Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação eletrofisiológica do sistema auditivo em indivíduos com gagueira desenvolvimental persistente

RESUMO:

Objetivo:

descrever os achados dos exames eletrofisiológicos de indivíduos com gagueira e comparar com indivíduos com desenvolvimento típico.

Métodos:

participaram desta pesquisa 34 indivíduos, de ambos aos gêneros, com idade entre 7 e 31 anos. O grupo pesquisa foi constituído por 13 crianças (G1a) e 4 adultos (G1b) diagnosticadas com gagueira e o grupo controle por 13 crianças (G2a) com bom desempenho acadêmico e 4 adultos (G2b) com desenvolvimento típico. Foi realizada a avaliação dos potenciais auditivos, na varredura de frequência e de duração.

Resultado:

quando comparados os grupos de crianças gagas e controle, foi observado que as crianças gagas apresentaram na varredura de frequência, aumento da latência dos componentes P2, N2 em Cz na orelha direita e N2 e P3 em Fz na orelha esquerda, e diferença na amplitude de P2 e P3 em Cz na orelha direita. Na varredura de duração, houve redução da amplitude dos componentes N2 em Cz e P3 em Fz na orelha direita. Já no grupo de adultos gagos, observou-se na varredura de frequência, aumento da latência no componente P3 em Cz e Fz na orelha direita e amplitude reduzida no P3 em Cz na orelha esquerda, e na varredura de duração, aumento de latência de N2 e P3 em Cz na orelha direita e N2 em Cz na orelha esquerda, quando comparados ao grupo controle.

Conclusão:

há diferenças entre os exames eletrofisiológicos de indivíduos com gagueira comparados aqueles com desenvolvimento típico. No entanto, novos estudos neste âmbito ainda são necessários para que os achados aqui apresentados possam ser confirmados.

DESCRITORES:
Potenciais Evocados Auditivos; Gagueira; Percepção Auditiva

ABSTRACT:

Purpose:

to describe the findings of electrophysiological examinations of individuals who stutter and compare with typically developing individuals.

Methods:

34 subjects participated in this study, both genders, aged between 7 and 31 years. The research group consisted of 13 children (G1a) and 4 adults (G1b) diagnosed with stuttering and the control group of 13 children (G2a) with good academic performance and 4 fluent adults (G2b). The auditory potentials assessment was performed on frequency and duration discrimination tests.

Result:

when compared groups of stuttering children and control group, it was observed that the stuttering children had the scan frequency, increased latencies of P2, N2 components at Cz in the right ear and N2 and P3 at Fz in the left ear, and the difference amplitude P2 and P3 in the right ear Cz. In the scan duration, decreased the amplitude of the N2 and P3 components in Cz Fz in the right ear. In the group of adult stutterers was observed in the frequency sweep, increased latency P3 component at Cz and Fz in the right ear and reduced P3 amplitude at Cz in the left ear, and scan duration, increased latency of N2 Cz and P3 in the right ear and N2 at Cz in the left ear, when compared to the control group.

Conclusion:

there are differences between the electrophysiological examinations of individuals who stutter compared with those with typical development. However, further studies in this area are still needed for the findings presented here can be confirmed.

