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Análise de sobrevida no melanoma infantojuvenil

RESUMO

Objetivos:

analisar a sobrevida no Melanoma Infantojuvenil.

Métodos:

estudo retrospectivo realizado mediante revisão de prontuários e registros hospitalares de câncer, de pacientes na faixa etária de 0 a 19 anos, com melanoma comprovado histologicamente e atendidos entre 1997 e 2017 no Hospital Erasto Gaertner em Curitiba-PR.

Resultados:

amostra composta por 24 pacientes, sexo feminino (62,5%), média de 14,12 ± 4,72 anos de idade, com melanoma em cabeça e pescoço (37,5%), tórax (25%) e extremidades (20,8%). Os sinais e sintomas ao diagnóstico foram aumento do tamanho da lesão (25%), sangramento (20,8%) e prurido (16,6%). Ocorreu Índice de Breslow II e IV e Nível de Clark IV, com tendência estatística entre Breslow IV e óbito (p=0,127) e significância entre Clark V e óbito (p=0,067). Nove (37,5%) pacientes apresentaram metástases, seis (25%) com metástases à distância morreram (p=0,001), cinco eram meninas (20,8%). A cirurgia foi o tratamento padrão e a quimioterapia o adjuvante mais utilizado (37,5%). A média de tempo entre diagnóstico e óbito foi de 1,3 ± 1,2 anos e de sobrevida foi 3,7 ± 3,2 anos.

Conclusão:

houve atraso no diagnóstico, alta morbimortalidade e média de sobrevida menor do que cinco anos.

Palavras chave:
Melanoma; Crianças; Linfonodo Sentinela; Análise de Sobrevida

ABSTRACT

Objectives:

to analyze the survival in juvenile melanoma.

Methods:

retrospective study conducted by hospital record review and cancer records of patients aged 0 to 19 years, with histologically proven melanoma and treated between 1997 and 2017 at the Erasto Gaertner Hospital in Curitiba-PR.

Results:

the sample comprised 24 patients, female (62.5%), mean 14.14 ± 4.72 years old, with head and neck melanoma (37.5%), chest (25%) and extremities. (20.8%). Signs and symptoms at diagnosis were increased lesion size (25%), bleeding (20.8%) and pruritus (16.6%). There was a Breslow II and IV index and Clark IV level, with a statistical tendency between Breslow IV and death (p = 0.127), and significance between Clark V and death (p = 0.067). Nine (37.5%) patients had metastases, six (25%) with distant metastases died (p = 0.001), five were girls (20.8%). Surgery was the standard treatment and chemotherapy the most used adjuvant (37.5%). The average time between diagnosis and death was 1.3 ± 1.2 years and survival were 3.7 ± 3.2 years.

Conclusion:

there was a delay in diagnosis, high morbidity and mortality and average survival less than five years.

Keywords:
Melanoma; Child; Sentinel Lymph Node; Survival Analysis

INTRODUÇÃO

Atualmente o melanoma corresponde a menos de 3% dentre todas as malignidades em menores de 20 anos, mas é considerado o tumor sólido mais comum entre 15 e 29 anos11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44.,22 Instituto Nacional do Câncer (INCA) [Intenet]. [Brasília, DF]. Câncer de pele me-lanoma; 2018 [citado 2020 Jan 08]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-pele-melanoma.
https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/...
. O desenvolvimento é influenciado por fatores individuais (sexo masculino, nevos displásicos atípicos, congênitos, grandes, numerosos ou de crescimento rápido, xeroderma pigmentoso, pele e olhos claros, histórico de câncer ou lesões pré-malignas cutâneas, transplantes de órgãos sólidos ou de células hematopoiéticas, HIV/AIDS e histórico familiar de melanoma) e ambientais ou modificáveis (bronzeamento artificial, morar próximo à linha do Equador, exposição inadequada à radiação solar e queimaduras solares)22 Instituto Nacional do Câncer (INCA) [Intenet]. [Brasília, DF]. Câncer de pele me-lanoma; 2018 [citado 2020 Jan 08]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-pele-melanoma.
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,33 Cordoro KM, Gupta D, Frieden IJ, McCalmont T, Kashani-Sabet M. Pediatric melanoma: results of a large cohort study and proposal for modified ABCD detection criteria for children. J Am Acad Dermatol. 2013; 68(6):913-925..

