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Triagem auditiva escolar: identificação de alterações auditivas em crianças do primeiro ano do ensino fundamental

Resumo:

OBJETIVO:

caracterizar o perfil audiológico de escolares do primeiro ano do Ensino Fundamental da rede municipal da cidade de Caxias do Sul-RS, investigando e identificando a ocorrência de alterações auditivas nesta população, por meio de medidas eletroacústicas.

MÉTODOS:

estudo transversal, prospectivo, descritivo e quantitativo de 391 escolares do primeiro ano do Ensino Fundamental de escolas municipais da cidade de Caxias do Sul-RS. Os estudantes foram submetidos a quatro procedimentos audiológicos na Triagem Auditiva Escolar: Meatoscopia, Emissões Otoacústicas Evocadas por Estímulo Transiente, Emissões Otoacústicas - Produto de Distorção e Timpanometria. Além disso, os responsáveis pelas crianças responderam a um questionário com perguntas referentes ao desenvolvimento e aos antecedentes otológicos de cada criança. Os escolares que apresentaram alguma alteração auditiva na Triagem Auditiva foram encaminhados para avaliação otorrinolaringológica e/ou avaliação audiológica completa.

RESULTADOS:

das 782 orelhas avaliadas, 85,4% apresentaram normalidade nos exames realizados e 14,6% demonstraram algum tipo de alteração. Na Meatoscopia, verificou-se que 6,3% das orelhas apresentaram alterações. Passaram nas Emissões Otoacústicas Evocadas por Estímulo Transiente 94,8% das orelhas e nas Emissões Otoacústicas - Produto de Distorção 95,8%. Na Timpanometria, a curva predominante foi a tipo A, seguida pela tipo C. Foram realizados encaminhamentos para 14,6% dos escolares.

CONCLUSÃO:

a população desse estudo foi composta, em sua maioria, por escolares do gênero masculino, com seis anos de idade. Das 782 orelhas avaliadas, 85,4% apresentaram normalidade nos exames realizados e 14,6% demonstraram algum tipo de alteração.

Descritores:
Audição; Triagem; Estudantes; Emissões Otoacústicas Espontâneas; Testes de Impedância Acústica

Abstract:

PURPOSE:

to characterize the audiological profile of first grade students from municipal elementary schools in Caxias do Sul (RS), Brazil, using electroacoustic measures to investigate and identify the occurrence of hearing impairments in this population.

METHODS:

prospective descriptive quantitative cross-sectional study of 391 first grade students from municipal elementary schools in Caxias do Sul (RS), Brazil. Students were submitted to four audiological procedures for the hearing screening: meatoscopy, Transient Evoked Otoacustic Emissions, Distortion Product Otoacoustic Emissions, and tympanometry. Furthermore, caregivers answered a questionnaire regarding each child's development and otologic history. The students who presented hearing deficits on the hearing screening were referred for otorhinolaryngological and/or complete audiological evaluation.

RESULTS:

from the 782 ears evaluated, 85.4% presented normal results, and 14.6% showed alterations. In the meatoscopy, 6.3% of the ears showed alterations, while 94.8% passed the Transient Evoked Otoacustic Emissions and 95.8%, the Product-Distortion Otoacoustic Emissions. The tympanometry showed predominance of type A curves, followed by type C. Referrals were made for 14.6% of the students.

CONCLUSION:

the sample of this study was composed mostly by male school-age children with six years of age. From the 782 ears evaluated, 85.4% had normal results on the screening, and 14.6% showed alterations.

Keywords:
Hearing; Triage; Students; Otoacoustic Emissions, Spontaneous; Acoustic Impedance Tests

Introdução

A audição dentro dos padrões de normalidade é um dos fatores essenciais para que o indivíduo tenha um bom desenvolvimento psicossocial. A integridade deste sentido depende do adequado funcionamento dos sistemas das orelhas externa, média e interna. Além disso, é importante em qualquer etapa da vida, não só para o desenvolvimento das habilidades auditivas, fundamentais para a aquisição da linguagem oral, mas também para a compreensão verbal, aquisição da leitura e da escrita e para um bom aprendizado e desempenho acadêmico11 Vieira ABC, Macedo LR, Gonçalves DU. O diagnóstico da perda auditiva na infância. Pediatria. 2007;29(1):43-9. 33 Guerra-Silva PL. Análise dos resultados de testes de triagem auditiva em escolares [dissertação]. São Paulo (SP) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP; 2012..

A perda auditiva tem um impacto significante sobre o indivíduo e a sociedade. Nas crianças, o problema é agravado, uma vez que a audição normal fornece a principal fonte para aquisição da linguagem, fala e habilidades cognitivas44 Hamid O, Shoukry T, Shehata W. Prevalence and pattern of hearing loss in children in house-held national survey in Egypt. EJENTAS. 2010;11(2):12-6.. Nos grupos etários mais jovens, mesmo uma ligeira alteração no limiar auditivo já pode prejudicar a aprendizagem e a compreensão da fala, o desenvolvimento de habilidades sociais e a autoimagem55 Shargorodsky J, Curhan SG, Curhan GC, Eavey R. Change in prevalence of hearing loss in US adolescents. JAMA. 2010;304(7):772-8..

