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Para uma análise jurídico-ambiental crítica e libertadora no Brasil

Resumo

O presente artigo cuida das possíveis contribuições advindas da análise crítica ao direito constitucional ambiental brasileiro para a proteção de grupos em situação de desigualdade ambiental. O ambiente sadio é considerado um direito humano fundamental à garantia de dignidade e qualidade de vida e, assim, a Constituição Federal de 1988 o consagrou em seu artigo 225 como um direito de todos. No entanto, observase que determinados grupos - historicamente construídos - suportam de forma desproporcional os impactos e riscos ambientais como também acessam de forma desigual os recursos ambientais. Nesse sentido, constitui objetivo específico deste estudo aplicar a ideia de “Pretensão Política de Justiça”, do filósofo argentino Enrique Dussel, como ferramenta de análise da proteção ambiental constitucional brasileira, tendo em vista justamente a desigualdade dos grupos supracitados em acessar o direito ao ambiente sadio. Trata-se de um artigo de abordagem metodológica qualitativa, fundamentada na decolonialidade e na justiça ambiental com pesquisa bibliográfica e documental.

Palavras-chave:
Crítica; Direito Constitucional Ambiental; Pretensão Política de Justiça; Libertação; Participação popular

Abstract

The present article deals with the possible contributions arising from the critical analysis of Brazilian constitutional environmental law for the protection of vulnerable groups. The healthy environment is considered a fundamental human right to guarantee dignity and quality of life, and thus, the Federal Constitution of 1988 enshrined it in its article 225 as a right for all. However, it is observed that certain groups - historically constructed - bear disproportionately the environmental impacts and risks, and also have unequal access to environmental resources. In this sense, the specific objective of this study is to apply the idea of "Political claim to Justice", by the Argentine philosopher Enrique Dussel, as a tool for analyzing the Brazilian constitutional environmental protection, precisely because of the inequality of the aforementioned groups in accessing the right to a healthy environment. This is an article of a qualitative methodological approach, based on decoloniality and environmental justice with bibliographic and documentary research.

Keywords:
Critical; Environmental Constitutional Law; Political claim to Justice; Liberation; Popular participation

1. Introdução

Uma vez reconhecida a relação intrínseca e necessária entre ser humano e natureza, consolidou-se a compreensão de que o ambiente sadio constitui um direito humano, pois a dignidade humana, a potencialidade de desenvolvimento pleno e integral do ser e, bem assim, de seu bem-estar existencial dependem de um ambiente com condições ambientais de saúde e segurança mínimas.1 1 No plano internacional, a preocupação com o equilíbrio ecossistêmico com vistas a garantia de qualidade de vida para o ser humano tornou-se pauta dos debates na década de 1970 e tem na Declaração de Estocolmo (1972) o primeiro documento que acolhe a proteção ambiental como necessária à garantia de dignidade e bem-estar para o ser humano. Desde então, o debate evoluiu e novos documentos internacionais trataram do tema, sendo que atualmente a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992) é um dos mais importantes em termos de reconhecimento de direitos ambientais. Em termos jurídicos isto implica dizer que a ausência de um ambiente sadio impacta também outros direitos como o direito à vida, à saúde, à integridade física e à alimentação adequada.

Dessa forma e alinhada a uma tendência mundial de constitucionalização da proteção ambiental (SARLET e FERNSTERSEIFER, 2019SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito Constitucional Ecológico: Constituição, direitos fundamentais e proteção da natureza. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.), a Constituição Federal de 1988 construiu um arcabouço jurídico e incorporou a preocupação com a questão ambiental, consagrando em seu artigo 225 o meio ambiente ecologicamente equilibrado como direito de todos, inclusive, das futuras gerações. Com isso, sob a perspectiva interna o direito ao ambiente sadio alcançou o status de direito fundamental.

Vale ressaltar que a Constituição Federal de 1988 apresenta-se como uma das mais avançadas ao longo da história do país em termos de garantia de direitos, sendo por esta razão reconhecida como Constituição Cidadã. Além disso, segundo Ayala e Rodrigues (2015AYALA, Patryck de Araujo; RODRIGUES, Eveline de Magalhes W.. Constitucionalismo e proteção ambiental na América Latina: é possível proteger melhor? In: CANOTILHO, Jose Joaquim G.; LEITE, José Rubens M. Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2015.), a Constituição brasileira integra o primeiro ciclo de reformas constitucionais no continente latino-americano, evidenciando uma disposição progressista que se reflete na proteção de direitos e garantias individuais e, também, na constitucionalização da proteção do ambiente - tema que até então ausente do texto constitucional.

No entanto, em que pese sua disposição progressista em relação às constituições brasileiras anteriores, não se deve olvidar que se situa em uma sociedade que ainda reverbera a colonialidade em suas estruturas, tanto sociais como jurídicas. Mignolo (2007MIGNOLO, Walter D. La Idea de América Latina: la herida colonial y la opción decolonial. Traducción de Silvia Jawerbaun y Julieta Barba. Barcelona: Gedisa, 2007.) e Quijano (2005QUIJANO, Anibal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, Edgardo (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais - perspectivas latino-americanas. Tradução de Júlio César Casarin Barroso Silva. Buenos Aires: CLACSO, 2005, p. 117-142. Disponível em: http://www.clacso.org.ar/libreria-latinoamericana/contador/sumar_pdf.php?id_libro=164. Acesso em: 05 mar. 2022.
http://www.clacso.org.ar/libreria-latino...
) assinalam que a “conquista” do continente latinoamericano alterou as dinâmicas aqui existentes, instalando uma nova forma de vida no sentido econômico, social, político, subjetivo e epistêmico, o que, por sua vez, não se encerrou com as declarações de independência das respectivas colônias em relação às metrópoles, mas que se mantém até os dias atuais.

Conforme esses autores, a independência apenas rompeu com o colonialismo, mas não com a colonialidade. Isto significa que as formas de dominação instituídas com a conquista sobre determinados grupos e espaços, doravante sob novo mecanismo, continuam produzindo seus efeitos e reverberando nas estruturas sociais, inclusive no Direito, até que se verifica uma ruptura total com essa lógica persiste de forma menos evidente. Os mesmos autores destacam que a alteração nas formas de vida aqui existentes foi responsável pela invisibilização ou, até mesmo, extermínio, daqueles que não correspondiam ao padrão estabelecido pela metrópole, durante o período colonial, ou pela elite política, após a declaração de independência - o que situa tais grupos à margem da totalidade concreta, isto é, exteriores àquele sistema mundo.