Crianças podem desenvolver melanoma sem preencher critérios convencionais do ABCDE (A = assimetria, B = borda irregular, C = coloração variada, D = diâmetro > 6mm, E = elevação)33 Cordoro KM, Gupta D, Frieden IJ, McCalmont T, Kashani-Sabet M. Pediatric melanoma: results of a large cohort study and proposal for modified ABCD detection criteria for children. J Am Acad Dermatol. 2013; 68(6):913-925. e sem correlação forte com queimaduras solares44 Xu JX, Koek S, Lee S, Hanikeri M, Lee M, Beer T, Saunders C. Juvenile melanomas: Western Australian Melanoma Advisory Service experience. Australas J Dermatol. 2017;58(4):299-303..

O melanoma Infantojuvenil, classificado em extensivo superficial (mais frequente), nodular, lentigo maligno e acral55 Averbook BJ, Lee SJ, Delman KA, Gow KW, Zager JS, Sondak VK, et al. Pediatric melanoma: Analysis of an international registry. Cancer. 2013;119(22):4012-4019.,66 Saiyed FK, Hamilton EC, Austin MT. Pediatric melanoma: incidence, treatment, and prognosis. Pediatric Health Med Ther. 2017;8:39-45., possui tendência a formas e localizações atípicas11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44.,33 Cordoro KM, Gupta D, Frieden IJ, McCalmont T, Kashani-Sabet M. Pediatric melanoma: results of a large cohort study and proposal for modified ABCD detection criteria for children. J Am Acad Dermatol. 2013; 68(6):913-925.,55 Averbook BJ, Lee SJ, Delman KA, Gow KW, Zager JS, Sondak VK, et al. Pediatric melanoma: Analysis of an international registry. Cancer. 2013;119(22):4012-4019.. Crescimento da lesão, irregularidade das bordas e das cores, inflamação e exsudação indicam a suspeita33 Cordoro KM, Gupta D, Frieden IJ, McCalmont T, Kashani-Sabet M. Pediatric melanoma: results of a large cohort study and proposal for modified ABCD detection criteria for children. J Am Acad Dermatol. 2013; 68(6):913-925.,55 Averbook BJ, Lee SJ, Delman KA, Gow KW, Zager JS, Sondak VK, et al. Pediatric melanoma: Analysis of an international registry. Cancer. 2013;119(22):4012-4019.. O diagnóstico requer biópsia de pele e estudo histopatológico para diferenciar de lesões pigmentadas benignas e malignas, analisar espessura (Índice de Breslow e Nível de Clark), fazer estadiamento e instituir terapêutica.

Na faixa etária pré-puberal (idade ≤ 11 anos) a positividade de linfonodo sentinela é mais frequente, o Índice de Breslow e Nível de Clark são maiores, porém os indicadores de sobrevida são melhores quando comparados com os adolescentes (idade ≥ 11 anos)11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44.,33 Cordoro KM, Gupta D, Frieden IJ, McCalmont T, Kashani-Sabet M. Pediatric melanoma: results of a large cohort study and proposal for modified ABCD detection criteria for children. J Am Acad Dermatol. 2013; 68(6):913-925.,66 Saiyed FK, Hamilton EC, Austin MT. Pediatric melanoma: incidence, treatment, and prognosis. Pediatric Health Med Ther. 2017;8:39-45.. Independente da faixa etária, o melanoma possui potencial de agressividade e metástases para sistema linfático, pele, cérebro e pulmões11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44..

Metástases estão associadas ao atraso diagnóstico e redução na curva de sobrevida para até 10% em cinco anos77 Strouse JJ, Fears TR, Tucker MA, Wayne AS. Pediatric melanoma: risk factor and survival analysis of the surveillance, epidemiology and end results database. J Clin Oncol. 2005; 23(21):4735-474.. O tratamento cirúrgico deve remover o o tumor e margens previamente definidas, conforme estadiamento. A biópsia do linfonodo sentinela é indicada para Índice de Breslow ≥ 0,75mm, Nível de Clark IV - V, índice mitótico ≥ 5/mm2 2 e ausência de regressão do tumor33 Cordoro KM, Gupta D, Frieden IJ, McCalmont T, Kashani-Sabet M. Pediatric melanoma: results of a large cohort study and proposal for modified ABCD detection criteria for children. J Am Acad Dermatol. 2013; 68(6):913-925.,66 Saiyed FK, Hamilton EC, Austin MT. Pediatric melanoma: incidence, treatment, and prognosis. Pediatric Health Med Ther. 2017;8:39-45.,77 Strouse JJ, Fears TR, Tucker MA, Wayne AS. Pediatric melanoma: risk factor and survival analysis of the surveillance, epidemiology and end results database. J Clin Oncol. 2005; 23(21):4735-474..

