Acessibilidade / Reportar erro

Tempo máximo fonatório de /e/ e /ė/ não-vozeado e sua relação com índice de massa corporal e sexo em crianças

RESUMO

Objetivo:

caracterizar e associar tempo máximo fonatório do /e/ vozeado e de /e/ não vozeado (/ė/), índice de massa corporal e sexo em crianças.

Métodos:

estudo transversal observacional analítico de campo e quantitativo do qual participaram 102 crianças com idades entre oito e 12 anos (média de 9,66 anos), sendo 53 (51,96%) meninas e 49 (48,04%) meninos. Os sujeitos passaram por triagem auditiva, avaliação antropométrica e coleta dos tempos máximos fonatórios de /e/ e /ė/. Os dados foram analisados por meio dos testes não-paramétricos Mann-Whitney e Correlação de Spearman, com nível de significância de 5%.

Resultados:

não houve diferença dos tempos máximos fonatórios de /e/, /ė/ e relação ė/e em função do índice de massa corporal e faixa etária, porém crianças do sexo masculino apresentaram tempo máximo fonatório de /e/ significantemente maior do que as meninas. Não foi encontrada correlação entre tempo máximo fonatório e índice de massa corporal.

Conclusão:

não houve diferença entre tempo máximo fonatório de /ė/, /e/ e relação ė/e, conforme faixa etária e índice de massa corporal, bem como o índice de massa corporal e os tempos máximos fonatórios não se correlacionaram, evidenciando homogeneidade entre as medidas dentro do grupo, sem influência do índice de massa corporal sobre os tempos máximos fonatórios. Em relação ao sexo, os meninos apresentaram tempo máximo fonatório de /e/ maior do que as meninas e apenas as crianças de oito anos apresentaram os TMF tempo máximo fonatório dentro do esperado.

Descritores:
Avaliação em Saúde; Criança; Estado Nutricional; Índice de Massa Corporal; Voz

ABSTRACT

Purpose:

to characterize and associate children's maximum phonation time of voiced /e/ and voiceless /e/ (/ė/), body mass index and gender.

Methods:

field and quantitative analytical observational cross-sectional study attended by 102 children aged between eight and 12 years (mean 9.66 years), being 53 (51.96%) girls and 49 (48.04%) boys. The subjects have gone through hearing screening, anthropometric assessment and collection of the maximum phonation times of /e/, /ė/. Data were analyzed using non-parametric Mann-Whitney and Spearman's rank correlation coefficient tests, with 5% significance level.

Results:

there was no difference of maximum phonation times of /e/, /ė/, or the relationship between them as a function of body mass index and age, but male children showed maximum phonation time significantly of /e/ higher than girls. No correlation was found between maximum phonation time and body mass index.

Conclusion:

there was no difference between maximum phonation time of /ė/, /e/ and ė/e ratio, according to age and body mass index, and body mass index and maximum phonation time were not correlated, showing homogeneity between measures within the group without influence of body mass index on the maximum phonation time. As for gender, boys presented maximum phonation time of /e/ higher than girls and only children aged eight years had maximum phonation time as expected.

Keywords:
Health Assessment; Child; Nutritional Status; Body Mass Index; Voice

Introdução

Na prática clínica fonoaudiológica, uma das formas de avaliação da voz são os tempos máximos fonatórios (TMF) que se tratam da sustentação de emissões vozeadas ou sonoras (com presença de vibração/sonorização glótica) e não vozeadas, áfonas ou surdas (sem participação de fonte glótica)11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.)-(44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72.. Uma medida de fácil aplicação é a relação entre TMF/e/ não vozeado (TMF/ė/) e TMF/e/ vozeado (relação ė/e), que tem por objetivo verificar a relação entre a eficiência glótica e o controle respiratório, evidenciando a hiperfunção glótica quando presente, sendo que o TMF/ė/ isoladamente fornece dados sobre a habilidade de controlar a saída progressiva do ar pulmonar sem auxílio das pregas vocais11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.),(44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72.. De acordo com a literatura, o TMF vozeado deve ser aproximadamente o mesmo do TMF não vozeado, resultando em uma relação em torno de um11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15..

