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Intervenção fonoaudiológica na esclerose sistêmica: relato de casos

RESUMO

A Esclerose Sistêmica é uma doença reumática autoimune do tecido conjuntivo, progressiva, pouco frequente, de etiologia desconhecida e com evolução variável. Atinge órgãos nobres e tecidos periorais, causando limitação na abertura da boca, hipertonia dos órgãos fonoarticulatórios, face com "aparência de máscara", dificuldades na mastigação e deglutição. Com o objetivo de comparar os resultados pré e pós-intervenção fonoaudiológica miofuncional orofacial em sujeitos com esclerose sistêmica, realizou-se estudo clínico exploratório qualiquantitativo no setor de Reumatologia do Hospital Universitário e na Clínica escola de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Sergipe, no período de julho/2012 a dezembro/2013. A amostra foi composta por cinco indivíduos, de ambos os gêneros, com faixa etária entre 24 e 60 anos e diagnóstico médico confirmado da referida afecção. Os indivíduos passaram por avaliação por meio do protocolo MBGR e 36 sessões de terapia fonoaudiológica (miofuncional e mioterápica). Ao término, os resultados iniciais e finais foram comparados a partir dos indicadores clínicos trabalhados. Diante da análise dos resultados obtidos, foram observadas melhoras em todos os aspectos trabalhados. A avaliação anterior à fonoterapia revelou restrição na abertura da boca em todos os indivíduos e os resultados finais apresentaram ganhos entre 5.3 e 14.2 mm de abertura (média: 9,26 mm). Com relação à tonicidade, mobilidade dos órgãos fonoarticulatórios e dormência orofacial, observaram-se melhoras e evidências de adequação das funções orais. Pode-se concluir que, apesar de alguns pacientes ainda apresentarem alterações, a reabilitação fonoaudiológica promoveu melhoras significativas no quadro clínico e qualidade de vida dos indivíduos do grupo de estudo.

Descritores:
Fonoaudiologia; Escleroderma Sistêmico; Fonoterapia

ABSTRACT

Systemic sclerosis is a rare, progressive of unknown etiology and variable evolution, autoimmune rheumatic connective tissue disease. It reaches vital organs and perioral tissues, causing limitation of mouth opening, hypertonia of the phonoarticulatory organs, face with the appearance of a mask, difficulty in chewing and swallowing. Aiming to compare the pre and post miofuncional orofacial intervention in subjects with systemic sclerosis, it was performed a quali quantitative exploratory clinical study in the Rheumatology department of the University Hospital and in the School Clinic of Speech, Language and Hearing Sciences of the Federal University of Sergipe (UFS), from July/2012 to December/2013. The sample consisted of five individuals, of both genders, aged between 24 and 60 years and with confirmed medical diagnosis of that condition. The subjects underwent through evaluation by MBGR protocol and 36 sessions of speech therapy (myofunctional and myotheray). At the end, the initial and final results were compared from the clinical indicators worked. After analyzing the results obtained, improvements in all aspects were observed. The previous Speech Therapy evaluation revealed restriction of mouth opening in all subjects and the final results presented gains between 5.3 and 14.2mm of opening (average: 9.26). Regarding muscle tonus, mobility of the phonoarticulatory organs and orofacial dormancy, improvements and evidences of adequacy of oral functions were observed. It can be concluded that, although some patients still show changes, the rehabilitation promoted significant improvements in the clinical condition and quality of life of the individuals of the study group.

Keywords:
Speech, Language and Hearing Sciences; Systemic Scleroderma; Speech Therapy

Introdução

A Esclerose Sistêmica (ES) faz parte de um grupo heterogêneo de doenças reumáticas. É relativamente rara e seu fator etiológico é desconhecido, produzindo alterações sistêmicas envolvendo o tecido conjuntivo de todo o corpo. Sua evolução é lenta, progressiva e incapacitante. No entanto, pode ocorrer de forma rápida em função do comprometimento dos órgãos internos11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73..

A ES acomete múltiplos órgãos incluindo pele, sistema cardiovascular, pulmões, trato gastrointestinal e rins22. Godoi ETAM, Barbosa AT, Godoi JTAM, Ramos MAM, Marques SRB, Duarte ALBP. Envolvimento macrovascular e esclerose sistêmica. J Vasc Bras. 2009;8(1):65-76.. É caracterizada clinicamente por acometimento vascular e alterações fibróticas da pele e dos órgãos internos33. Correa MJU, Perazzio SF, Andrade LEC, Kayser C. Laser doopler imaging para quantificação do fluxo sanguíneo de polpa digital em condições basais e após estímulo frio em pacientes com ES. Rev Bras reumat. 2010;50(2):128-34..

Pode ser classificada em dois subgrupos conforme o comprometimento cutâneo: limitada e difusa. A ES limitada apresenta fibrose cutânea limitada às mãos e antebraços, pés, pescoço e face. Os pacientes geralmente apresentam o fenômeno de Raynaud (FRY) por anos e podem ter telangiectasias, calcificações cutâneas e uma incidência tardia de hipertensão pulmonar. Já a ES difusa caracteriza-se por fibrose cutânea proximal dos joelhos ou cotovelos, excluindo face e pescoço. Os pacientes podem apresentar o fenômeno de Raynaud (FRY) dentro de um ano de desenvolvimento da doença e possuem maior probabilidade de apresentar envolvimento pulmonar, renal ou cardíaco22. Godoi ETAM, Barbosa AT, Godoi JTAM, Ramos MAM, Marques SRB, Duarte ALBP. Envolvimento macrovascular e esclerose sistêmica. J Vasc Bras. 2009;8(1):65-76..

No Brasil, as doenças reumáticas se apresentam como a terceira causa principal de incapacidade para o trabalho, suplantadas apenas pelas doenças psiquiátricas e cardiovasculares44. Miguel RCC, Resende GG, Garcia PP, Gresta LT. O tecido conjuntivo e o sistema musculoesquelético. In: Carvalho MAP, Lana CCD, Bértolo MB. (Org.) Reumatologia: diagnóstico e tratamento. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. p. 3-11..

Com relação aos aspectos que envolvem a motricidade orofacial, há lacunas na literatura especializada. Em pesquisas realizadas por reumatologistas e cirurgiões dentistas foram citadas algumas manifestações de estudo da Fonoaudiologia, incluindo a microstomia, xerostomia, perda da mucosa gengival55. Wada T, Ram S. Limited mouth opening secondary to diffuse systemic sclerosis. case Rep. Dent. 2013;2013:937487., acometimento laríngeo, disfagia orofaríngea66. Baron M, Hudson M, Tatibouet S, Steele R, Lo E, Gravel S et al. The Canadian systemic sclerosis oral health study: orofacial manifestations and oral health-related quality of life in systemic sclerosis compared with the general population. Rheumatology (Oxford). 2014;53(8):1386-94.),(77. Pereira DB, Amaral JLA, Szajubok JCM, Lima SMA, Chahade WH. Manifestações otorrinolaringológicas nas doenças reumáticas autoimunes. Rev Bras Reumatol. 2006;46(2):118-25., dificuldade na mastigação, enrijecimento de língua, alterações na produção de sons bilabiais em decorrência da limitação dos movimentos mandibulares e alteração vocal88. Magro PCFM. Esclerodermia: revisão da literatura e caracterização da população observada na consulta de Reumatologia do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E. [dissertação]. Covilhã (Portugal). Universidade da Beira Interior; 2009.)-(1010. Baldrighi SEZM, Nascimento LT. Repercussões orofaciais na Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. In: 19º Congresso Brasileiro e 8º Internacional de Fonoaudiologia, 2011, São Paulo. Disponível em: www.sbfa.org.br/portal/suplementossbfa. Acesso em: 25 set. 2013.
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Estima-se com este estudo, um aporte para a elucidação de lacunas existentes na literatura científica (na área da Fonoaudiologia) buscando melhor compreensão da fisiopatologia dessa doença, na interdisciplinaridade das áreas afins. Bem como acredita-se que possui impacto clínico importante na condução desses casos. Assim sendo, o objetivo do presente estudo foi comparar os resultados pré e pós-intervenção fonoaudiológica miofuncional orofacial em sujeitos com esclerose sistêmica.

