Composição corporal de bovinos de quatro raças zebuínas, abatidos em diferentes estádios de maturidade

Body composition of four zebu breed beef cattle slaughtered at different stages of maturity

Composição corporal de bovinos de quatro raças zebuínas, abatidos em diferentes estádios de maturidade¹

Body composition of four zebu breed beef cattle slaughtered at different stages of maturity

André Mendes Jorge^I; Carlos Augusto de Alencar Fontes^II; Mário Fonseca Paulino^III

^I Professor Assistente Doutor do DPEA/ UNESP - Faz. Lageado , Caixa Postal 560 - 18618-000 - Botucatu - SP

^II Professor Titular UENF - 28015-620 - Campos - RJ

^III Professor do Departamento de Zootecnia da UFV, Viçosa-MG

RESUMO

Este trabalho foi realizado com o objetivo de avaliar a composição química corporal de 63 animais não-castrados das raças Gir, Guzerá, Mocho de Tabapuã e Nelore, em confinamento, com pesos vivos médios iniciais de 376,4; 357,6, 362,0; e 368,6 kg, respectivamente. Em cada raça, os animais foram divididos em cinco categorias: abate inicial, alimentação ad libitum com ração contendo 50% de concentrado até atingirem pesos individuais de abate de 405, 450 e 500 kg, respectivamente, e, finalmente, categoria alimentação restrita recebendo a mesma ração, suprindo níveis de proteína e energia 15% acima da mantença. Não houve diferenças entre as raças quanto aos conteúdos corporais de proteína, gordura, energia e macroelementos minerais (Ca, P, Mg, K e Na). Os animais abatidos com pesos mais elevados apresentam menores porcentagens de proteína e macroelementos minerais (Ca, P, Mg, K e Na) no corpo, ocorrendo o inverso para a gordura corporal.

Palavras-chave: bovinos de corte, composição corporal, exigências nutricionais, Gir, Guzerá, Mocho Tabapuã, Nelore

ABSTRACT

This work was conducted to evaluate the chemical body composition of sixty three young bulls, from the Gyr, Guzera, Mocho Tabapuã, Nellore breeds, in feedlot, averaging, respectively, 376.4, 357.6, 362.0, and 368.6 kg of initial live weight. The animals from each breed were divided into five categories: initial slaughter, full fed diet containing 50% concentrate until the individual slaughter weights of 405, 450 and 500 kg, respectively, and finally the category restricted feeding fed the same diet supplying levels of protein and energy 15% above maintenance. There were no differences among breed regarding to body content of protein, fat, energy and macrominerals (Ca, P, Mg, K and Na). The animals slaughtered at higher weights showed lower percentage of body protein and macrominerals (Ca, P, Mg, K and Na), and occurring the inverse to the body fat.

Key Words: beef cattle, body composition, nutritional requirements, Gyr, Guzera, Mocho Tabapuã, Nellore

Introdução

No Brasil, nos últimos anos, esforços têm sido desenvolvidos no sentido de se estudarem a composição corporal e as exigências nutricionais de zebuínos e mestiços, destacando-se os trabalhos de GONÇALVES (1988), CARVALHO (1989), LANA et al. (1992a, b, c, d), PIRES et al. (1993a, b, c, d), SOARES (1994), FREITAS (1995), ESTRADA (1997) e PAULINO (1996). Entretanto, as informações disponíveis são ainda limitadas, em virtude de sua determinação ser trabalhosa e de alto custo.

Torna-se necessário ampliar o banco de informações sobre as raças zebuínas, a fim de estabelecer planos de nutrição compatíveis com o potencial genético dos animais, bem como criar pontos de abate que proporcionem eficiência de ganho e características desejáveis de carcaça.

O objetivo deste estudo foi avaliar, em confinamento, a composição química corporal de bovinos das raças Gir, Guzerá, Nelore e Mocho Tabapuã, abatidos em diferentes estádios de maturidade.

Material e Métodos

Este estudo foi realizado no Laboratório de Animais do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa.

