Avaliação do delirium em idosos atendidos em um serviço hospitalar de emergência

RESUMO

Objetivo:

identificar a ocorrência de delirium em idosos atendidos em serviço de emergência e verificar sua relação com as variáveis sociodemográficas e clínicas.

Método:

estudo transversal, prospectivo, de abordagem quantitativa. Participaram 200 idosos internados. Para coleta de dados utilizou-se o instrumento Confusion Assessment Method. Para as análises estatísticas, utilizaram-se os testes qui-quadrado, razão de verossimilhança e teste de Fisher, com nível de significância de 5%.

Resultados:

foram predominantes o sexo masculino e idade média de 71,8 anos. Nas primeiras 24 horas de internação, 56 (28%) idosos apresentaram delirium. Foi identificada relação da doença com falta de prática de atividade física, presença de cuidador, hipertensão, dislipidemia e doenças cerebrovasculares.

Conclusão:

o delirium foi associado à não realização de atividade física, à necessidade de um cuidador e à presença de comorbidades. Ressalta-se a importância da realização de outros estudos que possam levar à identificação precoce do quadro para prevenção de suas complicações.

Descritores:
Delirium; Idoso; Serviço Hospitalar de Emergência; Enfermagem; Avaliação Geriátrica

ABSTRACT

Objective:

identify the occurrence of delirium in aged patients assisted in emergency services and verify its relationship with sociodemographic and clinical variables.

Method:

cross-sectional, prospective study with a quantitative approach. Two hundred aged hospitalized patients participated. The Confusion Assessment Method was used for data collection. For statistical analysis, chi-square tests, likelihood ratio and Fisher’s test were used, with a significance level of 5%.

Results:

male gender and mean age of 71.8 years were predominant. In the first 24 hours of hospitalization, 56 (28%) aged individuals presented delirium. An association of the disease with lack of physical activity, presence of a caregiver, hypertension, dyslipidemia and cerebrovascular diseases was identified.

Conclusion:

Delirium was associated with no physical activity, the need of a caregiver, and the presence of comorbidities. The importance of conducting other studies that may lead to early identification of the condition to prevent its complications is emphasized.

Descriptors:
Delirium; Aged; Emergency Service Hospital; Nursing; Geriatric Assessment

RESUMEN

Objetivo:

identificar la ocurrencia de delirio en pacientes ancianos tratados en los servicios de urgencias y verificar su relación con variables sociodemográficas y clínicas.

Método:

estudio transversal prospectivo con enfoque cuantitativo. Participaron doscientos pacientes ancianos hospitalizados. Se utilizó el método de Confusion Assessment para la recopilación de datos. Para el análisis estadístico, se utilizaron testes de Chi-cuadrado, cociente de probabilidad y prueba de Fisher, con un nivel de significación del 5%.

Resultados:

predominaron el sexo masculino y la edad media de 71,8 años. En las primeras 24 horas de hospitalización, 56 (28%) ancianos presentaron delirio. Se identificó una relación entre la enfermedad y la falta de actividad física, la presencia de un cuidador, la hipertensión, la dislipidemia y las enfermedades cerebrovasculares.

Conclusión:

El delirio se asoció con la falta de actividad física, la necesidad de un cuidador y la presencia de comorbilidades. Se enfatiza la importancia de realizar otros estudios que puedan conducir a la identificación temprana de la afección para prevenir sus complicaciones.

Descriptores:
Delirio; Anciano; Servicio de Urgencia en Hospital; Enfermería; Evaluación Geriátrica

INTRODUÇÃO

O envelhecimento da população é um fenômeno que tem ocorrido mundialmente, tanto nos países mais desenvolvidos quanto nos menos desenvolvidos. No Brasil, a população acima de 60 anos soma mais de 20 milhões de pessoas, e esse fenômeno cresce a cada ano ⁽¹⁾.

Estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que, em 2040, a população do país será de cerca de 230 milhões de pessoas, configurando-se como a sexta população do mundo com o maior número de idosos – aproximadamente 54 milhões ^(1-2).

O aumento da expectativa de vida traz consigo uma série de desafios que os profissionais e gestores da área da saúde vêm enfrentando na atualidade. Por mais saudável que seja o processo de envelhecimento da população, a manutenção da qualidade de vida desses idosos como cidadãos integrados na sociedade, com autonomia, mobilidade, acesso a informações, serviços, segurança e saúde preventiva, torna-se um importante problema a ser vencido ^(1-2).