Estudos mostram que podem haver variáveis intervenientes na realização dos TMF, dentre elas destaca-se o índice de massa corporal (IMC) e o sexo55. Almeida CCB, Zeferino AMB, Barros-Filho AAB. Crescimento e função pulmonar. Rev Cienc Med. 1999;8(3):85-92.),(66. Beber BC, Cielo CA, Siqueira MA. Lesões de borda de pregas vocais e tempos máximos de fonação. Rev CEFAC. 2009;11(1):134-41.. Em crianças, diferentemente dos adultos, não costuma haver diferença na realização dos TMF visto que a configuração glótica é igual em ambos os sexos77. Behlau M. Voz: o livro do especialista. (1st ed.). Rio de Janeiro: Revinter, 2001., porém, há um trabalho que mostra que a força pulmonar de meninos é maior do que a de meninas55. Almeida CCB, Zeferino AMB, Barros-Filho AAB. Crescimento e função pulmonar. Rev Cienc Med. 1999;8(3):85-92..

As diferenças antropométricas, por sua vez, podem influenciar o desempenho respiratório e a qualidade vocal devido ao acúmulo de tecido adiposo na rinofaringe, orofaringe, laringe, língua e palato mole, podendo ocorrer prejuízo no desempenho e qualidade vocal88. Cunha MGB, Passerotti GH, Weber R, Zilberstein B, Cecconello I. Voice Feature Characteristic in Morbid Obese Population. Obes Surg. 2011;21(3):340-4.. Além disso, o acúmulo de tecido adiposo na parede abdominal e torácica, por produzir peso excessivo no diafragma, pode alterar sua movimentação e o padrão respiratório, comprometendo a qualidade vocal. Tal acúmulo de gordura pode influenciar a coordenação pneumofonoarticulatória, promovendo um desequilíbrio entre os níveis respiratório, glótico e ressonantal/articulatório99. Rasslan Z, Saad Júnior R, Stirbulov R, Fabbri RMA, Lima CAC. Avaliação da função pulmonar na obesidade graus I e II. J Bras Pneumol. 2004;30(6):508-14.)-(1212. Silvani IOFDM, Werlang A, Agne T. Avaliação respiratória em crianças obesas e não obesas. FisiSenectus. 2013;1(2):65-72..

A literatura é escassa referente a estudos que mostrem a influência do IMC e do sexo sobre o desempenho dos níveis respiratório e fonatório, e sobre o controle da saída progressiva do ar pulmonar sem auxílio das pregas vocais por meio da descontração sustentada da musculatura respiratória em crianças. Assim, torna-se necessário ampliar as pesquisas para conhecer as possíveis influências dessas variáveis sobre a voz infantil.

Considerando o exposto, o presente estudo teve como objetivo caracterizar e associar o TMF/e/, o TMF/ė/, o IMC e o sexo em crianças.

Métodos

O estudo foi transversal observacional analítico de campo e quantitativo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Maria sob o número 245.208. Os esclarecimentos necessários sobre a pesquisa foram fornecidos ao Secretário Municipal de Educação, que assinou o Termo de Autorização Institucional (TAI). Ainda, antes da coleta de dados, os pais ou responsáveis pelos participantes foram convidados e ler e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Para selecionar a escola municipal, foi realizado sorteio randomizado, no qual foram dispostos os nomes das escolas autorizadas pela Secretaria Municipal de Educação do município por ordem alfabética e, posteriormente, realizou-se sorteio de uma escola-alvo para o trabalho. Após, todas as crianças da escola selecionada foram convidadas a participar da pesquisa, conforme os critérios de seleção da amostra.

Os critérios de inclusão foram: crianças entre oito e 12 anos de idade (faixa etária de crianças considerando a idade mínima cujas avaliações pudessem ser bem compreendidas e executadas); ambos os sexos; assinatura do TCLE pelos responsáveis; e IMC acima de 18,5Kg/m22. Modolo DJ, Beraldinelle R, Brasolotto AG. Relação entre tempo máximo de fonação, estatura e idade em crianças de 8 a 10 anos. In: Anais do 17º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia; 21 a 24 out 2009; Salvador, Brasil. Brasília: Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia; 2009 [acesso em: 17 julho 2014]. Disponível em: http://www.sbfa.org.br/portal/anais2009/resumos/R1541-1.pdf ., pois valores inferiores são considerados "abaixo do peso" ou "desnutrição". Foram excluídas as crianças cujos responsáveis relatassem presença de afecções laríngeas, doenças neurológicas, gástricas ou respiratórias; histórico de terapia fonoaudiológica ou aula de canto prévias, por possibilitar conhecimento prévio sobre a voz; que apresentassem perda auditiva detectada na triagem audiológica, respiração oral, gripe e/ou afecções respiratórias no dia das avaliações; e que estivessem no estágio três ou superior de desenvolvimento puberal, buscando-se excluir o período de muda vocal. Para aplicar os critérios de inclusão e de exclusão, os pais responderam a um questionário de triagem e as crianças passaram pela avaliação antropométrica e triagem auditiva.