KEYWORDS:
Auditory Evoked Potentials; Stuttering; Auditory Perception

Introdução

A gagueira é um distúrbio da fala que pode estar relacionada a vários fatores, como a predisposição genética, habilidades motoras da fala, fatores linguísticos, cognitivos, emocionais e ambientais11. Smith A, Kelly E. Stuttering: A dynamic, multifactorial model. In: Curlee RF, Siegel GM. (Org) Nature and treatment of stuttering: New directions. Needham Heights: Allyn & Bacon. 1997. P. 204-17.. Uma fala fluente envolve tanto aspectos orgânicos quanto um sistema nervoso íntegro. A gagueira pode se manifestar durante o processo de desenvolvimento infantil, quando relacionada aos fatores estressantes físicos, como danos cerebrais precoces, traumas ou doenças no nascimento22. Oliveira CMC, Souza HA, Santos AC, Cunha DS. Análise dos fatores de risco para gagueira em crianças disfluentes sem recorrência familial. Rev CEFAC [online]. 2012 [acesso em 2014 abr 24]; 14(6): 1028-35. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v14n6/212-10.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v14n6/21...
, podendo ainda apresentar desenvolvimento da audição de maneira diferente de indivíduos fluentes33. Fox PT, Ingham RJ, Ingham JC, Hirsch TB, Downs JH, Martin C et al. A PET study of the neural systems of stuttering. Nature. 1996;382:158-62.),(44. Howel P, Williams SM. Development of Auditory Sensibility in Children who Stutter and Fluent Children.Ear & Hearing. 2004;25(3):265-73.) .O processamento neurofisiológico adequado da fala exige a coordenação temporal entre a execução das habilidades motoras e o desempenho do processamento cognitivo55. Andrade CRF, Cervane LM, Sassi FC. Relationship between the stuttering severity index and speech rate. Medical Journal. 2003;121(2):81-4., e indivíduos com gagueira submetidos a testes que avaliam o processamento neurológico apresentaram alterações nos aspectos temporais auditivos, linguísticos e motores66. Bosshardt HG, Ballmer W, De Nil LF. Effects of category and rhyme decisions on sentence production. Journal Speech Language Hearing Research. 2002;45(5):844-58.)-(88. Biermann-Ruben K, Salmelin R, Schnitzler A. Right rolandic activation during speech perception in stutterers:a MEG study. Neuroimage. 2005;25(3):793-801..

Os processos neuroaudio­lógicos envolvidos no processamento da fluência podem ser investigados por meio da avaliação do processamento auditivo central99. Schiefer A, Barbosa LMG, Pereira LD. Conside­rações preliminares entre uma possível correlação entre gagueira e os aspectos lingüísticos e auditivos. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;1(1):31-7., que está relacionado a uma série de processos que envolvem predominantemente as estruturas do sistema nervoso central (vias auditivas e córtex). A avaliação do processamento auditivo central permite o diagnóstico do processo gnósico auditivo do indivíduo, e é realizada por meio da aplicação de testes que mostram o desempenho do indivíduo frente à solução de uma tarefa difícil.

Os Potenciais Evocados Auditivos de Longa Latência (PEALL) ou Potenciais Cognitivos (PC) são testes eletrofisiológicos que avaliam as atividades corticais envolvidas nas habilidades de discriminação, integração e atenção do cérebro1010. Mcpherson DL. Late potentials of the auditory system. San Diego: Singular Publishing Group, 1996.. Também revelam a integridade e capacidade do sistema nervoso auditivo central (SNAC)1111. Baran JA, Musiek FE. Behavioral assessment of the central auditory nervous system. In: Rintelmann W. F (Ed). Hearing Assessment. 2nd Ed. Boston: Allyn & Bacon, 1991.),(1212. Schochat E, Matas CG, Sanches SGG, Carvallo RMM, Matas S. Central auditory evaluation in multiple sclerosis: case report. Arquivos de Neuro-Psiquiatria. 2006;64(3):872-6., por isso estes testes têm sido cada vez mais utilizados na investigação da via auditiva de indivíduos com gagueira. Apesar do P300 não indicar com precisão os locais de ativação cerebral, os resultados de estudos demonstraram, até certo ponto, que diferenças no padrão de ativação inter-hemisférica podem ser medidas no pré e pós-tratamento. Além das questões relacionadas à possibilidade do exame diferenciar indivíduos para os quais a terapia se mostra mais efetiva1313. Andrade CRF, Sassi FC, Matas CG, Neves IF, Martins VO. Potenciais evocados auditivos pré e pós-tratamento em indivíduos gagos: estudo piloto. Pró-Fono R Atual Cient. 2007;19(4):401-5.. Portanto, estudos sobre os potenciais cognitivos nesta população devem ser estimulados, a fim de esclarecer possíveis correlações entre os aspectos auditivos e a fluência. Diante do exposto, o presente estudo teve o objetivo de descrever os achados eletrofisiológicos da audição de indivíduos com gagueira e comparar com indivíduos com desenvolvimento típico.

Métodos

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNESP de Marília, São Paulo sob o número 0731/2013. Todos os participantes e os responsáveis foram informados sobre os procedimentos metodológicos e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido antes da realização de qualquer procedimento.

Foi realizado um estudo transversal e de delineamento quantitativo e qualitativo, do tipo analítico de 34 indivíduos com e sem gagueira, de ambos os gêneros, com idade entre 7 e 31 anos.

O grupo experimental foi formado por 13 crianças (G2a) e 4 adultos (G2b) avaliados e atendidos no Laboratório de Estudos da Fluência - LAEF do Centro de Estudos da Educação e da Saúde (CEES) da Universidade Estadual Paulista - FFC - Marília, e o grupo controle foi formado 13 crianças com desenvolvimento típico (G1a) e 4 adultos de desenvolvimento típico (G1b).