Esta perspectiva permite compreender que determinados grupos sociais em situação de desigualdade ambiental são resultado histórico de um conjunto de estruturas que remontam ao período colonial que os excluem, senão os distanciam, economicamente, socialmente e juridicamente. Aplicar esta lente teórica para o estudo da desigualdade ambiental na realidade brasileira aprofunda a elaboração da justiça ambiental na medida em que incorpora à análise o aspecto da colonialidade, então não explícito.

Nesse sentido é que é possível argumentar que, muito embora o texto constitucional brasileiro de 1988 consagre o direito fundamental ao ambiente ecologicamente equilibrado como direito de todos, observamos que determinados grupos - desde o processo colonizador - suportam de forma desproporcional os impactos e riscos ambientais como também acessam de forma desigual os recursos ambientais. A escassez de recursos naturais, a alteração adversa da qualidade ambiental promovida por processos poluidores e o acirramento das mudanças climáticas denunciam a fragilidade deste direito em relação a determinados grupos que na realidade prática sofrem mais que outros com esses efeitos.

Com isso, como compreender a proteção ambiental constitucional para garantia do direito fundamental em comento a grupos em desigualdade ambiental? Como questão de fundo se coloca a possibilidade de, pelo próprio Direito Ambiental Constitucional, romper com a lógica de marginalização e desigualdade socioambiental brevemente exposta. Para responder tais questionamentos, buscaremos contribuições para advindas da análise crítica ao direito constitucional ambiental brasileiro para a proteção de grupos em desigualdade ambiental/vulneráveis, ancorada na decolonialidade e em diálogo com a justiça ambiental.

A “Pretensão Política de Justiça” elaborada por Enrique Dussel trata-se de ferramenta da Filosofia da Libertação para condução das ações sociais, institucionais, jurídicas, que visem o combate de alguma forma de exclusão, que no caso deste artigo voltam-se à situação de desigualdade socioambiental no Brasil em contraste com o que prevê a Constituição. Assim, espera-se que a filosofia dusseliana forneça subsídios para a compreensão do direito fundamental ao ambiente sadio no Brasil transformando as estruturas da sociedade e decolonizando-a por seus próprios sujeitos.

O artigo, servindo-se de uma abordagem metodológica qualitativa, fará uma breve exposição acerca do processo que conduziu ao encobrimento de determinados grupos no país, expondo-os a situações de violação ao direito de um meio ambiente sadio. Aqui a colonialidade e a justiça ambiental como elaboração teórica compõe o ponto a partir do qual partem as reflexões deste trabalho. Em seguida, tais reflexões encontramse com os conceitos e fundamentos da Pretensão Política de Justiça para, então, os quais serão apresentados em seguida. Finalmente e a partir do que prevê a Constituição de 1988, busca-se identificar aspectos a serem considerados para construção de uma proteção ambiental crítica e libertadora. Os procedimentos de pesquisa utilizados consistem na pesquisa bibliográfica e documental.

A proposta consiste em oferecer uma compreensão da proteção ambiental constitucional da proteção que desafie a materialidade prática e se realize não apenas nos limites do próprio Direito, mas trazendo para o foco de análise os destinatários e construtores dessas normas.

2. Colonialidade, justiça ambiental e ambiente sadio

Os impactos e riscos ambientais decorrentes da exploração dos recursos naturais e da degradação da natureza não afetam de forma equitativa a todos os indivíduos, evidenciando que determinados grupos estão mais expostos a essas situações em que o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado encontra-se fragilizado. Eles tampouco têm o mesmo acesso, direto e/ou indireto aos recursos ambientais do país. A justiça ambiental, enquanto corrente teórica, traça esse diagnóstico evidenciando que na distribuição dos problemas ambientais não existe um caráter aleatório. Acserald (2004ACSERALD, Henri; HERCULANO, Selene; PÁDUA, José. Augusto. (Orgs.). Justiça Ambiental e Cidadania. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004.) explica que existe uma lógica subjacente, estreitamente relacionada com o modo de produção que direciona os impactos ambientais para grupos sociais que dispõem de menos recursos políticos e econômicos para resistir ou escapar dessa dinâmica. Dessa forma, acabam submetidos a situações de desigualdade ambiental em que o direito ao ambiente sadio não pode ser usufruído em sua plenitude, minando condições básicas de vida que podem se refletir em outros direitos.

As características que identificam os grupos em situação de desigualdade ambiental não escondem que sua construção está relacionada à ideia de raça. Nos Estados Unidos, onde se iniciam as discussões sobre justiça ambiental, verificou-se que a raça era a variável mais potente na predição de onde seriam instalados aterros de resíduos perigosos ao ponto de ter sido cunhada a expressão racismo ambiental (BULLARD, 2004BULLARD, Robert. Enfrentando o Racismo Ambiental no Século XXI. In: ACSERALD, Henri; HERCULANO, Selene; PÁDUA, José. Augusto. (Orgs.). Justiça Ambiental e Cidadania. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004, p. 41-68.). Já no Brasil tal característica aparece esmaecida e a injustiça ambiental - isto é, mecanismo pelo qual sociedades desiguais destinam maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento às populações marginalizadas e vulneráveis (ACSERALD, HERCULANO e PADUA, 2004ACSERALD, Henri; HERCULANO, Selene; PÁDUA, José. Augusto. (Orgs.). Justiça Ambiental e Cidadania. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004.) - passa a ser identificada com a questão de classe como critério na distribuição dos impactos e riscos ambientais entre a população (HERCULANO, 2002).

Contudo, cabe notar que ainda que classe, atualmente, seja a variável que melhor explica o fenômeno da desigualdade ambiental no Brasil, a construção de grupos mais sujeitos a impactos e riscos ambientais no país também pode ser descrito pela perspectiva da colonialidade. Assim, a desigualdade ambiental brasileira possui vínculos com um processo histórico comum à América Latina que tem como marco fundacional a conquista deste continente pelos europeus durante a expansão marítima, originalmente baseada na ideia de raça.