Para o cálculo do IMC, foi realizada a avaliação antropométrica, que consistiu na pesagem das crianças descalças, vestindo roupas leves, em uma balança digital Magna 150kg - G-Life. Para a mensuração da estatura, as crianças foram colocadas descalças, em posição ereta, encostadas em uma superfície plana vertical, braços pendentes com as mãos espalmadas sobre as coxas, os calcanhares unidos e as pontas dos pés afastadas, formando ângulo de 60º, joelhos em contato, cabeça ajustada ao plano de Frankfurt e em inspiração profunda. Utilizou-se um estadiômetro (portátil da marca Sanny, com precisão de milímetro), cujo cursor foi rebaixado lentamente até tocar o topo da cabeça em sua parte média, sem empurrá-la para baixo. O cursor foi fixado e a leitura da régua foi realizada até o milímetro mais próximo, registrando-se o escore. A altura foi verificada em tomada única. A partir desses dados, calculou-se o IMC, dividindo-se o peso em quilogramas (kg) pela altura em metros (m) ao quadrado1313. Organização Mundial da Saúde. Programas e projetos. Obesidade e sobrepeso. 2007. World Health Organization [acesso em: 18 fev 2014]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs311/en/índex.html
http://www.who.int/mediacentre/factsheet...
. O diagnóstico do IMC foi estabelecido por meio do valor do IMC encontrado para cada criança e levado à distribuição nas curvas de Escore Z. Considera-se, para crianças de cinco a 19 anos de idade, o escore Z>-2 e ≤+1 eutrófica; escore Z>+1e ≤+2 sobrepeso; e >+2 obeso1313. Organização Mundial da Saúde. Programas e projetos. Obesidade e sobrepeso. 2007. World Health Organization [acesso em: 18 fev 2014]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs311/en/índex.html
http://www.who.int/mediacentre/factsheet...
.

A avaliação do desenvolvimento puberal foi realizada por meio de uma consulta pediátrica, onde a médica aplicou um instrumento de autoavaliação composto por pranchas, que continham os desenhos específicos para o sexo dos diferentes estádios puberais de Tanner (mamas e pêlos pubianos para meninas; genitais e pêlos pubianos para meninos) para que o indivíduo indicasse qual o seu estádio atual de maturação.Para os dois sexos, o estágio 1 de Tanner caracteriza-se por ausência de sinais puberais, enquanto no estágio 5 de Tanner o indivíduo encontra-se com desenvolvimento puberal completo1414. Azevedo JCV, Brasil LMP, Macedo TBMA, Pedrosa LFC, Arrais LF. Comparação entre avaliação objetiva e autoavaliação da maturação sexual em crianças e adolescentes. J Pediatr. 2009;85(2):135-42..

A triagem auditiva foi realizada por meio de varredura dos tons puros nas frequências de 500, 1000, 2000 e 4000Hz a 20dB, somente pela via aérea, com audiômetro Amplivox, modelo A260/2011. O procedimento foi realizado em uma sala silenciosa na própria escola, com nível de ruído abaixo de 50dB, verificado por meio do medidor de pressão sonora Instrutherm, modelo Dec-480. As crianças que não responderam ao tom puro de 25dB foram retestadas em outros dias e, nos casos em que novamente não houve resposta, foram encaminhadas para avaliação auditiva completa e excluídas da pesquisa.

Das 130 crianças que passaram pela amostragem, excluíram-se 15 pela não aderência dos responsáveis ao TCLE; cinco pelo estágio três ou superior do desenvolvimento puberal; cinco por relato por parte dos pais de respiração oral diagnosticada e três por presença de resfriado no dia das avaliações. Assim, a amostra constituiu-se de 102 crianças, com idades entre oito e 12 anos (média de idade de 9 anos e 7 meses, das quais oito crianças possuíam oito anos, trinta e uma crianças com nove anos, vinte e seis crianças com dez anos, vinte e uma crianças com 11 anos e seis crianças com 12 anos) sendo 53 (51,96%) meninas e 49 (48,04%) meninos.