O impacto da perda auditiva sobre a aprendizagem inicia já nos primeiros anos de vida escolar, entretanto, muitas crianças com perda auditiva de grau leve manifestam dificuldades de aprendizagem consideráveis apenas ao alcançarem a 3ª série. Esta dificuldade pode ocorrer em razão de mudanças na complexidade da linguagem, do menor número de pistas visuais, da maior demanda de informações auditivas encadeadas e de evocações, além da perda do desenvolvimento das habilidades (pré-requisitos) nas séries anteriores66 Sousa TA. Investigação da ocorrência de transtornos auditivos em crianças de 1ª e 2ª series do ensino fundamental [dissertação]. São Paulo (SP): Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP; 2009..

Entende-se por Triagem Auditiva um processo simples, rápido e de baixo custo capaz de identificar indivíduos com maior probabilidade de uma alteração na função testada e que, se detectada falha nessa triagem, deverão ser encaminhados para a realização de procedimentos diagnósticos de maior complexidade. Em suma, busca identificar indivíduos com alterações auditivas, com o propósito de que possam ser encaminhados para avaliação otorrinolaringológica e audiológica completa77 Colella-Santos MF, Bragato GR, Martins PMF, Dias AB. Triagem auditiva em escolares de 5 a 10 anos. Rev CEFAC. 2009;11(4): 644-53. 88 Tazinazzio TG, Diniz TA, Marba STM, Colella-Santos MF. Emissões otoacústicas e medidas de imitância acústica com tons de sonda de 226 e 1000 hz em lactentes. Rev CEFAC. 2011;13(3):479-88.. Os Programas de Triagem Auditiva têm demonstrado a sua importância como a principal forma para detecção precoce de perdas auditivas no público infantil. Até agora, os Programas realizados nas escolas têm sido oferecidos principalmente em forma de iniciativas locais em lugares como Estados Unidos, Austrália, China e em alguns países europeus99 Skarzynski H, Piotrowska A. Prevention of communication disorders--screening pre-school and school-age children for problems with hearing, vision and speech: European Consensus Statement. Med Sci Monit. 2012;18(4):17-21., diferentemente do Brasil, onde ainda não fazem parte da rotina na maioria das escolas.

As Políticas de Saúde Pública recomendam, além do Programa de Triagem Auditiva Neonatal, a realização da Triagem Auditiva Escolar (TAE), a fim de que a perda auditiva tenha um diagnóstico precoce e para que seja realizada a intervenção necessária também o mais precocemente possível11 Vieira ABC, Macedo LR, Gonçalves DU. O diagnóstico da perda auditiva na infância. Pediatria. 2007;29(1):43-9.. Entre os testes utilizados nos diferentes Programas de Triagem, a avaliação auditiva pode ser realizada por exames objetivos como as Emissões Otoacústicas (EOA) e a Timpanometria, por apresentarem um perfil ideal devido sua rapidez, seu caráter não invasivo e sua fidedignidade1010 Vasconcelos RM, Serra LSM, Aragão VMF. Emissões otoacústicas evocadas transientes e por produto de distorção em escolares. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(4):503-7. 1111 Farias VV, Camboim ED, Azevedo MF, Marques LR. Ocorrência de falhas na triagem auditiva em escolares. Rev CEFAC. 2012;14(6):1090-5..

Kemp1212 Kemp DT. Stimulated acoustic emissions from within the human auditory system. J Acoust Soc Am. 1978;64(5):1386-91. foi o primeiro a observar e descrever as EOA. Definiu-as como a liberação de energia sonora originada na cóclea, que se propaga pela orelha média até alcançar o Meato Acústico Externo (MAE). Demonstrou que estão presentes em todas as orelhas funcionalmente normais e que deixam de ser detectadas quando os limiares tonais estão acima de 20-30 dB. Segundo o autor, a medida das EOA é um procedimento objetivo, não invasivo, rápido, aplicável em locais sem tratamento acústico e possível de ser realizado em qualquer faixa etária. A sua utilização é indicada para realização da Triagem Auditiva em escolares, por se tratar de um exame que já demonstrou seus benefícios para a realização de triagens, por ser um teste objetivo, capaz de avaliar a funcionalidade da cóclea33 Guerra-Silva PL. Análise dos resultados de testes de triagem auditiva em escolares [dissertação]. São Paulo (SP) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP; 2012..

A Timpanometria é um exame eletroacústico que contribui para a identificação de alterações da orelha média, investigando a integridade do sistema tímpano-ossicular. Este procedimento traz vantagens de baixo custo, rapidez e simplicidade como método de escolha para a diferenciação entre as condições da orelha média que afetam indivíduos em todas as faixas etárias, principalmente em escolares, onde a maioria das perdas auditivas encontradas é decorrente de alterações da orelha média1313 Russo ICP, Valente CHB, Lopes LQ, Brunetto-Borginanni LM. Medidas de imitância acústica. In: Momensohn-Santos TM, Russo ICP (Orgs.). A prática da audiologia clínica. São Paulo: Cortez, 2005. p. 183-216 1414 Carvalho RMM. Timpanometria. In: Bevilacqua MC, Martinez MAN, Balen AS, Pupo AC, Reis ACMB, Frota S. Tratado de audiologia. São Paulo: Santos, 2011. p. 123-33..

