Resumos
O objetivo deste trabalho é descrever como as adolescentes se relacionavam com seus familiares antes e após a descoberta da gravidez. Participaram quinze adolescentes que se encontravam no puerpério, em uma maternidade pública. Utilizamos como instrumento de coleta de dados a entrevista semi-estruturada. Para a análise dos dados recorremos à abordagem qualitativa. Os resultados indicam que as adolescentes viviam uma relação boa, mas ao revelarem que estavam grávidas são vítimas de atos violentos por parte dos pais e que diálogo sobre sexualidade e contracepção ainda é distante entre pais e filhos.
Violência; Gravidez na Adolescência; Enfermagem
The objective of this work is to describe how the adolescents had relationship with their relatives before and after the discovery of the pregnancy. Fifteen adolescents from a public maternity that were in the post-partum period participated fo the research. A semi-structured interview was used as instrument of data collection. Qualitative approach was used for data analysis. Results indicated that the adolescents had a good relationship, but when the pregnancy was revealed they became victims of violent acts by their parents and that dialogue about sexuality and contraception is still distant between parents and children.
Violence; Pregnancy in Adolescence; Nursing
El objetivo de este trabajo es describir como los adolescentes ellos se unieron con sus parientes antes y después del descubrimiento del embarazo. Quince adolescentes que estaban en el puerpério participaron, en una maternidad pública. El instrumento de recolección de datos utilizado fué la entrevista semi-estructurada. Para el análisis de datos fue utilizado el abordaje cualitativo. Los resultados indican que los adolescentes vivieron una relación buena, pero cuando ellos revelaran el embarazo sufriran actos violentos por parte de los padres y ese diálogo sobre la sexualidad y el anticoncepcionismo todavía está distante entre los padres y niños.
Violencia; Embarazo en adolescencia; Enfermería
PESQUISA
A violência intra-familiar contra adolescentes grávidas
Intrafamiliar violence against pregnant adolescents
Violencia dentro de la família contra la adolescente embarazada
Claudete Ferreira de Souza Monteiro I; Neyla Shirlene Santos Costa II; Patrícia Samara Veras Nascimento III; Yara Amorim de Aguiar IV
IEnfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal do Piauí - UFPI, Teresina PI. Sub-Coordendora do Núcleo de Estudos Sobre Mulher e Relações de Gênero-NEPEM da UFPI. Coordenadora do Programa de Pos-Graduação Mestrado em Enfermagem da UFPI. Professora da NOVAFAPI.Endereço para contato:Av. Cel. Costa Araújo, 323, Teresina - PI. claudetefmonteiro@hotmail.com
IIEnfermeira. Professora do Curso Técnico de Enfermagem do Colégio Êxito, Teresina, PI. neilashirlene@hotmail.com
IIIEnfermeira do Programa Saúde da Família- PSF do município de Campo Maior, PI. Aluna do Curso de Especialização em Saúde Pública da UFPI.
IVEnfermeira. Coordenadora do Programa Saúde da Família do município de Esperantina, PI
RESUMO
O objetivo deste trabalho é descrever como as adolescentes se relacionavam com seus familiares antes e após a descoberta da gravidez. Participaram quinze adolescentes que se encontravam no puerpério, em uma maternidade pública. Utilizamos como instrumento de coleta de dados a entrevista semi-estruturada. Para a análise dos dados recorremos à abordagem qualitativa. Os resultados indicam que as adolescentes viviam uma relação boa, mas ao revelarem que estavam grávidas são vítimas de atos violentos por parte dos pais e que diálogo sobre sexualidade e contracepção ainda é distante entre pais e filhos.
Descritores: Violência; Gravidez na Adolescência; Enfermagem.
ABSTRACT
The objective of this work is to describe how the adolescents had relationship with their relatives before and after the discovery of the pregnancy. Fifteen adolescents from a public maternity that were in the post-partum period participated fo the research. A semi-structured interview was used as instrument of data collection. Qualitative approach was used for data analysis. Results indicated that the adolescents had a good relationship, but when the pregnancy was revealed they became victims of violent acts by their parents and that dialogue about sexuality and contraception is still distant between parents and children.
Descriptors: Violence; Pregnancy in Adolescence; Nursing.
