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Intensidade da dor torácica aguda em unidade de emergência cardiopulmonar

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A mensuração da dor no momento do acolhimento em emergência é uma conduta clínica vital para criação de estratégias visando o tratamento e minimizando seus custos. Nesse contexto, o objetivo deste estudo foi mensurar a intensidade da dor torácica aguda de pacientes atendidos em uma unidade de emergência cardiopulmonar.

MÉTODOS:

Pesquisa de natureza quantitativa realizada em dois momentos com pacientes atendidos em uma unidade de dor torácica do município de Fortaleza no estado do Ceará no período de março de 2007 a fevereiro de 2010. População composta de 430 pacientes que após exclusão formou-se amostra de 213. Aplicou-se a escala analógica visual em dois momentos e a análise dos escores obtidos, das médias e desvio padrão ocorreu por meio do teste de Wilcoxon e U de Mann-Whitney.

RESULTADOS:

Encontraram-se diferenças significativas entre os valores dos escores obtidos nos dois momentos, apresentando-se maiores escores de intensidade da dor no primeiro momento em relação ao segundo, ao nível de significância de 5%. A intensidade da dor quando associada com a presença de doença cardíaca ou pulmonar demonstrou não haver correlação.

CONCLUSÃO:

A mensuração da dor é um desafio para os profissionais nas emergências e são necessários estudos que busquem novos métodos para avaliação da dor.

Descritores:
Dor; Dor no peito; Emergências; Escala analógica visual; Mensuração da dor

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Pain evaluation at emergency unit admission is vital for the establishment of strategies to manage it and minimize its costs. So, the objective of this study was to evaluate acute chest pain intensity in patients admitted to a cardiopulmonary emergency unit.

METHODS:

This is a quantitative study carried out in two moments with patients admitted to a chest pain unit of the city of Fortaleza, state of Ceará, in the period from March 2007 to February 2010. Initial sample was made up of 430 patients and, after exclusion, 213 have remained. Visual analog scale was applied in two moments and Wilcoxon and Mann-Whitney U tests were used for analysis of scores, means and standard deviation.

RESULTS:

There were significant differences between both moments, with higher pain intensity scores in the first moment as compared to the second, at significance level of 5%. There has been no correlation between the presence of cardiac or pulmonary disease and pain intensity.

CONCLUSION:

Pain evaluation is a challenge for professionals working in emergency units and further studies looking for new evaluation methods are necessary.

Keywords:
Chest pain; Emergencies; Pain; Pain evaluation; Visual analog scale

INTRODUÇÃO

A dor torácica aguda é uma importante queixa de usuários atendidos em unidades de saúde no Brasil, especialmente em serviços de emergência onde são estimados quatro milhões de atendimentos por ano11 Oliveira GN, Silva MF, Araujo IE, Carvalho Filho MA. Perfil da população atendida em uma unidade de emergência referenciada. Rev Latino-Am Enfermagem. 2011;19(3):548-56.; além disso, as manifestações da síndrome coronariana aguda são complexas e de difícil triagem, o que exige preparo de médicos e enfermeiros em relação à avaliação, mensuração e identificação da dor e suas possíveis causas22 Caveião C, Santos RB, Montezeli JH, Visentin A, Brey C, Oliveira VB. Dor torácica: atuação do enfermeiro em um pronto atendimento de um hospital escola. R Enferm Cent O Min. 2014;4(1):921-8..

Esses profissionais precisam verificar a presença de quadro anginoso ou doença coronariana pelo exame físico minucioso e exames complementares, e isso exige raciocínio rápido e conciso devido aos fatores emocionais e culturais que influenciam a percepção da dor do paciente, bem como às diversas causas de origem cardíaca e não cardíaca com características clínicas associadas aos sistemas vascular, pulmonar, gastrointestinal, musculoesquelético e psicológico33 Bassan R, Pimenta L, Leães PE, Timerman A. Sociedade Brasileira de Cardiologia. I Diretriz de Dor Torácica na Sala de Emergência. Arq Bras Cardiol. 2002;79(Suppl 2):1-22..