A fragilidade é uma condição frequente entre a população de idosos, pois eles estão mais sujeitos a doenças, incapacidades e sequelas que vão demandar ações efetivas e abrangentes do sistema de saúde. Dentre essas fragilidades, uma das condições crônicas mais prevalentes entre a população idosa é o delirium.

O delirium se configura como uma síndrome neurológica caracterizada por alterações agudas no nível de consciência e na função cognitiva, que se inicia de forma aguda e se desenvolve de maneira flutuante, raramente diagnosticada e/ou tratada ⁽³⁾. Na maioria das vezes, é confundido com transtornos emocionais, como depressão, pois afeta a percepção, a memória, a orientação e o raciocínio, além de comprometer o ciclo sono-vigília, podendo emergir ideias delirantes e alucinações ^(3-4).

As causas do delirium são complexas e multifatoriais, incluindo, como fatores desencadeantes, infecção, privação de sono, dor, falhas orgânicas específicas e distúrbios metabólicos. O limiar de cada indivíduo para delirium difere na predisposição de fatores de risco, como idade e fragilidade. Sua prevalência em pacientes hospitalizados aumenta com a idade e varia de acordo com o diagnóstico de internação ⁽⁵⁾.

Essa é considerada a segunda síndrome psiquiátrica mais prevalente no ambiente hospitalar, após os transtornos do humor, afetando de 29% a 64% dos pacientes hospitalizados, podendo ocorrer em pessoas de qualquer idade se o comprometimento neurológico for extenso, e podendo afetar até 80% dos pacientes internados em unidades de terapia intensiva ⁽⁶⁾.

A incidência do delirium está associada à alta mortalidade, ao aumento do tempo de internação em unidades críticas e ao maior tempo de ventilação mecânica, além de déficit funcional e cognitivo em longo prazo. Nos serviços de emergência, acomete cerca de 10% a 30% dos idosos atendidos logo no momento da admissão ou durante sua internação ^(7-8).

Geralmente, a equipe médica não é assertiva no diagnóstico do delirium, com uma média de precisão de apenas 24% a 35% dos casos entre os idosos. Assim, a prevalência de idosos com a doença poderia ser ainda maior, pois alguns pacientes são incapazes de se comunicar ou de cooperar e, dessa forma, muitos acabam sendo excluídos de estudos ⁽⁸⁾.

O diagnóstico precoce e preciso da doença nos idosos pode ser o prenúncio de uma grave condição médica. O erro de diagnóstico de delirium nos idosos que são atendidos em unidades de emergência pode levar à alta precoce, o que potencializa a mortalidade nos seis meses pós-alta hospitalar ⁽⁸⁾. Estudos indicam também a existência de associação de delirium com um maior tempo de internação, pior prognóstico, deterioração funcional, maior risco de mortalidade hospitalar, demência, institucionalização e internações recorrentes ^(3,9-10).

A fisiopatologia do delirium ainda não é bem esclarecida, e sua etiologia é considerada complexa e multifatorial. Sabe-se que fatores como infecção, privação de sono, dor, consumo de álcool, uso de psicofármacos, má nutrição, distúrbios metabólicos, entre outras comorbidades, podem ser desencadeantes desse distúrbio. O nível de delirium difere individualmente entre pessoas, dependendo dos fatores de risco predisponentes, como idade e fragilidade ^(3-4,9). Nesse sentido, faz-se necessária a identificação precoce desse distúrbio em pacientes idosos admitidos nos serviços de emergência, pois o delirium é considerado um forte indicador potencial de risco de morte ⁽³⁾.

Clinicamente, é importante estar ciente de que cada sintoma-chave dessa condição crônica está fortemente relacionado à morte, e os sujeitos que apresentam apenas um sintoma ainda representam um risco aumentado, destacando-se assim a necessidade de reconhecer cada sintoma separadamente. Uma melhor conscientização do risco de mortalidade associada ao delirium reforçaria os argumentos para a intervenção precoce, gerando, assim, um melhor tratamento e maior qualidade da assistência ao paciente ⁽³⁾.

Existem inúmeras escalas ou instrumentos com o objetivo de ajudar o profissional a identificar pacientes com delirium. Porém é recomendado que esses instrumentos considerem como padrão de referência as diretrizes estabelecidas no Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-5), da American Psychiatric Association (APA), e na International Statistical Classification of Diseases and Related Health Problems (ICD-10), da Organização Mundial de Saúde ⁽¹⁰⁾.