RESUMEN
El objetivo de este trabajo es describir como los adolescentes ellos se unieron con sus parientes antes y después del descubrimiento del embarazo. Quince adolescentes que estaban en el puerpério participaron, en una maternidad pública. El instrumento de recolección de datos utilizado fué la entrevista semi-estructurada. Para el análisis de datos fue utilizado el abordaje cualitativo. Los resultados indican que los adolescentes vivieron una relación buena, pero cuando ellos revelaran el embarazo sufriran actos violentos por parte de los padres y ese diálogo sobre la sexualidad y el anticoncepcionismo todavía está distante entre los padres y niños.
Descriptores: Violencia; Embarazo en adolescencia; Enfermería.
1. INTRODUÇÃO
A adolescência constitui um período de transição gradativa, no qual surgem características sexuais secundárias e se desenvolvem processos psicológicos e padrões de identificação. Embora se configure como transição são os grupos etários mais numerosos do país. A população brasileira é constituída de, aproximadamente, 21% de jovens na faixa etária dos 10 aos 19 anos(1).
É também a adolescência um período marcado por mudanças físicas e psicológicas, no qual ocorrem intensos processos conflituosos de auto-afirmação(2). Desta forma, a gravidez precoce e não planejada pode gerar problemas a curto e a longo prazo em função das adolescentes não terem suporte físico e emocional consolidado e favorecer situação de conflito com a família, como a rejeição, críticas, punições. Essas situações podem levar a atitudes que coloquem em risco tanto a vida da adolescente como a da criança, oriundas da interrupção da gravidez, isolamento e tentativa de suicídio(3).
A gravidez na adolescência vem ocupando lugar de significativa relevância no contexto da saúde pública, despertando interesse de acadêmicos, profissionais e gestores de saúde no que se refere à saúde sexual e reprodutiva, bem como questões ligadas a violência. Além disso, a gravidez na adolescente se torna um problema em função de conseqüências a ela atribuídas, principalmente o abandono a escola e a estigmatização de ser mãe e não estar maritalmente unida(4).
Os motivos que contribuem para o surgimento da gravidez precoce podem estar ligados a ingenuidade, submissão, violência, dificuldades de obter algum método contraceptivo, expectativas de mudança de status social ou outros fatores ligados a subjetividade da adolescente(4) .
Entre os problemas relacionados à adolescência a literatura mostra a violência sexual, emocional e física que muitas vezes é praticada por pessoas da estreita relação com as adolescentes, destacando-se familiares e parceiros.
Atos violentos entre pais e filhos são relatados na história social da infância através dos tempos e se caracterizam por "atos de natureza assimétrica, hierárquica e adultocêntrica, assentadas nos pressupostos do poder do adulto sobre a criança"(5).
Com a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, o índice de denúncias de maus-tratos tem crescido levando o poder público a unir-se aos vários setores da sociedade na tentativa de encontrar uma eficiente política de saúde e de educação que favoreça a interrupção do ciclo da violência(6).
Entre os vários tipos de violência contra mulheres adolescentes, a violência física tem destaque. Por ser um fenômeno complexo, de etiologia multicausal, seu desafio está na área de prevenção. Uma das dificuldades encontra-se na subnotificação. Tanto as mulheres adolescentes, quanto outros familiares, como mães, em geral, escondem o fato, camuflando com outras respostas aos registros corporais deixados pelos espancamentos e chutes.
No setor de urgência dos serviços de saúde a identificação dos casos de violência doméstica é ainda de difícil registro, pois faltam informações e preparo dos profissionais de saúde para olhar além do dano físico visível e buscar aspectos significativos neste atendimento, como a fala, os gestos e outras expressões de dor e sofrimento que não se mostram tão objetivamente(7).
Nesse sentido os serviços que prestam atendimentos a mulheres adolescentes durante o período gravídico deveriam estar também, atentos a investigação de práticas violentas aplicadas a estas adolescentes.
Assim, a motivação do estudo se fez no recorte de buscar, a partir das próprias adolescentes, como estas se relacionavam com seus familiares antes e após a revelação de que estavam grávidas.