A dor torácica aguda necessita de uma avaliação clínica acurada por meio de vários indicadores comuns também a outros tipos de dores como localização, forma de início, intensidade, irradiação, tipo, duração, recorrência, fatores precipitantes, de melhora e piora, sinais e sintomas associados, comorbidades, fatores de risco e antecedentes mórbidos pessoais e familiares44 Nicolau JC, Timerman A, Marin-Neto JA, Piegas LS, Barbosa CJ, Franci A, et al. [Guidelines of Sociedade Brasileira de Cardiologia for unstable angina and non-ST-segment elevation myocardial infarction (II ed. 2007) 2013-2014 update]. Arq Bras Cardiol. 2014;102(3Suppl 1):1-61. Portuguese..

Nesse quadro alarmante, o índice de mortalidade por doenças do aparelho circulatório é elevado no Brasil. Os dados estatísticos do DATASUS apontam a maior taxa de mortalidade de 11,32% para a região sudeste e a terceira maior taxa (6,86%) para a região nordeste no período de janeiro a dezembro de 201555 Brasil. Ministério da Saúde. Banco de dados do Sistema Único de Saúde-DATASUS, Sistema de Informações sobre Mortalidade. [http://www2.datasus.gov.br/DATASUS/].
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O uso de protocolos assistenciais hospitalares encontra resistência por parte de muitos profissionais que atuam nas emergências, apesar de ser amplamente difundido e recomendado pela I Diretriz Brasileira de Dor Torácica na Sala de Emergência. Nesse sentido, a Agência Americana de Pesquisa e Qualidade em Saúde Pública e a Sociedade Americana de Dor estabeleceram diretrizes considerando a dor como o quinto sinal vital, exigindo assim, avaliação, mensuração e atendimento adequados ao mesmo tempo em que são avaliados os demais sinais vitais66 Araujo LC, Romero B. Dor: avaliação do 5° sinal vital. Uma reflexão teórica. Rev Dor. 2015;16(4):291-6.,77 Queiróz DT, Carvalho MA, Carvalho GD, Santos SR, Moreira AS, Silveira MF. Dor - 5º sinal vital: conhecimento de enfermeiros. Rev Enferm UFPE. 2015;9(4):7186-92.. Além dessas instituições, o Ministério da Saúde recomenda que os profissionais de saúde nas situações comuns de acolhimento à demanda espontânea de usuários com queixa de dor torácica aguda, utilizem os saberes clínicos, epidemiológicos e a subjetividade para identificar riscos e vulnerabilidades88 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Acolhimento à demanda espontânea: queixas mais comuns na Atenção Básica/Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. - Brasília: Ministério da Saúde, 2012. 290 p. : il. - (Cadernos de Atenção Básica n. 28, Volume II)[http://www.saude.gov.br/bvs].
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A intensidade da dor é o grau de dor experimentado pelo paciente e a forma de expressão está diretamente relacionada com a sua subjetividade, o que torna difícil o controle da dor. Diante dessa dificuldade, instrumentos para a quantificação ou mensuração da dor foram criados permitindo, assim, maior planejamento da terapêutica analgésica e alívio eficaz da dor99 Pereira LV, Pereira GA, Moura LA, Fernandes RR. Intensidade da dor em idosos institucionalizados: comparação entre as escalas numérica e de descritores verbais. Rev Esc Enferm USP. 2015;49(5):804-10..

Os instrumentos utilizados para a mensuração da intensidade da dor podem ser divididos em uni e multidimensionais. Os instrumentos multidimensionais de mensuração da dor englobam questionários e prontuários sobre percepção da dor, enquanto os instrumentos unidimensionais referem-se às escalas verbais e numéricas, destacando-se a escala analógica visual (EAV) que permite o acompanhamento do quadro doloroso e a avaliação periódica da terapêutica proposta1010 Salaffi F, Sarzi-Puttini P, Atzeni F. How to measure chronic pain: new concepts. Best Pract Res Clin Rheumatol. 2015;29(1)164-86.. As escalas numéricas funcionam através de uma pontuação de zero a 10 que representam a intensidade da dor do paciente naquele momento. Na EAV, a avaliação pode ser realizada por meio de uma linha com 10cm ou 100mm, onde uma extremidade representa "ausência de dor" e a outra indica "maior dor imaginável". A EAV possui vantagem em relação às outras escalas, pois não há valores pré-estabelecidos entre as extremidades e proporciona diferenças porcentuais nas avaliações de dor de um indivíduo ou entre eles1111 Moutte SD, Brudvik C, Morken T. Physicians' use of pain scale and treatment procedures among children and youth in emergency primary care - a cross sectional study. BMC Emerg Med. 2015;15(33):8..