A coleta dos TMF foi realizada na própria escola, em sala silenciosa (com ruído ambiental inferior a 50dB), e as crianças foram orientadas a emitir em posição ortostática e de forma sustentada o TMF/e/ e posteriormente realizar o TMF/ė/ após inspiração profunda. O TMF/e/ deveria ser emitido em pitch e loudness habituais, o TMF/ė/ deveria ser emitido da mesma forma, porém, sem som. Cada emissão foi realizada pelas crianças por três vezes, cronometradas em segundos (cronômetro Stop Watch modelo VL512), sendo considerada como dado a emissão de maior valor para cada TMF. Para estabelecimento da relação ė/e, foi dividido o maior valor em segundos do TMF/ė/ pelo maior valor em segundos do TMF/e/11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72..

O valor esperado para o TMF/ė/ de adultos é de 16 a 18s11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36., sendo que valores inferiores são sugestivos de falta de controle expiratório à fonação e superiores sugerem controle do fluxo expiratório melhor do que o esperado11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.. Para crianças, não há valores de referência; entretanto para o TMF/e/ e vogais em geral a normalidade é de um segundo por ano de vida77. Behlau M. Voz: o livro do especialista. (1st ed.). Rio de Janeiro: Revinter, 2001., sendo que valores inferiores sugerem escape aéreo à fonação e superiores sugerem hipertensão glótica à fonação33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.),(77. Behlau M. Voz: o livro do especialista. (1st ed.). Rio de Janeiro: Revinter, 2001.. Na relação ė/e, espera-se para adultos valores entre 0,8 e 1,2. Valores acima de 1,2 sugerem escape aéreo à fonação e abaixo de 0,8 sugerem hipertensão glótica11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.),(44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72..

Os dados foram tabulados e as variáveis foram analisadas estatisticamente por meio dos testes não-paramétricos Mann-Whitney e Correlação de Spearman, com nível de significância de 5%.

Resultados

Na Tabela 1, observam-se as médias por faixa etária das variáveis TMF/ė/, TMF/e/ e relação ė/e.

Tabela 1:
Análise descritiva de tempo máximo de fonação de /ė/, de /e/ e relação ė/e em função da idade das crianças

A Tabela 2 mostra os TMF/ė/, TMF/e/ e relação ė/e em função do sexo.

Tabela 2:
Análise do índice de massa corporal, tempo máximo de fonação de /ė/, de /e/ e relação ė/e em função do sexo das crianças

Observam-se os TMF/e/, TMF/ė/ e a relação ė/e em função do IMC na Tabela 3.

Tabela 3:
Análise de tempo máximo de fonação de /ė/, de /e/ e relação ė/e em função do índice de massa corporal das crianças

As correlações entre IMC e os TMF/e/, TMF/ė/ e a relação ė/e podem ser visualizadas na Tabela 4.

Tabela 4:
Correlação entre índice de massa corporal, tempo máximo de fonação de /ė/, de /e/ e relação ė/e em crianças

Discussão

A emissão do TMF/ė/ é realizada com a mesma posição articulatória da vogal /e/, porém sem vibração de pregas vocais, apenas com a saída sustentada do ar, sem qualquer tipo de ruído, evidenciando o controle respiratório11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.),(44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72.. Por não possuir obstrução articulatória em sua emissão, é considerada a emissão não vozeada mais adequada para se avaliar o controle expiratório da saída progressiva do ar para a fonação11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.),(44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72..

Assim, a relação entre o TMF/ė/, que avalia o desempenho do nível respiratório, e o TMF/e/ que, por se tratar de um fonema vozeado, possibilita verificar a eficiência glótica, avalia a interação entre os níveis glótico e respiratório11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.),(1515. Ferreira FV, Cielo CA, Trevisan ME. Força muscular respiratória, postural corporal, intensidade vocal e tempos máximos de fonação na doença de Parkinson. Rev CEFAC. 2012;14(2):161-8.),(1616. Christmann MK, Scherer TM, Cielo CA, Hoffmann CF. Tempo máximo de fonação de futuros profissionais da voz. Rev CEFAC. 2013;15(3):622-30.. Nesta pesquisa, não houve diferença entre as faixas etárias para o TMF/ė/, o TMF/e/ e a relação ė/e.