Os requisitos de inclusão dos dois grupos experimentais foram: ser falante nativo do português brasileiro e com bom desempenho acadêmico. Os indivíduos com gagueira (G2a e G2b) deveriam apresentar: (1) queixa de gagueira; (2) diagnóstico fonoaudiológico de gagueira desenvolvimental persistente, por profissional especialista da área; (3) mínimo de 3% de disfluências gagas 1414. Riley GD. A stuttering severity instrument for children and adults. SSI-3. 3rd ed. Austin: ProEd; 1994.)-(1616. Bloodstein O. A handbook on stuttering. Chicago: National Easter Seal Society; 1995.; (4) duração mínima de 12 meses das disfluências, e; (5) gagueira classificada no mínimo de grau leve de acordo com o Instrumento de Severidade da Gagueira - SSI-31717. Yairi E, Ambrose NG, Cox N. Genetics of stuttering: a critical review. J Speech Lang Hear Res. 1996;39:771-84.. Para a composição do grupo controle de crianças e adultos fluentes (G1a e G1b), foram seguidos os critérios de inclusão: (1) não apresentar queixa de gagueira atual ou pregressa; (2) histórico familial negativo de gagueira; (3) apresentar menos de 3% de disfluências gagas na avaliação específica.

Para os grupos controle (G1a e G1b), os 17 indivíduos foram pareados de acordo com idade, gênero e nível educacional, com bom desempenho.

Como critérios de exclusão para os grupos foram definidos a presença de outros comprometimentos associados, como fatores biológicos, visuais, além de queixas auditivas, fatores de risco audiológicos e ou perda auditiva, detectados pela equipe especializada, por meio de anamnese com os responsáveis e participantes, inspeção do conduto auditivo externo, timpanometria e audiometria tonal limiar.

Na investigação desses fatores de riscos audiológicos, não foram detectadas alterações em todos os casos, tanto na anamnese, quanto na timpanometria, apresentando curva do tipo A bilateralmente, além de média auditiva tonal compatível com a normalidade 1818. Jerger J. Clinical experience with impedance audiometry. Arch Otolaryngol.1970;92(4):311-24..

Inicialmente, foi realizado o registro audiovisual de uma amostra de fala autoexpressiva dos indivíduos do grupo experimental e controle, composta de 200 sílabas fluentes, com o auxílio de uma filmadora digital Sony e tripé. A transcrição e análise da fala foram realizadas de acordo com o Teste de Linguagem Infantil - Fluência (ABFW)77. Andrade CRF. Abordagem neurolingüística e motora da gagueira. In: Ferreira LP; Befi-Lopes DM; Limongi SCO. Tratado de Fonoaudiologia. São Paulo: Roca, 2004. P. 1001-16., que considera a tipologia das disfluências, a velocidade de fala e a frequência das rupturas. Posteriormente, o Instrumento de Severidade da Gagueira (SSI-4)1919. Riley G. Stuttering severity instrument for young children (SSI-4) (4°ed.). Austin, TX: Pro-Ed. 2009.) foi aplicado nos participantes do grupo experimental para classificar o grau de comprometimento da gagueira em leve, moderada, severa ou muito severa.

No segundo momento, para a avaliação dos PEALL, foi utilizado o equipamento Biologic Navigator Pro e registrado mediante a utilização de cinco eletrodos descartáveis posicionados em Fz e Cz em referência ao lóbulo direito (A2) e esquerdo (A1), utilizando-se os dois canais de registro do equipamento, o eletrodo terra foi posicionado em Fpz. A impedância foi mantida em um nível inferior a 5 KW.

Para o registro do P300, os componentes foram pesquisados em duas varreduras, ou seja, primeiramente foi eliciado para estímulos tonais (tone burst) diferindo quanto à frequência (estímulo frequente: frequência de 750Hz e estímulo raro: frequência de 1000Hz), e após, estímulos diferindo quanto à duração (estímulo frequente: 100ms e estímulo raro: 50ms; ambos na frequência de 1000Hz).