Como parte desse processo, a Europa Ocidental se construiu como centro do sistema-mundo e referência de um novo padrão de poder mundial que exerce sua influência até a atualidade (DUSSEL, 1993DUSSEL, Enrique. 1492: o encobrimento do outro: a origem do mito da modernidade: Conferencias de Frankfurt. Tradução Jamie A. Classen. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993; MIGNOLO, 2007MIGNOLO, Walter D. La Idea de América Latina: la herida colonial y la opción decolonial. Traducción de Silvia Jawerbaun y Julieta Barba. Barcelona: Gedisa, 2007.; QUIJANO, 2006). De início, esse processo utilizou-se do uso da força física para dominação dos colonizados (indígenas e africanos), determinados em sua subjetividade como inferiores por um aspecto negativo, isto é, pela ausência de identidade para com os europeus. Posteriormente, e principalmente após a independência das colônias latino-americanas, este processo passou a atuar por meio de uma lógica de domínio que subjaz o controle imperial e reverbera nas estruturas sociais, adaptando-se às novas realidades para continuar produzindo seus efeitos (MIGNOLO, 2007).

Trata-se da colonialidade que opera sobre ser, saber e poder. Em breves linhas, temos que no primeiro caso valida-se apenas a subjetividade que se aproxima daquela estabelecida pelo padrão branco europeu. No segundo, estabelece o eurocentrismo como forma de produzir conhecimento, descartando episteme diversa da europeia, pois a racionalidade moderna europeia seria o único meio válido de produzir conhecimento e fundamento para legitimar todas as formas de agir em sociedade, o que explica o processo de dominação da natureza. Por fim, a colonialidade do poder se fundamenta na ideia de raça classificação social básica se espraiando também para relações de gênero, sexualidade e classe (RODRIGUES; CAVALCANTE; SOUZA, 2016).

É dessa forma, então, que se realiza o que Dussel (1993DUSSEL, Enrique. 1492: o encobrimento do outro: a origem do mito da modernidade: Conferencias de Frankfurt. Tradução Jamie A. Classen. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993) denomina de encobrimento do Outro se referindo à exclusão da diversidade de rostos e sujeitos históricos que compõem os oprimidos. Rostos estes que pertencem aos indígenas (o primeiro protagonista da história latino-americana que resistiu por séculos à dominação europeia e teve sua vida afetada de todas as formas); ao negro (escravizado para atender o mercado mundial); aos mestiços (que sofriam dependência cultural, política e econômica); aos crioulos; aos operários (porque a revolução industrial aqui foi tardia e dependente) e aos marginais (que compõem um exército operário de reserva) (DUSSEL, 1993DUSSEL, Enrique. 1492: o encobrimento do outro: a origem do mito da modernidade: Conferencias de Frankfurt. Tradução Jamie A. Classen. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993). Aqui incluímos também os que sofrem mais que outros os problemas ambientais, em uma situação de “não-direito” ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Quanto mais distantes do padrão masculino europeu, branco, heteronormativo relacionado à elite, mais invisíveis são esses sujeitos em nossas sociedades, percebendo diversas formas de marginalização e, inclusive, a transferência dos custos ambientais dos processos de produção sem que usufruíssem também de seus ônus ou pudessem acessar, direta ou indiretamente, os bens ambientais em sua integridade.

A racionalidade moderna cartesiana caracterizada pelo rigor científico e pela imparcialidade, objetificou a natureza e a dominou explorando seus recursos para satisfação das necessidades humanas e do capital sob a lógica do “quanto mais “desenvolvida" uma sociedade, maior o controle e a influência do ser humano na natureza” (SANTAMARIA, 2017SANTAMARIA, Ramiro Avila. Os Direitos da Natureza desde o Pensamento Crítico Latino-Americano. Revista Culturas Jurídicas, v. 4, n. 8, mai-ago, p. 17-85, 2017. Disponível em: www.culturasjuridicas.uff.br/index.php/rcj/article/download/433/168. Acesso em: 05 mar. 2022.
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, p. 36). Dessa forma e em apertada síntese, podemos compreender que a América, ao longo de sua história, serviu como fonte de metais preciosos à exaustão, depois, de matérias-primas e, enfim, de commodities, sempre em benefício das metrópoles ou sob a ideia de desenvolvimento, invisibilizando os efeitos sobre os grupos que aqui viviam e sobre suas formas de vida:

la destrucción de la base de recursos naturales, el desarraigo de la población de su entorno natural, la disolución de sus identidades colectivas, sus solidaridades sociales y sus prácticas tradicionales. Así, los proyectos del estado en América Latina para sacar a los pueblos de su “atraso” con la capitalización del campo y el proceso dependiente de industrialización no sólo produjeron fracasos económicos sino que desencadenaron procesos de destrucción ecológica y degradación ambiental (LEFF, 2004LEFF, Enrique. Racionalidad Ambiental: La reapropiación social de la naturaleza. Mexico: siglo XXI Editores, 2004., p. 421-422).

O que se pretende evidenciar, nesse caso, é que a destinação dos “custos do desenvolvimento” a determinados grupos como quilombolas, indígenas, sem terra ou população pobre não se refere a um processo aleatório ou determinado pela classe, mas que encontra raízes históricas conexas à história da reprodução da colonialidade no continente e perante os povos latino-americanos. História essa que os invisibilizou e privou-lhes certos direitos.

Discorrendo a respeito da degradação ambiental, Leff (2004LEFF, Enrique. Racionalidad Ambiental: La reapropiación social de la naturaleza. Mexico: siglo XXI Editores, 2004., p. 422) verifica pontos importantes:

Hay un orden económico que ha transferido los costos ecológicos del crecimiento económico hacia los países del tercer mundo, y de políticas económicas que han expulsado a los pobres hacia las zonas ecológicamente más frágiles del planeta.

A constatação acima de Leff também é verificada no Brasil e nos remete a necessidade de superação dessa condição, que cria uma situação de violação do direito ao ambiente sadio para determinados grupos que acabam também sofrendo com a ameaça de violação de outros direitos inter-relacionados. A partir daqui refletiremos sobre a Pretensão Política da Justiça e sua aplicação para analise crítica proteção constitucional ambiental no Brasil, buscando, dentro do direito, caminhos possíveis para transformação da realidade.