Apresentação dos Casos

Estudo exploratório, longitudinal, prospectivo, descritivo, de série de casos clínicos intervencionais, qualitativo-quantitativo, não randomizado e não controlado. De acordo com o estabelecido pela Resolução do Conselho Nacional de Saúde Nº 466/12, de 12 de dezembro de 2012, a presente pesquisa foi submetida à apreciação do Comitê de Ética em pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe (UFS), e aprovada sob o registro CEP-0132.0.107.000-10.

O presente estudo é decorrente da parceria entre o Ambulatório de Reumatologia do Hospital Universitário e a clínica escola do Curso de Fonoaudiologia, ambos situados à UFS, no período de julho de 2012 a dezembro de 2013.

A amostra foi constituída por conveniência, sendo que os critérios de inclusão adotados foram que todos os sujeitos deveriam ter diagnóstico médico confirmado de ES, apresentar queixa fonoaudiológica, ser adulto ou idoso e ter capacidade cognitiva que permitisse sua participação em todas as etapas do estudo. Os de exclusão deram-se pela recusa e desistência na participação da pesquisa.

Inicialmente foi requisitada uma lista dos pacientes com diagnóstico confirmado de ES assistidos pelo médico reumatologista do referido Hospital Universitário. Em seguida, os sujeitos foram contatados por telefone e informados sobre os procedimentos da pesquisa - aqueles que demonstraram interesse em participar realizaram uma entrevista inicial.

Foram selecionados cinco indivíduos, quatro do gênero feminino e um do masculino, com idades entre 24 e 60 anos (média de idade de 44,6 anos).

A entrevista inicial seguiu roteiro previamente elaborado a fim de coletar dados acerca dos registros pessoais, queixa fonoaudiológica, história pregressa da doença (idade do diagnóstico e dos sintomas iniciais, medicamentos utilizados etc.) e demais inferências da ES sobre as condições de vida dos participantes. O instrumento para coleta de dados foi aplicado oralmente pelas examinadoras e os dados obtidos foram registrados em folha própria. Nesse encontro também foi solicitada a assinatura da carta de informação, do termo de consentimento livre e esclarecido e do termo de autorização para o uso da imagem. Além das informações coletadas, houve consulta ao prontuário médico dos indivíduos com a finalidade de obter mais informações sobre cada um dos casos.

Na sequência, foi iniciada a avaliação miofuncional orofacial. Durante o procedimento, foi solicitado ao sujeito que permanecesse sentado, com os pés apoiados no chão em posição habitual, enquanto a examinadora permaneceu sentada de frente para o paciente. A coleta de dados e o exame clínico tiveram a estimativa total de uma hora. Adotou-se o protocolo MBGR1111. Baldrighi SEZM, Lopes LD, Lima MC, Almeida LF, Macieira JC. Achados Fonoaudiológicos na Esclerose Sistêmica. In: 21º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia, 2013, Porto de Galinhas. Disponível em: http://sbfa.org.br/fono2013/pdf/anais_poster.pdf. Acesso em: 25 set. 2013.
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para os momentos de pré e pós-intervenção fonoaudiológica.

Após a conclusão da avaliação, decidiu-se sobre a necessidade ou não de terapia fonoaudiológica. Tal necessidade foi informada individualmente aos participantes que, durante a devolutiva, decidiam pela sua participação no processo terapêutico.

A intervenção fonoaudiológica foi realizada uma vez por semana, em sessões individuais de aproximadamente 50 minutos. Inicialmente, todos os participantes receberam devolutivas sobre os resultados encontrados, os objetivos de trabalho e as propostas terapêuticas, sendo selecionadas duas abordagens: a) a miofuncional - que atua na modificação muscular por meio do restabelecimento das funções orofaciais e b) a mioterápica - que busca a modificação do comportamento muscular por meio da execução de exercícios1212. Genaro KF, Berretin-Félix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial: protocolo MBGR. Rev CEFAC. 2009;11(2):237-55..

Trabalhou-se o preparo da região escapular, cervical, facial e de musculatura específica (temporais, masseteres e esternocleidomastoideos). Foram realizados exercícios isotônicos e exercícios isométricos1313. Marchesan IQ. Deglutição - diagnóstico e possibilidades terapêuticas. In: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia - aspectos clínicos da motricidade oral. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 51-8.),(1414. Vincent C, Agard C, Barbarot S, N'Guyen JM, Planchon B, Durant C et al. Orofacial manifestations of systemic sclerosis: A study of 30 consecutive patients. Rev Stomatol Chir Maxillofac.. 2010;111(3):128-34. estabelecidos de acordo com as necessidades de cada paciente.

As funções orais de mastigação e deglutição foram trabalhadas com alimentos sólidos e líquidos, apoiando-se na diretriz da percepção de como o paciente as realiza e na demonstração dos padrões ideais de realização, revendo a postura, a velocidade, o ritmo, a sequência e a coordenação entre as funções1212. Genaro KF, Berretin-Félix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial: protocolo MBGR. Rev CEFAC. 2009;11(2):237-55.. Para ampliar tal percepção, recursos visuais (máquina fotográfica, filmadora e espelho) foram utilizados nas sessões.

Durante os momentos pré e pós-intervenção terapêutica também foram feitos registros fotográficos, com o paciente posicionado em pé, coluna e cabeça eretos e a um metro da câmera fotográfica (Cyber-shot DSC-WX7 Sony), com exceção para a análise das rugas, em que os participantes foram posicionados sentados, solicitando-se que olhassem para a frente, sem sorrir. Foram observados presença ou ausência de marcas ou rugas (primárias ou secundárias) na testa, glabela, olhos, bochechas, lábios e mentual1515. Yuen HK, Marlow NM, Reed SG, Mahoney S, Summerlin LM, Leite R et al. Effect of orofacial exercises on oral aperture in adults with systemic sclerosis. Disabil Rehabil. 2012;34(1):84-9..

Para análise da diminuição dos distúrbios miofuncionais orofaciais e das queixas dos pacientes que compuseram a amostra, foi utilizado parcialmente o protocolo MBGR1111. Baldrighi SEZM, Lopes LD, Lima MC, Almeida LF, Macieira JC. Achados Fonoaudiológicos na Esclerose Sistêmica. In: 21º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia, 2013, Porto de Galinhas. Disponível em: http://sbfa.org.br/fono2013/pdf/anais_poster.pdf. Acesso em: 25 set. 2013.
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, cujo instrumento apresenta escores que possibilitam a mensuração (mesmo que subjetiva no item "tônus" da avaliação) do desempenho dos pacientes nos aspectos avaliados. Assim sendo, os itens reavaliados diariamente foram: análise facial subjetiva, norma frontal (itens mandíbula e posição habitual de lábios), movimento mandibular (distância interincisal máxima ativa), respiração (item fluxo aéreo nasal), mobilidade parcial (lábios, língua, bochechas e mandíbula), tônus e funções orais, como respiração (modo e fluxo aéreo nasal), mastigação e deglutição. O procedimento pós-intervenção foi considerado com desfecho clínico eficiente quando os escores obtidos nesta etapa foram "zero".