A mensuração da dor ainda pode ser complementada com o uso de diagramas corporais, nos quais o paciente demonstra pontos dolorosos. Os diagramas permitem correlacionar informações como locais dolorosos, distribuição nervosa, músculos envolvidos resultando em uma melhor compreensão da dor e norteando uma terapêutica mais adequada1212 Fortunato JG, Furtado MS, Hirabae LF, Oliveira JA. Escalas de dor no paciente crítico: uma revisão integrativa. Rev Hosp Univ Pedro Ernesto. 2013;12(3):110-7..

Pesquisadores identificaram poucas investigações científicas sobre a temática dor nas emergências e alertam quanto ao grande quantitativo de usuários atendidos, o tempo de permanência nesse setor e o volume de variáveis a serem pesquisadas. Desse modo, objetivou-se mensurar a intensidade da dor torácica aguda de pacientes atendidos em uma unidade de emergência cardiopulmonar de referência no estado do Ceará em dois momentos, no acolhimento e após administração de terapêutica analgésica, com o intuito de fornecer dados necessários para o controle e alívio da dor de forma satisfatória e individual de acordo com o perfil traçado por cada entrevistado.

MÉTODOS

Estudo categorizado como uma pesquisa exploratória com abordagem quantitativa, no qual foi avaliada a intensidade da dor torácica aguda em dois momentos. O "primeiro momento" diz respeito à intensidade da dor referida por pacientes ao chegar à unidade de atendimento de emergência e o "segundo momento" ocorre após a administração de terapêutica analgésica.

A população constou de 430 pacientes atendidos em uma unidade de emergência cardiopulmonar de referência no estado do Ceará, Brasil durante o período de março de 2007 a fevereiro de 2010, onde foram incluídos pacientes com idade de 18 a 60 anos de ambos os gêneros, e excluídos os que haviam ingerido fármacos analgésicos previamente ao atendimento, relatado transtornos psiquiátricos, incongruência verbal, auditiva e irritação. Os critérios de exclusão foram assim estabelecidos devido à necessidade do comparativo entre a intensidade da dor nos dois momentos com o uso da EAV. Os dados do primeiro momento dos pacientes que desistiram ou não foram encontrados no segundo momento permaneceram inalterados na pesquisa.

Esta pesquisa faz parte dos Projetos de Pesquisa para o Sistema Único de Saúde (PPSUS), sendo fomentada pela Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (FUNCAP). Os aspectos éticos presentes nas diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos contidos na resolução nº 466/12 também foram respeitados. Para tal, os pacientes foram informados sobre a possibilidade de risco à saúde, durante a entrevista e mensuração da dor pela EAV, com garantia de atendimento imediato caso ocorresse algum evento agravante. Além disso, foi garantido tanto o sigilo da sua identidade quanto a recusa em participar da pesquisa a qualquer momento.

A amostra foi composta de 213 pacientes, não probabilística, não intencional e por conveniência de acesso dos usuários à unidade. Os pacientes foram informados e reiterados no Termo de Compromisso Livre e Esclarecido (TCLE) e as entrevistas ocorreram em horários convenientes para o (a) entrevistador (a) após assinatura do TCLE. No primeiro momento, os pacientes foram abordados e um questionário contendo perguntas sobre dados de identificação e morbidades prévias foi aplicado. Logo em seguida, os pacientes foram apresentados à EAV e solicitados que marcassem um risco perpendicular em uma linha estendida horizontalmente de 10cm com um lápis no ponto que melhor representasse a intensidade da dor percebida no momento da avaliação sendo estabelecido o extremo esquerdo como "ausência de dor" e o extremo direito como "maior dor imaginável". No segundo momento, o paciente teve acesso à sua avaliação inicial e o procedimento foi repetido. O valor numérico da EAV foi extraído pela medida da distância em centímetros do extremo esquerdo "ausência de dor" até o ponto sinalizado pelo paciente, obtendo-se o escore absoluto de intensidade da dor quando comparado com uma régua de 10cm. A intensidade da dor foi classificada em dor leve (0 a 3,9cm), dor moderada (4,0 a 7,9cm) e dor intensa (8,0 a 10,0cm) de acordo com os escores obtidos pela EAV.

Análise estatística

Os dados foram organizados em planilhas e analisados no programa Estatistica® 6.0. Para a análise das variáveis quantitativas, foi realizado o cálculo dos valores mínimos e máximos, das médias, desvio padrão e mediana. As médias dos escores atribuídos na EAV foram analisadas utilizando-se o teste de Wilcoxon e U de Mann-Whitney, considerando-se diferenças significativas valores de p<0,05.