3. A Pretensão Política de Justiça como categoria analítica

Para Dussel (2009DUSSEL, Enrique. Política de la Liberación. Volumen II: Arquitectónica. Ferraz: Editorial Trotta, 2009.) a totalidade representa uma ordem vigente como aquela onde se manifesta a reprodução da vida humana com seu conjunto de normas, instituições e estruturas. O autor aponta, entretanto, que esta totalidade jamais se encerra em si mesma na medida em que inevitavelmente produz efeitos negativos, que recaem sobre determinados indivíduos - excluídos e oprimidos dessa esfera da totalidade - que, por sua vez, constituem a exterioridade rumo uma nova ordem, futura e transformadora que os liberte da situação atual (DUSSEL, 2009DUSSEL, Enrique. Política de la Liberación. Volumen II: Arquitectónica. Ferraz: Editorial Trotta, 2009.).

Para que isso seja possível, o movimento deve se iniciar da alteridade, do Outro, de baixo para cima, em busca do cumprimento das reivindicações e necessidades destes sujeitos. Assim, a transformação passa invariavelmente por aqueles que estão excluídos. A analética designa o processo de passagem de uma ordem dada que passa a ser questionada pela exterioridade, já que a realidade não se resume a totalidade, para uma ordem futura, melhor que esta, pelos sujeitos que constituem a exterioridade (DUSSEL, 1996DUSSEL, Enrique. Filosofía de la liberación. 4. ed. Bogotá: Nueva América, 1996.).

A analética parte da interação entre a Totalidade e a Exterioridade, gerando a transformação da totalidade vigente em todos os seus diversos campos ônticos, dentre os quais se encontra também o campo jurídico. Ademais, enquanto método teórico, a analética pressupõe uma opção ética préoriginária, em favor da Exterioridade, do oprimido pela estrutura do atual sistema-mundo vigente (DIEHL; LEONEL JÚNIOR, 2016DIEHL, Diego; LEONEL JÚNIOR, Gladstone. A dialética social do direito como método descolonizador do saber jurídico na América Latina. In: Direitos Humanos na América Latina. (Org.) LEAL, J.; MACHADO, L. Curitiba, Multideia: 2016., p. 173).

Nesse ponto cabe refletir sobre a Pretensão Política de Justiça como uma ferramenta para que esses sujeitos caminhem rumo à construção de uma nova sociedade. A Pretensão Política de Justiça fala da “determinação da norma, do ato, da micro - ou macro- estrutura, da instituição ou sistema políticos que tenham realizado de maneira honesta e séria as condições (ou princípios universais)” (DUSSEL, 2015DUSSEL, Enrique. Direitos humanos e ética da libertação: Pretensão política de justiça e a luta pelo reconhecimento dos novos direitos. Revista InSURgência, v. 1, n. 1, jan/jun, p. 121-136, 2015. Disponível em: periodicos.unb.br/index.php/insurgencia/article/view/18800. Acesso em: 05 mar. 2022. p. 126).

Segundo o autor, a ética estuda as condições universais que são condições para a pretensão de bondade, sendo as condições universais identificadas por três momentos que são o momento material de reprodução de verdade prática para reprodução da vida, o momento formal de validez consensual com exigência de participação simétrica do(s) interessado(s) e o momento de factibilidade da razão instrumental que informa e se preocupa com as consequências possíveis do ato, os efeitos negativos não intencionais e suas vítimas (DUSSEL, 2015DUSSEL, Enrique. Direitos humanos e ética da libertação: Pretensão política de justiça e a luta pelo reconhecimento dos novos direitos. Revista InSURgência, v. 1, n. 1, jan/jun, p. 121-136, 2015. Disponível em: periodicos.unb.br/index.php/insurgencia/article/view/18800. Acesso em: 05 mar. 2022.). Do cumprimento destas condições universais tem-se a Pretensão Política de Justiça.

Estas condições da constituição do ato, da norma, da micro ou macro estrutura, da instituição ou sistema política operam em três níveis de generalidade que Dussel identifica como A, B e C. O nível A corresponde à ação política no nível estratégico que fundamenta a possibilidade de um ato concreto possuir pretensão de bondade, constitutiva da potentia2 2 Dussel propõe que a noção de poder deve ser identificada de forma positiva e tendo como última referencia a potentia, isto é, os indivíduos responsáveis por construir desde baixo o fundamento do poder institucionalizado, o potestas. (DUSSEL, 2009). , com base nas condições (ou princípios universais) da Política, quais sejam: aquelas de produção e reprodução da vida em comunidade política, aquelas referentes aos procedimentos normativos de legitimidade consensual e aquelas da factibilidade política na realização dos meios e fins. Trata-se de Política (com p maiúsculo), pois se refere:

a do estadista que luta a longo prazo pela sobrevivência da humanidade e pela simetria democrática dos interessados (em especial das vítimas), e não a “política” com minúscula, a de M. Weber, do mero profissional para quem suas vítimas lhe são invisíveis, profissional do lucro, da fama ou do mero propósito estratégico schmittiano de vencer o “inimigo”. (DUSSEL, 2015DUSSEL, Enrique. Direitos humanos e ética da libertação: Pretensão política de justiça e a luta pelo reconhecimento dos novos direitos. Revista InSURgência, v. 1, n. 1, jan/jun, p. 121-136, 2015. Disponível em: periodicos.unb.br/index.php/insurgencia/article/view/18800. Acesso em: 05 mar. 2022., p. 126)

O nível B diz respeito ao nível das instituições ou mediações sistêmicas, é o nível político institucional, da potestas3 3 “A necessária institucionalização do poder da comunidade, do povo (...)” (DUSSEL, 2007, p. 32). , que realiza as condições universais por meio de três sistemas concretos. O primeiro destes sistemas é o material, onde se encontram as dimensões ecológica, econômica e cultural, sendo a dimensão ecológica a última instância material, pois se relaciona diretamente com a própria vida. A dimensão cultural é a que confere sentido à vida e a econômica é responsável por produzir bens e promover bemestar a todos. O segundo sistema do nível das mediações é o formal, que, por sua vez, envolve todo o sistema de direito e a opinião pública. (DUSSEL, 2015DUSSEL, Enrique. Direitos humanos e ética da libertação: Pretensão política de justiça e a luta pelo reconhecimento dos novos direitos. Revista InSURgência, v. 1, n. 1, jan/jun, p. 121-136, 2015. Disponível em: periodicos.unb.br/index.php/insurgencia/article/view/18800. Acesso em: 05 mar. 2022.)