O estadiamento TNM considera Índice de Breslow, presença de ulcerações, acometimento linfonodal e localização das metástases à distância22 Instituto Nacional do Câncer (INCA) [Intenet]. [Brasília, DF]. Câncer de pele me-lanoma; 2018 [citado 2020 Jan 08]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-pele-melanoma.
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,88 Saenz N, Saenz-Badillos J, Busam K. Childhood melanoma survival. Cancer.1999;85(3):750-754.. O prognóstico tende a ser melhor nos pacientes com tumores in situ, ausência de ulcerações e metástases, Índice de Breslow e Nível de Clark baixos e negatividade na pesquisa do linfonodo sentinela11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44.,66 Saiyed FK, Hamilton EC, Austin MT. Pediatric melanoma: incidence, treatment, and prognosis. Pediatric Health Med Ther. 2017;8:39-45.,88 Saenz N, Saenz-Badillos J, Busam K. Childhood melanoma survival. Cancer.1999;85(3):750-754.. A literatura nacional é escassa quanto ao melanoma Infantojuvenil.

MÉTODOS

Estudo retrospectivo para analisar perfil do melanoma e a sobrevida de pacientes na faixa etária de 0 a 19 anos, atendidos entre janeiro de 1997 e outubro de 2017, no Hospital Erasto Gaertner em Curitiba-PR. Projeto realizado mediante revisão de prontuários e registros hospitalares de câncer, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Erasto Gaertner (CEP HEG - CAAE: 89962518.0.0000.0098).

Os critérios de inclusão foram possuir diagnóstico comprovado histologicamente de melanoma e ter menos de 19 anos. Foram excluídos aqueles que não apresentavam os dados completos (exceto tipo histológico, Índice de Breslow e Nível de Clark). Para traçar o perfil epidemiológico dos pacientes foram avaliados: sexo, idade, Índice de Breslow, Nível de Clark, presença de ulceração, história familiar de melanoma, ocorrência de metástase, sítio de metástase e tipo histológico. Para a construção da curva de sobrevida, utilizou-se como definição de desfecho as datas de óbito constantes no prontuário.

O Índice de Breslow22 Instituto Nacional do Câncer (INCA) [Intenet]. [Brasília, DF]. Câncer de pele me-lanoma; 2018 [citado 2020 Jan 08]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-pele-melanoma.
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, classicamente, é usado como fator determinante para estadiamento, prognóstico e tratamento, e avalia a profundidade do tumor (T) em milímetros classificando como: Tis (tumor in situ); TI (<0,75mm); TII (0,75 mm até 1,5 mm); TIII (1,5 até 3,0 mm); TIV (3,0 mm até 4,0 mm) e TV (>4,0 mm). O Nível de Clark22 Instituto Nacional do Câncer (INCA) [Intenet]. [Brasília, DF]. Câncer de pele me-lanoma; 2018 [citado 2020 Jan 08]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-pele-melanoma.
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descreve a invasão neoplásica da pele em níveis: I (somente a epiderme); II (epiderme e parte da derme papilar); III (derme papilar); IV (derme reticular); V (hipoderme).

As variáveis contínuas foram expressas como média ± desvio padrão e comparadas com os testes Qui-quadrado e Exato de Fisher, conforme apropriado, com auxílio do programa SPSS, considerado p<0,05. O Método de Kaplan-Meier foi utilizado na produção das curvas de sobrevivência, seguidos de análise univariável para fatores prognósticos empregando os testes de Log Rank, Breslow e Tarone-Ware.