2. METODOLOGIA
O estudo constituiu-se em uma pesquisa qualitativa. O universo empírico considerado foi de adolescentes puerpéras que se encontravam internadas em uma maternidade pública de referência do município de Teresina-PI.
O recorte empírico do estudo foi constituído por quinze mulheres adolescentes que se encontravam no puerpério imediato, selecionadas por meio de consultas aos prontuários da unidade de puerpério. O grupo de adolescentes encontrava-se na faixa etária compreendida entre 17a19 anos, com procedência majoritária do interior do Estado, situação conjugal entre união estável (4) e solteira (11). Eram adolescentes em sua maioria primigesta. No grupo foram identificadas duas adolescentes que haviam praticado mais de um aborto.
Em conformidade com a Resolução 196/96, do Conselho Nacional de Saúde, obteve-se a aquiescência dos responsáveis que acompanhavam as adolescentes na maternidade e das próprias adolescentes para que as mesmas fizessem parte do estudo. A estas foram informadas sobre os objetivos do estudo e solicitadas permissão para uso de suas informações, garantindo-lhes o anonimato e o direito de afastar-se do mesmo se assim julgassem necessários. O estudo também foi previamente aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Piauí, conforme as normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos.
A técnica utilizada para a coleta de dados foi uma entrevista contendo questões abertas oportunizando o discurso livre sobre as questões buscadas. As entrevistas, do tipo semi-estruturada, duraram em torno de trinta minutos, sendo abordados os seguintes conteúdos: dados de identificação; a relação com a família antes da gravidez; o momento da descoberta da gravidez e a relação com a família após a descoberta da gravidez. A coleta de dados ocorreu no período de setembro a novembro de 2005 e foram gravados em fitas K7.
O corpus de análise foi composto pelos dados das entrevistas e analisados por meio do método de análise de conteúdo, modalidade temática (8). As discussões dos conteúdos levantados estão fundamentadas nas concepções de adolescência, gravidez e violência.
3. RESULTADOS
As falas das adolescentes foram agrupadas em significados comuns evidenciando o comportamento da família antes e após a descoberta da gravidez.
Nos discursos a maioria das adolescentes fala da convivência com sua família como uma relação harmoniosa, considerada normal, incluindo a presença de diálogo e respeito. Entretanto, elas não se referiam a diálogos sobre sexualidade e orientações à cerca da gravidez na adolescência. Nesse sentido os pais, em sua maioria, encontram-se despreparados para avançar nesse diálogo, embora, "às vezes a adolescente até quer contar suas experiências, mas muitos pais fantasiam ter uma eterna criança dentro de casa"(9).
Era uma relação boa. Era tudo normal. Todo mundo me tratava bem, era tudo normal! Não tinham brigas, nem piadas (...) com meus irmãos e irmãs era cada um na sua, mas não faltava com o respeito. Era tudo tranqüilo lá em casa, sem conflitos comigo! (D9).
Era uma relação boa, normal, como de qualquer pessoa, quer dizer, eu vivia em paz com a minha família, não faziam piadas, não me xingavam e a gente ficava junto, conversava, assistia televisão, uma família normal! (D10).
Era um relacionamento normal. Havia diálogo, compreensão atenção (D11).
Nestes relatos, para algumas adolescentes o fato de não existir conflito evidencia uma relação de normalidade, o que de fato se configura na maioria dos lares, pois os pais ainda apresentam limitações para ultrapassar a convivência ao simples fato de `assistir televisão em conjunto com os filhos', delegando a escola e aos amigos esta função de orientação sobre a sexualidade, doenças transmissíveis e contracepção.
A família tanto pode ser um recurso de possibilidade ao crescimento e desenvolvimento saudável dos seus membros como também pode apresentar limitações que impedem a compreensão dos valores básicos da formação dos jovens(10). Muitos pais, por apresentarem enormes dificuldades para tratar da sexualidade dos filhos, transferem este papel educativo a terceiros perpetuando assim esse modelo para muitas gerações(11).
Acredita-se que por questões culturais, vergonha, preconceitos, muitos pais têm dificuldades em dialogar sobre sexualidade com os filhos e, em especial, a filha. No geral, as conversas giram em torno de uma orientação sexual resumida à educação sobre a higiene no período menstrual, esta designada na maioria das vezes às mães. Talvez seja uma das razões pelas qual a mãe procura compreender mais a adolescente do que o pai por já ter vivenciado este período(12).