Especificamente no que se refere ao sistema de direito Dussel (2015DUSSEL, Enrique. Direitos humanos e ética da libertação: Pretensão política de justiça e a luta pelo reconhecimento dos novos direitos. Revista InSURgência, v. 1, n. 1, jan/jun, p. 121-136, 2015. Disponível em: periodicos.unb.br/index.php/insurgencia/article/view/18800. Acesso em: 05 mar. 2022.) afirma que deve incluir direitos da esfera material que garantam a condição de vida, direitos das esferas procedimentais de autonomia e liberdade que permitam ao indivíduo acionar e exercer seus direitos, participando com igualdade de oportunidade dos processos de formação de consenso e direitos de factibilidade de onde emanam os deveres para os indivíduos.

O terceiro e último sistema que integra o nível B é o da factibilidade sistêmica-institucional, que realiza a articulação no campo político da sociedade civil e a sociedade política (Estado), exercitando os poderes necessários aos sistemas materiais e formais anteriores.

O último nível de generalidade em que as condições de bondade operam (nível C) é o dos princípios implícitos fundamentais, que não se articulam em última instância, mas se codeterminam na ação concreta de luta política em que se discute a maneira de exercício do poder e se utiliza da coação para fazer respeitar o estado de direito. Os princípios implícitos fundamentais são o princípio material da política (fraternidade), o princípio democrático (igualdade) e o princípio de factibilidade estratégico-político (liberdade).

Assim, enxergamos as manifestações das condições universais nos três níveis de generalidade que constituem um ato que integram os componentes da Pretensão Política de Justiça quais sejam: a pretensão de cumprimento das exigências materiais (ou pretensão de verdade prática), que mantém correspondência com a realidade prática; a pretensão de cumprimento das exigências formais democráticas (ou pretensão de legitimidade) e a pretensão de cumprimento das exigências de factibilidade política (ou pretensão de performatividade) que considera as destinatários possíveis do ato.

Tem-se, portanto, que em quaisquer níveis que se manifeste, o ato precisa cumprir com os referidos componentes para possuir Pretensão Política de Justiça e, dessa forma, se constituir ferramenta de libertação. Com efeito, importa destacar que a formalidade por si só não é suficiente. Tampouco a mera factibilidade uma vez que seu juízo não pode descolar do que a realidade prática evidencia.

Assim, a aplicação da Pretensão Política de Justiça à proteção ambiental constitucional no Brasil deve assumir como ponto de partida a exterioridade cujas práticas operam lutas que podem conduzir à transformação da ordem posta. Nesse caso, assumir a exterioridade como ponto de partida não significa abandoná-la ao longo do processo, pelo contrário: importa na necessária consideração do oprimido na mediação prática de maneira permanente, o que sinaliza para um processo em contínuo movimento e nunca acabado posto que sempre sujeito à contingência dos próprios atos e da impossibilidade de prever todos os efeitos.

A exterioridade figura como artífice de sua própria libertação, isto é, da sua superação de sua exclusão, opressão, encobrimento, abrindo a brecha para uma nova ordem até que ela se realize e afaste aquilo que da ordem anterior lhe for contrária. Os grupos em situação de desigualdade ambiental além de não serem determinados aleatoriamente possuem relação o processo histórico de constituição da sociedade brasileira que os situou para fora da materialidade concreta, turvando o acesso ao direito ao ambiente sadio. À luz da Pretensão Política de Justiça significa fundamentalmente que estes grupos interagindo com a totalidade, carregam a possibilidade de realização da analética. Logo, além da garantia do direito em decorrência da previsão constitucional, tem-se como necessário trazer condições para seu exercício, inclusive, a partir de perspectivas não hegemônicas e relações mais harmônicas com a natureza.

A inclusão de determinados grupos à totalidade não completa a proposta dusseliana, pois mantém ativada a estrutura responsável pela exclusão, situando sempre um grupo à margem. Daí então a relevância, transformar a realidade, de reformularmos a relação com o Outro e com a natureza para transcender à razão utilitária que orienta a atual lógica extrativista de apropriação dos recursos naturais com que direciona impactos e riscos ambientais.

4. Proteção constitucional ambiental no Brasil: crítica e libertação?

Uma vez compreendida a proposta dusseliana, o trabalho passa agora à aplicação de tais formulações para análise da proteção constitucional ambiental no Brasil. O objeto de análise, então, passa a ser investigado em sua capacidade de garantir o acesso ao direito ao ambiente sadio àqueles que, em situação de desigualdade ambiental, situam-se na exterioridade. Existem formas dentro do direito que permitam que a mudança do estado de coisas atual passe por esses grupos tomando por referência o texto constitucional?

O direito está inserido no nível das mediações sistêmicas e realiza em concreto as condições do nível A por meio de normas que, preenchendo as condições universais, realizarão a Pretensão Política de Justiça. Dessa forma, tem-se que o Direito deve se orientar pela materialidade da realidade prática, ou seja, por aquilo que se manifesta na concretude diária de nossas vidas (pretensão de verdade) buscando garantir os direitos historicamente construídos. No caso, isso será respaldado pela própria norma ao observar o artigo 225, da Constituição Federal.

Como mencionado no início, o meio ambiente ecologicamente equilibrado foi consagrado no texto constitucional após ter se estabelecido a compreensão de essencialidade do meio ambiente sadio para a dignidade humana, incumbindo ao poder público e à coletividade o dever de zelá-lo para as presentes e futuras gerações. Certamente, o dispositivo não foi positivado por mera consciência ambiental dos constituintes ou disposição interessada na temática, mas em decorrência de lutas políticas anteriores que vão desde as influências internacionais na preservação das matas e rios até a luta concreta interna, travada por exemplo, por Chico Mendes, ao realizar os “empates4 4 O empate era um método de luta, em que os povos da floresta, sobretudo os seringueiros que viviam da extração do látex das árvores, se organizavam para impedir que tratores devastassem a floresta e derrubassem as árvores, se colocando a frente dos veículos impedindo que continuassem o desmatamento. A prática foi muito comum no Acre ao longo dos anos 80. ” para a manutenção da floresta de pé!