As hipóteses avaliadas foram: primeira hipótese - a média dos escores de intensidade da dor no primeiro momento será diferente da média dos escores do segundo momento, sendo a média do primeiro momento maior do que a do segundo; segunda hipótese - a média dos escores de intensidade da dor no primeiro momento não será diferente da média dos escores do segundo momento, quando correlacionadas com a presença ou não de doença cardíaca e/ou pulmonar.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará (Processo nº431/2007).

RESULTADOS

A tabela 1 exibe média, desvio padrão, mediana, valor mínimo e valor máximo dos escores de intensidade da dor utilizados nos box-plots sendo obtidos nos dois momentos por meio da EAV. A média da intensidade da dor no primeiro momento foi de 5,30±3,75cm e no segundo 1,68±3,02cm.

Tabela 1
Intensidade da dor nos dois momentos. Fortaleza/CE, Brasil, 2007-2010

A figura 1 apresenta o box-plot de intensidade da dor nos dois momentos. No primeiro momento, os escores de dor concentraram-se entre 2 e 9, enquanto no segundo momento, os escores foram de 0 a 2. Em ambos os momentos, os valores mínimos e máximos foram 0 e 10. Conforme o teste de Wilcoxon (Tabela 2) verificaram-se diferenças significativas entre os escores de intensidade da dor do paciente no primeiro momento em relação ao segundo existindo um maior valor da escala de dor no primeiro momento com significância de 5%.

Figura 1
Boxplot da intensidade de dor nos dois momentos. Fortaleza/CE, Brasil, 20072010

Tabela 2
Teste de Wilcoxon para a intensidade da dor nos dois momentos. Fortaleza/CE, Brasil, 2007-2010

A figura 2 apresenta box-plots de intensidade da dor nos dois momentos relacionada à presença de doença cardíaca e/ou pulmonar. A intensidade da dor relacionada à presença de doença cardíaca e/ ou pulmonar no primeiro momento esteve por volta de 2 a 9 escores, os pacientes sem doença cardíaca e/ou pulmonar apresentaram escores semelhantes. No segundo momento, pacientes com ou sem doença cardíaca e/ou pulmonar exibiram valores aproximados de 0 a 2 escores de dor. Por meio do teste U de Mann-Whitney (Tabela 3), não se verificaram diferenças significativas entre os escores de intensidade da dor dos pacientes que informaram possuir ou não doença cardíaca e/ou pulmonar no primeiro momento em relação ao segundo com significância de 5%.

Figura 2.Box-plot
da intensidade da dor segundo a presença de doença cardíaca e/ou pulmonar nos dois momentos. Fortaleza/CE, Brasil, 2007-2010

Tabela 3
Teste U de Mann-Whitney para a intensidade da dor nos dois momentos segundo presença de doença cardíaca e/ou pulmonar. Fortaleza/CE, Brasil, 2007-2010

DISCUSSÃO

Este estudo buscou avaliar a intensidade da dor torácica aguda por meio da EAV em diferentes momentos da assistência nas emergências como no pré-atendimento e no pós-atendimento. Além disso, a intensidade da dor foi relacionada com doença cardíaca e/ou pulmonar. A trajetória do estudo ocorreu dessa forma a fim de discutir duas ideias relevantes para a assistência ao paciente com dor torácica aguda: os pacientes permanecem com alto índice de dor mesmo após o atendimento; a intensidade da dor torácica não se relaciona com doença cardíaca e/ou pulmonar.

Um estudo de intervenção avaliou a eficácia da implementação da escala visual numérica (EVN) em pacientes no pós-operatório de cirurgia cardíaca. Os pesquisadores treinaram a equipe de enfermagem para o uso e observaram uma grande aceitação da escala, além de ampliarem o conhecimento sobre dor e adequação da analgesia para cada tipo de dor1313 Keller C, Paixão A, Moraes MA, Rabelo ER, Goldmeier S. Escala da dor: implantação para pacientes em pós-operatório imediato de cirurgia cardíaca. Rev Esc Enferm USP. 2013;47(3):621-5.. As escalas numéricas devem ser implementadas nos serviços de atenção à saúde, pois são úteis como instrumentos norteadores da terapêutica analgésica como demonstrado no presente estudo e possuem uma baixa resistência apresentada por profissionais de saúde.