A família, como uma instituição social, apresenta aspectos positivos, enquanto núcleo afetivo, mas pode apresentar aspectos negativos, como a imposição de normas, gerando conflitos(13). Nessa perspectiva, uma adolescente expressou a existência de normas rígidas que culminaram com a sua saída de casa.
Eu convivia com meu padrasto que é o tipo de uma pessoa assim muito obsessiva, para eu sair de casa, saía de casa escondida. Ele não deixava eu ir nem no portão de casa conversar com uma colega, só era de casa para escola e ainda contava o tempo desse período que eu ia. Aí, eu fui num domingo, saí e não voltei mais (...) passei três meses fora de casa sem dar notificação (...) Ele não deixava faltar nada dentro de casa, mas era grosseiro comigo e com a minha mãe (D6).
Na análise desse depoimento é possível compreender que esta era uma adolescente oriunda de um lar onde a violência fazia ninho. A prática de maus tratos afeta a qualidade de vida de milhares de crianças e jovens e se verifica nos ambientes que deveriam ser para apoio e de vivência de cidadania plena como os lares. No entanto, estes locais se configuram como meio preferencial de agressão cujo agressor é pessoa das relações dos adolescentes. No Brasil, estes relacionamentos agressivos são, em geral, usados como forma de educar ou para corrigir possíveis erros(14) .
Para algumas adolescentes a notícia da gravidez não trouxe grandes mudanças. A família ficou surpresa, preocupada, mas aceitou o fato. Entretanto, nestes relatos é possível compreender que para a adolescente a gravidez não era considerada um problema.
Não senti alteração quando disse que estava grávida. Ficaram surpresos, mas me trataram como sempre. Minha mãe disse que tava tudo bem, aí eu fiquei bem (D2).
Meu relacionamento em casa não mudou quase nada. Foi só meus irmãos que ficaram assim, um pouco chateados.. Hoje eles me tratam melhor porque acham que não posso passar raiva e antes tinha aquelas discussõezinhas e hoje já não tem mais (D7).
Não senti mudanças no nosso relacionamento. Ficaram surpresos, um pouco assustados, mas até me apoiaram. Não me trataram ruim por causa disso, minha mãe tem muito cuidado comigo por causa da gravidez, só meu pai é um pouco indiferente (D8).
Com base nas falas, a gravidez foi vivenciada com o apoio da família, elemento importante para que a gravidez tenha maior probabilidade de ser levada a termo normalmente e sem grandes transtornos(3).
Entretanto, nem todas as adolescentes que participaram deste estudo tiveram da família o apoio e o desprendimento diante da descoberta da gravidez. Para a maioria das depoentes a revelação da gravidez gerou conflitos e presença de violência que se manifestava tanto na forma física, através de espancamento, como na forma psicológica, quando eram xingadas e induzidas ao abortamento.
Com a descoberta da gravidez, o relacionamento com a família, a não aceitação do fato, gera conflitos que ultrapassam a sentimentos de mágoa, de vergonha, de perplexidade. A relação paterna, principalmente, se tornou difícil.
Meu pai ficou distante de mim quando eu falei pra ele que estava grávida e ele disse que eu não poderia ficar mais dentro de casa. Estabeleceu um prazo para sair, até que o cara com quem eu estava me relacionando pudesse me buscar. Minha mãe disse que era para gente procurar meio de viver junto, já que meu pai não me queria mais dentro de casa (D1).
Quando souberam que eu estava grávida, a situação foi mudando cada vez mais. Tive muitas brigas, mais com meus pais. (...) ficaram chateados por ser nova demais! Ouvi muitas brigas, principalmente do meu pai (D5).
Falavam que tinha que mudar as coisas, que a mãe não tinha que me tratar do mesmo jeito, tinha que me dar um castigo, porque eu tinha aprontado, falavam um bocado de coisas mesmo! (...) A minha irmã dizia muito assim: que eu não mandava mais nada lá em casa, não tinha mais direito em nada! Tinha que ficar quieta num canto, não tinha mais direito de opinar em nada! (...) A minha irmã tem dois gêmeos, aí ela dizia: os meus vão ter que ser mais merecidos porque sou casada, ela não é! Não sei o quê! Os meus são dois, o dela é só um (D9).