Devido ao fato de muitas crianças não terem acesso a nenhum tipo de avaliação auditiva antes de iniciarem a vida escolar, a TAE é um importante instrumento para a identificação precoce de comprometimentos na audição1515 Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Saúde na escola. Brasília: Ministério da Saúde, 2009: 96 p.: il. - (Série B. Textos Básicos de Saúde) (Cadernos de Atenção Básica ; n. 24). Por meio da TAE, é possível oferecer uma maior atenção para a saúde auditiva infantil e, principalmente, para o diagnóstico e intervenção precoce da perda auditiva nesta população. Detectar alterações auditivas em crianças já em idade escolar é de fundamental importância. Quanto mais tarde for identificada a perda auditiva, maiores serão as dificuldades enfrentadas. O diagnóstico, quando realizado precocemente, possibilita encaminhamentos para profissionais especializados, visando a reabilitação e prevenindo alterações cognitivas, sociais, emocionais e comunicativas da criança.

Diante disso, este trabalho teve como objetivo caracterizar o perfil audiológico de escolares do primeiro ano do Ensino Fundamental da rede municipal da cidade de Caxias do Sul-RS, investigando e identificando a ocorrência de alterações auditivas nesta população, por meio de medidas eletroacústicas.

Métodos

Este estudo foi submetido à análise do Comitê de Ética em Pesquisa da Associação Cultural e Científica Virvi Ramos e obteve sua aprovação sob o parecer n° 183.613. O trabalho foi realizado após a aprovação da Secretaria Municipal da Educação de Caxias do Sul-RS (ofício nº 728/2012).

Por meio de um estudo transversal, prospectivo, descritivo e quantitativo, foram triados 391 escolares, de ambos os sexos, com idade entre seis e nove anos, matriculados no primeiro ano do Ensino Fundamental de nove escolas da rede municipal da cidade de Caxias do Sul-RS, escolhidas de forma aleatória, porém, abrangendo as quatro regiões da cidade e diferentes classes econômicas.

Como critérios de inclusão foram considerados: estar cursando o primeiro ano do Ensino Fundamental em uma das escolas da rede municipal da cidade de Caxias do Sul-RS selecionadas para esse estudo e apresentar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) assinado por um responsável. Foram excluídos da amostra os sujeitos que apresentaram alguma alteração otológica prévia referida no questionário e/ou perda auditiva permanente já diagnosticada.

O TCLE foi enviado aos responsáveis por meio da agenda escolar dos alunos, juntamente com um questionário adaptado pelas pesquisadoras especialmente para este estudo33 Guerra-Silva PL. Análise dos resultados de testes de triagem auditiva em escolares [dissertação]. São Paulo (SP) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP; 2012. 1616 Lacerda ABM. Audição no contexto da educação: práticas voltadas à promoção e à prevenção. In: Bevilacqua MC, Martinez MAN, Balen AS, Pupo AC, Reis ACMB, Frota S. Tratado de audiologia. São Paulo: Santos, 2011. p. 549-69. (Figura 1). Composto por 11 questões de múltipla escolha, sendo estas objetivas e de fácil compreensão, o questionário englobou perguntas sobre o desenvolvimento e antecedentes otológicos de cada criança.

Figura 1:
Questionário pré-triagem auditiva

A TAE foi realizada em salas silenciosas, onde os escolares foram submetidos a quatro procedimentos audiológicos: Meatoscopia, Emissões Otoacústicas Evocadas por Estímulo Transiente (EOAT), Emissões Otoacústicas - Produto de Distorção (EOAPD) e Timpanometria.

Como primeiro procedimento da TAE, foi realizada a Meatoscopia, utilizando o otoscópio de diagnóstico HEINE MINI 3000, a fim de avaliar se as condições do MAE dos escolares encontravam-se adequadas para a realização dos demais testes, bem como verificar a presença de excesso de cerúmen e/ou corpo estranho. Os alunos que não apresentaram alterações no MAE foram submetidos aos demais procedimentos da TAE. Nos casos em que foram observadas alterações, o escolar foi encaminhado para avaliação otorrinolaringológica pré-agendada no Centro de Saúde Clélia Manfro - Unidade Auditiva (CSCM-UA) - centro de referência para atendimentos otorrinolaringológicos e audiológicos de média complexidade pelo Sistema Único de Saúde em Caxias do Sul-RS - em dia diferente ao da Triagem Auditiva e em fluxo contrário ao dos atendimentos rotineiramente realizados. Após a avaliação e conduta otorrinolaringológica, os escolares foram reavaliados, na mesma data e local.

Em seguida à inspeção do MAE, aqueles que não apresentaram alterações realizaram as EOAT e as EOAPD, por meio do equipamento automático portátil ERO--SCAN(tm) da marca Maico, bem como a Timpanometria, por meio do imitanciômetro portátil MT-10 da marca Interacoustics. Todos os equipamentos utilizados na pesquisa foram calibrados conforme as normas e orientações preconizadas pelos fabricantes.