Utilizaram-se 63 bovinos machos não-castrados, sendo 16 Gir (GIR), 16 Guzerá (GUZ), 15 Nelore (NEL) e 16 Mocho Tabapuã (TAB), com idade média de 24 meses e pesos médios iniciais de 357,6 ± 32,95; 362,0 ± 28,95; 376,4 ± 28,56; e 368,6 ± 25,83 kg, respectivamente, provenientes da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG).

Os animais foram mantidos em regime de confinamento, distribuídos aleatoriamente em baias individuais, com área total concretada de 30 m², sendo 8 m² cobertos com telhas de amianto, providas de comedouro e bebedouro de concreto.

Os animais de cada raça foram distribuídos em cinco grupos, cada um designado, aleatoriamente, para um dos tratamentos:

AB - Abate inicial ou referência;

AR - Alimentação restrita;

1 - Alimentação ad libitum até o abate, a peso vivo de 405 kg, equivalente a 90% do peso estimado à maturidade das vacas da raça;

2 - Alimentação ad libitum até o abate, a peso vivo de 450 kg, equivalente a 100% do peso estimado à maturidade das vacas da raça; e

3 - Alimentação ad libitum até o abate, a peso vivo de 500 kg, equivalente a 110% do peso estimado à maturidade das vacas da raça.

No tratamento AB foram alocados quatro animais das raças Gir, Guzerá e Mocho-Tabapuã e três da raça Nelore. Nos demais tratamentos foram alocados três animais de cada raça.

O período de adaptação teve duração de 60 dias, fornecendo-se a todos os animais a dieta utilizada no período experimental, ad libitum. Após o período de adaptação, foram abatidos os animais do grupo AB, servindo como referência no estudo da composição corporal inicial dos animais.

Os animais dos tratamentos 1, 2 e 3 receberam, durante o período experimental, dieta balanceada ad libitum, formulada segundo as normas do NRC (1984), de modo a permitir ganho diário de 1,1 kg, atendendo, ao mesmo tempo, às exigências de proteína degradável no rúmen (PDR) e proteína não-degradável no rúmen (PNDR), segundo o ARC (1980). Procurou-se sempre manter a proporção concentrado: volumoso próxima de 1:1, na matéria seca (MS). A dieta foi fornecida aos animais da categoria AR em quantidades limitadas, de forma a ingerirem quantidades de energia e proteína 15% acima das exigências de mantença.

A composição percentual da dieta experimental é apresentada na Tabela 1 e os teores de matéria seca (MS), proteína bruta (PB), energia metabolizável (EM) e macroelementos minerais dos ingredientes e da dieta encontram-se na Tabela 2.

O período experimental não teve duração pré-fixada, uma vez que os animais foram abatidos assim que atingiram os pesos preestabelecidos de 405, 450 ou 500 kg, correspondentes aos tratamentos 1, 2 e 3, respectivamente.

Para cada raça, na medida em que um animal da categoria 2 atingia o peso de abate, o animal do grupo AR mais semelhante quanto ao peso e à condição corporal, no início do experimento, era também abatido.

Antes do período de adaptação, os animais foram pesados, após jejum de 16 horas, identificados com brincos numerados, submetidos ao controle de endo e ectoparasitas e receberam 2.000.000 UI de vitamina A injetável.

Os animais foram pesados a cada 28 dias e, à medida que cada um se aproximava do peso de abate preestabelecido, era pesado a intervalos menores, de forma a ser abatido com o peso previsto.

Antes do abate, os animais foram submetidos a período de jejum de 16 horas, com livre acesso à água. O abate ocorreu após pesagem do animal, por concussão cerebral e posterior seção da veia jugular. De cada animal abatido, pesaram-se e coletaram-se amostras de sangue, rúmen-retículo, omaso, abomaso, intestino delgado, intestino grosso, mesentério, carne industrial, gordura interna, fígado, coração, rins, baço, pulmão, língua, couro, cauda, esôfago, traquéia e aparelho reprodutor. Para um animal de cada raça, foram pesadas, dissecadas e retiradas amostras de uma cabeça e um pé.

A carcaça foi dividida em duas metades, pesadas individualmente e resfriadas em câmara fria, por aproximadamente 18 horas, à temperatura de -5ºC. Decorrido este tempo, utilizou-se a metade esquerda da carcaça, retirou-se a seção transversal, incluindo a 9ª, 10ª e 11ª costelas, da qual se destacou a seção HH, segundo HANKINS e HOWE (1946).