A família, como apresentada pelas adolescentes, corresponde ao modelo patriarcal, com característica de posse dos pais em relação aos filhos dependentes, impondo autoritarismo e disciplina. Entretanto, para que a família passe a constituir-se como apoio ao adolescente no que se refere à orientação sexual, a mesma teria que apresentar critérios como adaptação, participação, afeto e resolução(13).
O inicio da atividade sexual precoce e a gravidez na adolescência ainda são realidades que não agrada nem a família, nem a sociedade e não podem ser ignoradas(9). As famílias, mesmo sem compreenderem que se distanciam do diálogo destas questões, a principio não aceitam a descoberta, culpam mais os adolescente sem terem a preocupação de buscarem reflexão sobre como foram repassados este conhecimentos junto aos filhos.
Eles passaram a me chamar de irresponsável e me discriminar entre as coisas familiares, começaram a dizer que eu era vagabunda, tinha que trabalhar, ía parar de estudar. Meu pai, principalmente! Ele passou a me olhar de outro jeito, ser diferente, me bater, dizendo que eu tinha que parar de estudar... é confusão lá em casa! O povo lá já me bateu muito! Eles disseram que eu tenho que sair, pois não me querem mais lá! (D10).
Meu pai não aceitou meu filho, então ele queria que eu abortasse. Quando minha mãe soube, disse que não queria o meu filho, então eu chorei muito com isso! (D15).
Meus pais me rejeitaram e ficaram muito chateados, me expulsaram de casa e não ligaram mais pra mim, disseram que eu tinha que tomar um rumo e meu namorado mudou, mandou eu tirar o menino (D14).
A surra que eu levei do meu pai! E me deram remédio, não sei que remédio era, acho que era pra perder. Tomei! Se não eu apanhava. Perdi pai, perdi mãe, perdi irmão (...) (D12).
Quando minha mãe soube que eu estava grávida, ela me agrediu! Me bateu muito, me chutando, me jogou na parede e foi até a geladeira, pegou um litro de gelo e jogou em mim! Ela disse que não queria o meu filho (D5).
Na leitura desses depoimentos a violência intrafamiliar, de natureza psicológica, com as agressões, ridicularização, humilhação, punição e cobrança, torna-se mais visível. O pai e a mãe figuram como principais agressores. Nesta questão dados epidemiológicos do Peru mostram que a violência infligida a adolescentes grávidas tem como agressores principais pai e mãe e a própria gravidez é citada como uma das causas desta violência, sendo que a violência psicológica foi sentida pela quase totalidade (99,54%) das adolescentes que participaram do estudo(15).
Outro aspecto relevante ressaltado pelas depoentes foi à violência física, perpetrada por espaçamentos e chutes. A violência contra a mulher se destaca pela sua prevalência dentro da família e por causar grave impacto sobre a saúde das mulheres(4). Atos violentos contra crianças e adolescentes são também considerados uma realidade dolorosa responsável por altas taxas de mortalidade e de morbidade nessa faixa etária. Dela "gera sentimentos como o desamparo, o medo, a culpa ou a raiva, que, não podendo ser manifestados, se transformam em comportamentos distorcidos, perpetuando-se por gerações seguidas"(16).
A presença de situações de violência pode ainda contribuir para o desenvolvimento de distúrbios psicológicos que afetem profundamente o indivíduo em todas as suas relações, especialmente intrafamiliares, dificultando ainda mais suas relações afetivas(3).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo mostra que a maioria das adolescentes ao revelarem que estão grávidas passa a serem violentada tanto física quanto psicológica. Sentem-se inferiorizadas, culpadas, discriminadas, humilhadas e punidas em seu próprio lar. Marcadas muito mais pela dor dessa violência vir de entes queridos como pai, mãe, irmãos, irmãs e até do próprio parceiro.
A violência intrafamiliar percebida neste trabalho revela o quanto está distante o diálogo sobre sexualidade e contracepção entre pais e filhos. A adolescente vive uma relação de normalidade e de afeto até o momento em que revela sua gravidez, entretanto, a partir desse momento, instaura-se o conflito, já não se sabe mais o que é o certo e o que é errado. Os valores se embaralham e a família se sente impotente, envergonhada e joga na adolescente toda a sua raiva, sua insegurança.