Como critérios de normalidade e/ou "passa" nas EOAT foram considerados os resultados que apresentaram valores de amplitude igual ou superior a -12 dB e relação sinal/ruído igual ou superior a 4 dB em pelo menos três das frequências testadas. Para as EOAPD, foram considerados normais e/ou "passa" os resultados que apresentaram amplitude igual ou superior a -5 dB e relação sinal/ruído igual ou superior a 6 dB em pelo menos três das frequências testadas. Estes critérios foram adotados de acordo com o sugerido pelo fabricante.

Para os valores das curvas timpanométricas, utilizou-se a classificação proposta por Jerger1717 Jerger J. Clinical experience with impedance audiometry. Arch Otolaryngol. 1970;92(4):311-24.. Considerou-se como "passa" todos os escolares que obtiveram curvas tipo A, C, Ad e As na Timpanometria, bem como resultado satisfatório nas EOAT e EOAPD. Aqueles que apresentaram curvas tipo B, em pelo menos uma das orelhas, foram considerados como "falha" e encaminhados para avaliação audiológica completa, a fim de confirmar ou não a presença de alteração de orelha média.

Todos os escolares que não apresentaram alteração à Meatoscopia e falharam nas EOA e/ou na Timpanometria foram encaminhados para a realização do diagnóstico audiológico, por meio de avaliação audiológica completa pré-agendada, por meio dos testes de Audiometria Tonal por Via Aérea e por Via Óssea, Logoaudiometria (realizados com o audiômetro MA 41 da marca Maico), Imitanciometria (realizado com o Imitanciômetro automático AT 235 da marca Interacoustics), EOAT e EOAPD (realizados com o ERO-SCAN(tm)), no CSCM-UA.

Para melhor esclarecimento, elaborou-se um fluxograma dos procedimentos realizados desde a TAE até a conduta audiológica final dos escolares (Figura 2).

Imediatamente após receberem o resultado do diagnóstico audiológico, os responsáveis pelos escolares, nos quais foi constatada alguma alteração na avaliação audiológica, receberam um encaminhamento e foram orientados a procurar avaliação e conduta otorrinolaringológica.

Para análise dos resultados, foram utilizados o Teste de Igualdade de Duas Proporções e o Teste de Qui-quadrado. Ao utilizar o Teste de Qui-Quadrado é necessário, em alguns resultados, fazer a Correção de Yates, uma vez que o resultado do Qui-Quadrado é significante, mas há uma frequência inferior ou igual a cinco casos. Adotou-se um nível de significância de 0,05 (5%), onde todos os intervalos de confiança foram construídos com 95% de confiança estatística.

Resultados

Foram submetidos à triagem auditiva 391 escolares, sendo 208 (53,2%) do gênero masculino e 183 (46,8%) do gênero feminino. Destes, 288 (73,7%) tinham seis anos de idade, 101 (25,8%) sete anos e apenas dois (0,5%) nove anos. Todas as crianças foram submetidas a quatro procedimentos em ambas as orelhas, tendo sido avaliadas, portanto, 782 orelhas.

Destas 782 orelhas avaliadas, 85,4% apresentaram normalidade nos exames realizados (Meatoscopia, EOAT, EOADP e Timpanometria) e 14,6% demonstraram algum tipo de alteração. A seguir serão apresentados os resultados obtidos em cada procedimento. Vale salientar que, para tanto, foram analisadas as orelhas em conjunto.

Com relação à meatoscopia, foi verificado que 733 (93,7%) orelhas não apresentaram alterações e 49 (6,3%) apresentaram, sendo o excesso de cerúmen a mais observada.

Todos os escolares em que foi constatada alteração à meatoscopia foram encaminhados para o otorrinolaringologista (Figura 2) e, em seguida, submetidos à TAE após realizada a conduta médica. Considerando as orelhas que não apresentaram alteração à meatoscopia durante a TAE e as avaliadas posteriormente à conduta otorrinolaringológica, estão apresentados na Tabela 1 os resultados passa/falha das EOAT e EOAPD por orelha.

Figura 2:
Fluxograma de procedimentos desde a triagem auditiva escolar até a conduta audiológica final

Tabela 1:
Distribuição de passa/falha das emissões otoacústicas evocadas transientes e emissões otoacústicas - produto de distorção por orelha

Na Figura 3 estão demonstrados os resultados obtidos na Timpanometria, onde a curva timpanométrica predominante foi a tipo A, seguida pela tipo C.

Figura 3:
Distribuição do tipo de curva timpanométrica

Em relação aos encaminhamentos realizados para os escolares que apresentaram comprometimento em algum momento da TAE, 37 (9,5%) (sendo 49 orelhas) foram encaminhados para avaliação e conduta otorrinolaringológica e 21 (5,4%) para o diagnóstico audiológico.

Quanto aos escolares encaminhados para o diagnóstico audiológico, foi detectada perda auditiva condutiva em 14 (66,7%) e audição normal em três (14,3%), conforme mostra a Tabela 2.