Para a medição da distância interincisal máxima ativa (DIMA) nos momentos pré e pós-intervenção (inicial e final da sessão), foi utilizado paquímetro digital Western 6" com precisão de 0,01mm, verificando-se a distância interincisal máxima ativa na visão frontal e o resultado foi transcrito em milímetros na folha do próprio protocolo1111. Baldrighi SEZM, Lopes LD, Lima MC, Almeida LF, Macieira JC. Achados Fonoaudiológicos na Esclerose Sistêmica. In: 21º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia, 2013, Porto de Galinhas. Disponível em: http://sbfa.org.br/fono2013/pdf/anais_poster.pdf. Acesso em: 25 set. 2013.
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Além do exposto, os participantes foram orientados também sobre a realização de cada exercício no domicílio, com o uso de espelho, diariamente (duas vezes ao dia), conforme prescrição oferecida e registrar as dificuldades encontradas. Em todo início de sessão, havia consulta sobre os exercícios domiciliares, sanando-se as possíveis dúvidas.

Foram estipulados como parte do protocolo de pesquisa os procedimentos abaixo, executados em todas as sessões:

Consulta, por parte do terapeuta, dos exercícios domiciliares, sanando as possíveis dúvidas;

Mensuração do fluxo aéreo nasal (com e sem limpeza)1111. Baldrighi SEZM, Lopes LD, Lima MC, Almeida LF, Macieira JC. Achados Fonoaudiológicos na Esclerose Sistêmica. In: 21º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia, 2013, Porto de Galinhas. Disponível em: http://sbfa.org.br/fono2013/pdf/anais_poster.pdf. Acesso em: 25 set. 2013.
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e da DIMA1111. Baldrighi SEZM, Lopes LD, Lima MC, Almeida LF, Macieira JC. Achados Fonoaudiológicos na Esclerose Sistêmica. In: 21º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia, 2013, Porto de Galinhas. Disponível em: http://sbfa.org.br/fono2013/pdf/anais_poster.pdf. Acesso em: 25 set. 2013.
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com uso do paquímetro (ao início e término da terapia);

Aplicação de manobras globais de relaxamento e soltura da musculatura cervical, concomitante com a respiração (capacidade respiratória);

Manobras de alongamento da musculatura orofacial;

Realização de exercícios orofaciais propriamente ditos com aplicação de parte do protocolo1111. Baldrighi SEZM, Lopes LD, Lima MC, Almeida LF, Macieira JC. Achados Fonoaudiológicos na Esclerose Sistêmica. In: 21º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia, 2013, Porto de Galinhas. Disponível em: http://sbfa.org.br/fono2013/pdf/anais_poster.pdf. Acesso em: 25 set. 2013.
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antes e após os exercícios;

Reabilitação das funções orais, com aplicação de parte do protocolo1111. Baldrighi SEZM, Lopes LD, Lima MC, Almeida LF, Macieira JC. Achados Fonoaudiológicos na Esclerose Sistêmica. In: 21º Congresso Brasileiro de Fonoaudiologia, 2013, Porto de Galinhas. Disponível em: http://sbfa.org.br/fono2013/pdf/anais_poster.pdf. Acesso em: 25 set. 2013.
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antes e após da execução das atividades terapêuticas planejadas para tal intento.

Os exercícios foram selecionados e organizados como descritos na literatura1515. Yuen HK, Marlow NM, Reed SG, Mahoney S, Summerlin LM, Leite R et al. Effect of orofacial exercises on oral aperture in adults with systemic sclerosis. Disabil Rehabil. 2012;34(1):84-9.),(1616. Tasca SMT. Programa de aprimoramento muscular em fonoaudiologia estética facial. Barueri: Pró-Fono; 2002.. As massagens orofaciais foram compostas por manobras de deslizamento para promover o relaxamento e diminuir e desfazer as tensões. Manobras de amassamento foram realizadas para melhorar o poder de contratibilidade, elasticidade, flexibilidade e estimular a circulação. As bases da terapia de motricidade orofacial adotadas foram as descritas por Bianchini1717. Toledo PN. Programa de tratamento miofuncional e estomatognático para estética facial. fonoaudiologia e estética. São Paulo: Lovise; 2006.. O trabalho com a respiração, a mastigação e a deglutição partiu do princípio terapêutico miofuncional1212. Genaro KF, Berretin-Félix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial: protocolo MBGR. Rev CEFAC. 2009;11(2):237-55., sendo que para a mastigação e a deglutição foram ofertados alimentos de diferentes consistências.

Cabe ressaltar que, para a seleção do protocolo fonoterápico de pesquisa em motricidade orofacial, foi realizado projeto piloto com uma paciente com ES1818. Bianchini EMG. Bases da terapia de motricidade orofacial. In: Marchesan IQ, Silva HJ, Berretin-Felix G. Terapia fonoaudiológica em motricidade orofacial. São José dos Campos: Pulso; 2012. p. 31-42.. A partir do sucesso terapêutico no referido projeto foi estabelecido as etapas terapêuticas deste estudo, incluindo o aprimoramento da mímica facial e da mobilidade de lábios, língua, bochechas e mandíbula; a diminuição da tonicidade de lábios, língua e bochechas; a diminuição da sensação de dormência; o reestabelecimento do modo respiratório nasal; a adequação dos padrões de mastigação e de deglutição e a suavização das marcas de expressão e rugas.

O processo de intervenção fonoaudiológica teve duração de um ano e meio (36 sessões) e, para comparação da efetividade do trabalho, foi realizada reavaliação utilizando-se o mesmo protocolo utilizado durante a avaliação inicial. Bimestralmente e ao término da pesquisa, foram dadas devolutivas individuais para os participantes.

As sessões terapêuticas, incluindo avaliação e terapia, foram realizadas por duas alunas estagiárias do Curso de Fonoaudiologia da Universidade Federal de Sergipe, campus São Cristóvão. Antes do início da pesquisa, as alunas participaram de capacitação para a aplicação dos protocolos utilizados junto à professora orientadora. Esta, especialista em motricidade orofacial e com experiência na área, acompanhou a aplicação de todas as etapas do procedimento proposto a fim de favorecer a aplicação da proposta.

Os dados obtidos foram digitados no software de planilha eletrônica Excel (pacote Microsoft(r) Office) para análise descritiva de dados e a análise estatística foi realizada no Departamento de Estatística e Ciências Atuariais da instituição de origem. Foi utilizado o programa Statistical Package for the Social Sciences - IBM SPSS(r) versão 16.0 para o Windows (SPSS Inc., 1989-2006, Chicago, Illinois, EUA).

Resultados

Com exceção do sujeito 1 (único participante do gênero masculino na pesquisa), a maioria dos sujeitos apresentou início da doença entre os 30 e 55 anos (média: 34,6). O participante do gênero masculino, de 24 anos, relatou o início da doença aos 22.

O intervalo entre o diagnóstico de ES e os primeiros sintomas foi de um ano e meio. A xerostomia foi uma queixa frequente no grupo amostral (80% - n= 4), bem como o fenômeno de Raynaud - citado pela maioria da amostra (em três dos cinco pacientes - sujeitos 2, 3 e 5) como sintoma inicial. Outros sintomas relatados foram: fraqueza nos membros (sujeito 1), inchaço (sujeitos 4 e 5) e dores nas articulações (sujeito 4).

Os resultados da comparação da mobilidade geral de lábios, língua e bochechas durante a avaliação e após oito meses de intervenção fonoaudiológica e dos dados relativos à tonicidade das estruturas relacionadas a lábios, língua e bochechas encontram-se na Tabela 1.

