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Lesões impalpáveis da mama marcadas com suspensão de carvão: avaliação de aspectos anatomopatológicos, viabilidade de interpretação e resposta inflamatória

Resumos

OBJETIVO: Analisar a eficácia da suspensão de carvão inerte na marcação de lesões impalpáveis mamárias e as alterações morfológicas associadas ao seu uso, além de determinar se há ou não prejuízo na interpretação destas lesões pelo patologista. MÉTODOS: Foram atendidos 135 casos de lesões impalpáveis mamárias, previamente marcadas com suspensão de carvão. As lâminas coradas pelo método de HE contendo pigmentos de carvão foram analisadas ao microscópio óptico, onde se realizou avaliação quantitativa e qualitativa da resposta inflamatória e determinação da presença ou não de prejuízo ao diagnóstico anatomopatológico. Os índices avaliados quantitativamente quanto à resposta inflamatória foram as contagens de linfócitos, células gigantes e neutrófilos, todos observados e quantificados em campos de grande aumento. Foi, ainda, avaliada a quantidade e distribuição de carvão presente nas lesões. RESULTADOS: Na avaliação quantitativa e qualitativa da resposta inflamatória observou-se, independente da quantidade de carvão, granulomas a "corpo estranho" em todas as amostras. Em relação à resposta inflamatória linfocitária 5,19% das amostras não apresentaram infiltração linfocítica, sendo que em 82,22% ela era de discreta intensidade e em 12,59% de moderada intensidade. Quanto à resposta inflamatória aguda, observou-se ausência total de exsudação neutrofílica em 42,96% dos espécimes, exsudação neutrofílica discreta em 42,22%, moderada em 11,11% e acentuada, sob forma de microabscessos, em 3,7% dos casos. Nesta série foram observados cinco nódulos de carvão, posicionados paralesionalmente, e que não geraram interferência na análise morfológica. CONCLUSÃO: Este método é marcador eficaz de lesões impalpáveis, de baixo custo, alta efetividade, sem prejuízo à análise histológica, além de ser de fácil execução; é confortável para a paciente e de grande auxílio ao cirurgião e patologista na localização destas lesões.

Carvão vegetal; Morfologia; Mama; Neoplasias; Neoplasias da mama


OBJECTIVE: To analyze the efficiency of labeling impalpable breast lesions with inert charcoal suspension; to evaluate the morphological alterations associated with its use and to determine whether the use of charcoal labeling hampers the diagnostic interpretation of the pathologist. METHODS: Was evaluated a total of 135 cases of impalpable breast lesions previously labeled with charcoal suspension. Histological H&E stained slides containing charcoal pigments were analyzed using optical microscopy, by which both quantitative and qualitative evaluations with regards to inflammatory response and interference in diagnosis were performed. Lymphocyte, giant cells and neutrophils were evaluated and quantified. Moreover, the distribution of the charcoal suspension present in the lesions was evaluated. RESULTS: As to the quantitative and qualitative evaluation of the inflammatory response caused by the use of charcoal labeling, granulomas were present in all samples regardless of the quantity of injected charcoal. Lymphocytic inflammatory response was absent in only 5.19% of the samples, 82.22% exhibited discrete intensity and 12.59% were moderate. With regards to acute inflammatory response, 42.96% showed total absence of neutrophilic exudate, whereas 42.22% contained discrete and 11.11% moderate neutrophilic exudate, and only 3.7% of cases had intense neutrophilic exudate. CONCLUSION: This study corroborates the utility and easiness of the charcoal method as a mean of efficient labeling of impalpable breast lesions; this technique is easy to use, has a low cost, high efficiency and does not interfere with the histological analysis. Moreover, it is comfortable for the patient and is of great help in finding and localizing the lesions for both the surgeon and pathologist.

Charcoal; Mophology; Breast; Neoplasms; Breast neoplasms


ARTIGO ORIGINAL

Lesões impalpáveis da mama marcadas com suspensão de carvão: avaliação de aspectos anatomopatológicos, viabilidade de interpretação e resposta inflamatória

Teresa Cristina Santos CavalcantiI; Osvaldo Malafaia, ECBC-PRII; Paulo Afonso Nunes Nassif, TCBC-PRII; Thelma Larocca SkareII; Daniel Cury OgataIII; Marcelo Tizzot MiguelIV; Larissa Krüger GomesIV

IMestre do Programa de Pós Graduação em Princípios da Cirurgia do Instituto de Pesquisas Médicas da Faculdade Evangélica do Paraná/Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, Curitiba, PR, Brasil