Tabela 2:
Distribuição para o diagnóstico audiológico Legenda - N: Número de sujeitos estudados.

Na Tabela 3, estão demonstrados os valores referentes à conduta fonoaudiológica adotada após terem sido realizadas todas as avaliações. Quinze (3,8%) escolares apresentaram alterações após o diagnóstico audiológico e foram encaminhados para avaliação e conduta otorrinolaringológica.

Tabela 3:
Distribuição para a conduta fonoaudiológica

As respostas dos responsáveis ao questionário pré-triagem auditiva estão apresentadas na Tabela 4.

Tabela 4:
Distribuição para respostas ao questionário pré-triagem auditiva

Ao serem comparadas as respostas do questionário com os quatro procedimentos realizados na TAE, verificou-se relação estatisticamente significante entre a questão "Você acha que seu filho ouve bem?" e todos os testes da TAE. Em 92% dos escolares, onde o responsável respondeu achar que a criança ouve bem, não foi encontrada alteração durante a inspeção do MAE, passaram nas EOAT, EOAPD e na Timpanometria. Já para os escolares em que o responsável respondeu achar que a criança não ouve bem, foram observadas alterações à Meatoscopia em 23%, falharam nas EOAT e EOAPD 27% e na Timpanometria 32%.

Observa-se na Tabela 5 que, ao serem associadas as EOAT com as demais perguntas do questionário, também foi verificada significância estatística entre o teste e as questões: "Você acha que seu filho ouve bem?" e "Seu filho já teve infecções de ouvido ou qualquer outro problema de ouvido?".

Tabela 5:
Relação e/ou associação entre as emissões otoacústicas evocadas transientes e o questionário pré-triagem auditiva

Discussão

Foram selecionados para este estudo quatro procedimentos distintos, que avaliam desde o MAE até a integridade e a funcionalidade das Células Ciliadas Externas da cóclea, a fim de proporcionar uma avaliação mais completa na TAE e por ser considerada imprescindível a detecção precoce de perdas auditivas que possam interferir no processo de aprendizagem, leitura e escrita dos escolares. A identificação e a reabilitação precoce das alterações auditivas proporcionam grandes benefícios à criança1818 Lee CY, Hsieh TH, Pan SL, Hsu CJ. Thresholds of tone burst auditory brainstem responses for infants and young children with normal hearing in Taiwan. J Formos Med Assoc. 2007;106(10):847-53., além de diminuírem os prejuízos linguísticos, educacionais e psicossociais. Desta forma, é consensual que a investigação auditiva e o acompanhamento não devem ser realizados apenas quando a criança nasce, mas também durante os primeiros anos de vida escolar.

O cerúmen é uma ocorrência natural, expulsado normalmente do MAE e, geralmente, assintomático. Porém, quando em excesso, pode causar complicações, como a perda auditiva1919 McCarter DF, Courtney AU, Pollart SM. Cerumen impaction. Am Fam Physician. 2007;75(10):1523-8.. No presente estudo, a alteração mais observada à meatoscopia foi o excesso de cerúmen, relatado na literatura como uma das causas mais frequentes de alterações em crianças na fase pré-escolar e escolar11 Vieira ABC, Macedo LR, Gonçalves DU. O diagnóstico da perda auditiva na infância. Pediatria. 2007;29(1):43-9.. Em estudos recentes, a presença de cerúmen excessivo no MAE foi a alteração mais comumente encontrada nos escolares2020 Yamamah G, Mabrouk A, Ghorab E, Ahmady M, Abdulsalam H. Middle ear and hearing disorders of schoolchildren aged 7-10 years in South Sinai, Egypt. East Mediterr Health J. 2012;18(3):255-60. 2121 Chadha SK, Sayal A, Malhotra V, Agarwal AK. Prevalence of preventable ear disorders in over 15,000 schoolchildren in northern India. J Laryngol Otol. 2013;127(1):28-32. 2222 Absalan A, Pirasteh I, Khavidaki GAD, Rad AA, Esfahani AAN, Nilforoush MH. A Prevalence Study of Hearing Loss among Primary School Children in the South East of Iran. Int J Otolaryngol. 2013(2013): 4 pages., concordando com os resultados deste estudo. Entretanto, em outras pesquisas1010 Vasconcelos RM, Serra LSM, Aragão VMF. Emissões otoacústicas evocadas transientes e por produto de distorção em escolares. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(4):503-7. 1111 Farias VV, Camboim ED, Azevedo MF, Marques LR. Ocorrência de falhas na triagem auditiva em escolares. Rev CEFAC. 2012;14(6):1090-5. 2323 Al-Kandari JM, Alshuaib WB. Hearing evaluation of school children in Kuwait. Electromyogr Clin Neurophysiol. 2010;50(6):309-18. 2424 Nogueira JCR, Mendonça MC. Assessment of hearing in a municipal public school student population. Braz. j. otorhinolaryngol. 2011;77(6):716-20., a prevalência de cerúmen em excesso foi superior à encontrada neste.