Tabela 1:
Comparação dos resultados pré e pós-intervenção fonoaudiológica quanto à mobilidade e tonicidade de língua, lábios e bochechas dos cinco pacientes com Esclerose Sistêmica

Em relação ao padrão mastigatório, 100% dos indivíduos apresentaram alterações na avaliação. No momento pós-terapia, o padrão permaneceu unilateral apenas no sujeito 3.

Quanto à deglutição, a Figura 1 demonstra os sinais e sintomas observados durante a avaliação da deglutição no período pré e pós terapia.

Figura 1:
Demonstração dos fatores causadores de intercorrências na deglutição

Também foram pesquisados o tipo e modo respiratório. Quanto ao tipo, todos os indivíduos da amostra apresentaram respiração costo-diafragmática e 80% da amostra (n=4) apresentaram modo oral. Após o processo terapêutico, dos indivíduos que apresentavam alterações, 75% (n=3) apresentaram modo nasal e apenas 25% (n=1) apresentou, assistematicamente, o modo oronasal.

Quanto à abertura máxima de boca, pode-se observar evolução em todos os pacientes da pesquisa, embora somente dois (sujeitos 4 e 5) tenham obtido valores considerados dentro da normalidade (Tabela 2).

Tabela 2:
Medidas, em milímetros, da abertura de boca nos momentos pré e pós-intervenção fonoaudiológica

Na Figura 2 é possível observar a presença de marcas e rugas (primárias ou secundárias) dos indivíduos estudados nos momentos pré e pós-intervenção fonoaudiológica.

Pela avaliação pré-terapia foram observadas alterações na rigidez dos músculos da expressão facial, ausência de linhas de expressão, face com aspecto de máscara e brilho intenso. Além disso, foi observado anteriorização da cabeça em relação ao eixo cervical, rigidez dos músculos esternocleidomastóideos e trapézio em 100% da amostra.

Após a intervenção fonoaudiológica, em 100% da amostra a rigidez encontrada anteriormente nos músculos da expressão facial foi minimizada, foi atenuada a face com aspecto de máscara pela suavização do sulco nasogeniano e diminuição do brilho existente na pele. A anteriorização e rigidez dos músculos cervicais também foram atenuados em 100% dos casos.

Figura 2:
Apresentação dos sujeitos envolvidos no estudo, comparando-se a presença de marcas e rugas (primárias e secundárias) nos momentos pré e pós-terapia

A Figura 3 demonstra, em azul, as áreas de dormência relatadas pelos indivíduos no início da intervenção fonoaudiológica e, em vermelho, a área intraoral ainda com a presença de dormência mesmo após a intervenção fonoaudiológica.

Figura 3:
Regiões da face afetadas pela dormência, referidas pelos sujeitos nos momentos pré-intervenção (em azul) e pós-intervenção fonoaudiológica (em vermelho)

Discussão

A interação entre a Fonoaudiologia e a Reumatologia faz-se relevante, para a ampliação do conhecimento entre as áreas e uma melhor assistência em Saúde aos sujeitos que apresentam doenças reumáticas. Destaca-se a ES pois, apesar de ser relativamente rara, produz significativas alterações sistêmicas progressivas, com curso lento ou rápido, a depender do comprometimento do tecido conjuntivo corpóreo11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73., principalmente por atingir múltiplos22. Godoi ETAM, Barbosa AT, Godoi JTAM, Ramos MAM, Marques SRB, Duarte ALBP. Envolvimento macrovascular e esclerose sistêmica. J Vasc Bras. 2009;8(1):65-76., externos e internos33. Correa MJU, Perazzio SF, Andrade LEC, Kayser C. Laser doopler imaging para quantificação do fluxo sanguíneo de polpa digital em condições basais e após estímulo frio em pacientes com ES. Rev Bras reumat. 2010;50(2):128-34., o que requer equipe especializada e interdisciplinar.

Outro aspecto a ser salientado é a necessidade de assistência constante e de medidas protetoras nas Políticas Públicas, uma vez que a ES pode incapacitar o sujeito para o trabalho44. Miguel RCC, Resende GG, Garcia PP, Gresta LT. O tecido conjuntivo e o sistema musculoesquelético. In: Carvalho MAP, Lana CCD, Bértolo MB. (Org.) Reumatologia: diagnóstico e tratamento. 3 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. p. 3-11., favorecendo a exclusão social.

A ES pode ser classificada como limitada ou difusa22. Godoi ETAM, Barbosa AT, Godoi JTAM, Ramos MAM, Marques SRB, Duarte ALBP. Envolvimento macrovascular e esclerose sistêmica. J Vasc Bras. 2009;8(1):65-76., sendo a limitada de maior interesse à Fonoaudiologia por incluir alterações na face e no pescoço. Apesar do exposto, a literatura ainda é escassa em relatar as alterações miofuncionais orofaciais em sujeitos com ES e as possibilidades de intervenção fonoaudiológica nesta afecção.

Uma das hipóteses que justificam pesquisas incipientes na área diz respeito à relativa raridade da ES. Tal hipótese foi ratificada neste estudo, em que se pode constatar a dificuldade no recrutamento de casos para a composição da amostra. Na literatura11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73. é demonstrada uma incidência anual de quatro a 19 indivíduos por milhão de habitantes.

Outra hipótese diz respeito à dificuldade do estabelecimento de parcerias entre os profissionais, embora justificam-se as pesquisas na área pela necessidade de ampliação do tratamento interdisciplinar. Algumas publicações já demonstraram o envolvimento estrutural e funcional do sistema estomatognático55. Wada T, Ram S. Limited mouth opening secondary to diffuse systemic sclerosis. case Rep. Dent. 2013;2013:937487.)-(1010. Baldrighi SEZM, Nascimento LT. Repercussões orofaciais na Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. In: 19º Congresso Brasileiro e 8º Internacional de Fonoaudiologia, 2011, São Paulo. Disponível em: www.sbfa.org.br/portal/suplementossbfa. Acesso em: 25 set. 2013.
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, justificando a importância da inserção da Fonoaudiologia em ambulatórios de Reumatologia.

Apesar deste estudo ter sido realizado com grupo amostral reduzido, durante o processo terapêutico observou-se a participação efetiva dos participantes, que raramente faltavam às sessões. Os resultados aqui discutidos serão relacionados à avaliação inicial e à reavaliação após um ano e meio de terapia fonoaudiológica (média de 36 sessões). A intenção inicial foi verificar se a intervenção fonoaudiológica a estes sujeitos poderia melhorar o quadro clínico apresentado. As maiores queixas foram a dificuldade nas funções respiratória e de mastigação, na abertura de boca, na higienização dentária, na execução de mímica facial; eventuais engasgos e sensação de dormência e tensão (principalmente em região de masseter, articulação temporomandibular, mentual e orbicular da boca).

Para o atendimento clínico, alguns cuidados especiais foram estabelecidos em virtude da própria afecção, como a preocupação com a climatização do espaço físico. Os atendimentos foram realizados sempre em uma sala que foi propositadamente não climatizada1818. Bianchini EMG. Bases da terapia de motricidade orofacial. In: Marchesan IQ, Silva HJ, Berretin-Felix G. Terapia fonoaudiológica em motricidade orofacial. São José dos Campos: Pulso; 2012. p. 31-42., pois a refrigeração (quer por ar condicionado ou ventilador) podem piorar o quadro do FRy, que ocasiona sinais clínicos como vasoespasmos de extremidades, associados com alterações de coloração típicas, além de ocorrer também limitação dos movimentos articulares e restringindo, dessa forma, a continuidade da sessão terapêutica1919. Baldrighi SEZM, Almeida LF, Lima MC, César CPHAR, Macieira JC. Impacto da intervenção fonoaudiológica na esclerose sistêmica. Distúrb Comum. 2014;26(3):596-605..