Tanto os estímulos diferindo quanto à frequência, como quanto à duração foram apresentados aleatoriamente, num paradigma oddball, numa velocidade de 1.1 estímulos por segundo, com uma probabilidade de ocorrência do estímulo raro de 20% do total de 250 estímulos. O tempo de análise das ondas foi de 500ms, com filtro de 0,5 a 30 Hz e sensibilidade de 50.000 V e polaridade alternada.

O indivíduo foi orientado a realizar uma tarefa ativa, prestando atenção e discriminando os estímulos, nomeando-os como "fino" durante os estímulos de frequência e "curto" para os de duração.

As ondas N1, P2, N2 e P3 foram identificadas por meios dos critérios estabelecidos por Junqueira e Colafêmina 2020. Junqueira CAO, Colafêmina JF. Investigação da estabilidade inter e intra-examinador na identificação do P300 auditivo: análise de erros. Rev Bras Otorrinolaringol. 2002;68(4):468-78., adaptados.

Para a análise estatística dos dados foi realizada estatística descritiva (média e desvio padrão) das ondas quanto a latência (ms) e amplitude (µV) e exploratória (Teste "t" de Student) para comparação entre os grupos, utilizando-se o software STATISTICA 7.0. O critério de determinação de significância adotado foi o nível de 5% (p * ≤ 0,05).

Resultados

Na Tabela 1 estão representados os valores descritivos e inferencial das variáveis estudadas na varredura de frequência do PEALL, do grupo experimental de crianças (G2a) e do grupo controle de crianças (G1a).

Tabela 1:
Análise estatística descritiva e exploratória do potencial cognitivo quanto às latências e amplitudes absolutas dos componentes N1, P2, N2 e P3, em ms, e a interamplitude N2-P3, para o registro em Cz e Fz do G1 (a) criança e G2 (a) criança na varredura de frequência

Os resultados obtidos na pesquisa do PEALL nos grupos de crianças (G1a e G2a) em relação à pesquisa de frequência, mostraram aumento na latência dos componentes P2, N2 em Cz na orelha direita e N2 e P3 em Fz na orelha esquerda, no grupo experimental (G2a) quando comparados ao grupo controle (G1a). Em relação à amplitude dos componentes do PEALL, observou-se diferença em P2 e P3 em Cz na orelha direita, no G2a quando comparado ao G1a (Tabela 1).

Na Tabela 2 estão representados os valores descritivos e inferencial das variáveis estudadas na varredura de duração do PEALL, do grupo experimental de crianças (G2a) e do grupo controle de crianças (G1a).

Tabela 2:
Análise estatística descritiva e exploratória do potencial cognitivo quanto às latências e amplitudes absolutas dos componentes N1, P2, N2 e P3, em ms, e a interamplitude N2-P3, para o registro em Cz e Fz do GI(a)criança e GII(a)criança na varredura de duração

Quanto aos resultados obtidos em relação à pesquisa de duração, quando comparados os grupos de criança (G1a e G2a), houve redução nas amplitudes dos componentes N2 em Cz e P3 em Fz na orelha direita no G2a (Tabela 2).

Na Tabela 3 estão representados os valores descritivos e inferencial das variáveis estudadas na varredura de frequência do PEALL, do grupo experimental de adultos (G2b) e do grupo controle de adultos (G1b).

Tabela 3:
Análise estatística descritiva e exploratória do potencial cognitivo, quanto às latências e amplitudes absolutas dos componentes N1,P2 ,N2 e P3, em ms, e a interamplitude N2-P3, para o registro em Cz e Fz do GIb adulto e GIIb adulto na varredura de frequência.

Na pesquisa do PEALL nos grupos de adultos (G1b e G2b) em relação à pesquisa de frequência foi observado aumento na latência de P3 em Cz e Fz na orelha direita, no grupo G2b em comparação ao G1b. Em relação à amplitude dos componentes do PEALL, observou-se redução em P3 em Cz na orelha esquerda, quando comparados os dois grupos (G1b e G2b) (Tabela 3).

Na Tabela 4 estão representados os valores descritivos e inferencial das variáveis estudadas na varredura de duração do PEALL, do grupo experimental de adultos (G2b) e do grupo controle de adultos (G1b).

Tabela 4:
Análise estatística descritiva e exploratória do potencial cognitivo quanto às latências e amplitudes absolutas dos componentes N1, P2 ,N2 e P3, em ms, e a interamplitude N2-P3, para o registro em Cz e Fz do GI(b) adulto e GII(b) adulto na varredura de duração

Quanto aos resultados obtidos em relação à pesquisa de duração, quando comparados os grupos de adultos (G1b e G2b), houve aumento nas latências de N2 e P3 em Cz na orelha direita, no grupo G2b (Tabela 4).