Para o TMF/ė/ nos adultos, a única referência teórica propõe a normalidade entre 16 e 18s11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.. No entanto, pesquisa de campo encontrou média de TMF/ė/ de 10,43s para mulheres adultas saudáveis44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72.. Não há trabalhos nacionais e nem internacionais que tenham avaliado os TMF/ė/ e TMF/e/ em crianças, porém, a literatura propõe que os TMF de vogais sejam de um segundo para cada ano de idade22. Modolo DJ, Beraldinelle R, Brasolotto AG. Relação entre tempo máximo de fonação, estatura e idade em crianças de 8 a 10 anos. In: Anais do 17º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia; 21 a 24 out 2009; Salvador, Brasil. Brasília: Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia; 2009 [acesso em: 17 julho 2014]. Disponível em: http://www.sbfa.org.br/portal/anais2009/resumos/R1541-1.pdf .),(77. Behlau M. Voz: o livro do especialista. (1st ed.). Rio de Janeiro: Revinter, 2001..

No presente estudo, as médias de TMF/ė/ encontraram-se rebaixadas para as faixas etárias de nove, dez, 11 e 12 anos; e, para o TMF/e/, mostraram-se abaixo do esperado em crianças de 11 e 12 anos. Como não houve diferença estatística entre os valores de IMC, este trabalho pode representar uma contribuição na direção da busca de valores de referência para crianças nas faixas etárias estudadas. Evidentemente, faz-se necessário maior número de estudos acerca desses aspectos, uma vez que tais resultados podem ter ocorrido devido à incoordenação pneumofonoarticulatória comum em crianças77. Behlau M. Voz: o livro do especialista. (1st ed.). Rio de Janeiro: Revinter, 2001., ou mesmo, serem achados eventuais, visto que não há apoio na literatura com outros trabalhos que tenham pesquisado especificamente os TMF/ė/ TMF/e/ na população da mesma faixa etária. Além disso, a comparação com outras relações entre fonemas não vozeados com fonemas vozeado, como a relação entre o TMF/s/ e TMF/z/, não seriam adequadas, visto que há grande diferença articulatória.

Quanto a variável sexo, visualiza-se que os meninos apresentaram TMF/e/ significantemente maior. Pesquisa de revisão que reuniu dados sobre as forças pulmonares de crianças mostrou que meninos apresentam valores maiores para as medidas de função pulmonar e que essa diferença em função do sexo aumenta com o decorrer da idade, sendo observada já a partir dos dez anos de idade55. Almeida CCB, Zeferino AMB, Barros-Filho AAB. Crescimento e função pulmonar. Rev Cienc Med. 1999;8(3):85-92., o que pode ter contribuído para esse achado. Tal diferença não foi encontrada na emissão do TMF/ė/ possivelmente porque essa medida depende, além de volume e fluxo aéreo pulmonares, também da habilidade muscular respiratória de manter uma descontração progressiva durante a emissão e, ainda, não conta com o controle de saída do ar pulmonar efetuado pela adução glótica que ocorre durante o TMF/e/.

Um estudo relacionou os TMF com a altura e idade de 150 crianças entre oito e dez anos de idade, sendo 75 meninos e 75 meninas que realizaram emissões sustentadas das vogais /a/, /i/, /u/ e das consoantes /s/ e /z/. Houve correlação positiva entre os TMF e a idade e o TMF/a/ foi significantemente maior no sexo masculino22. Modolo DJ, Beraldinelle R, Brasolotto AG. Relação entre tempo máximo de fonação, estatura e idade em crianças de 8 a 10 anos. In: Anais do 17º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia; 21 a 24 out 2009; Salvador, Brasil. Brasília: Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia; 2009 [acesso em: 17 julho 2014]. Disponível em: http://www.sbfa.org.br/portal/anais2009/resumos/R1541-1.pdf ., corroborando parcialmente os achados desta pesquisa.