A amostra foi composta por cinco indivíduos, sendo 80% do gênero feminino (n=4) e 20% (n=1) do gênero masculino. A média total de idades foi de 44,6 anos (24-60 anos), a média de idade de início da doença 34,6 anos. A ES inicia-se entre 30 e 50 anos77. Pereira DB, Amaral JLA, Szajubok JCM, Lima SMA, Chahade WH. Manifestações otorrinolaringológicas nas doenças reumáticas autoimunes. Rev Bras Reumatol. 2006;46(2):118-25., dado esse também encontrado na maioria dos indivíduos estudados. A média de anos de evolução da doença foi de dez anos e o tempo para diagnóstico de 1,6 anos.

No que diz respeito ao gênero, a predominância feminina veio corroborar os achados da revisão bibliográfica que citaram uma maior prevalência da ES em mulheres, chegando à proporção de três mulheres afetadas para cada homem88. Magro PCFM. Esclerodermia: revisão da literatura e caracterização da população observada na consulta de Reumatologia do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E. [dissertação]. Covilhã (Portugal). Universidade da Beira Interior; 2009.. Além de a prevalência maior em mulheres, a ES também é citada como rara em homens abaixo dos 30 anos e com um prognóstico pior2020. Kayser C, Correa MJU, Andrade LEC. Fenômeno de Raynaud. Rev Bras Reumatol. 2009;49(1):48-63., algo também foi observado nesta amostra.

Os achados referentes à sintomatologia inicial da afecção vão de encontro com a maioria dos achados da literatura. Em 20% da amostra houve como sintoma inicial fraqueza nos membros, outros 20% apresentaram inchaço e manchas pelo corpo. Já os sintomas de apenas manchas pelo corpo apareceram em 40% e inchaço e dores nas articulações em outros 20% da amostra. Portanto, a maior parte dos indivíduos relatou perceber como primeiros sinais manchas pelo corpo, inchaço e dores nas articulações. O achado difere dos dados bibliográficos, pois, segundo a literatura77. Pereira DB, Amaral JLA, Szajubok JCM, Lima SMA, Chahade WH. Manifestações otorrinolaringológicas nas doenças reumáticas autoimunes. Rev Bras Reumatol. 2006;46(2):118-25.),(1919. Baldrighi SEZM, Almeida LF, Lima MC, César CPHAR, Macieira JC. Impacto da intervenção fonoaudiológica na esclerose sistêmica. Distúrb Comum. 2014;26(3):596-605., a presença do Fenômeno de Raynaud (FRy) aparece como sintoma mais frequente em cerca de 90% dos casos. Um viés a ser salientado diz respeito ao número amostral reduzido deste estudo, não sendo possível fazer generalização dos resultados.

Com relação aos órgãos fonoarticulatórios (OFAs), pode-se perceber comprometimento na mobilidade, tonicidade e postura habitual de repouso.

A tonicidade, mobilidade e postura dos OFAs tornam-se significativas durante a função, ou seja, não devem ser observadas apenas isoladamente1212. Genaro KF, Berretin-Félix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial: protocolo MBGR. Rev CEFAC. 2009;11(2):237-55.. Apesar dos indivíduos estudados conseguirem realizar as atividades de mobilidade dos OFAs, observou-se rigidez muscular das bochechas e do mentual. As funções destas estruturas são importantes não só em repouso, mas também durante a mastigação, pois alguns indivíduos apresentaram fechamento assistemático de lábios, alteração na função de mastigação e de deglutição (Figura 1), indicando inadequado funcionamento dos músculos orofaciais e consequente prejuízo na funcionalidade de bochechas e do mentual.

No que diz respeito à mobilidade, toda a amostra estudada apresentou dificuldades na mobilidade de língua (Tabela 1), sendo esta associada à presença de rigidez. Contudo, após a intervenção todos os indivíduos alcançaram o padrão de normalidade. Com relação aos lábios, apenas 20% da amostra apresentou escore zero durante o período de pré-intervenção e após o tratamento, 80% da amostra conseguiu obter escore nulo. A mobilidade das bochechas foi observada normal inicialmente em 40% dos sujeitos, sendo que posterior a intervenção fonoaudiológica esse valor subiu para 80%.

Apesar da melhora da maioria da amostra (80% - como pode ser observado na Tabela 1), um dos sujeitos (S5) ainda não obteve melhora completa da mobilidade de lábios e bochechas (tenta realizar o movimento e o faz aproximado do normal).

Os movimentos práxicos orofaciais são os que mais interessam para a execução das funções orais, em especial a mastigação, a deglutição, a fala e a fonação, e são essenciais tanto a precisão do movimento quanto para sua sequência temporal. No protocolo utilizado, há a possibilidade de anotação tanto para movimentos isolados quanto para os movimentos práxicos de diferentes gradações (zero para normalidade, escore um para movimento aproximado, escore dois para a tentativa de realização do movimento e escore três para a situação de mobilidade inexistente), o que favorece o acompanhamento da evolução dos pacientes em atendimento. No entanto, seria interessante o acréscimo de parâmetros como tempo-hesitação, se houve ou não necessidade de demonstração e ajuda por parte do terapeuta, quer seja por meio de pistas proprioceptivas, táteis ou cinestésicas - o que não foi empregado nesta pesquisa, sendo este um fator que pode ser considerado como uma limitação deste estudo.

Com relação à tonicidade dos lábios (Tabela 1) foi observada normalidade em 60% da amostra. Dos 40% que apresentaram alterações (S2 e S3), verificou-se hipertonia. Apesar desses mesmos sujeitos apresentaram melhora nesse quadro, ainda há presença de hipertonicidade em grau leve (por esse motivo observa-se o valor de 60% no período pós-intervenção). Já com relação à língua, foram observados na avaliação pré-terapia 60% da amostra sem alterações. Na reavaliação final, 100% da amostra foi considerada normal quanto à tensão de língua. A tonicidade das bochechas foi normal em 20% da amostra estudada na avaliação, e após a intervenção 60% dos indivíduos obtiveram normalidade.

Na postura habitual de lábios em repouso, 100% da amostra passou a apresentar selamento labial após realizar intervenção fonoaudiológica. Hipotetiza-se que o ganho tenha ocorrido devido à redução na rigidez oral e facial adquirida em virtude do alongamento das fibras oromiofaciais. Cabe salientar, no entanto, que o sujeito 2 teria, em virtude de má oclusão de Angle Classe II, dificuldades no selamento labial. Pode-se observar, pela Figura 2, que tal sujeito faz o selamento, porém com hipertonia de mentual, não sendo, portanto, exigida tal postura a este sujeito.

Pesquisadores1010. Baldrighi SEZM, Nascimento LT. Repercussões orofaciais na Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. In: 19º Congresso Brasileiro e 8º Internacional de Fonoaudiologia, 2011, São Paulo. Disponível em: www.sbfa.org.br/portal/suplementossbfa. Acesso em: 25 set. 2013.
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relataram alterações nos aspectos relacionados à mobilidade, tonicidade dos OFAs e na postura habitual de repouso em pacientes com ES. Essas alterações provavelmente ocorrem em decorrência da diminuição da função da musculatura da face, indicando aumento da rigidez, o que pode contribuir para a redução da amplitude dos movimentos mandibulares e, consequentemente, causar prejuízos nas funções orais.