A proteção constitucional ambiental cumprirá com a realização do consenso discursivo (pretensão de legitimidade), fornecendo aos interessados normas para exercício e reivindicação do direito material. Dessa forma, há uma necessidade de criação de espaços para participação dos interessados em uma relação simétrica, trazendo aqueles que estão à margem do direito material para participar com capacidade de influir na tomada de decisões. Tal ideia pode ser vislumbrada ao considerar o princípio democrático que se expressa da seguinte maneira:

Operemos siempre de tal manera que toda norma o máxima de toda acción, de toda organización o de las estructuras de una institución (micro o macro) en el nivel material o en del sistema formal del derecho (como el dictado de una ley) o en su aplicación judicial, es decir, del ejercicio del poder comunicativo, sea fruto de un proceso de acuerdo por consenso en el que puedan de la manera más plena participar los afectados (de los que se tenga conciencia). Dicho entendimiento debe llevarse a cabo a partir de razones (sin violencia) con el mayor grado de simetría posible, de manera pública y según la institucionalidad acordad de antemano. La decisión así elegida se impone como un deber político que normativamente o con exigencia practica (que subsume como político al principio moral formal) obliga legítimamente al ciudadano. (DUSSEL, 2009DUSSEL, Enrique. Política de la Liberación. Volumen II: Arquitectónica. Ferraz: Editorial Trotta, 2009., p. 405)

Trata-se de conferir à exterioridade - afetada e ameaçada pelos impactos e riscos ambientais - espaço dentro da totalidade para elaboração por si mesma de formas de superação dessa situação. Neste aspecto cabe refletir acerca das formas de participação dessa exterioridade em matéria ambiental e, ainda, considerar novas propostas jurídicas para proteção da natureza.

De acordo com o art. 225, caput5 5 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; (...) , o meio ambiente sadio constitui direito fundamental das presentes e futuras gerações, cabendo a sua defesa ao Poder Público, mas também à coletividade. A parte final do texto constitucional, ao incluir a coletividade na defesa ambiental, sinaliza para o reconhecimento de que tal tarefa depende de uma realização conjunta e, portanto, da participação de todos. Em seu parágrafo primeiro, inciso IV, o dispositivo já menciona o dever de publicidade de estudos de impacto ambiental de atividades poluidoras como mecanismo de informação às populações potencialmente afetadas, necessário à eventual participação em assuntos ambientais. Porém sob uma visão sistêmica é possível extrair outras normas que reforçam a questão da participação na proteção do ambiente e que, bem assim, devem alcançar os grupos em situação desigualdade ambiental se alicerçada em um compromisso ética de realização da analética.

José Rubens Morato Leite (1999LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. Florianópolis, 1999. 350 p. Tese (Doutorado em Direito) - Curso de Pós-Graduação em Direito, Universidade Federal de Santa Catarina, 1999.) identifica na Constituição três formas de participação direta em assuntos ambientais: a participação na criação do direito ambiental, a participação na formulação e execução de políticas ambientais e participação via acesso ao Poder Judiciário. No primeiro caso, o autor identifica a lei de iniciativa popular (art. 14, III) como manifestação de um dos mecanismos de participação popular, contudo, ele próprio destaca que se trata de uma participação de difícil concretude, o que acaba, portanto, reduzindo a materialização do que prevê o ordenamento como dever de proteção da coletividade junto ao poder Público.

Quanto à participação na formulação de políticas públicas, além de normas infraconstitucionais como aquelas que estabelecem a obrigatoriedade de realização de audiências públicas, o autor elenca o plebiscito (art. 14, I) como ferramenta disponível para participação popular. Ao lado dele podemos mencionar também o referendo (art. 14, II) como instância de consulta à população para chancela, ou não, de determinada política pública. Por fim quanto ao acesso ao poder Judiciário, além do consagrado direito fundamental do art. 5º que garante a inafastabilidade do poder jurisdicional, destaca-se aqui a ação popular (art. 5º, LXXIII, da Constituição Federal, regulamentado pela Lei nº 4.717/65). Com efeito, tal ação serve para anulação de ato lesivo ao meio ambiente (entre outras hipóteses), ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. Não obstante, trata-se de resolução de conflito ambiental no âmbito do poder judiciário que para ser instrumentalizado demanda tempo e conhecimento que aqueles sujeitos que compõem a exterioridade concreta muitas vezes não possuem, além disso, transfere a solução da questão desses sujeitos para o poder judiciário.

Esses mecanismos, como bem observa Morato Leite (1999LEITE, José Rubens Morato. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. Florianópolis, 1999. 350 p. Tese (Doutorado em Direito) - Curso de Pós-Graduação em Direito, Universidade Federal de Santa Catarina, 1999.), são significativos nos sentidos de sinalizarem para a identificação do ordenamento jurídico brasileiro com a questão da importância da participação em matéria ambiental.

Ainda no que se refere ao momento formal do sistema do direito, cabe mencionar os tratados e convenções internacionais, onde se destaca a convenção 169 da OIT sobre povos indígenas e tribais ratificada pelo Brasil. Muito embora não tenha ingressado a ordem jurídica com status de emenda constitucional, mas sim de norma supralegal, serve para orientar a interpretação das normas infraconstitucionais e, por isso, merece destaque6 6 O art. 5º, § 3º, da Constituição Federal dispõe que tratados e convenções internacionais aprovados em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5 dos votos dos respectivos membros e que versem sobre direitos humanos ingressam com status de emenda constitucional. Os demais tratados de direitos humanos que não sejam aprovados com quórum qualificado situam-se entre a Constituição Federal e as leis ordinárias com status de supralegalidade, interrompendo a eficácia de normas infraconstitucionais com eles conflitantes, de acordo com entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 466.343-1, STF/2008. . Tal convenção estabelece o dever de consulta prévia dos povos indígenas e tribais sempre que forem “previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente” (art. 6º, 1, convenção 169 OIT). A norma complementa a Constituição, mas em razão dos seus destinatários específicos - povos indígenas e tradicionais - não confere esse direito a toda a exterioridade, mas trata-se de uma disposição positiva que merece ser alargada.

Apenas a forma não serve para a materialização de direitos, sobretudo, porque devem ser questionadas em seus limites como meios viáveis para que grupos localizados na exterioridade consigam superar a condição em que se encontram em termos de acesso ao direito ao ambiente sadio.

Quanto a pretensão de factibilidade no sistema do direito, esta refere-se ao exercício do poder administrativo que inclui o direito das instituições públicas e que criam deveres para os indivíduos, como à regulação de atividades potencialmente poluidoras, criando para os indivíduos a obrigação de realizar estudos de impacto, recuperação e indenização por dano.