As amostras de sangue, carne, gordura, couro, osso, cauda e amostras compostas de vísceras e órgãos foram processadas conforme descrito por PAULINO (1996), que determinou as exigências nutricionais dos animais utilizados neste trabalho.

As análises de nitrogênio total foram feitas em aparelho semimicro Kjeldahl; as de extrato etéreo, em aparelho Goldfish; e as de cinza, em mufla elétrica a 600ºC. Na determinação dos macroelementos minerais, foi preparada solução mineral pela via úmida. O fósforo foi determinado em espectrofotômetro (colorímetro), segundo o método adaptado por BRAGA e DEFILIPO (1979). O cálcio e o magnésio foram determinados em espectrofotômetro de absorção atômica (aparelho Varian, modelo AA-175) e o sódio e o potássio, em espectrofotômetro de chama (Corning, modelo 400). As análises foram realizadas conforme metodologia descrita por SILVA (1990).

A composição química corporal foi determinada considerando-se o peso e a composição de cada parte do corpo (sangue, couro, cauda, vísceras e órgãos) e dos componentes isolados (músculos, tecido adiposo e osso) da seção HH, da cabeça e dos pés.

Os conteúdos corporais de proteína, gordura, energia e cinzas foram obtidos conforme descrito por PAULINO (1996).

O peso corporal vazio dos animais referência (AB) foi determinado somando-se o peso de carcaça, sangue, cabeça, pés, couro, cauda, vísceras e órgãos. Relações específicas entre o peso corporal vazio (PCVZ) e o peso vivo (PV) foram determinadas para animais de cada raça. O valor obtido para cada raça foi utilizado para se estimar o PCVZ inicial dos animais experimentais das categorias remanescentes (AR, 1, 2 e 3). O PCVZ final destes animais foi determinado de modo semelhante ao obtido pelos animais-referência, por ocasião do abate.

A relação observada para os animais AB, entre o peso de carcaça e o peso corporal vazio, foi utilizada para estimar o peso inicial de carcaça dos animais remanescentes.

As análises estatísticas foram feitas utilizando-se o programa LSMLMW, versão PC-1, segundo HARVEY (1987).

Para análise utilizou-se o modelo abaixo:

em que

Y_ijk = observação referente ao animal k, da raça i e categoria j;

μ = média geral;

R_i = efeito da raça i, em que i = 1, (GIR); 2, (GUZ); 3,(NEL); 4, (TAB);

C_j = efeito da categoria j, em que j = 1, (AB); 2, (AR); 3, (1); 4, (2); 5, (3);

RC_ij = efeito da interação entre raça i e categoria j; e

e_ijk = erro aleatório, pressuposto normalmente distribuído, com média zero e variância s².

O efeito de regressão, por raça e geral, do PCVZ inicial para as características estudadas foi pesquisado em análises preliminares, sendo excluído do modelo, por não se mostrar significativo.

As médias foram comparadas pelo teste Tukey a 5% de probabilidade.

Resultados e Discussão

As análises de variância para conteúdos corporais totais de proteína, gordura, energia e macroelementos minerais mostraram não haver efeito significativo de interação entre raças (GIR, GUZ, NEL e TAB) e categorias (AB, AR, 1, 2 e 3), sendo, portanto, os dois efeitos considerados independentes.

Na Tabela 3 são apresentados os valores médios dos conteúdos corporais totais de proteína, gordura e energia e na Tabela 4, os valores médios dos conteúdos corporais totais de macroelementos minerais, dos animais para as quatro raças, obtidos conforme descrito por PAULINO (1996).