RESULTADOS

Foram atendidos 29 casos de melanoma em menores de 19 anos no período do estudo. Cinco prontuários encontravam-se inadequados para coleta. A amostra foi composta por 24 pacientes, sexo feminino (62,5%), na faixa etária média de 14,12 ± 4,72 anos, com lesão em cabeça e pescoço (41,7%). Havia um portador de Xeroderma Pigmentoso e um com história familiar de melanoma cutâneo. Síndrome do nevo displásico e nevo melanocítico congênito não foram observados. Não havia dados sobre fotoexposição e queimaduras solares.

Biópsia do Linfonodo Sentinela foi realizada em 16 pacientes (66,8%) e ampliação de margens em 14 (58,3%). Sete pacientes (31.8%) apresentaram ulceração da lesão primária, cinco (20,8%) infiltração linfocitária peritumoral e três (13,6%) comprometimento de margens.

Os sinais e sintomas ao diagnóstico foram aumento do tamanho da lesão em 9 (37,5%) casos, sangramento em 5 (20,8%), prurido em 4 (16,6%), mudança de cor da lesão em 2 (8,3%), dor em 2 (8,3%) e outras manifestações em 25 (astenia, emagrecimento, etc).

Ocorreu Índice de Breslow II (35,3%) e IV (29,4%), Nível de Clark IV (43,8%), com tendência entre Breslow IV e óbito (p=0,127) e significância entre Clark V e óbito (p=0,067). Em 7 laudos (29,1%) não constavam Breslow e Clark e em 11 (47,8%) faltava a classificação do melanoma. Dos 12 casos com registro do tipo histológico, 6 (26,08%) eram melanoma extensivo superficial (Tabela 1).

Tabela 1
Características do melanoma infantojuvenil.

Nove pacientes (37,5%) apresentaram doença metastática (p=0,001), em dois casos apenas o linfonodo foi acometido. Os sítios de metástases foram linfonodos em 7 (29,2%) pacientes, pulmão em 3 (12,5%), sistema nervoso central em 3 (12,5%), e fígado (4,2%), baço (4,2%) e ossos (4,2%) com um caso cada. Todos os 6 casos com metástases na região cefálica (25%) foram a óbito (p=0,001), 5 eram meninas.

Quimioterapia foi o tratamento adjuvante em 9 casos (37,5%), em 2 pacientes associou-se radioterapia e em um a imunoterapia. A média de tempo entre diagnóstico e óbito foi de 1,3 ± 1,2 anos. A média de sobrevida foi de 3,70 ± 3,24 anos, considerando a data de óbito.

A distribuição de sobrevida (Kaplan-Meier) teve significância estatística (p=0,01) de acordo com o Nível de Clark (Figura 1), diferentemente do que ocorreu com Índice de Breslow (Figura 2) e presença de ulceração (Figura 3).

Figura 1
Análise da sobrevida e Nivel de Clark.

Figura 2
Análise de sobrevida e Índice de Breslow em melanoma infantojuvenil.

Figura 3
Análise de sobrevida e presença de ulceração em melanoma infantojuvenil.

Quanto às comorbidades associadas, um paciente apresentava asma e sobreviveu; uma com cardiopatia congênita associada à hipertensão arterial sistêmica e outra com leucemia linfoide aguda tiveram desfecho letal.

DISCUSSÃO

Embora a incidência de melanoma em crianças e adolescentes tenha aumentado nas últimas décadas88 Saenz N, Saenz-Badillos J, Busam K. Childhood melanoma survival. Cancer.1999;85(3):750-754.,99 Wong JR, Harris JK, Rodriguez-Galindo C, Johnson KJ. Incidence of childhood and adolescent melanoma in the United States: 1973-2009. Pediatrics. 2013;131(5):846-854. é considerado raro nessas faixas etárias, especialmente entre pré-púberes77 Strouse JJ, Fears TR, Tucker MA, Wayne AS. Pediatric melanoma: risk factor and survival analysis of the surveillance, epidemiology and end results database. J Clin Oncol. 2005; 23(21):4735-474.

8 Saenz N, Saenz-Badillos J, Busam K. Childhood melanoma survival. Cancer.1999;85(3):750-754.

9 Wong JR, Harris JK, Rodriguez-Galindo C, Johnson KJ. Incidence of childhood and adolescent melanoma in the United States: 1973-2009. Pediatrics. 2013;131(5):846-854.