IIDoutor, Professor Permanente do Programa de Pós Graduação em Princípios da Cirurgia do Instituto de Pesquisas Médicas da Faculdade Evangélica do Paraná/Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, Curitiba, PR, Brasil

IIIAluno do Programa de Pós Graduação em Princípios da Cirurgia do Instituto de Pesquisas Médicas da Faculdade Evangélica do Paraná/Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, Curitiba, PR, Brasil

IVAluno da Faculdade Evangélica do Paraná/Hospital Universitário Evangélico de Curitiba, Curitiba, PR, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Teresa Cristina Santos Cavalcanti E-mail: tcava@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Analisar a eficácia da suspensão de carvão inerte na marcação de lesões impalpáveis mamárias e as alterações morfológicas associadas ao seu uso, além de determinar se há ou não prejuízo na interpretação destas lesões pelo patologista.

MÉTODOS: Foram atendidos 135 casos de lesões impalpáveis mamárias, previamente marcadas com suspensão de carvão. As lâminas coradas pelo método de HE contendo pigmentos de carvão foram analisadas ao microscópio óptico, onde se realizou avaliação quantitativa e qualitativa da resposta inflamatória e determinação da presença ou não de prejuízo ao diagnóstico anatomopatológico. Os índices avaliados quantitativamente quanto à resposta inflamatória foram as contagens de linfócitos, células gigantes e neutrófilos, todos observados e quantificados em campos de grande aumento. Foi, ainda, avaliada a quantidade e distribuição de carvão presente nas lesões.

RESULTADOS: Na avaliação quantitativa e qualitativa da resposta inflamatória observou-se, independente da quantidade de carvão, granulomas a "corpo estranho" em todas as amostras. Em relação à resposta inflamatória linfocitária 5,19% das amostras não apresentaram infiltração linfocítica, sendo que em 82,22% ela era de discreta intensidade e em 12,59% de moderada intensidade. Quanto à resposta inflamatória aguda, observou-se ausência total de exsudação neutrofílica em 42,96% dos espécimes, exsudação neutrofílica discreta em 42,22%, moderada em 11,11% e acentuada, sob forma de microabscessos, em 3,7% dos casos. Nesta série foram observados cinco nódulos de carvão, posicionados paralesionalmente, e que não geraram interferência na análise morfológica.

CONCLUSÃO: Este método é marcador eficaz de lesões impalpáveis, de baixo custo, alta efetividade, sem prejuízo à análise histológica, além de ser de fácil execução; é confortável para a paciente e de grande auxílio ao cirurgião e patologista na localização destas lesões.

Descritores: Carvão vegetal. Morfologia. Mama. Neoplasias. Neoplasias da mama.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, vem crescendo consideravelmente a taxa de detecção de lesões impalpáveis mamárias, também denominadas subclínicas. As lesões não palpáveis são caracterizadas por serem não nodulares ou nodulares, estas com tamanho geralmente menor que 1cm, podendo atingir dimensões maiores na dependência das características do parênquima e tamanho da mama afetada.

O tamanho de tumores de mama invasivos não palpáveis é, em média, de 10mm. Dentre as lesões mamárias impalpáveis as que despertam maior interesse são aquelas suspeitas de malignidade. Elas se apresentam como nodulações ou assumem ainda outras características radiográficas, como calcificações1,2, anormalidades no tecido mole, distorção arquitetural e a presença de massas irregulares.

O alto índice de detecção é decorrente da implementação de programas de prevenção, maior participação do rastreamento mamográfico e melhoria acentuada das técnicas de imagem, favorecendo o achado de alterações, cada vez mais refinadas, e de menores dimensões1-4. A mamografia é considerada, até hoje, o método mais específico e sensível para o diagnóstico do câncer de mama em sua forma mais precoce2.

Mais recentemente a ressonância magnética vem assumindo importante papel no diagnóstico de lesões iniciais, porém, mesmo tendo alta sensibilidade, este método apresenta especificidade menor. Da mesma forma, o uso da ultrassonografia é preconizado como método complementar à mamografia e ressonância magnética, constituindo-se em ferramenta importante, principalmente em casos de mamas pequenas e densas3.

O rastreamento mamográfico anual em mulheres acima de 40 anos, detecta aproximadamente 100 a 200 novos casos de lesões suspeitas, que se apresentam como não palpáveis em cada 20.000 mamografias. Tais lesões necessitam de estudo histológico, sendo uma das opções a sua localização e marcação pré-operatória1,5-13.