Todavia, acreditamos que o estudo possibilita aos profissionais de saúde e em especial a(o) enfermeira(o) uma reflexão diante dos resultados. Por ser a prática de atos agressivos contra adolescentes grávidas registradas nas famílias, estas devem ser foco do cuidado dos programas de atenção básica, notadamente as equipes de saúde da família que podem ter um olhar mais atentivo para a detecção e prevenção aos maus-tratos na infância e adolescência.
Submissão: 13/05/2007
Aprovação: 14/07/2007
-
1Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo demográfico 2000 Primeiros resultados da amostra. Parte 1. Rio de Janeiro (RJ): IBGE; 2000.
- 2. Whaley L, Wong DL. Enfermagem Pediátrica elementos essenciais a intervenção efetiva. 5Ş ed. Rio de Janeiro (RJ): Guanabara-Koogan; 1999.
- 3. Ballone GJ. Gravidez na Adolescência. PsiqWeb, 2003, São Paulo (SP). (citado 16 mai 2005). Disponível em: URL: http://sites.uol.com.br/gballone/infantil/adoelesc3.html
-
4Rede Feminista de Saúde. Adolescente, saúde sexual, saúde reprodutiva: dossiê. Belo Horizonte (MG): Rede Feminista de Saúde; 2004.
- 5. Vieira D, Martins CS, Ferriani MGC, Nascimento LC. Caracterização da violência física contra crianças e adolescente. Rev Enferm UERJ 2004;12(3):306-11.
- 6. Cardoso ES, Santana JSS, Ferriani MGC. Criança e adolescente vítima de maus-tratos: informações dos enfermeiros de um hospital público. Rev Enferm UERJ 2006;14(4):524-30.
- 7. Monteiro CFS. Marcas no corpo e na alma de mulheres que vivenciam a violência conjugal: uma compreensão pela Enfermagem (tese). Rio de Janeiro (RJ): Escola de Enfermagem Anna Nery, Universidade Federal do Rio de Janeiro; 2005.
- 8. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa (POR): Edições 70; 1977.
- 9. Crizostomo DC, Nery IS, Luz MHBA. Planejamento familiar na visão das adolescentes puérperas. Rev Rene 2005;6(1):29-36.
- 10. Patrício ZM. O cuidado com a qualidade de vida dos adolescentes: um movimento ético e estético de "Kroans e tricksters". In: Ramos FRS, Marisa M, Rosane GN (org). Projeto Acolher: um encontro da Enfermagem com o adolescente brasileiro. Brasília (DF): ABEn/Governo Federal; 2000. p. 121-43.
- 11. Brêtas JRS, Silva CV. Interesse de escolares e adolescentes sobre o corpo e sexualidade. Rev Bras. Enferm 2002;55(5): 528-34.
- 12. Sousa ABG, Silva CL, Cavalcante CGD, Gomes RR. O enfermeiro frente aos maus tratos na infância e adolescência: proposta de um protocolo. Nursing 2005;89(8);462-7.
- 13. Rocha CRM, Tassitano CMLM, Santana JSS. Acompanhamento da adolescente na família. In: Associação Brasileira de Enfermagem. Adolescer: compreender, atuar, acolher: Projeto Acolher. Brasília (DF): ABEn/Governo Federal; 2001. p. 38-44.
-
14Ministério da Saúde (BR). Norma técnica prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes. Secretaria de política de saúde. Área técnica saúde da mulher. Brasília (DF): MS; 2002.
- 15. Flores TS, Schirmer J. Violência intra-familiar na adolescência na cidade de Puno-Peru. Rev Latino-am Enfermagem 2006; 14(4):579-85.
-
16Ministério da Saúde (BR). Notificação de maus-tratos contra crianças e adolescentes pelos profissionais de saúde: um passo a mais na cidadania em saúde. Brasília (DF): MS; 2002.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
30 Out 2007 -
Data do Fascículo
Ago 2007
Histórico
-
Aceito
04 Jul 2007 -
Recebido
13 Maio 2007