10 Brecht IB, De Paoli A, Bisogno G, Orbach D, Schneider DT, Leiter U, et al. Pediatric patients with cutaneous melanoma: A European study. Pediatr Blood Cancer. 2018;65(6):e26974.
-1111 Ferrari A, Bisogno G, Cecchetto G, Santinami M, Maurichi A, Bono A, et al. Cutaneous melanoma in children and adolescents: the Italian rare tumors in pediatric age project experience. J. Pediatr. 2014;164(2):376-382.. Essa primeira série histórica brasileira de melanoma infantojuvenil (1997-2017) confirma tal raridade pois apenas 4 casos ocorreram na primeira década de vida.

A casuística da neoplasia acometendo meninas (62,5%) e localizada em cabeça e pescoço (41,7%), membros (25,%) e tronco (20,8%) contrasta com a literatura que aponta incidência semelhante entre meninos e meninas e maior frequência em membros (40%), tórax (35%) e cabeça e pescoço (17%)99 Wong JR, Harris JK, Rodriguez-Galindo C, Johnson KJ. Incidence of childhood and adolescent melanoma in the United States: 1973-2009. Pediatrics. 2013;131(5):846-854..

Manifestações clínicas como aumento da lesão, prurido e sangramento se assemelharam a literatura88 Saenz N, Saenz-Badillos J, Busam K. Childhood melanoma survival. Cancer.1999;85(3):750-754., entretanto, podem passar desapercebidos ou ocultos. Profissionais de saúde e pais/responsáveis devem se manter atentos a lesões de pele em crianças e adolescentes com tais características, ou com aspectos incomuns33 Cordoro KM, Gupta D, Frieden IJ, McCalmont T, Kashani-Sabet M. Pediatric melanoma: results of a large cohort study and proposal for modified ABCD detection criteria for children. J Am Acad Dermatol. 2013; 68(6):913-925., para não retardar a detecção e tratamento de um possível câncer.

Quanto à classificação histológica, dentre os tipos tumorais especificados, predominou melanoma extensivo superficial, seguido do nodular e do acral/mucoso (Tabela 1), corroborando com estudos na população pediátrica44 Xu JX, Koek S, Lee S, Hanikeri M, Lee M, Beer T, Saunders C. Juvenile melanomas: Western Australian Melanoma Advisory Service experience. Australas J Dermatol. 2017;58(4):299-303.,1111 Ferrari A, Bisogno G, Cecchetto G, Santinami M, Maurichi A, Bono A, et al. Cutaneous melanoma in children and adolescents: the Italian rare tumors in pediatric age project experience. J. Pediatr. 2014;164(2):376-382.

12 Stefanaki C, Chardalias L, Soura E, Katsarou A, Stratigos A. Paediatric melanoma. JEADV. 2017;31(10):1604-15.
-1313 Moscarella E, Zalaudek I, Cerroni L, Sperduti I, Catricalà C, Smolle J, et al. Excised melanocytic lesions in children and adolescents - a 10 - year survey. Br J Dermatol. 2012;167(2):368-373. e geral22 Instituto Nacional do Câncer (INCA) [Intenet]. [Brasília, DF]. Câncer de pele me-lanoma; 2018 [citado 2020 Jan 08]. Disponível em: https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-de-pele-melanoma.
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,1414 Dean PH, Bucevska M, Strahlendorf C, Verchere C. Pediatric Melanoma: A 35-year Population-based Review. Plast Reconstr Surg Glob Open. 2017;5(3):1252-58..