As EOA têm revelado uma aplicabilidade relevante para a realização de triagens auditivas, por serem um método rápido, eficiente e viável2525 Yin L, Bottrell C, Clarke N, Shacks J, Poulsen MK. Otoacoustic emissions: a valid, efficient first-line hearing screen for preschool children. J Sch Health. 2009;79(4):147-52.. Porém, os resultados destas triagens são frequentemente influenciados pela presença de anormalidades patológicas da orelha média. As EOA mostram-se como medidas eficazes para identificar estas alterações, bem como graus moderados ou mais severos de perdas auditivas cocleares2626 Balatsouras DG, Koukoutsis G, Ganelis P, Korres GS, Aspris A, Kaberos A. Transiently Evoked Otoacoustic Emissions in Children with Otitis Media with Effusion. Int J Otolaryngol. 2012(2012): 4 pages..

A frequência de falhas nas EOA encontradas na literatura diverge quanto às observadas neste estudo. Ao realizar a triagem em 744 pré-escolares, avaliando-os por meio das EOAT, autores encontraram um índice de falhas em 5,5% das crianças2525 Yin L, Bottrell C, Clarke N, Shacks J, Poulsen MK. Otoacoustic emissions: a valid, efficient first-line hearing screen for preschool children. J Sch Health. 2009;79(4):147-52.. Em outro estudo, onde foram realizadas as EOAT em 93 escolares, foi encontrado um percentual de 25,8% de falhas2727 Baruzzi AO. Triagem auditiva escolar: análise da sensibilidade e especificidade de uma proposta metodológica [dissertação]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2008.. Ao avaliar 105 crianças por meio das EOAPD, autores verificaram que 5,37% das crianças submetidas ao teste apresentavam exames alterados2828 Dell'Aringa AR, Dell'Aringa AHB, Juares AJC, Melo C, Perches Filho RM. Emissões otoacústicas por produtos de distorção em crianças de 2 a 7 anos. Rev Bras Otorrinolaringol. 2004;70(3):380-4.. Já em outro estudo utilizando as EOAPD para examinar 846 crianças, foi encontrado um índice de 96% de passa na triagem auditiva2929 Foust T, Eiserman W, Shisler L, Geroso A. Using otoacoustic emissions to screen young children for hearing loss in primary care settings. Pediatrics. 2013;132(1):118-23., dado semelhante ao deste estudo.

Em pesquisa com metodologia semelhante ao presente estudo, ao serem analisados os exames por orelhas, foram encontradas 818 (90,6%) que passaram e 84 (9,4%) que falharam nas EOAT. Nas mesmas orelhas, quando foram realizadas as EOAPD, foram observadas 849 (94,0%) que passaram e 53 (6,0%) que falharam nesse tipo de emissão1010 Vasconcelos RM, Serra LSM, Aragão VMF. Emissões otoacústicas evocadas transientes e por produto de distorção em escolares. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(4):503-7.. Estes dados corroboram com os do presente estudo, uma vez que foi encontrado um maior número de passa nas EOAPD do que nas EOAT. Isso pode ocorrer devido ao fato de as EOAT serem registradas em aproximadamente 98% das pessoas com limiares auditivos de até 25dBNA, já as EOAPD podem ser detectadas em praticamente 100% dos indivíduos com limiares auditivos normais ou melhores que 45dBNA, não detectando, assim, as perdas auditivas cocleares leves3030 Lasmar A. Otoemissões. In: Hungria H, ed. Otorrinolaringologia. 8ª ed. Rio de Janeiro; Guanabara Koogan; 2000. p. 346-51. 3131 Menezes PL, Soares IA, Albuquerque RRC, Moraes MFT. Distortion Product otoacoustic emissions: a study of the cochlear function. J Bras Fonoaudiol 2002;3:104-7..

É relatado, ainda, na literatura, variações de 11,6 a 37,8% de alterações auditivas encontradas na TAE1111 Farias VV, Camboim ED, Azevedo MF, Marques LR. Ocorrência de falhas na triagem auditiva em escolares. Rev CEFAC. 2012;14(6):1090-5. 3232 Schonhaut BL, Farfán RTMC, Neuvonen R, Vacarisas AP. Problemas auditivos en preescolares, según estudio audiológico y percepción de educadores: Región Metropolitana, diciembre 2005. Rev. chil. pediatr. [periódico na Internet]. 2006 Jun [acesso em Out 2013]; 77(3):247-53. Disponível em: http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0370-41062006000300003.
http://www.scielo.cl/scielo.php?script=s...
3333 Oliveira RTO, Oliveira JP. A triagem auditiva escolar enquanto instrumento de parceria entre a saúde e a educação. In: IX Congresso Nacional de Educação - EDUCERE, III Encontro Sul Brasileiro de Psicopedagogia. PUCPR: 2009 Out 26-29. p. 6949-60.. Autores recomendam que as EOAT sejam sempre utilizadas em conjunto com a Timpanometria, uma vez que, desta forma, uma interpretação mais significante é possível, bem como a detecção de perdas auditivas com alteração de orelha média2626 Balatsouras DG, Koukoutsis G, Ganelis P, Korres GS, Aspris A, Kaberos A. Transiently Evoked Otoacoustic Emissions in Children with Otitis Media with Effusion. Int J Otolaryngol. 2012(2012): 4 pages. 2727 Baruzzi AO. Triagem auditiva escolar: análise da sensibilidade e especificidade de uma proposta metodológica [dissertação]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2008. 3434 Lyons A, Kei J, Driscoll C. Distortion product otoacoustic emissions in children at school entry: a comparison with pure-tone screening and tympanometry results. J Am Acad Audiol. 2004;15(10):702-15. 3535 Harlor AD Jr, Bower C. Hearing assessment in infants and children: recommendations beyond neonatal screening. Pediatrics. 2009;124(4):1252-63..

