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Um convite para pensar, viver, aprender e fazer enfermagem de muitos modos: o temário do 56° Congresso Brasileiro de Enfermagem

EDITORIAL

Um convite para pensar, viver, aprender e fazer enfermagem de muitos modos: o temário do 56° Congresso Brasileiro de Enfermagem

An invitation to think, live and do nursing in many ways: the topics of the 56th Brazilian Nursing Congress

Una invitación para pensar, vivir, aprender y hacer enfermería de muchas maneras: el temario del 56° Congreso Brasileño de Enfermería

Maria Henriqueta Luce KruseI; Dagmar Esterman MeyerII

ICoordenadora da Comissão de Temas do 56° CBEn

IIMembro da Comissão de Temas do 56° CBEn

E-mail: kruse@uol.com.br

O 56° Congresso Brasileiro de Enfermagem (CBEn) será realizado em Gramado (RS) de 24 a 29 de outubro. O grupo que construiu o temário deste tradicional evento da ABEn partiu das idéias de Jorge Larrosa, educador espanhol já conhecido e com algumas publicações no Brasil, dentre elas o livro Pedagogia Profana(1). Deste livro destacamos o texto Agamenon e seu porqueiro. Ali, Larrosa faz uma série de reflexões sobre a verdade do poder e sobre o poder da verdade, nesta época de globalização informativa e comunicativa. Ao introduzir as idéias de Vattimo, que enfatiza que vivemos numa sociedade de comunicação generalizada, na qual os aparatos de comunicação de massa são determinantes para a produção, a reprodução e para a dissolução disso que chamamos realidade, o autor nos convida a envolver-nos com uma pergunta: de onde vem e o que vem a ser a realidade?

Quando destaca a idéia de que talvez as coisas não sejam como nos dizem que elas são, que os fatos podem não ocorrer como aprendemos a pensar que eles ocorrem e, principalmente, que aquilo que nos dizem que tem que ser ou que tem que ocorrer de um determinado modo não está assegurado e poderia assumir também outras formas, o autor nos desafia a aceitar e apostar na pluralização disso que aprendemos a nomear como 'a' realidade e a investir na desconstrução da realidade como princípio. Assim, o texto vai nos conduzindo para a idéia de já que não temos 'uma' realidade que seja distinta ou que esteja fora das interpretações que dela fazemos e a questionar se existe alguma realidade que possa nos servir como princípio ou como fundamento da boa interpretação.

Esse modo de pensar institui o pressuposto de que a palavra realidade e, por conseguinte, a própria realidade pode estar desvinculada desta conhecida propriedade que ela teria de encarnar uma verdade incontestável. Em determinada passagem do texto o autor destaca:

Em nosso tempo, uma vez que a realidade esteja convertida em plenamente real e as coisas em objetos plenamente objetivos, o real não pode ser aquilo que se discute, aquilo que se põe em questão, aquilo que abre a questão e o questionamento: agora o apelo à realidade da realidade e à objetividade das coisas funciona terminantemente como aquilo que fecha a discussão e resolve a questão. Quando é a realidade que fala nós devemos nos calar(1:202).

Assim, o estado da realidade é visto como ambíguo e, nessa direção, para encetar qualquer combate à realidade do poder torna-se necessário colocar em dúvida o poder disso que se apresenta como realidade. E essa realidade da qual viemos falando não poderia referir-se, por exemplo, à realidade da ciência? E esta realidade não estaria solidária com o modelo de verdade próprio da ciência positiva? Aí, então, o autor diz que o embate com a verdade do poder pressupõe a disposição de colocar em dúvida o poder da verdade. Esta operação nos coloca diante, ou nos posiciona dentro, de um movimento que instaura uma tensão interessante: aquela que emerge entre a produção e a imposição de uma verdade única e a emergência de verdades múltiplas e conflitantes. Para concluir, Larrosa destaca que nos submetemos ao poder da verdade quando nos apegamos à verdade do poder e quando, ao fazê-lo, aceitamos que ela é a única verdade e a verdade verdadeira.

Naquilo que nos interessa aqui, o autor e as abordagens teórico-metodológicas que se aproximam de sua perspectiva, nos propõem viver, pensar, fazer e ensinar, em qualquer campo do conhecimento, considerando a conflitualidade e as disputas subjacentes aos processos que instauram e legitimam 'a' verdade e o exercício do poder nas instâncias nas quais nos movimentamos como profissionais. Tomando, pois, como referência essas provocações do autor e os efeitos que elas produziram em nós, construímos o tema central do Congresso que é Enfermagem hoje: coragem de experimentar muitos modos de ser.

Como a adoção de um certo modo de 'ver e de entender' implica não apenas a delimitação de um tema que encaminhe na direção do que se pretende que seja discutido, mas supõe, também, um 'como dizer' que seja congruente com essa perspectiva, desdobramos este tema em quatro subtemas: Modos de viver, Modos de fazer, Modos de pensar e Modos de aprender enfermagem. Para além disso, um 'como dizer' que pudesse nos confrontar com a pluralidade e a conflitualidade que se articulam no saber de enfermagem demandou priorizar, no programa oficial, formas de apresentação mais coletivas como mesas redondas, comunicações coordenadas e pôsteres dialogados agrupados por tema, mais do que palestras e conferências. Procuramos contemplar, diariamente, os quatro subtemas, desdobrados em torno de temas/problemas contemporâneos, além de agrupar, nas mesmas mesas redondas, estudios@sª a Utilizamos a arroba para contemplar os gêneros masculino e feminino. com enfoques teórico-políticos plurais e, por vezes, conflitantes. Com essa estratégia não se pretende estabelecer, necessariamente, confrontos teóricos e políticos entre os componentes da mesa, mas tornar audíveis e visíveis vozes e abordagens que emergem como inovações ou que têm sido subsumidas pelas vozes hegemônicas ou, ainda, que as problematizam em cada área, convidando-as para os debates e reflexões que o Congresso Brasileiro de Enfermagem, historicamente, fomenta e estimula na área.

É, pois, com este olhar e com muito prazer que @s enfermeir@s gaúch@s, associad@s da ABEn RS, organizam este tradicional evento anual da ABEn. Aguardamos @s colegas de todo o Brasil para este encontro no qual, além de divulgar e difundir a produção do conhecimento em enfermagem, se investe também na construção de um espaço de expressão social e política da enfermagem brasileira, propiciando o intercâmbio entre @s profissionais e organizações de enfermagem.

  • 1. Larrosa J. Pedagogia profana. Danças, piruetas e mascaradas. Porto Alegre (RS): Contrabando; 1998.252p.
  • a
    Utilizamos a arroba para contemplar os gêneros masculino e feminino.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Jun 2011
    • Data do Fascículo
      Abr 2004
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