A explicação para os aspectos supracitados pode ser justificada também em função da deposição crônica de colágeno, bem como na restrição da abertura da boca citada frequentemente na literatura11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73.),(99. Baldrighi SEZM, Brito AF, Teixeira JP. Lima APLV. Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. Revista extensão & Sociedade. 2011 [acesso em 30 set 2015]; 2(3). Disponível em http://www.periodicos.ufrn.br/ojs/index.php/extensaoesociedade
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em sujeitos com ES, visualizada também na Tabela 2. Nesses casos, a pele vai se tornando progressivamente espessa e perde elasticidade, limitando os movimentos faciais. Na face, o espessamento cutâneo leva a manifestações orofaciais incluindo a rigidez e a atrofia da pele, a perda de expressão (com diminuição dos lábios e o afilamento do nariz) e alteração da abertura de boca. Tais características acarretam em facies de máscara11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73.),(77. Pereira DB, Amaral JLA, Szajubok JCM, Lima SMA, Chahade WH. Manifestações otorrinolaringológicas nas doenças reumáticas autoimunes. Rev Bras Reumatol. 2006;46(2):118-25.. A melhora nos aspectos supracitados já fora verificada por pesquisadores1818. Bianchini EMG. Bases da terapia de motricidade orofacial. In: Marchesan IQ, Silva HJ, Berretin-Felix G. Terapia fonoaudiológica em motricidade orofacial. São José dos Campos: Pulso; 2012. p. 31-42. em um caso clínico após instauração de terapia fonoaudiológica.

Conforme demonstrado, a função de mastigação foi alterada em 100% dos indivíduos - antes da terapia, era caracterizada por trituração ineficiente, contrações musculares atípicas, velocidade diminuída e incidência de preferência mastigatória. A conquista da mastigação ideal (bilateral) pós-terapia esteve presente em 80%. A dificuldade na mastigação em sujeitos com ES foi citada na literatura88. Magro PCFM. Esclerodermia: revisão da literatura e caracterização da população observada na consulta de Reumatologia do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E. [dissertação]. Covilhã (Portugal). Universidade da Beira Interior; 2009.)-(1010. Baldrighi SEZM, Nascimento LT. Repercussões orofaciais na Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. In: 19º Congresso Brasileiro e 8º Internacional de Fonoaudiologia, 2011, São Paulo. Disponível em: www.sbfa.org.br/portal/suplementossbfa. Acesso em: 25 set. 2013.
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. A função de mastigação alterada pode estar relacionada à desordem da articulação temporomandibular e de limitações dos movimentos mandibulares. Além disso, o enrijecimento leva a uma alteração nos movimentos das estruturas envolvidas nesse ato em decorrência da deposição de colágeno nos tecidos periorais11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73..

Assim, aspectos multifatoriais podem justificar os prejuízos no processo mastigatório de sujeitos com ES, como o tônus aumentado de língua, lábios e bochechas; o enrijecimento com perda da elasticidade da pele, as disfunções temporomandibulares, as condições precárias dos elementos dentários e do periodonto e a xerostomia e a limitação de mobilidade de lábios, língua, bochechas e mandíbula. Justifica-se, sobremaneira, a necessidade de intervenção fonoaudiológica o mais breve possível, uma vez que as referidas funções são executada diariamente e não prejudica apenas nos aspectos nutricionais, como também interferem nos aspectos emocionais e sociais que envolvem os sujeitos.

Outra função que também sofrerá os mesmos impactos é a deglutição, que depende de complexa ação neuromuscular (sensibilidade, paladar, propriocepção, mobilidade, tônus e tensão). Na ES a deglutição foi relatada pela literatura88. Magro PCFM. Esclerodermia: revisão da literatura e caracterização da população observada na consulta de Reumatologia do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E. [dissertação]. Covilhã (Portugal). Universidade da Beira Interior; 2009.)-(1010. Baldrighi SEZM, Nascimento LT. Repercussões orofaciais na Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. In: 19º Congresso Brasileiro e 8º Internacional de Fonoaudiologia, 2011, São Paulo. Disponível em: www.sbfa.org.br/portal/suplementossbfa. Acesso em: 25 set. 2013.
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),(1919. Baldrighi SEZM, Almeida LF, Lima MC, César CPHAR, Macieira JC. Impacto da intervenção fonoaudiológica na esclerose sistêmica. Distúrb Comum. 2014;26(3):596-605. como alterada. A desordem na deglutição pode levar a quadros de complicações pulmonares que, se não forem reconhecidos e tratados a tempo, levarão a hospitalizações frequentes e piora no quadro de saúde, podendo comprometer severamente as condições de vida e saúde desses indivíduos.

Pesquisadores2121. Marcucci M, Abdala N. Análise do masseter, por espectroscopia de próton, em pacientes com esclerose sistêmica. Radiol Bras. 2009;42(3):145-50. relataram caso clínico de paciente do gênero feminino, de 50 anos de idade, que apresentava doença mista de tecido conjuntivo (ES, lúpus eritematoso disseminado e polimiosite) com queixas de dificuldades de deglutição, engasgos frequentes, abertura de boca limitada e sintomas de refluxo. Foi instaurada terapia fonoaudiológica semanal, por um ano, demonstrando efetividade no processo fonoterápico. Por meio de exame videofluoroscópico foi evidenciada dificuldades em ejeção do bolo alimentar, com estase em valéculas e recesso piriforme, demonstrando diminuição da motilidade faríngea. Por manometria de esôfago, constataram alteração motora caracterizada por hipotonia e ausência de atividade contrátil.

Neste estudo, apesar do encaminhamento para exames por imagem, os pacientes não os realizaram. Sendo assim, procedeu-se com a análise clínica da deglutição, obtendo-se a presença de sinais e sintomas de alterações na deglutição conforme pode ser observado na Figura 1. A dieta alimentar exclusivamente líquida e com resíduos de alimento na cavidade oral ocorreu em 20% da amostra estudada, com contração de masseter em 60%. A contração de mentual, a participação perioral e a rigidez de laringe foram notadas em 80% da amostra. O movimento associado de cabeça (ântero-posterior) ocorreu em 40%. Após a terapia fonoaudiológica o sujeito S3, que inicialmente só se alimentava por dieta líquida, após a 17ª sessão, passou a se alimentar na consistência pastosa. A contração de masseter, de mentual e a participação perioral ainda persistem em 20% da amostra - mesmo assim, foi possível observar melhoras no quadro clínico dos participantes. O resíduo alimentar na cavidade oral e movimento associado de cabeça não foi mais notado em 100% dos sujeitos. Com relação à rigidez de laringe, 40% da amostra ainda apresenta a alteração, porém com relatos de melhora no quadro.

Durante a anamnese, alguns participantes informaram a presença de sintomas de desordem da deglutição como tosse pós-deglutição (60% dos casos) e engasgo (80%). Cabe ressaltar que tais sintomas, sugestivos de distúrbios da deglutição, não foram observados no momento da avaliação nem durante o processo de intervenção fonoaudiológica. Quando esses dados foram retomados durante a reavaliação, não houve mais queixas desses sintomas por parte do grupo amostral.

Outro fator que prejudica a mastigação e a deglutição é a presença de xerostomia. Segundo a literatura, deglutir2222. Mendes LMA, Mendes CG, Rehder MIBC. Atuação fonoaudiológica em um caso de doença mista do tecido conjuntivo. Rev CEFAC. 2006;8(1):79-83. é uma sensação subjetiva de boca seca. Quando ocorre a diminuição quantitativa do fluxo salivar, entre os sinais mais importantes está a não acumulação de saliva no pavimento da boca: os lábios tornam-se secos e com textura alterada (saliva branca, espumosa, fibrosa ou pegajosa), além de poder ocorrer persistência de cáries do colo dentário, erosões dentárias, dor crônica ou ardência, dificuldade em falar, mastigar e deglutir. Na realização da anamnese, 80% dos indivíduos apresentaram tal queixa. Durante a reavaliação, esse dado não foi mais relatado pelos indivíduos estudados.