Apesar do bom desempenho da mamografia na identificação da neoplasia mamária em estágio inicial, 10% a 30% das lesões não palpáveis são malignas quando biopsiadas14, sendo que 15% a 25% são lesões intraductais5. Consequentemente, a correta localização e posterior exérese das lesões não palpáveis que são malignas são determinantes no sucesso cirúrgico. Há necessidade de marcação prévia do sítio da lesão para que ela possa ser corretamente identificada pelo cirurgião, retirada de forma precisa e adequada, considerando ainda os resultados cosméticos decorrentes da exérese da menor quantidade de tecido.

Adicionalmente, é de grande importância oferecer ao patologista condições ideais para o manejo do espécime, identificação macroscópica e microscópica das lesões e sua interpretação redundando em diagnóstico preciso em termos morfológicos, tanto qualitativo como quantitativo.

Os objetivos deste estudo foram avaliar a eficiência e viabilidade de marcação de lesões mamárias impalpáveis com solução aquosa de carbono inerte a 4%; avaliar se a solução de carvão leva ao prejuízo ou não na interpretação diagnóstica histopatológica; quantificar a resposta inflamatória à presença de carvão; e verificar o padrão de distribuição do carvão em relação às lesões-alvo.

MÉTODOS

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba. Todos os participantes assinaram termo de consentimento livre e esclarecido.

A amostra inicial constitui-se de 135 espécimes cirúrgicos procedentes de 109 pacientes portadoras de lesões impalpáveis mamárias marcadas através de mamografia ou ultrassonografia por punção e injeção de suspensão de carvão. Cada lesão foi submetida à avaliação prévia para seleção das lâminas contendo o pigmento de carvão e, dentre estas, as que apresentavam as alterações morfológicas mais significativas em relação a componentes inflamatórios e presença de carvão. Os espécimes foram identificados e processados de acordo com as técnicas histológicas de rotina, sendo previamente conservados e fixados em formol à 10%.

As amostras foram avaliadas na totalidade de suas lâminas, sendo selecionadas aquelas com alterações associadas à presença do carvão e da alteração impalpável que propiciou o procedimento cirúrgico. Foram então separados os blocos de parafina contendo as lesões correspondentes e submetidos à microtomia para novos cortes com espessura de 4µm. Foram subsequentemente corados em hematoxilina e eosina (HE) e reavaliados. As 135 amostras eram procedentes de 109 pacientes do sexo feminino. Destas, 89 pacientes tiveram somente uma lesão na mama investigada e marcada com suspensão de carvão, de forma prospectiva; 15, duas lesões; quatro, três lesões; e uma, quatro lesões. As idades variaram entre 21 e 87 anos, com média de 48 anos.

O microscópio usado para análise das lâminas foi acoplado a um sistema de fotomicrografia. Todos os espécimes selecionados foram primeiramente visualizados com objetiva de 100 aumentos (10x) para que fosse realizada a localização da área de impregnação por carvão, assim como, comprovação da presença da lesão "alvo" do procedimento cirúrgico. A seguir, concentrou-se a análise na região de maior intensidade de reação inflamatória associada à presença do carvão, sendo usada então objetiva de 400 aumentos (40x). Em todos os casos foram avaliados dez campos de maior aumento com contagem diferencial do número de linfócitos, neutrófilos e macrófagos multinucleados. Os dados numéricos foram padronizados de acordo com o número e distribuição de elementos inflamatórios monomorfonucleados e polimorfonucleados, assim como, pela quantidade de vascularização presente na amostra, de acordo com os parâmetros a seguir especificados.

Os critérios morfológicos e numerização para inflamação aguda basearam-se na proliferação vascular (PV) e número de polimorfonucleares (PMN) da seguinte forma: ausente (0); discreta, PV e PMN isolados (1); moderada, PV e PMN agregados em parte da área lesada (2); acentuada, PV e PMN agregados e confluentes em toda a área lesada (3).

Para inflamação crônica quantificaram-se linfócitos/plasmócitos e macrófagos (MMN), da seguinte forma: ausente, sem MMN; discreta, MMN isolados; moderada, MMN agregados em parte da lesão; acentuada, MMN agregados e confluentes em toda a lesão.

A inflamação aguda teve como consideração a somatória: 0 = ausência de inflamação aguda; somatória 1 ou 2 = inflamação aguda discreta; somatória 3 ou 4 = inflamação aguda moderada; somatória 5 ou 6 = inflamação aguda acentuada.