A materialização das perspectivas jurídicas emerge de forma curiosa no Brasil. Um caso que se notabilizou recentemente é a da consideração e recepção jurisdicional do Rio Doce como sujeito de direito no Brasil. Isso ocorreu em razão do crime socioambiental cometido pela mineradora Samarco, controlada pela Vale, no fim de 2017, ao negligenciar sua fiscalização e permitir o rompimento da barragem de rejeitos de Fundão na bacia do Rio Doce. Por conta desse episódio, o próprio Rio Doce, representado pela Associação Pachamama, ingressou com uma ação (processo nº 1009247-73.2017.4.01.3800) perante a Justiça Federal, em face do Estado de Minas Gerais, requerendo sua responsabilização. A ação não se limitava a pedir o reconhecimento do Rio Doce como sujeito de direito, mas legitimar todas as pessoas a defenderem o direito da bacia à existência sana, além da responsabilização por omissão do poder público. Até então, nenhum rio brasileiro teria sido considerado legitimado ao ajuizamento de uma ação reconhecendo seu caráter se sujeito de direitos. Como lembra Carlos Frederico Marés, este não reconhecimento não é por acaso, pois na linha hegemônica do desenvolvimento capitalista, a natureza foi expulsa da modernidade (MARÉS, 2017MARÉS, Carlos. De como a natureza foi expulsa da modernidade. Revista de Direitos Difusos. v.68, n.2, julho-dezembro, 2017.). Para Germana Moraes, as críticas à essa ação vieram da seguinte forma:

Destacam-se a falta de previsão legal para que os rios sejam sujeitos de direito e a acusação de romantismo e lirismo, sem que enfrentasse o argumento segundo o qual seria juridicamente sustentável no Direito Ambiental Brasileiro a interpretação semelhante a do Tribunal Constitucional da Colômbia (MORAES, 2018MORAES, Germana de Oliveira. Harmonia com a natureza e direitos de pachamama. Fortaleza: Edições UFC, 2018., p. 118).

Mesmo com as críticas, o reconhecimento do rio como sujeito de direito materializa não só uma possibilidade real de reivindicar um direito difuso, como alia o protagonismo ambiental aos povos atingidos pelo rejeito, visto que a individualização da reparação é insuficiente frente ao colapso comunitário causado. Vale mencionar sobre o tema que os autores Ingo Sarlet e Tiago Fensterseifer (2019SARLET, Ingo Wolfgang; FENSTERSEIFER, Tiago. Direito Constitucional Ecológico: Constituição, direitos fundamentais e proteção da natureza. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.) defendem a interpretação do alcance do art. 225 de forma abrangente para contemplar na palavra todos que inicia o texto normativo também como sujeito de direitos a natureza, ampliando a esfera de proteção constitucional e, sobretudo, rompendo com o paradigma antropocentrista vigente.

O protagonismo ambiental pode ser identificado ainda entre os já mencionados seringueiros em sua luta pela floresta de pé que concebem a preservação das riquezas naturais da floresta como condição para o desenvolvimento humano econômico e social e, bem assim, para sua própria sobrevivência, já que identificam uma associação intrínseca e necessária entre suas práticas sociais e seu contexto ecológico. De forma semelhante, as quebradeiras de coco babaçu7 7 As quebradeiras são trabalhadoras rurais que sobrevivem da extração do babaçu - uma palmeira da qual se aproveita todas as partes - e lutam pelo seu território contra fazendeiros, pecuaristas e empresas agropecuárias que cercaram as terras e impedem o acesso aos babaçuais já que tais trabalhadoras não possuem títulos de propriedade. , identificadas como guardiãs da floresta, possuem uma relação de territorialidade por conexões existenciais como parte da construção de sua identidade pelo especial vínculo que possuem com a natureza.

Assim, para além da participação ativa por mecanismos de participação direta nas tomadas de decisões, o reconhecimento pelo campo jurídico de modos de vida diversos do paradigma moderno, incluindo a concepção de recursos naturais como sujeitos de direito, mitiga a perspectiva antropocêntrica de proteção ambiental e favorece a luta dos grupos que se encontram exterioridade sistêmica na medida em que esmaece a invisibilidade que os recobre.

Por esta singela análise jurídico-ambiental no sistema de direito constitucional brasileiro, é possível observar que as condições universais que conferirão pretensão de verdade, legitimidade e factibilidade estão mais ou menos presentes no ordenamento, devendo ainda se aperfeiçoar. No âmbito da proposta deste artigo que se dedica àqueles mais expostos e afetados pelos danos ambientais e suas possibilidades de participação para superação da sua condição, vale mencionar que da forma como está colocado, a proteção constitucional ambiental no Brasil acaba por contribuir para a perpetuação da situação de desigualdade, mantendo grupos excluídos e reverberando a colonialidade em suas estruturas. Isto porque há uma carência dos espaços de factibilidade e materialização das demandas ambientais pela falta de um projeto democrático e popular comprometido com um processo libertador e pautado por uma transversalidade ambiental. Conforme aponta o professor Marés, o protagonismo desta pauta, em algum momento, requererá a ruptura com o capitalismo, que emergirá de uma revolução ou uma catástrofe, de um avanço ainda tímido da consciência socioambiental revolucionária (2017, p.39). A questão socioambiental assume para si alternativas não capitalistas, sendo possível compreender também com a lente marxista, as atuais crises ecológicas do capitalismo (FOSTER, 2005FOSTER, John Bellamy. A ecologia de Marx: materialismo e natureza. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2005.).

O Direito, cujo símbolo máximo em uma nação é a Constituição, se construiu com base na noção moderna de poder que se identifica com a dominação, portanto não surpreende que isso ocorra no caso em tela. Todavia, vale ter em perspectiva a realização das condições universais pelo Direito, pois agindo dessa forma,

a normatividade da luta pelo reconhecimento como libertação teria legitimidade antecipada, e o processo de deslegitimação do que deve derrogar perde sua angustiosa aparência e se torna um momento já antecipado também na necessária impossibilidade de uma legalidade perfeita ou legitimidade perfeita, impossibilidade exigida pela condição humana. (DUSSEL, 2015DUSSEL, Enrique. Direitos humanos e ética da libertação: Pretensão política de justiça e a luta pelo reconhecimento dos novos direitos. Revista InSURgência, v. 1, n. 1, jan/jun, p. 121-136, 2015. Disponível em: periodicos.unb.br/index.php/insurgencia/article/view/18800. Acesso em: 05 mar. 2022., p. 135-136).