Hipotetiza-se que o aumento da mobilidade de língua, bem como o fornecimento de orientações quanto à necessidade de maior hidratação oral foram aspectos que propiciaram a melhora obtida quanto à xerostomia.

Em relação às questões respiratórias, autores1212. Genaro KF, Berretin-Félix G, Rehder MIBC, Marchesan IQ. Avaliação miofuncional orofacial: protocolo MBGR. Rev CEFAC. 2009;11(2):237-55.),(2323. Michels-VanAmelsfort JM, Brand HS, Van Laar JM. Oral manifestation of systemic sclerosis. Review Dutch. 2013;120(9):446-50. afirmaram que a respiração nasal é um processo de vital importância para o indivíduo, sendo essencial para o crescimento e desenvolvimento equilibrado da musculatura orofacial. Assim, quando há permanência do quadro respiratório alterado (oral ou oronasal), coloca-se em perigo o equilíbrio das demais funções orais.

Na ES, mais de 70% dos pacientes apresentam acometimento pulmonar, manifestado desde a fibrose pulmonar até doença vascular pulmonar. O quadro pode evoluir para hipertensão pulmonar, citada na literatura como uma das principais causas de óbito nesta afecção2424. Silva MAA, Marchesan IQ, Ferreira LP, Schimitd R, Ramires RR. Postura, tônus e mobilidade de lábios e língua de crianças respiradoras orais. Rev CEFAC. 2012;14(5):853-60..

Existe relato88. Magro PCFM. Esclerodermia: revisão da literatura e caracterização da população observada na consulta de Reumatologia do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E. [dissertação]. Covilhã (Portugal). Universidade da Beira Interior; 2009. de alteração no modo respiratório na ES. Isso se justifica pelos problemas pulmonares e pela dificuldade apresentada para o fechamento labial sistemático em função da rigidez na musculatura orofacial e do espessamento da pele.

Inicialmente, durante a anamnese, os indivíduos foram questionados a respeito de queixas em relação à percepção da respiração. Todos os sujeitos (100%) referiram sintomas como cansaço e falta de ar ao realizar atividades de pouco esforço físico. Na literatura, esse dado pode ser explicado pela falta de ar causada pela fibrose pulmonar - o indivíduo passa a ter o pulmão enrijecido11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73.. Após a verificação de que nenhum fator obstrutivo orgânico impedia o modo respiratório nasal, o trabalho com a conscientização e exercícios envolvendo o modo respiratório nasal foram executados, sendo possível a melhora já na sexta sessão. Na avaliação pós-intervenção foi possível constatar que nem a queixa nem o modo respiratório alterado estavam presentes na amostra. Cabe ressaltar que o sujeito 2, por apresentar alterações oclusais, apesar de respirar pelo nariz, ainda permanecia com postura de lábios abertos.

Com relação à limitação de abertura da boca, alguns sujeitos passam a apresentar, no decorrer da evolução da doença, a microstomia. Este é um achado frequente nos casos de ES e possivelmente está relacionada ao espessamento da pele característico da doença11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73..

Medidas que proporcionam o aumento da amplitude de abertura da boca promovem a melhora das funções orais e de medidas de higiene, justificando a ação o mais precocemente possível em pacientes com doenças reumáticas como a ES. Evita-se, assim, a instalação da microstomia1313. Marchesan IQ. Deglutição - diagnóstico e possibilidades terapêuticas. In: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia - aspectos clínicos da motricidade oral. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 51-8.),(1414. Vincent C, Agard C, Barbarot S, N'Guyen JM, Planchon B, Durant C et al. Orofacial manifestations of systemic sclerosis: A study of 30 consecutive patients. Rev Stomatol Chir Maxillofac.. 2010;111(3):128-34..

Neste estudo, esse dado foi confirmado no exame clínico do sistema estomatognático: durante relatos na anamnese, foram relatadas dificuldades em realizar manobras de higiene bucal (contratempos no manuseio da escova de dente causada pela garra esclerodérmica e na abertura da boca para a higienização), aspectos também citados pela literatura11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73.. Esse achado foi ratificado por outro estudo99. Baldrighi SEZM, Brito AF, Teixeira JP. Lima APLV. Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. Revista extensão & Sociedade. 2011 [acesso em 30 set 2015]; 2(3). Disponível em http://www.periodicos.ufrn.br/ojs/index.php/extensaoesociedade
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, que comentou sobre as implicações da limitação na abertura da boca para a fala e para a eficiência da mastigação.

Na Tabela 2 pode-se verificar os resultados obtidos nos momentos pré e pós-intervenção fonoaudiológica quanto a abertura máxima de boca. Pode-se observar que os valores iniciais, de todo grupo amostral, foram menores de 40 milímetros (mm). Na literatura, os valores de referência para a normalidade para a abertura são discutidos, pois há autores1313. Marchesan IQ. Deglutição - diagnóstico e possibilidades terapêuticas. In: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia - aspectos clínicos da motricidade oral. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2005. p. 51-8.),(1414. Vincent C, Agard C, Barbarot S, N'Guyen JM, Planchon B, Durant C et al. Orofacial manifestations of systemic sclerosis: A study of 30 consecutive patients. Rev Stomatol Chir Maxillofac.. 2010;111(3):128-34.),(2525. Miranda IA. Análise da mecânica ventilatória de indivíduos portadores de esclerose sistêmica através da Técnica de Oscilações Forçadas [Dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Universidade do Rio de Janeiro; 2010. que citaram a normalidade para valores acima de 40mm, enquanto outros2626. Paquette DL, Falanga V. Cutaneous concerns of scleroderma patients. J Dermatol. 2003;30:438-43. defendem a normalidade acima de 45mm em adultos.

Optou-se, neste estudo, pelo índice de normalidade acima de 45mm de acordo com o citado por Bianchini2626. Paquette DL, Falanga V. Cutaneous concerns of scleroderma patients. J Dermatol. 2003;30:438-43.. Durante o processo terapêutico observou-se que, no percurso terapêutico, houve uma expressiva melhora nos valores de abertura de toda a amostra.

As medições foram realizadas em todas as sessões para que o indivíduo observasse como as manobras de alongamento e os exercícios resultavam em ganho expressivo da abertura da boca, valorizando o processo terapêutico. Desta forma, as medições serviram de incentivo na adesão ao processo terapêutico e na realização contínua dos exercícios em casa. No entanto, apesar de ainda estar abaixo do padrão de normalidade de abertura de boca2626. Paquette DL, Falanga V. Cutaneous concerns of scleroderma patients. J Dermatol. 2003;30:438-43., os sujeitos S1, S2, e S3 tiveram ganhos expressivos. S1 e S2 apresentaram ganho com variação de 5 a 6mm, S3 aumentou 10.3mm e os sujeitos S4 e S5 atingiram o padrão de normalidade com ganho variando de 10 a 14.2mm.