Não se observou diferença entre raças quanto ao parâmetros supracitados. Os valores médios dos conteúdos corporais totais de proteína e gordura (%PCVZ) e energia (Mcal/kg PCVZ), foram 2,3; 12,4; e 7,22% superiores, respectivamente, aos valores médios estimados por PAULINO (1996), utilizando-se equações de regressão, para os mesmos animais do presente estudo, com pesos de 300 a 500 kg, nas quais não foram incluídos os animais submetidos à restrição alimentar. Estes resultados são bastante próximos aos valores médios estimados encontrados por FREITAS (1995) e ESTRADA (1997), para animais Nelore, utilizando-se metodologia semelhante à empregada neste trabalho. FONTES (1995), analisando os dados de vários experimentos em conjunto e tomando como referência o Nelore não-castrado, na faixa de 200 a 400 kg PCVZ, encontrou valores estimados para a proteína, gordura e energia, 10,73% superior, 26,9% e 3,67% inferiores, respectivamente, aos do presente estudo.

Os valores médios de conteúdos corporais totais (em %PCVZ) de cálcio, fósforo e potássio foram 2,26; 2,40; e 4,76% inferiores e os de magnésio e sódio, iguais, respectivamente, aos valores médios estimados por PAULINO (1996), que não incluiu, ao ajustar as equações, os animais submetidos à alimentação restrita.

Na Tabela 5 são apresentados os conteúdos corporais totais de proteína, gordura e energia e na Tabela 6, os conteúdos corporais totais de macroelementos minerais, dos animais para os cinco tratamentos (AB, AR, 1, 2 e 3), obtidos conforme descrito por PAULINO (1996).

Observou-se que animais mais pesados (tratamento 3) apresentaram maiores (P<0,05) conteúdos totais de proteína, gordura e energia que animais mais leves (tratamentos AB, AR, 1 e 2). Todavia, em termos de concentrações, ou seja, em % do PCVZ ou Mcal/kg de PCVZ, com a elevação do peso de abate, houve decréscimo no conteúdo corporal de proteína e aumento na concentração de gordura, com incremento concomitante no conteúdo de energia. Estes resultados, semelhantes aos relatados por PAULINO (1996), guardam coerência com as estimativas feitas por GONÇALVES (1988), LANA et al. (1992b), PIRES et al. (1993a, b), FREITAS (1995), FONTES (1995) e ESTRADA (1997).

O aumento verificado no conteúdo de gordura corporal (total e em % PCVZ), em animais de maior maturidade (tratamento 3), é coerente com as maiores proporções observadas de tecido adiposo na carcaça e maior espessura de gordura subcutânea (ESPGOR), em animais mais pesados.

Os animais do tratamento 3 apresentaram maiores (P<0,05) conteúdos corporais totais de macroelementos minerais que animais dos tratamentos AB, AR e 1, diferindo (P<0,05) somente do tratamento 2 quanto ao conteúdo de potássio. De maneira geral, observou-se que as quantidades totais de macroelementos minerais aumentaram com a elevação do peso corporal (maturidade). Por outro lado, os resultados mostraram tendência de decréscimo nas concentrações dos cinco macroelementos minerais no corpo vazio com a elevação do peso corporal vazio, o que, segundo PAULINO (1996), pode estar associado ao efeito de diluição provocado pelo aumento da gordura corporal, uma vez que a gordura tem baixo teor de minerais, e à constatação, no presente trabalho, de redução na proporção de ossos e aumento na de gordura da carcaça, em animais de maturidade mais elevada (categoria 3). O decréscimo na concentração de minerais verificado neste trabalho foi demonstrado por PAULINO (1996), encontrando suporte nos resultados de PIRES et al. (1993c, d), SOARES (1994), FONTES (1995) e ESTRADA (1997).

Conclusões

As raças não diferiram quanto ao conteúdo corporal de gordura, proteína, energia e macroelementos minerais.

Animais abatidos com pesos mais elevados apresentaram menores porcentagens de proteína e de macroelementos minerais (Ca, P, Mg, K e Na) no corpo, o inverso ocorrendo em relação à gordura, quando comparados a animais abatidos com pesos mais leves.

Recebido em: 03/06/98

Aceito em: 22/09/98

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¹

Parte da Tese apresentada à UFV pelo primeiro autor, para obtenção do título de Doctor Scientiae. Trabalho realizado em colaboração com a EPAMIG/FAPEMIG.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  07 Fev 2013
• Data do Fascículo
  Abr 1999

Histórico

• Aceito
  22 Set 1998
• Recebido
  03 Jun 1998