Discussão

Neste estudo, os processos neuroaudio­lógicos envolvidos no processamento da fluência foram investigados por meio da avaliação dos potenciais evocados auditivos. Quando submetidos aos testes que avaliaram o processamento neurológico nos aspectos auditivos e linguísticos 77. Andrade CRF. Abordagem neurolingüística e motora da gagueira. In: Ferreira LP; Befi-Lopes DM; Limongi SCO. Tratado de Fonoaudiologia. São Paulo: Roca, 2004. P. 1001-16.),(88. Biermann-Ruben K, Salmelin R, Schnitzler A. Right rolandic activation during speech perception in stutterers:a MEG study. Neuroimage. 2005;25(3):793-801.) os indivíduos com gagueira apresentaram dificuldades neurofisiológicas.

Têm sido descritas na literatura, diferenças funcionais em gagos no padrão de atividade hemisférica em resposta a estímulos linguísticos e não linguísticos, diferenças de respostas neuro-magnéticas e na medida de amplitude do P300 2121. Salmelin R, Schnitzler A, Scmitz F, Jancke L, Witte OW, Freund HJ. Functional organization of the auditory cortex is different in stutterers and fluent speakers. Neuroreport. 1998;13(9-10):2225-9.),(2222. Morgan MD, Cranford JL, Burk K. P300 event-related potentials in stutterers and nonstutterers. Journal Speech Language Hearing Research. 1997;40(6):1334-40..

Quando analisado os grupos de crianças não gagas (G1a) e gagas (G2a) diferenças foram observadas quanto à amplitude de P3, independente da orelha estimulada. Já os grupos de adultos não gagos (GI1b) e gagos (G2b), diferenças na amplitude de P3, menor quando estimulada à orelha direita foi identificada para captação da atividade elétrica na linha mediana do córtex (Cz). Potenciais Evocados Auditivos são gerados a partir da ativação das vias tálamo-corticais, córtex auditivo primário e córtex. Em geral, os picos de latência dos potenciais evocados auditivos de pessoas gagas diferem de pessoas não gagas 2323. Eggermont JJ, Ponton CW. The neurophysiology of auditory perception: From single units to evoked potentials. Audiology and Neuro-Otology. 2002;7(2):71-99.)-(2525. Angrisani RMG, Matas CG, Neves IF, Sassi FC, Andrade CRF. Avaliação eletrofisiológica da audição em gagos, pré e pós terapia fonoaudiológica. Pró-Fono R Atual Cient. 2009;21(2):95-100..