Outro estudo avaliou a aplicabilidade de três instrumentos de avaliação da dor em diferentes unidades de atendimento. Os instrumentos de avaliação da dor avaliados foram o inventário breve de dor e o questionário McGill de dor como instrumentos multidimensionais e a EAV como unidimensional. As unidades selecionadas foram ambulatório, enfermaria e urgência. Os pesquisadores observaram que os instrumentos multidimensionais são limitados em relação ao tempo que levam para ser aplicados, o que dificulta sua aplicabilidade em unidades de urgência, enquanto os instrumentos unidimensionais são recomendados devido à sua aplicação rápida e não invasiva1414 Martinez JE, Grassi DC, Marques LG. Análise da aplicabilidade de três instrumentos de avaliação de dor em distintas unidades de atendimento: ambulatório, enfermaria e urgência. Rev Bras Reumatol. 2011;51(4):299-308.. O uso de instrumentos de avaliação da dor parece não apresentar desvantagens, contudo a sua implementação deve ocorrer de maneira adequada assim como no presente estudo onde se utilizou a EAV em uma unidade de emergência. Dessa forma colheram-se informações relevantes com o mínimo de desconforto possível ao paciente; em contrapartida o uso de instrumentos extensos como o questionário McGill na emergência pode gerar transtornos ao paciente e uma interpretação equivocada da dor percebida naquele momento.

Um estudo randomizado desenvolvido na Turquia investigou os efeitos da analgesia peridural e paravertebral torácica sobre diversos parâmetros inclusive a intensidade da dor após toracotomia. Não houve diferenças significativas entre a intensidade da dor sob analgesia peridural ou paravertebral quando mensurada pela EAV, demonstrando que a analgesia paravertebral pode ser uma alternativa para o alívio da dor após toracotomia. Nesse estudo, a EAV foi essencial para definir que não há diferença entre dois métodos de analgesia no que concerne à intensidade da dor, no entanto, houve menos complicações com a analgesia paravertebral torácica do que com a peridural tornando-se uma opção mais segura para o paciente1515 Öztürk T, Topcu I, Yaldiz S, Özbakkaloglu A, Asik K, Yentürk A. Comparison of thoracic epidural and paravertebral analgesia for postoperative pain control after thoracotomy. Agri. 2016;28(1):32-8.,1616 Yeung JH, Gates S, Naidu BV, Wilson MJ, Gao Smith F. Paravertebral block versus thoracic epidural for patients undergoing thoracotomy. Cochrane Database Syst Rev. 2016;2:CD009121..

Os resultados obtidos neste trabalho demonstraram que a maioria dos pacientes apresentou redução da intensidade da dor torácica aguda após administração de terapêutica analgésica, contudo alguns pacientes ainda permaneceram com dor intensa evidenciada mediante o uso da EAV. Isso ilustra que o modelo de terapêutica atual é precário não sendo capaz de promover analgesia a todos os pacientes. Para tal, a terapêutica analgésica deve ser flexível de modo que sempre alcance a analgesia e o conforto do paciente.

Por seu caráter inespecífico, a dor torácica aguda pode estar relacionada com doença coronariana ou não, e a EAV é utilizada para mensurar a intensidade da dor e adequar a terapêutica analgésica, contudo, há limitações no tocante ao envolvimento das variáveis afetivas e culturais e às múltiplas dimensões envolvidas no fenômeno álgico, o que torna a busca por marcadores bioquímicos da dor uma opção relevante1717 Van der Woude MCE, Bormans L, Hofhuis JGM, Spronk PE. Current use of pain scores in Dutch intensive care units: a postal survey in the Netherlands. Anesth Analg. 2016;122(2):456-61..

Um estudo analisou o escore de cálcio coronário para descartar a possibilidade de síndrome coronariana aguda, e mostrou-se como uma boa alternativa para afastar a maioria dos casos de doença coronária, entretanto, é imprescindível a avaliação dessa informação frente às outras como o exame clínico e o histórico do paciente1818 Staniak HL, Bittencourt MS, Sharovsky R, Benseñor I, Olmos RD, Lotufo PA. Escore de cálcio para avaliar dor torácica na sala de emergência. Arq Bras Cardiol. 2013;100(1):90-3.. Outro estudo sugere a avaliação da dor torácica aguda por métodos mais objetivos como a angiotomografia coronariana, por exemplo. Com base na literatura, autores levantaram dados consistentes sobre o uso dessa técnica, a qual se apresentou como eficaz, de baixo custo e permite aperfeiçoar o tratamento nas salas de emergência, bem como reduzir o tempo de internação dos pacientes1919 Prazeres CE, Cury RC, Carneiro AC, Rochitte CE. [Coronary computed tomography angiography in the assessment of acute chest pain in the emergency room]. Arq Bras Cardiol. 2013;101(6):562-9. English, Portuguese..