O grau de invasão prevalente no diagnóstico foi Índice de Breslow II e IV e Nível de Clark IV (Tabela 1). Pesquisas nessa faixa etária demonstram maior frequência de diagnóstico da lesão ao nível IV de Clark44 Xu JX, Koek S, Lee S, Hanikeri M, Lee M, Beer T, Saunders C. Juvenile melanomas: Western Australian Melanoma Advisory Service experience. Australas J Dermatol. 2017;58(4):299-303.,1111 Ferrari A, Bisogno G, Cecchetto G, Santinami M, Maurichi A, Bono A, et al. Cutaneous melanoma in children and adolescents: the Italian rare tumors in pediatric age project experience. J. Pediatr. 2014;164(2):376-382. enquanto na população geral ocorre tendência ao Nível de Clark menor que III1313 Moscarella E, Zalaudek I, Cerroni L, Sperduti I, Catricalà C, Smolle J, et al. Excised melanocytic lesions in children and adolescents - a 10 - year survey. Br J Dermatol. 2012;167(2):368-373.. Esses dados apontam para possibilidade de diagnóstico mais tardio de melanoma em crianças e adolescentes em comparação com adultos1515 Austin MT, Xing Y, Hayes-Jordan AA, Lally KP, Cormier JN. Melanoma incidence rises for children and adolescents: An epidemiologic review of pediatric melanoma in the United States. J Pediatr Surg. 2013;48(11):2207-2213..

Relacionando a sobrevida com grau de invasão, estudo clássico de Saenz et al. (1999)88 Saenz N, Saenz-Badillos J, Busam K. Childhood melanoma survival. Cancer.1999;85(3):750-754. demonstrou que todos os pacientes com melanomas de espessura ≤1mm tiveram sobrevida maior que 10 anos. Na pesquisa de Averbook et al. (2013)55 Averbook BJ, Lee SJ, Delman KA, Gow KW, Zager JS, Sondak VK, et al. Pediatric melanoma: Analysis of an international registry. Cancer. 2013;119(22):4012-4019., jovens com melanomas medindo ≤1mm de espessura tiveram prognóstico favorável, porém quando mediam >1mm a 2mm, mesmo que semelhante, ocorreu queda na taxa de sobrevida.

Espessura e ulceração do tumor são fortes preditores de metástases de linfonodo sentinela em crianças66 Saiyed FK, Hamilton EC, Austin MT. Pediatric melanoma: incidence, treatment, and prognosis. Pediatric Health Med Ther. 2017;8:39-45.,1616 Eggen CAM, Durgaram VVL, van Doorn R, Mooi WJ, Pardo LM, Pasmans SGMA, et al. Incidence and relative survival of melanoma in children and adolescents in the Netherlands, 1989-2013. J Eur Acad Dermatol Venereol. 2018;32(6):956-961.,1717 Kim J, Sun Z, Gulack BC, Adam MA, Mosca PJ, Rice HE, et al. Sentinel lymph node biopsy is a prognostic measure in pediatric melanoma. J Pediatr Surg. 2016;51(6):986-990.. Jovens portadores de melanoma com Índice de Breslow maior do que I com análise de linfonodo sentinela negativa tiveram sobrevida de 100% enquanto naqueles com análise positiva a sobrevida caiu para 89%, indicando que linfonodo sentinela positivo está associado a prognóstico desfavorável1717 Kim J, Sun Z, Gulack BC, Adam MA, Mosca PJ, Rice HE, et al. Sentinel lymph node biopsy is a prognostic measure in pediatric melanoma. J Pediatr Surg. 2016;51(6):986-990..

Na presente investigação, observou-se tendência estatística de menor taxa de sobrevida a partir do nível IV de Clark e forte relação ao nível V. Não foi possível encontrar relação estatística entre redução da sobrevida e Índices de Breslow maiores e nem com presença de ulceração devido pequeno tamanho amostral e ausência desses registros.

Todos os pacientes dessa amostra realizaram biópsia excisional. Em 9 casos (37,5%) foi identificada metástase regional ou à distância, condizente com investigações nessa faixa etária11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44.,1111 Ferrari A, Bisogno G, Cecchetto G, Santinami M, Maurichi A, Bono A, et al. Cutaneous melanoma in children and adolescents: the Italian rare tumors in pediatric age project experience. J. Pediatr. 2014;164(2):376-382.. Pesquisa revelou que em pacientes com metástases à distância1111 Ferrari A, Bisogno G, Cecchetto G, Santinami M, Maurichi A, Bono A, et al. Cutaneous melanoma in children and adolescents: the Italian rare tumors in pediatric age project experience. J. Pediatr. 2014;164(2):376-382. a maioria envolvia mais de um sítio, sendo os pulmões, o sistema nervoso central, os ossos e o fígado os locais acometidos. No presente estudo verificou-se padrão similar de metástases e em adição ainda houve acometimento do baço.