O componente P2 é um potencial exógeno e sua geração está relacionada às respostas do sistema auditivo central aos parâmetros físicos e acústicos do estímulo auditivo e representam a ativação do córtex auditivo supratemporal laterofrontal. Já o N2 é um potencial misto que possui características relativas às respostas exógena e endógena envolvidas na recepção e interpretação das informações físicas e acústicas do estímulo auditivo. Este componente sofre influencias da tarefa de discriminação e de estado de atenção e representa a atividade do córtex auditivo supratemporal 2626. Hansen JC, Hillyard SA. Temporal dynamics of human auditory selective attention. Psychophysiology. 1988;25:316-29.)-(2828. Hall J. Handbook of auditory evoked responses. Boston: Allyn & Bacon, 2006.). Nesse estudo estão alterados no grupo de crianças (G1b) e adultos (G2b) gagos, os componentes P3 e N2 quanto à latência e amplitude. Quando pesquisados a partir de estímulos não linguísticos utilizando-se paradigma oddball as respostas eletrofisiológicas traduzem as habilidades de atenção e discriminação auditiva. Especialmente em pacientes adultos gagos, a percepção das características acústicas é realizada com menor precisão e num tempo mais longo de reação ao estímulo alvo em decorrência de um processamento não-linguístico deficiente, o que resulta em padrões anormais de forma de ondas como observado neste estudo em adultos e crianças gagas 2929. Hampton A, Weber-Fox C. Nonlinguistic auditory processing in adults who stutter. Journal of Fluency Disorders. 2008;33(4):253-330.),(3030. Preibisch C, Raab P, Neumann K, Euler HA, Von Gudenberg AW, Gall V et al. Event-related fMRI for the suppression of speech-associated artifacts in stuttering. NeuroImage. 2003;19(3):1076-84. . O P3 é gerado a partir de características endógenas, relacionado com a cognição, mais especificamente à tarefa de identificação e nomeação do estímulo2323. Eggermont JJ, Ponton CW. The neurophysiology of auditory perception: From single units to evoked potentials. Audiology and Neuro-Otology. 2002;7(2):71-99.. Apesar do P300 não indicar com precisão os locais de ativação cerebral por estar relacionados ao córtex auditivo associativo2828. Hall J. Handbook of auditory evoked responses. Boston: Allyn & Bacon, 2006. e ser gerado a partir da ativação de diferentes áreas do córtex, os resultados desses estudos mostram as diferenças no padrão de ativação inter-hemisférica entre gagos e não gagos22. Oliveira CMC, Souza HA, Santos AC, Cunha DS. Análise dos fatores de risco para gagueira em crianças disfluentes sem recorrência familial. Rev CEFAC [online]. 2012 [acesso em 2014 abr 24]; 14(6): 1028-35. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v14n6/212-10.pdf
http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v14n6/21...
),(2525. Angrisani RMG, Matas CG, Neves IF, Sassi FC, Andrade CRF. Avaliação eletrofisiológica da audição em gagos, pré e pós terapia fonoaudiológica. Pró-Fono R Atual Cient. 2009;21(2):95-100.),(2929. Hampton A, Weber-Fox C. Nonlinguistic auditory processing in adults who stutter. Journal of Fluency Disorders. 2008;33(4):253-330.. Estudos2424. Andrade CRF, Sassi FC, Matas CG, Neves IF, Martins VO. Potenciais evocados auditivos pré e pós-tratamento em indivíduos gagos: estudo piloto. Pró-Fono R Atual Cient. 2007;19(4):401-5.),(2525. Angrisani RMG, Matas CG, Neves IF, Sassi FC, Andrade CRF. Avaliação eletrofisiológica da audição em gagos, pré e pós terapia fonoaudiológica. Pró-Fono R Atual Cient. 2009;21(2):95-100. mostraram diferenças especialmente em relação à latência do componente P3 em gagos e não gagos.

Conclusão

Há diferenças entre os exames eletrofisiológicos de indivíduos com gagueira comparados aos com desenvolvimento típico. No entanto, novos estudos neste âmbito ainda são necessários para que os achados aqui apresentados possam ser confirmados e permitam evoluir para novas propostas de avaliação da gagueira.