Em relação ao IMC, não houve associação significante entre os TMF e a relação ė/e, mostrando que, no grupo estudado, o IMC não influenciou a produção vocal e o controle da musculatura respiratória das crianças11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(1515. Ferreira FV, Cielo CA, Trevisan ME. Força muscular respiratória, postural corporal, intensidade vocal e tempos máximos de fonação na doença de Parkinson. Rev CEFAC. 2012;14(2):161-8.),(1616. Christmann MK, Scherer TM, Cielo CA, Hoffmann CF. Tempo máximo de fonação de futuros profissionais da voz. Rev CEFAC. 2013;15(3):622-30.. Tais dados convergem com os dados apresentados na análise da correlação entre IMC e TMF, que mostram que apesar do coeficiente de correlação mostrar-se negativo, ou seja, conforme aumento do IMC há diminuição dos TMF, conforme esperado, não há relevância estatística para esse achado.

Estudo que analisou 54 crianças, divididas em eutróficas e com sobrepeso, não encontrou diferença na pressão respiratória máxima entre os grupos. Os autores justificaram esse achado inferindo que o sobrepeso parece não interferir na mecânica de contração muscular de crianças com idades entre oito e 11 anos1717. Oliveira-Junior RP, Dias AS, Dal-Bosco A, Angelich AG, Ulsefer L, Magalhães FC, Silva S. Avaliação da capacidade respiratória, obesidade e capacidade física em crianças de 8 a 11 anos de idade. Ciência em Movimento. 2010;7(23):7-18., o que pode subsidiar os resultados obtidos nesta pesquisa.

No entanto, mesmo sem significância estatística, as crianças com sobrepeso e obesas apresentaram relação ė/e abaixo de 0,8, podendo ser indicativa de hipertensão glótica11. Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.),(33. Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.),(44. Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72.),(1515. Ferreira FV, Cielo CA, Trevisan ME. Força muscular respiratória, postural corporal, intensidade vocal e tempos máximos de fonação na doença de Parkinson. Rev CEFAC. 2012;14(2):161-8.),(1616. Christmann MK, Scherer TM, Cielo CA, Hoffmann CF. Tempo máximo de fonação de futuros profissionais da voz. Rev CEFAC. 2013;15(3):622-30., provavelmente devido à pressão aérea subglótica reduzida88. Cunha MGB, Passerotti GH, Weber R, Zilberstein B, Cecconello I. Voice Feature Characteristic in Morbid Obese Population. Obes Surg. 2011;21(3):340-4..

Um estudo que buscou caracterizar a voz de 45 adultos com obesidade mórbida realizou avaliação laringológica, vocal perceptivoauditiva com a escala GRBASI e ainda avaliou a presença de final de emissões em fry (encurtamento máximo das pregas vocais), analise acústica e medidas de TMF. As vozes dos pacientes obesos foram caracterizadas como rouca (62%), soprosa (27%) e com instabilidade à fonação (44%). Os autores atribuíram tais características aos baixos valores de TMF encontrados nos pacientes obesos, que provocariam irregularidade de vibração das pregas vocais devido à pressão subglótica reduzida, resultando em voz rouca e soprosa88. Cunha MGB, Passerotti GH, Weber R, Zilberstein B, Cecconello I. Voice Feature Characteristic in Morbid Obese Population. Obes Surg. 2011;21(3):340-4..

Observou-se, ainda, que os indivíduos que sofriam de obesidade mórbida exibiram valores muito baixos de TMF, podendo estar relacionados ao seu peso excessivo que levaria à acumulação de gordura na laringe, provocando dificuldade de ajuste entre as forças mioelásticas da laringe e aerodinâmicas pulmonares para uma produção vocal adequada88. Cunha MGB, Passerotti GH, Weber R, Zilberstein B, Cecconello I. Voice Feature Characteristic in Morbid Obese Population. Obes Surg. 2011;21(3):340-4..

Conclusão

No grupo de crianças de oito a 12 anos de idade de ambos os sexos estudado, não houve diferença entre TMF/ė/, TMF/e/ e relação ė/e, conforme faixa etária e IMC, bem como o IMC e os TMF não se correlacionaram, evidenciando homogeneidade entre as medidas dentro do grupo, sem influência do IMC sobre os TMF. No entanto, em relação ao sexo, os meninos apresentaram TMF/e/ maior do que as meninas e apenas as crianças de oito anos apresentaram os TMF dentro do esperado.