Embora não existam diretrizes específicas para o tratamento do melanoma em crianças1212 Stefanaki C, Chardalias L, Soura E, Katsarou A, Stratigos A. Paediatric melanoma. JEADV. 2017;31(10):1604-15., a abordagem cirúrgica foi complementada com quimioterapia, radioterapia e imunoterapia adjuvante, quando pertinentes. Em concordância com a literatura11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44., pacientes com metástases à distância morreram durante o acompanhamento. Estudo analisando sobrevida no melanoma pediátrico66 Saiyed FK, Hamilton EC, Austin MT. Pediatric melanoma: incidence, treatment, and prognosis. Pediatric Health Med Ther. 2017;8:39-45. mostrou que nos casos metastáticos o tempo médio de sobrevida foi inferior a um ano e a sobrevida global em 5 anos foi menor que 12%.

A recidiva da doença em 4 casos (16,6%), da presente amostra, se assemelha à pesquisa de Ferrari et al. (2014)1111 Ferrari A, Bisogno G, Cecchetto G, Santinami M, Maurichi A, Bono A, et al. Cutaneous melanoma in children and adolescents: the Italian rare tumors in pediatric age project experience. J. Pediatr. 2014;164(2):376-382. em que 10 dos 54 pacientes (18,5%) tiveram recorrência relacionada com formas metastáticas de melanoma. Estudos demonstram variação de mortalidade global de melanoma de 10% até 41%, nas populações até 21 anos de idade11 Paradela S, Fonseca E, Pita-Fernández S, Kantrow SM, Diwan AH, Herzog C, et al. Prognostic factors for melanoma in children and adolescents: a clinicopathologic, single-center study of 137 Patients. Cancer. 2010;116(18):4334-44.,88 Saenz N, Saenz-Badillos J, Busam K. Childhood melanoma survival. Cancer.1999;85(3):750-754..

Na presente investigação, 6 pacientes (25%) morreram ao longo do acompanhamento com pior sobrevida em meninas e portadores de comorbidades (cardiopatia congênita/hipertensão arterial e leucemia linfoide aguda). Subtipo tumoral, biologia, influência hormonal, status linfonodal, entre outros, são fatores prognósticos importantes no melanoma na infância e adolescência1818 Al-Himdani S, Naderi N, Whitaker IS, Jones NW. An 18-year Study of Malignant Melanoma in Childhood and Adolescence. Plast Reconstr Surg Glob Open. 2019;30;7(8):2338-41.,1919 Neves JM, Duarte B, Paiva Lopes MJ. Pediatric Melanoma: Epidemiology, Pathogenesis, Diagnosis and Management. SPDV [Internet]. 2020Jul.14 [cited 2020Oct.22];78(2):107-14. Available from: https://revista.spdv.com.pt/index.php/spdv/article/view/1197
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. Provavelmente as taxas significativas de insucesso no tratamento da neoplasia metastática ocorreram pelo avanço da doença, influenciada por características populacionais e recursos disponíveis77 Strouse JJ, Fears TR, Tucker MA, Wayne AS. Pediatric melanoma: risk factor and survival analysis of the surveillance, epidemiology and end results database. J Clin Oncol. 2005; 23(21):4735-474.,1818 Al-Himdani S, Naderi N, Whitaker IS, Jones NW. An 18-year Study of Malignant Melanoma in Childhood and Adolescence. Plast Reconstr Surg Glob Open. 2019;30;7(8):2338-41..

Este estudo possui limitações pelo delineamento retrospectivo e registros incompletos. Contudo, contribui com conhecimentos sobre o perfil epidemiológico e patológico do melanoma infantojuvenil, alerta sobre a necessidade da detecção precoce para melhorar prognóstico, maximizar qualidade de vida e minimizar complicações e custos, e incentiva encaminhamento adequado ao serviço de oncologia.

CONCLUSÃO

Detectou-se melanoma no sexo feminino, faixa etária 14,12 ± 4,72 anos, Índice de Breslow II e IV, Nível de Clark IV, com alto potencial metastático e sobrevida média de 3,7 ± 3,2 anos.

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  • Fonte de financiamento:

    nenhuma.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    16 Jan 2020
  • Aceito
    01 Abr 2020
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