados, explicado pelo mecanismo de interdependência pulmonar, facilitando o transporte de secreções das vias aéreas periféricas para as vias aéreas centrais.(1515 Assmann CB, Vieira PJ, Kutchak F, Rieder MM, Forgiarin SG, Forgiarini Júnior LA. Lung hyperinflation by mechanical ventilation versus isolated tracheal aspiration in the bronchial hygiene of patients undergoing mechanical ventilation. Rev Bras Ter Intensiva. 2016;28(1):27-32.,1616 Stiller K. Physiotherapy in intensive care: towards an evidence-based practice. Chest. 2000;118(6):1801-13.)

Os achados do nosso estudo, em relação ao aumento da quantidade da secreção pulmonar aspirada após a aplicação da associação das técnicas HVM + VB, foram similares aos de Lemes et al. que, em um ensaio clínico randomizado cruzado com pacientes em VM, demonstraram aumento da quantidade de secreção pulmonar aspirada após técnica de HVM.(1717 Lemes DA, Zin WA, Guimaraes FS. Hyperinflation using pressure support ventilation improves secretion clearance and respiratory mechanics in ventilated patients with pulmonary infection: a randomised crossover trial. Aust J Physiother. 2009;55(4):249-54.) Corroborando estes achados, nosso grupo, em estudo prévio randomizado cruzado em pacientes em VM, demonstrou também aumento da quantidade de secreção pulmonar aspirada após técnica de HVM associada à VB.(55 Naue WS, Forgiarini Junior LA, Dias AS, Vieira SR. Chest compression with a higher level of pressure support ventilation: effects on secretion removal, hemodynamics, and respiratory mechanics in patients on mechanical ventilation. J Bras Pneumol. 2014;40(1):55-60.) No entanto nestes dois estudos prévios, a técnica de HVM necessitava de drive ventilatório dos pacientes para ser utilizada, o que inviabilizou seu uso em pacientes sedados. Tal desvantagem foi minimizada com a atual técnica, já que é realizada em modos ventilatórios assisto-controlados, não necessitando de drive ventilatório dos pacientes.

A técnica de VB isolada foi avaliada por Unoki et al. em estudo randomizado cruzado com pacientes em VM, sem demonstrar aumento da quantidade de secreção pulmonar aspirada após sua realização.(1111 Unoki T, Kawasaki Y, Mizutani T, Fujino Y, Yanagisawa Y, Ishimatsu S, et al. Effects of expiratory rib-cage compression on oxygenation, ventilation, and airway-secretion removal in patients receiving mechanical ventilation. Respir Care. 2005;50(11):1430-7.) Além disso, em revisão sistemática, Borges et al. não encontraram efeito positivo na quantidade de secreção aspirada nos estudos que compararam a VB isolada com o grupo controle.(1818 Borges LF, Saraiva MS, Saraiva MA, Macagnan FE, Kessler A. Manobra de compressão torácica expiratória em adultos ventilados mecanicamente: revisão sistemática com metanálise. Rev Bras Ter Intensiva. 2017;29(1):96-104.) Ambos autores reforçam nossos achados. Assim, a HVM parece ser ponto crucial na facilitação de aspiração de secreções pulmonares.

Outro fato importante é que o aumento na quantidade de secreção pulmonar aspirada parece estar associado à diminuição da necessidade de reintubação traqueal. Conforme demonstrado por Gonçalves et al. em estudo randomizado realizado com pacientes em VM, foi encontrada uma incidência de reintubação traqueal de 17% no grupo intervenção (técnica de higiene brônquica de insuflação-exuflação pulmonar mais cuidado usual) e de 48% no grupo controle (cuidado usual), com p < 0,05. Além disso, 5,7% dos pacientes do grupo intervenção apresentaram retenção de secreções versus 22,5% no grupo controle.(1919 Gonçalves MR, Honrado T, Winck JC, Paiva JA. Effects of mechanical insufflation-exsufflation in preventing respiratory failure after extubation: a randomized controlled trial. Crit Care. 2012;16(2):R48.) Corroborando estes achados, Miu et al., por meio de estudo de coorte com 2.007 pacientes em VM, demonstraram aumento na frequência de aspirações em 24 horas (8,4 ± 4,0 versus 6,6 ± 4,1) e no escore de secreção nos pacientes reintubados quando comparados aos que não foram (12,2 ± 8,0 versus 9,0 ± 7,0), com p < 0,01.(2020 Miu T, Joffe AM, Yanez ND, Khandelwal N, Dagal AH, Deem S, et al. Predictors of reintubation in critically ill patients. Respir Care. 2014;59(2):178-85.) Neste estudo, o escore de secreção foi calculado tendo por base os seguintes valores em 24 horas: 3 pontos para grande quantidade de secreção pulmonar aspirada, 2 pontos para média e 1 ponto para pouca.

Tais estudos apresentaram resultados similares aos encontrados pelo nosso grupo, sugerindo que a técnica de VB e, principalmente, sua associação com a HVM, pode diminuir a necessidade de reintubacão traqueal, por possivelmente reduzir o acúmulo de secreções pulmonares por meio do aumento do pico de fluxo expiratório.(2121 Silva AR, Fluhr SA, Bezerra AL, Correia Junior MA, França EE, Andrade FM. Pico de fluxo expiratório e resistência do sistema respiratório de pacientes sob ventilação mecânica submetidos a duas formas de tosse manualmente assistida. Rev Bras Ter Intensiva. 2012;24(1):58-63.)

Este estudo apresentou algumas limitações, como heterogeneidade da quantidade de secreção basal encontrada na amostra estudada, necessitando de estudos com amostras maiores, para demonstrar diferenças significativas entre os grupos. Outra limitação foi a falta de controle de variáveis que poderiam influenciar nos desfechos de reintubação traqueal, como necessidade e uso de antibioticoterapia, número de intervenções cirúrgicas e estratificação da amostra por patologia de base.

CONCLUSÃO

A técnica de hiperinsuflação com ventilador mecânico associada à vibrocompressão, quando comparada à aspiração isolada, é mais eficaz na remoção de secreções, fato demonstrado pelo aumento da quantidade de secreção pulmonar aspirada, porém novos estudos são necessários, para detalhar melhor o mecanismo fisiológico das técnicas de higiene brônquica para estes desfechos, visando esclarecer ainda mais seu efeito sobre os pacientes em ventilação mecânica.

AGRADECIMENTOS

Este projeto foi financiado pelo Fundo de Incentivo ao Ensino e Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (FIPE-HCPA).

REFERÊNCIAS

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Editado por

Editor responsável: Thiago Costa Lisboa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Mar 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2018
  • Aceito
    27 Nov 2018
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