Referências

  • 1
    Pinho SMR. Avaliação e tratamento da voz. (1st ed.). In: Pinho SMR. (Org.). Fundamentos em fonoaudiologia: tratando os distúrbios da voz. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003. p. 3-36.
  • 2
    Modolo DJ, Beraldinelle R, Brasolotto AG. Relação entre tempo máximo de fonação, estatura e idade em crianças de 8 a 10 anos. In: Anais do 17º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia; 21 a 24 out 2009; Salvador, Brasil. Brasília: Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia; 2009 [acesso em: 17 julho 2014]. Disponível em: http://www.sbfa.org.br/portal/anais2009/resumos/R1541-1.pdf .
  • 3
    Cielo CA, Lima JPM, Gonçalves BFT, Christmann MK. Relações entre /s/ e /z/ e entre /e/ e /e/ não vozeado ou áfono. Rev CEFAC. 2013;15(5):1308-15.
  • 4
    Miglioranzi SL, Cielo CA, Siqueira MA. Relação entre capacidade vital, tempos máximos de fonação de /e/ emitido de forma áfona, de /s/ e estatura em mulheres adultas. Rev CEFAC. 2011;13(6):1066-72.
  • 5
    Almeida CCB, Zeferino AMB, Barros-Filho AAB. Crescimento e função pulmonar. Rev Cienc Med. 1999;8(3):85-92.
  • 6
    Beber BC, Cielo CA, Siqueira MA. Lesões de borda de pregas vocais e tempos máximos de fonação. Rev CEFAC. 2009;11(1):134-41.
  • 7
    Behlau M. Voz: o livro do especialista. (1st ed.). Rio de Janeiro: Revinter, 2001.
  • 8
    Cunha MGB, Passerotti GH, Weber R, Zilberstein B, Cecconello I. Voice Feature Characteristic in Morbid Obese Population. Obes Surg. 2011;21(3):340-4.
  • 9
    Rasslan Z, Saad Júnior R, Stirbulov R, Fabbri RMA, Lima CAC. Avaliação da função pulmonar na obesidade graus I e II. J Bras Pneumol. 2004;30(6):508-14.
  • 10
    Bortolotti PA, Andrada e Silva MA. Caracterização da voz de um grupo de mulheres com obesidade mórbida acompanhadas no Setor de Cirurgia Bariátrica da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Distúrb Comun. 2005;17(2):149-60.
  • 11
    Lee BJ, Kim KH, Ku B, Jang JS, Kim JY. Prediction of body mass index status from voice signals based on machine learning for automated medical applications Artif Intell Med. 2013;58(1):51-61.
  • 12
    Silvani IOFDM, Werlang A, Agne T. Avaliação respiratória em crianças obesas e não obesas. FisiSenectus. 2013;1(2):65-72.
  • 13
    Organização Mundial da Saúde. Programas e projetos. Obesidade e sobrepeso. 2007. World Health Organization [acesso em: 18 fev 2014]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs311/en/índex.html
    » http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs311/en/índex.html
  • 14
    Azevedo JCV, Brasil LMP, Macedo TBMA, Pedrosa LFC, Arrais LF. Comparação entre avaliação objetiva e autoavaliação da maturação sexual em crianças e adolescentes. J Pediatr. 2009;85(2):135-42.
  • 15
    Ferreira FV, Cielo CA, Trevisan ME. Força muscular respiratória, postural corporal, intensidade vocal e tempos máximos de fonação na doença de Parkinson. Rev CEFAC. 2012;14(2):161-8.
  • 16
    Christmann MK, Scherer TM, Cielo CA, Hoffmann CF. Tempo máximo de fonação de futuros profissionais da voz. Rev CEFAC. 2013;15(3):622-30.
  • 17
    Oliveira-Junior RP, Dias AS, Dal-Bosco A, Angelich AG, Ulsefer L, Magalhães FC, Silva S. Avaliação da capacidade respiratória, obesidade e capacidade física em crianças de 8 a 11 anos de idade. Ciência em Movimento. 2010;7(23):7-18.
  • Fontes de auxílio à pesquisa: Bolsa CAPES, CNPq e FAPERSG

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2015
  • Aceito
    14 Jul 2015
ABRAMO Associação Brasileira de Motricidade Orofacial Rua Uruguaiana, 516, Cep 13026-001 Campinas SP Brasil, Tel.: +55 19 3254-0342 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revistacefac@cefac.br