Estudos internacionais buscam uma avaliação mais rápida e eficaz da dor torácica aguda por meio de parâmetros bioquímicos e escores de riscos. Os autores recomendam o uso de escores do coração (histórico, eletrocardiograma, idade, fatores de risco e troponina) associados a testes seriados de troponina ultrassensível na 0 e 3h após a manifestação dos sintomas ao invés de 6 ou 12h como é preconizado pelas diretrizes2020 Dries DJ. Chest pain. Air Med J. 2016;35:107-10.

Diante da dificuldade de avaliação da dor torácica aguda e da limitação das escalas de avaliação da dor, novos marcadores bioquímicos que anunciem precocemente o quadro anginoso e mimetizem a intensidade da dor são necessários, bem como a busca por fármacos analgésicos mais eficazes e com baixa capacidade de induzir tolerância.

Um estudo transversal desenvolvido na sala de emergência de um hospital cardiológico do sul brasileiro comparou a intensidade da dor entre pacientes diabéticos e não diabéticos. Seus resultados demonstraram que a intensidade da dor de pacientes diabéticos e não diabéticos é semelhante quando mensurada pela EVN2121 Paim CP, Azzolin Kde O, de Moraes MA. [Chest pain in acute myocardial infarction among diabetic and non-diabetic patients]. Rev Bras Enferm. 2012;65(1):77-82. Portuguese.. Da mesma forma, este estudo encontrou que a mensuração da intensidade da dor pela EAV é semelhante nos dois momentos do atendimento não se correlacionando com a presença de doença cardíaca e/ou pulmonar.

Um estudo de caso com uma paciente do gênero feminino de 59 anos com antecedentes de síndrome depressiva, dislipidemia, hérnia de hiato e doença de Parkinson que apresentava dor torácica aguda em intensidade crescente iniciada pelo esforço físico e com alívio após repouso, mostrou que apesar dos sintomas direcionarem à hipótese diagnóstica de síndrome coronariana, a paciente sofria de um recidiva de hérnia de hiato2222 Sousa M, Gatta N. Dor torácica e dispneia de esforço. Galicia Clin. 2015;76(1):41-2.. Por conseguinte, uma revisão de literatura buscou possíveis causas para a dor torácica de origem não cardíaca, e dentre as causas estão a doença do refluxo gastroesofágico, hipersensibilidade visceral, distúrbios motores esofágicos e comorbidades de natureza psicológica2323 Domingues GR, Moraes-Filho JPP. Dor torácica não-cardiogênica. Arq Gastroenterol. 2009;46(3):233-40..

Os resultados deste estudo demonstraram que a intensidade da dor torácica aguda não se relaciona com doença cardíaca e/ou pulmonar tanto no primeiro momento como no segundo momento. Esses resultados juntamente com os estudos já citados corroboram que a dor torácica aguda pode ter origens distintas e não se relacionar com diversos fatores até mesmo os esperados como fatores referentes ao sistema cardiopulmonar. Dessa forma, a dor torácica aguda de origem cardíaca deve ser detectada precocemente e ter atendimento priorizado, contudo a dor torácica de origem não cardíaca não pode ser subestimada devendo receber atenção e tratamento adequados.

CONCLUSÃO

A mensuração da dor constitui-se um desafio para os pesquisadores e profissionais de saúde devido à sua subjetividade e a complexidade da experiência dolorosa vivenciada. A avaliação da intensidade da dor no momento da admissão e durante a evolução clínica é essencial para nortear a terapêutica analgésica mais adequada e o uso das escalas deve ser implementados pela gestão em virtude de seus inúmeros benefícios para o paciente e o serviço. Novos estudos são necessários de maneira que sejam explorados novos métodos para sistematização e eficiência da avaliação.

  • Fontes de fomento: Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2016

Histórico

  • Recebido
    16 Jun 2016
  • Aceito
    22 Ago 2016
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