A distribuição do carvão representou a quantidade de carvão encontrado conforme sua introdução pela agulha na lesão/adjacência da mesma no momento da injeção desta suspensão dentro da mama. Avaliou-se o padrão de distribuição da presença do carvão em relação à lesão analisada e classificou-se como intralesional, perilesional, paralesional ou combinação de duas ou mais das distribuições citadas.

Foi também verificada a presença ou não de lesão no espécime, elaborada nova avaliação diagnóstica e reconhecido se a presença do carvão causou qualquer tipo de interferência na qualidade da análise morfológica e diagnóstico anatomopatológico final, graduando-se a dificuldade de interpretação da lesão alvo em escala numérica de zero a dez.

RESULTADOS

Todos os parâmetros analisados e resultados obtidos foram lançados em banco de dados, sob a forma de planilha eletrônica.

Foram analisados 135 espécimes cirúrgicos obtidos para exérese de lesões impalpáveis mamárias de 109 pacientes, 82 localizadas na mama esquerda e 53 na direita. Dentre as amostras, 88 eram representadas por nódulos puros, oito por nódulos associados à microcalcificações, uma representada por placa/massa impalpável e 38 casos investigados exclusivamente pela presença de microcalcificações.

Dos 135 casos analisados, 35 eram representados por lesões malignas (26,66%), 97 por lesões benignas (71,85%), um caso constituiu-se de lesão maligna associada à lesão benigna (0,74%), em dois espécimes (1,48%) não foram observadas lesões (Tabela 1 e Figura 1).


O menor diâmetro de lesão nodular foi 0,3cm, o maior 2cm. O volume médio observado nas lesões de padrão nodular foi 0,60cm3, variando entre 0,02 e 2,3cm3.

A distribuição do carvão em relação à lesão-alvo, deu-se de forma intralesional em oito casos (5,92%); em 61 casos (45,14%) foi paralesional (Figura 2); perilesional em 26 casos (19,26%); intra e perilesional em 21 casos (15,50%); intra e paralesional em 11 casos (8,14%); peri e paralesional em cinco casos (3,70%) e intra, peri e paralesional em um caso (0,74%) (Figuras 3).



No que concerne ao processo inflamatório crônico, observou-se presença de macrófagos multinucleados com partículas de carvão intracitoplasmáticas em todos os casos (100%). Com relação ao componente linfocitário, 111 casos (82,22%) revelaram intensidade discreta, 17 intensidade moderada (12,59%) e sete (5,19%) não apresentaram linfócitos (Figura 4).


Já a resposta inflamatória aguda não foi observada em 58 (42,96%) dos casos, sendo que teve intensidade discreta em 57 (42,23%), moderada em 15 (11,11%), e acentuada, sob forma de abscedação, em cinco casos (3,7%) (Figura 5).


A quantidade de carvão presente nas amostras foi discreta em 39 casos (29%), moderada em 91 (67,4%), e acentuada, sob forma de nódulos negros em cinco casos (3,7%).

A quantidade de suspensão de carvão nos espécimes foi discreta em 29%, moderada em 67,4% e acentuada em 3,7%.

Em dois dos espécimes cirúrgicos (1,48%) não foi possível detectar presença de lesão histológica, sendo que em um a quantidade de carvão observada era mínima.

Na vizinhança de 12 casos observou-se presença de necrose gordurosa e em um caso, além da necrose, e de artefatos de deslocamento que suscitaram a realização de estudo imunoistoquímico para definição de lesão maligna infiltrante ou in situ.

Na totalidade de casos contendo lesão detectável (98,52%) não houve qualquer prejuízo à análise histológica e o diagnóstico anatomopatológico final foi direto, com nível de dificuldade de zero, levando-se em consideração escala de zero a dez.

DISCUSSÃO

A crescente utilização da mamografia e da ultrassonografia nos programas de rastreamento de doenças mamárias associada aos avanços tecnológicos gerando aparelhos de imagem com maior acurácia, vem possibilitando o achado de número crescente de lesões mamárias não palpáveis15.

É de grande importância a localização pré-operatória adequada para que a lesão-alvo seja retirada com sucesso associada à exérese de menor quantidade de tecido mamário normal, seguindo a tendência das operações conservadoras atualmente preconizadas. Têm sido propostos vários métodos e técnicas distintas, desde a marcação em "x", com agulhas simples e múltiplas4,5,7,10, fio metálico5,16 injeção de corantes1,17-19, suspensão de carvão1,3,4,6,11,20 e o uso de radioisótopos21,22.