A Timpanometria é um teste objetivo, rápido e que tem sido amplamente utilizado nos programas de triagem auditiva, por ser decisivo para a identificação precisa de alterações condutivas, visto que o principal objetivo deste procedimento é avaliar a integridade funcional do sistema tímpano-ossicular77 Colella-Santos MF, Bragato GR, Martins PMF, Dias AB. Triagem auditiva em escolares de 5 a 10 anos. Rev CEFAC. 2009;11(4): 644-53. 3636 Yockel NJ. A comparison of audiometry and audiometry with tympanometry to determine middle ear status in school-age children. J Sch Nurs. 2002;18(5):287-92.. Assim como neste estudo, outros autores também observaram a predominância da curva timpanométrica tipo A3737 Guida HL, Diniz TH. Perfil audiológico em crianças de 5 a 10 anos de idade. Arq. Int. Otorrinolaringol. 2008;12(2):224-9. 3838 Araújo AS, Moura JR, Camargo LA, Alves W. Avaliação auditiva em escolares. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 2002;68(2):263-6., seguida pela tipo C, na realização da Timpanometria na TAE22 Etges CL, Reis MCP, Menegotto IH, Sleifer P, Soldera CLC. Achados na triagem imitanciométrica e de processamento auditivo em escolares. Rev CEFAC 2012;6(14):1098-107. 77 Colella-Santos MF, Bragato GR, Martins PMF, Dias AB. Triagem auditiva em escolares de 5 a 10 anos. Rev CEFAC. 2009;11(4): 644-53. 2222 Absalan A, Pirasteh I, Khavidaki GAD, Rad AA, Esfahani AAN, Nilforoush MH. A Prevalence Study of Hearing Loss among Primary School Children in the South East of Iran. Int J Otolaryngol. 2013(2013): 4 pages. 2727 Baruzzi AO. Triagem auditiva escolar: análise da sensibilidade e especificidade de uma proposta metodológica [dissertação]. São Paulo: Universidade Federal de São Paulo; 2008..

A ocorrência de 26,5% de curvas timpanométricas dos tipos B, C, As e Ad identificadas na população deste estudo, as quais podem ter relação com alterações de orelha média e/ou tuba auditiva, infere que os achados foram compatíveis com os tipos de perda auditiva (condutiva e mista) encontrados nos escolares encaminhados para o diagnóstico audiológico.

Qualquer resultado alterado na TAE requer um encaminhamento adequado para realização de avaliação audiológica, a fim de que sejam realizados testes mais completos e definitivos. A triagem auditiva só irá resultar em benefício para o escolar, se os resultados dos procedimentos que estão fora do padrão de normalidade forem confirmados e, após isso, for realizada a intervenção adequada3535 Harlor AD Jr, Bower C. Hearing assessment in infants and children: recommendations beyond neonatal screening. Pediatrics. 2009;124(4):1252-63..

A perda auditiva condutiva pode ser considerada a causa mais comum de falhas de TAE, sendo esta mais frequente nos meses de outono e inverno, devido ao clima3232 Schonhaut BL, Farfán RTMC, Neuvonen R, Vacarisas AP. Problemas auditivos en preescolares, según estudio audiológico y percepción de educadores: Región Metropolitana, diciembre 2005. Rev. chil. pediatr. [periódico na Internet]. 2006 Jun [acesso em Out 2013]; 77(3):247-53. Disponível em: http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0370-41062006000300003.
http://www.scielo.cl/scielo.php?script=s...
3535 Harlor AD Jr, Bower C. Hearing assessment in infants and children: recommendations beyond neonatal screening. Pediatrics. 2009;124(4):1252-63.. Vale salientar que a coleta desta pesquisa foi realizada neste período. Assim como no presente estudo, este tipo de alteração auditiva é o mais relatado como falha na TAE, tanto na literatura nacional quanto na internacional1010 Vasconcelos RM, Serra LSM, Aragão VMF. Emissões otoacústicas evocadas transientes e por produto de distorção em escolares. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(4):503-7. 2222 Absalan A, Pirasteh I, Khavidaki GAD, Rad AA, Esfahani AAN, Nilforoush MH. A Prevalence Study of Hearing Loss among Primary School Children in the South East of Iran. Int J Otolaryngol. 2013(2013): 4 pages. 3232 Schonhaut BL, Farfán RTMC, Neuvonen R, Vacarisas AP. Problemas auditivos en preescolares, según estudio audiológico y percepción de educadores: Región Metropolitana, diciembre 2005. Rev. chil. pediatr. [periódico na Internet]. 2006 Jun [acesso em Out 2013]; 77(3):247-53. Disponível em: http://www.scielo.cl/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0370-41062006000300003.
http://www.scielo.cl/scielo.php?script=s...
3838 Araújo AS, Moura JR, Camargo LA, Alves W. Avaliação auditiva em escolares. Rev. Bras. Otorrinolaringol. 2002;68(2):263-6..