Como exemplos interessantes, nesse sentido, podemos mencionar as Constituições de Bolívia e Equador que privilegiam canais de participação da sociedade civil e formas de democracia direta, o que viabiliza a manifestação de reivindicações pela sociedade que é ao mesmo tempo fiscal e sujeito de implementação de direitos (BELLO, 2016BELLO, Enzo. O pensamento descolonial e o modelo de cidadania do novo constitucionalismo latino-americano. In: BRANDÃO, Clarissa; BELLO, Enzo (Ogrs.). Direitos Humanos e Cidadania no Constitucionalismo Latino-Americano. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016, p. 5-29.; LEONEL JÚNIOR, 2018LEONEL JÚNIOR, Gladstone. O Novo Constitucionalismo Latino-americano: um estudo sobre a Bolívia. 2ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018.). Não por acaso, a Constituição de Montecristi (do Equador) é a primeira carta constitucional a positivar os direitos da Pachamama ou o que se considera como direitos da Natureza, o que a coloca com um protagonismo na abordagem do Direito Ambiental e a torna uma referência para todo o mundo. Esta é uma questão importante e singular, pois o tratamento conferido à Natureza como organismo vivo a eleva como sujeito de direito e lhe retira o caráter de objeto.

Um exemplo do reconhecimento da natureza como sujeito de direito é o caso do Rio Blanco. A cidade de Tabacundo - Estado de Pichincha - concedeu autorização, sem licenciamento ambiental, para proprietários locais realizarem 53 atividades de mineração artesanal. Essa exploração causou o deslizamento dos materiais usados no Rio Granobles (Rio Blanco), afetando-o. O Rio Blanco, considerado sujeito de direito, ajuíza, então, “Acción de Protección”, em janeiro de 2013, sob a alegação de violação dos direitos do Rio e do direito à água.

A sentença judicial determinou a suspensão temporária das atividades de mineração até a obtenção da licença ambiental e um estudo da água do rio com a finalidade de remediar os possíveis danos. Essa sentença foi confirmada em segunda instância.

Para uma proteção constitucional ambiental com abordagem crítica e libertadora por meio da aplicação da Pretensão Política de Justiça, as ações não se esgotam em si ao abordar a questão da distribuição desproporcional dos impactos e riscos ambientais, mas devem contribuir para pensar, identificar lacunas e propor caminhos a serem aperfeiçoados para a construção de uma sociedade social e ambientalmente mais justa.

5. Considerações Finais

Na compreensão aqui adotada, indígenas, atingidos por barragens, seringueiros, quilombolas, faxinalenses, quebradeiras de coco babaçu e tantos outros que se encontram à margem da totalidade estão em situação de desigualdade ambiental. Não são sujeitos criados ao acaso, mas frutos de um processo histórico de dominação que reverbera ainda hoje nas estruturas sociais e é responsável pela exclusão dos mesmos, aos quais são sistematicamente direcionados os impactos e riscos ambientais como produtos da racionalidade moderna que também dominou e se apropriou da natureza.

À justiça ambiental como corrente teórica foram trazidas as reflexões acerca da colonialidade que aprofundaram a relação entre impactos e riscos ambientais e o processo de dominação que contribuiu para a constituição de grupos mais expostos a estes cenários. Assim foi possível delinear este fenômeno e caracterizar alguns grupos em situação de desigualdade ambiental como parte da exterioridade pensada por Dussel já que não desfrutam, tal como a totalidade, do direito ao ambiente sadio.

As formulações que tratam da pretensão de bondade e Pretensão Política de Justiça nos serviram para buscar no Direito as condições para uma proteção constitucional ambiental que não desconsidere os que se encontram nessa situação, mas os tomem por fundamento na construção de uma realidade mais justa. A participação ativa é parte fundamental junto à materialidade e factibilidade, sem as quais a Pretensão de Justiça não se realiza.

O que se avalia é que se deve levar em conta seriamente a participação da exterioridade na questão ambiental e, inclusive, considerar o reconhecimento de elementos da natureza como sujeitos de direitos.

Uma sociedade cujos indivíduos e a coletividade possam usufruir, inclusive sendo reconhecido como sujeitos, e não meros objetos, de seus direitos em harmonia e em um ambiente sadio, trata-se de um projeto permanente, que continuará em conflito com o modo de produzir a vida no capitalismo.

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  • 1
    No plano internacional, a preocupação com o equilíbrio ecossistêmico com vistas a garantia de qualidade de vida para o ser humano tornou-se pauta dos debates na década de 1970 e tem na Declaração de Estocolmo (1972) o primeiro documento que acolhe a proteção ambiental como necessária à garantia de dignidade e bem-estar para o ser humano. Desde então, o debate evoluiu e novos documentos internacionais trataram do tema, sendo que atualmente a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992) é um dos mais importantes em termos de reconhecimento de direitos ambientais.
  • 2
    Dussel propõe que a noção de poder deve ser identificada de forma positiva e tendo como última referencia a potentia, isto é, os indivíduos responsáveis por construir desde baixo o fundamento do poder institucionalizado, o potestas. (DUSSEL, 2009).
  • 3
    “A necessária institucionalização do poder da comunidade, do povo (...)” (DUSSEL, 2007, p. 32).
  • 4
    O empate era um método de luta, em que os povos da floresta, sobretudo os seringueiros que viviam da extração do látex das árvores, se organizavam para impedir que tratores devastassem a floresta e derrubassem as árvores, se colocando a frente dos veículos impedindo que continuassem o desmatamento. A prática foi muito comum no Acre ao longo dos anos 80.
  • 5
    Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; (...)
  • 6
    O art. 5º, § 3º, da Constituição Federal dispõe que tratados e convenções internacionais aprovados em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por 3/5 dos votos dos respectivos membros e que versem sobre direitos humanos ingressam com status de emenda constitucional. Os demais tratados de direitos humanos que não sejam aprovados com quórum qualificado situam-se entre a Constituição Federal e as leis ordinárias com status de supralegalidade, interrompendo a eficácia de normas infraconstitucionais com eles conflitantes, de acordo com entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 466.343-1, STF/2008.
  • 7
    As quebradeiras são trabalhadoras rurais que sobrevivem da extração do babaçu - uma palmeira da qual se aproveita todas as partes - e lutam pelo seu território contra fazendeiros, pecuaristas e empresas agropecuárias que cercaram as terras e impedem o acesso aos babaçuais já que tais trabalhadoras não possuem títulos de propriedade.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    08 Mar 2022
  • Aceito
    05 Ago 2022
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