O método mais usado na atualidade em todo o mundo é a localização com agulha/fio metálico. Constitui técnica que possibilita a marcação pré-operatória adequada de 92-98% das lesões mamárias impalpáveis. É, porém, associado à taxas de complicação e falha que, segundo a literatura, variam de 1% a 10%23,24. O fio metálico apresenta problemas logísticos, com colocação e posicionamento realizados poucas horas antes do procedimento cirúrgico, gerando inconveniência, ansiedade à paciente, demora e, por vezes, localização subótima. Como são estruturas móveis em relação ao parênquima mamário, podem estar associadas à complicações perioperatórias importantes, salientando-se o deslocamento da agulha/fio metálico dentro da mama, principalmente nas mais gordurosas, havendo relatos de sua migração até para a cavidade pleural com ocorrência de pneumotórax25. Podem, também, serem transeccionadas ou quebradas involuntariamente pelo cirurgião durante o procedimento, dificultando ou impossibilitando sua localização durante a operação podendo, inclusive, gerar a presença de "corpos estranhos" iatrogênicos26.

A marcação de lesões impalpáveis de mama com radioisótopos (Radioguided Occult Lesion Localization - ROLL), vem sendo usada, porém, tem a desvantagem de necessitar procedimento de localização em ocasião distinta do procedimento cirúrgico, alto custo, uso de radiofármacos especializados e disposição de detector de radiação gama no centro cirúrgico5. É também importante ressaltar que o uso de contraste iodado relatado na técnica original pode levar à necrose gordurosa e da pele além de ulcerações cutâneas, síndrome de compartimento e alergias, devido ao extravasamento do contraste para o tecido celular subcutâneo5,27. O tempo entre a injeção e o procedimento cirúrgico é muito curto, gerando desconforto ao agendamento.

O uso de corantes vitais como o azul de tuloidina28, azul Evans e Vital18, azul de metileno, verde isocianido28 e tinta da Índia foram usados para identificação de lesões subclínicas pelo seu baixo custo, porém são pouco eficazes, pois difundem-se facilmente no parênquima mamário, devendo ter sua inoculação realizada imediatamente antes da operação, sendo que a difusão dificulta a identificação adequada do segmento a ser retirado. Já o uso de carvão como corante, que vem sendo usado em poucos lugares, não oferece o problema de difusão, como os outros corantes, sendo inerte ou com difusão mínima.

Povos pré-históricos (os Otzi) já faziam uso de tatuagens associadas à acupuntura com a finalidade de marcação de pontos e tratamento de doenças crônicas sofridas pelo homem da era glacial. Na atualidade, o carvão foi introduzido como meio de marcação de lesões impalpáveis mamárias por volta do ano de 1979, no Hospital Karolinska, Estocolmo, Suécia. Em 1983, Svane19 publicou trabalho descrevendo a técnica estereotáxica para marcação pré-operatória em 53 pacientes portadoras de lesões impalpáveis. A estabilidade da marcação com solução de carvão ao longo do tempo torna-a muito atrativa. Sendo particulada e não solúvel em água, ela permanece no trajeto e não se difunde para os tecidos adjacentes, em contraste com o que ocorre com outros corantes. É biologicamente inerte, facilmente identificável a olho nu e, na grande maioria dos casos, o carvão não é identificado radiograficamente.

Em concordância com diversos estudos realizados anteriormente, a presente pesquisa corrobora a utilização do carvão como marcador eficiente, de fácil visualização tanto pelo cirurgião, como pelo patologista. Dentre os 135 espécimes analisados, detectou-se a presença de lesão e do carvão em sua periferia em 133 das amostras. Em uma das isentas de lesão-alvo, a quantidade de carvão era mínima o que sugere falha na sua injeção. Com relação à outra amostra sem lesão, a quantidade de carvão observada era abundante, sendo o espécime representado exclusivamente por tecido adiposo, o que sugere colocação do carvão em sítio inadequado.

Poucos relatos da literatura avaliam o prejuízo ou dificuldade de interpretação histopatológica de espécimes marcados com suspensão de carvão1,4,11,20. No presente estudo não foram detectados dificuldade alguma ou prejuízo qualquer à interpretação para o diagnóstico anatomopatológico final. Observou-se um caso de carcinoma intraductal com artefatos de deslocamento que, à microscopia óptica habitual, geraram dúvidas quanto à presença ou não de lesão infiltrante. Foi necessária realização de avaliação imunoistoquímica que corroborou o diagnóstico de lesão intraductal. Tais achados morfológicos são relatados como provenientes de procedimento intervencionista anterior, biópsia por agulha ou punção aspirativa, não estando relacionados diretamente à presença das partículas de carvão.