Conforme mencionado, a ES é uma doença incomum do tecido conjuntivo tendo como manifestação proeminente o espessamento ou fibrose cutânea2727. Bianchini EMG. Mastigação e ATM: avaliação e terapia. In: Marchesan IQ. Fundamentos em Fonoaudiologia - aspectos clínicos da motricidade oral. 2ªed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 2005; p.45-57.. Em relação à mímica facial, os músculos orais (em estado estático ou em movimento) apresentaram-se rígidos, principalmente o músculo orbicular da boca. Esse estado é mais evidente na região superior do lábio, dado relatado por pesquisadores da área99. Baldrighi SEZM, Brito AF, Teixeira JP. Lima APLV. Esclerodermia Sistêmica: relato de caso. Revista extensão & Sociedade. 2011 [acesso em 30 set 2015]; 2(3). Disponível em http://www.periodicos.ufrn.br/ojs/index.php/extensaoesociedade
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. A redução da mímica facial é relatada na literatura como uma alteração bastante frequente nesses indivíduos11. Pereira MCMC, Nunes RAM, Marchionni AM, Martins GB. Esclerodermia sistêmica: relato de caso clínico. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2009;21(1):69-73.),(88. Magro PCFM. Esclerodermia: revisão da literatura e caracterização da população observada na consulta de Reumatologia do Centro Hospitalar Cova da Beira, E.P.E. [dissertação]. Covilhã (Portugal). Universidade da Beira Interior; 2009.),(2828. Kayser C, Andrade LEC. Esclerose sistêmica. In: Sato E. Guias de medicina ambulatorial e hospitalar-reumatologia. São Paulo: Manole; 2010. p. 113-23.)-(3030. Scardina GA, Mazzillo M, Messina P. Early diagnosis of progressive systemic sclerosis: the role of oro-facial phenomena. Minerva Stomatol. 2002;51(7-8):311-7..

A presença de marcas e rugas (primárias ou secundárias) foi analisada neste estudo por meio de exame clínico subjetivo realizado por meio da observação visual e por registros fotográficos, conforme as imagens contidas na Figura 2. Na avaliação pré-terapia foram observadas alterações quanto rigidez dos músculos da expressão facial, ausência de linhas de expressão, face com aspecto de máscara e brilho intenso. Também foram observados anteriorização da cabeça em relação ao eixo cervical, rigidez dos músculos esternocleidomastóideos e trapézio em 100% da amostra.

Após a intervenção fonoaudiológica, houve diminuição da rigidez da musculatura da face em 100% da amostra, sendo possível a execução de mímicas faciais. Além disso, foi atenuada a característica da face com aspecto de máscara pela suavização do suco nasogeniano, bem como houve a diminuição do brilho existente na pele. A anteriorização e rigidez dos músculos cervicais também foram atenuados em 100% dos casos.

Para a melhora de tais aspectos, tornou-se imprescindível que o grupo de estudo apresentasse propriocepção corporal e orofacial para que houvesse a regulação da postura habitual e a modificação dos estados tensionais (quando possíveis), conforme afirmado pela literatura1515. Yuen HK, Marlow NM, Reed SG, Mahoney S, Summerlin LM, Leite R et al. Effect of orofacial exercises on oral aperture in adults with systemic sclerosis. Disabil Rehabil. 2012;34(1):84-9..

Além disso, as manobras de relaxamento na região orofacial favorecem, segundo a literatura1515. Yuen HK, Marlow NM, Reed SG, Mahoney S, Summerlin LM, Leite R et al. Effect of orofacial exercises on oral aperture in adults with systemic sclerosis. Disabil Rehabil. 2012;34(1):84-9., os receptores sensoriais e o aumento do fluxo da circulação sanguínea e linfática pelo aumento da dilatação dos vasos e, por conseguinte, podem eliminar toxinas mesmo após as massagens realizadas na região orofacial. Deste modo, permite movimentos musculares mais ágeis, coordenados e sem esforço - sensações não percebidas desde o início da evolução da doença por todos os sujeitos da amostra. Este aspecto também foi significativo para a adesão dos sujeitos da pesquisa.

Uma observação importante na análise facial pré e pós-intervenção fonoaudiológica foi a diminuição de marcas e rugas em 80% da amostra (sujeitos 2 a 5), como pode ser observado na Figura 2. De acordo com a literatura1515. Yuen HK, Marlow NM, Reed SG, Mahoney S, Summerlin LM, Leite R et al. Effect of orofacial exercises on oral aperture in adults with systemic sclerosis. Disabil Rehabil. 2012;34(1):84-9., as rugas podem advir de contrações musculares repetidas, habituais e por excessiva contração. No caso da ES, a rigidez da musculatura orofacial aliada ao acometimento vascular e às alterações fibróticas da pele33. Correa MJU, Perazzio SF, Andrade LEC, Kayser C. Laser doopler imaging para quantificação do fluxo sanguíneo de polpa digital em condições basais e após estímulo frio em pacientes com ES. Rev Bras reumat. 2010;50(2):128-34. são suficientes para o envelhecimento precoce nesses sujeitos. Desta forma, outro benefício da atuação fonoaudiológica na ES diz respeito à estética facial, atuando na autoestima dos sujeitos da amostra e, por consequência, na adesão ao tratamento.

Outro sintoma citado e possível de ser observado na Figura 3 foi a dormência orofacial. Neste sentido, duas hipóteses podem ser elencadas. A primeira, da presença concomitante de neuropatia trigeminal (V nervo craniano), relatado como possível pela literatura66. Baron M, Hudson M, Tatibouet S, Steele R, Lo E, Gravel S et al. The Canadian systemic sclerosis oral health study: orofacial manifestations and oral health-related quality of life in systemic sclerosis compared with the general population. Rheumatology (Oxford). 2014;53(8):1386-94.. A segunda pela falta de suprimento sanguíneo, em virtude do acometimento vascular específico da doença33. Correa MJU, Perazzio SF, Andrade LEC, Kayser C. Laser doopler imaging para quantificação do fluxo sanguíneo de polpa digital em condições basais e após estímulo frio em pacientes com ES. Rev Bras reumat. 2010;50(2):128-34.. Durante a aplicação de massagens para aumentar o fluxo sanguíneo na região facial, ocorre o aumento da mobilidade e melhora da circulação sanguínea. Consequentemente, há diminuição da sensação de dormência, presente em 60% dos participantes deste estudo. Após a terapia fonoaudiológica, a dormência persistiu apenas em 20% da amostra estudada (S1), porém apenas no terço inferior intraoral e com intensidade menor da citada anteriormente à intervenção terapêutica.

Pode-se afirmar que as metas terapêuticas estabelecidas, a partir do desfecho clínico proposto, foram atingidas com sucesso, já que nos sujeitos observou-se:

  • o aprimoramento da mímica facial e da mobilidade de lábios, língua, bochechas e mandíbula;

  • a diminuição da tonicidade de lábios, língua e bochechas;

  • a diminuição da sensação de dormência;

  • o restabelecimento do modo respiratório nasal;

  • a adequação dos padrões de mastigação e deglutição; e

  • a suavização das marcas de expressão e rugas na maioria dos sujeitos do estudo.

Os relatos obtidos também citaram como ganhos obtidos no percurso terapêutico a possibilidade de melhor expressar suas emoções; a diminuição da sensação de "boca seca"; a possibilidade de se alimentar melhor; a sensação de respirar com mais facilidade; e a percepção de "soltura" da musculatura orofacial. São evidentes, portanto, os impactos dos benefícios biopsicossociais e de qualidade de vida ocasionados pelo procedimento proposto - principalmente considerando que os sujeitos têm consciência de que a ES é uma doença progressiva e crônica.

São necessários grupos maiores e estudo de acompanhamento longitudinal para observar se há ou não manutenção das metas terapêuticas fonoaudiológicas atingidas.

Conclusão

Comparando-se os resultados da avaliação inicial e os resultados obtidos nos momentos pré e pós-intervenção fonoaudiológica, observou-se melhora significativa nos aspectos miofuncionais orofaciais trabalhados, principalmente nos que dizem respeito à abertura máxima da boca; à mobilidade e tonicidade de língua, bochechas e mandíbula; à execução de mímica facial; às funções de mastigação, respiração e deglutição; à diminuição da dormência orofacial e à queixa de xerostomia; à postura habitual de lábios.

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  • Fonte de auxílio à pesquisa: Programa Pibic/CNPq - bolsa COPES/UFS(2012-13).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Feb 2016

Histórico

  • Recebido
    29 Out 2015
  • Aceito
    26 Nov 2015
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