Referências

  • 1
    Smith A, Kelly E. Stuttering: A dynamic, multifactorial model. In: Curlee RF, Siegel GM. (Org) Nature and treatment of stuttering: New directions. Needham Heights: Allyn & Bacon. 1997. P. 204-17.
  • 2
    Oliveira CMC, Souza HA, Santos AC, Cunha DS. Análise dos fatores de risco para gagueira em crianças disfluentes sem recorrência familial. Rev CEFAC [online]. 2012 [acesso em 2014 abr 24]; 14(6): 1028-35. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v14n6/212-10.pdf
    » http://www.scielo.br/pdf/rcefac/v14n6/212-10.pdf
  • 3
    Fox PT, Ingham RJ, Ingham JC, Hirsch TB, Downs JH, Martin C et al. A PET study of the neural systems of stuttering. Nature. 1996;382:158-62.
  • 4
    Howel P, Williams SM. Development of Auditory Sensibility in Children who Stutter and Fluent Children.Ear & Hearing. 2004;25(3):265-73.
  • 5
    Andrade CRF, Cervane LM, Sassi FC. Relationship between the stuttering severity index and speech rate. Medical Journal. 2003;121(2):81-4.
  • 6
    Bosshardt HG, Ballmer W, De Nil LF. Effects of category and rhyme decisions on sentence production. Journal Speech Language Hearing Research. 2002;45(5):844-58.
  • 7
    Andrade CRF. Abordagem neurolingüística e motora da gagueira. In: Ferreira LP; Befi-Lopes DM; Limongi SCO. Tratado de Fonoaudiologia. São Paulo: Roca, 2004. P. 1001-16.
  • 8
    Biermann-Ruben K, Salmelin R, Schnitzler A. Right rolandic activation during speech perception in stutterers:a MEG study. Neuroimage. 2005;25(3):793-801.
  • 9
    Schiefer A, Barbosa LMG, Pereira LD. Conside­rações preliminares entre uma possível correlação entre gagueira e os aspectos lingüísticos e auditivos. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;1(1):31-7.
  • 10
    Mcpherson DL. Late potentials of the auditory system. San Diego: Singular Publishing Group, 1996.
  • 11
    Baran JA, Musiek FE. Behavioral assessment of the central auditory nervous system. In: Rintelmann W. F (Ed). Hearing Assessment. 2nd Ed. Boston: Allyn & Bacon, 1991.
  • 12
    Schochat E, Matas CG, Sanches SGG, Carvallo RMM, Matas S. Central auditory evaluation in multiple sclerosis: case report. Arquivos de Neuro-Psiquiatria. 2006;64(3):872-6.
  • 13
    Andrade CRF, Sassi FC, Matas CG, Neves IF, Martins VO. Potenciais evocados auditivos pré e pós-tratamento em indivíduos gagos: estudo piloto. Pró-Fono R Atual Cient. 2007;19(4):401-5.
  • 14
    Riley GD. A stuttering severity instrument for children and adults. SSI-3. 3rd ed. Austin: ProEd; 1994.
  • 15
    Yairi E, Ambrose N. Onset of stuttering in preschool children: select factors. J Speech Lang Hear Res. 1992;35(4):783-8.
  • 16
    Bloodstein O. A handbook on stuttering. Chicago: National Easter Seal Society; 1995.
  • 17
    Yairi E, Ambrose NG, Cox N. Genetics of stuttering: a critical review. J Speech Lang Hear Res. 1996;39:771-84.
  • 18
    Jerger J. Clinical experience with impedance audiometry. Arch Otolaryngol.1970;92(4):311-24.
  • 19
    Riley G. Stuttering severity instrument for young children (SSI-4) (4°ed.). Austin, TX: Pro-Ed. 2009.
  • 20
    Junqueira CAO, Colafêmina JF. Investigação da estabilidade inter e intra-examinador na identificação do P300 auditivo: análise de erros. Rev Bras Otorrinolaringol. 2002;68(4):468-78.
  • 21
    Salmelin R, Schnitzler A, Scmitz F, Jancke L, Witte OW, Freund HJ. Functional organization of the auditory cortex is different in stutterers and fluent speakers. Neuroreport. 1998;13(9-10):2225-9.
  • 22
    Morgan MD, Cranford JL, Burk K. P300 event-related potentials in stutterers and nonstutterers. Journal Speech Language Hearing Research. 1997;40(6):1334-40.
  • 23
    Eggermont JJ, Ponton CW. The neurophysiology of auditory perception: From single units to evoked potentials. Audiology and Neuro-Otology. 2002;7(2):71-99.
  • 24
    Andrade CRF, Sassi FC, Matas CG, Neves IF, Martins VO. Potenciais evocados auditivos pré e pós-tratamento em indivíduos gagos: estudo piloto. Pró-Fono R Atual Cient. 2007;19(4):401-5.
  • 25
    Angrisani RMG, Matas CG, Neves IF, Sassi FC, Andrade CRF. Avaliação eletrofisiológica da audição em gagos, pré e pós terapia fonoaudiológica. Pró-Fono R Atual Cient. 2009;21(2):95-100.
  • 26
    Hansen JC, Hillyard SA. Temporal dynamics of human auditory selective attention. Psychophysiology. 1988;25:316-29.
  • 27
    Oades RD, Dittmann-Balcar A, Schepker R, Eggers C, Zerbin D. Auditory event-related potentials (ERPs) and mismatch negativity (MMN) in healthy children and those with attention-deficit or tourette/tic symptoms. Biological Psychology. 1996;12:163-85.
  • 28
    Hall J. Handbook of auditory evoked responses. Boston: Allyn & Bacon, 2006.
  • 29
    Hampton A, Weber-Fox C. Nonlinguistic auditory processing in adults who stutter. Journal of Fluency Disorders. 2008;33(4):253-330.
  • 30
    Preibisch C, Raab P, Neumann K, Euler HA, Von Gudenberg AW, Gall V et al. Event-related fMRI for the suppression of speech-associated artifacts in stuttering. NeuroImage. 2003;19(3):1076-84.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    24 Maio 2014
  • Aceito
    13 Nov 2014
ABRAMO Associação Brasileira de Motricidade Orofacial Rua Uruguaiana, 516, Cep 13026-001 Campinas SP Brasil, Tel.: +55 19 3254-0342 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistacefac@cefac.br