Em estudo realizado por Mullen et al.4, em 2001, onde foram comparados o uso de marcação com agulha e com carvão, cirurgiões relataram grande preferência ao carvão, já que ocorreu deslocamento da agulha e erros quanto à correta localização da lesão usando a técnica por agulhamento4.

São poucas as desvantagens do uso de carbono como meio de marcação de lesões não palpáveis relatadas até hoje. Entre elas há relatos esparsos de casos com reação a "corpo estranho" de baixo grau20 sem reações adversas significativas, mesmo após meses e anos de acompanhamento1,4,6,11. De acordo com relatos na literatura, o aparecimento de reações granulomatosas pode ocorrer quando a retirada do trajeto realizado pela marcação de carvão não for efetuada em seis meses4,12,13, prazo este em que o carvão é fagocitado por macrófagos, ocorrendo pouca ou nenhuma inflamação29.

Até o momento, não se tem conhecimento de estudos para análise quantitativa e qualitativa de resposta inflamatória ao carvão nem da distribuição dele em relação às lesões anatomopatológicas.

Neste estudo realizou-se avaliação quantitativa e qualitativa da resposta inflamatória e observou-se, independente da quantidade de carvão, granulomas a "corpo estranho" em todas as amostras, contradizendo dados obtidos em outras pesquisas, onde foi encontrada reação a "corpo estranho" mínima ou ausente1,4,6,11-13,20.

Em relação à resposta inflamatória linfocitária 5,19% das amostras não apresentaram infiltração linfocítica, sendo que em 82,22% ela era de discreta intensidade e em 12,59% de moderada intensidade.

Quanto à resposta inflamatória aguda, observou-se ausência total de exsudação neutrofílica em 42,96% dos espécimes, discreta em 42,22%, moderada em 11,11% e acentuada, sob forma de microabscessos, em 3,7% dos casos. Tal ocorrência é inusitada já que as soluções usadas são teoricamente estéreis não devendo propiciar reação inflamatória aguda.

Outro problema enfrentado pelos patologistas durante o exame histopatológico é que aos cortes de microtomia o carvão pode deixar o tecido resistente existindo então a possibilidade de distorcer ou ocultar a lesão4. Nesta série foram observados cinco nódulos de carvão, posicionados paralesionalmente, e que não geraram interferência na análise morfológica.

Mais recentemente foram relatados três casos de alterações mamográficas de aspecto suspeito, coincidentes com sítios prévios de marcação com carvão, e que após a sua investigação traduziram-se por granulomas a carvão29.

Este estudo corrobora a utilidade e facilidade do método como marcador eficaz de lesões impalpáveis, de baixo custo, alta efetividade, sem prejuízo à análise histológica, além de ser de fácil execução. É confortável para o paciente e de grande auxílio ao cirurgião e patologista na localização destas lesões. Consequentemente, este método deve ser mais difundido e utilizado na Medicina.

Em conclusão, a eficácia e viabilidade da marcação foram de bom domínio radiológico, cirúrgico, anatomopatológico, com baixo custo, confortável às pacientes e equipe cirúrgica, de fácil agendamento e maior tempo para a execução entre o procedimento de marcação e a remoção cirúrgica; quanto ao prejuízo ou não na interpretação diagnóstica histopatológica, o método foi muito eficaz não gerando dificuldades diagnósticas; a quantificação da resposta inflamatória à presença de carvão, na maioria dos casos foi em reação inflamatória crônica de grau variável e, em mais da metade, em reação inflamatória aguda, inclusive com focos de abscedação; em relação às lesões-alvo demonstrou que a forma paralesional de distribuição do carvão foi a mais frequente e as lesões malignas infiltrantes são as que têm maior tendência a apresentar distribuição do carvão intralesional.

Recebido em 01/06/2012

Aceito para publicação em 30/07/2012

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhuma

Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Princípios da Cirurgia da Faculdade Evangélica do Paraná/Hospital Universitário Evangélico de Curitiba/ Instituto de Pesquisas Médicas, Curitiba, PR, Brasil.

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  • Endereço para correspondência:
    Teresa Cristina Santos Cavalcanti
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      01 Jun 2012
    • Aceito
      30 Jul 2012
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