A combinação de procedimentos para a identificação de crianças com comprometimentos auditivos é recomendada, pois, muitas vezes, a criança falha somente em um deles66 Sousa TA. Investigação da ocorrência de transtornos auditivos em crianças de 1ª e 2ª series do ensino fundamental [dissertação]. São Paulo (SP): Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP; 2009.. A realização das EOAT e das EOAPD em conjunto33 Guerra-Silva PL. Análise dos resultados de testes de triagem auditiva em escolares [dissertação]. São Paulo (SP) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP; 2012., assim como a Timpanometria e a avaliação audiológica completa após a TAE, caso necessitem de encaminhamento, é importante para evitar falso-positivos, uma vez que, no presente estudo, houve escolares que, após encaminhados para o diagnóstico audiológico, apresentaram audição normal.

A relação significante entre algumas das respostas dadas pelos responsáveis sobre os escolares e os procedimentos realizados na TAE, demonstra que é possível a utilização de questionários associados a outros testes para a realização de triagens auditivas. Em um estudo para analisar a eficácia de uma ferramenta para triagem de baixo custo, autoras concluíram que questionários podem ser usados como um instrumento de triagem para classificar crianças como tendo audição normal ou perda auditiva. Ainda apontaram que o desenvolvimento de estratégias com baixo custo pode ajudar no cuidado às crianças com problemas de audição nos países em desenvolvimento. Para tanto, é necessário estabelecer e adotar procedimentos de menor despesa, tais como a utilização de triagem e/ou questionários, que são acessíveis às áreas carentes e permitem identificar grupos de crianças que estão em risco para perda auditiva3939 Samelli AG, Rabelo CM, Vespasiano AP. Development and analysis of a low-cost screening tool to identify and classify hearing loss in children: a proposal for developing countries. Clinics. 2011;66(11):1943-8..

É relatado na literatura que a perda auditiva pode ser percebida por alguns comportamentos dos escolares, tais como: pedidos frequentes para repetir frases, virar a cabeça em direção ao orador, falar com intensidade elevada ou reduzida, demonstrar esforço ao tentar ouvir, olhar e concentrar-se nos lábios da professora, ser desatento quando há debates na sala de aula, preferir o isolamento social, ser passivo ou tenso, cansar-se com facilidade, não se esforçar para demonstrar capacidade, ter dificuldade no aprendizado11 Vieira ABC, Macedo LR, Gonçalves DU. O diagnóstico da perda auditiva na infância. Pediatria. 2007;29(1):43-9..

Muitas vezes os responsáveis também não percebem a dificuldade auditiva da criança. Não é raro que a perda auditiva seja detectada apenas na escola, por meio da TAE e da observação do comportamento do aluno. Muitas crianças chegam à idade escolar sem identificar uma perda auditiva e são tachadas de desatentas, hiperativas, com baixo rendimento, de difícil adaptação escolar, entre outros, quando o verdadeiro problema está em uma perda auditiva não diagnosticada2424 Nogueira JCR, Mendonça MC. Assessment of hearing in a municipal public school student population. Braz. j. otorhinolaryngol. 2011;77(6):716-20..

A prevalência de 14,6% de alterações auditivas encontrada na população deste estudo evidencia a necessidade de intensificação da implantação de programas de prevenção e diagnóstico precoce de alterações auditivas. A TAE mostra-se um meio eficaz e acessível para identificar comprometimentos não diagnosticados até a idade escolar, assim como aqueles que se desenvolvem ao longo dessa, a fim de que suas consequentes dificuldades e prejuízos possam ser minimizados.

Sendo assim, a triagem auditiva regular das crianças durante sua fase escolar garantiria que não fossem afetadas por perdas auditivas ou outras alterações evitáveis. As informações desse estudo demonstram a importância da priorização da identificação e do tratamento precoce de comprometimentos audiológicos.

Conclusão

A população desse estudo foi composta, em sua maioria, por escolares do gênero masculino, com seis anos de idade. Das 782 orelhas avaliadas, 85,4% apresentaram normalidade nos exames realizados e 14,6% demonstraram algum tipo de alteração. Destas, 5,8% apresentaram ausência de respostas nas EOAT e 4,2% nas EOAPD. A curva timpanométrica predominante foi a tipo A, seguida pela tipo C. Nos escolares encaminhados para o diagnóstico audiológico, a alteração mais encontrada foi a perda auditiva condutiva.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Out 2015

Histórico

  • Recebido
    06 Jul 2014
  • Aceito
    02 Jul 2015
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