Um dos principais instrumentos derivados do DSM-5 e amplamente utilizado nos serviços de emergência no Brasil é o Confusion Assessment Method (CAM). O CAM foi validado para a língua portuguesa, demonstrando ser um instrumento adequado e confiável para verificar a presença do delirium, pois apresentou altos níveis de sensibilidade (94,1%) e especificidade (96,4%), valores preditivos positivos altos (84,2%) e negativos (98,8%), sugerindo que pouquíssimos casos da doença não são identificados quando a escala é usada sistematicamente ^(11-13).

Em uma revisão sistemática com o propósito de avaliar a precisão de instrumentos de avaliação do quadro de delirium, foram comparados 11 instrumentos diferentes, sendo que a escala CAM foi o instrumento-padrão mais utilizado para fins clínicos e de pesquisa ao longo das últimas duas décadas. Esse instrumento ainda se destaca devido ao seu alto grau de especificidade e sensibilidade, e em razão de sua acurácia, concisão e facilidade de aplicação ^(14-15).

O serviço de emergência é caracterizado como um ambiente onde existe superlotação, barulho intenso, perturbações e situações de estresse, e esses fatores podem provocar ou mesmo intensificar o desenvolvimento de alterações cognitivas nos pacientes, justificando a detecção precoce de delirium nesse serviço ⁽¹⁶⁾.

OBJETIVO

Identificar a ocorrência de delirium em idosos atendidos no serviço de emergência de um hospital público de ensino do município de São Paulo, e verificar a relação da doença com as variáveis sociodemográficas e clínicas identificadas nesses sujeitos.

MÉTODO

Aspectos éticos

A pesquisa foi realizada observando-se a Resolução nº 466/2012 do Ministério da Saúde – diretrizes e normas que regulamentam as pesquisas em seres humanos – sendo o projeto encaminhado e submetido à análise e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, sob parecer nº 965.524, CAAE 40675614.8.0000.5505.

Desenho, local de estudo e período

Estudo transversal e analítico, realizado no serviço de emergência de um hospital público federal universitário da cidade de São Paulo, no ano de 2016. Participaram da pesquisa 200 idosos internados que atenderam aos critérios de inclusão da pesquisa.

Critérios de inclusão e exclusão

Foram estabelecidos como critérios de inclusão do estudo: ter idade igual ou acima de 60 anos, com tempo máximo de internação de 24 horas, e aceitar participar do estudo, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foram excluídos os pacientes que apresentavam barreiras de comunicação ou linguagem e com diagnóstico prévio de demência.

Protocolo do estudo

A obtenção dos dados sociodemográficos e clínicos foi realizada por meio de questionário elaborado pelas pesquisadoras contendo informações sobre idade, gênero, escolaridade, situação conjugal, cor da pele referida, renda familiar, presença de cuidador, condições clínicas, comorbidades e hábitos de vida (atividade física, etilismo, medicamentos que utiliza em domicílio e no serviço de emergência).

Para a identificação do delirium foi utilizado o CAM, instrumento composto por nove variáveis: 1 – início agudo e curso flutuante; 2 – desatenção; 3 – pensamento desorganizado; 4 – alteração no nível de consciência; 5 – desorientação; 6 – prejuízo da memória; 7 – distúrbio da percepção; 8 – agitação psicomotora; 9 – alteração do ciclo sono-vigília.

As quatro primeiras variáveis possuem maior especificidade e sensibilidade para detectar o quadro. Dessa forma, a configuração do estado de delirium é dada pela presença obrigatória das duas primeiras características associadas a uma das duas últimas¹⁰⁾.

Análise dos resultados e estatística

A análise descritiva das variáveis categóricas foi realizada pelo cálculo da frequência e do percentual. Para as variáveis contínuas, calculou-se média, desvio-padrão, mediana, mínimo e máximo. A associação das variáveis sociodemográficas foi realizada pelo teste qui-quadrado e pelo teste da razão de verossimilhança. Para associar variáveis clínicas, desfechos e classe de medicamentos, utilizou-se o teste qui-quadrado e, quando necessário, o teste exato de Fisher. Foi utilizado um nível de significância de 5% (valor de p < 0,05).

RESULTADOS

Entre os participantes do estudo prevaleceram os do gênero masculino (n = 104, 52%), com média de idade de 71,8 ± 8,1 anos, casados (n = 97, 48,5%), aposentados (n = 158, 79%), com ensino fundamental incompleto (n = 105, 52,5%), renda individual entre um e dois salários mínimos (n = 121, 60,5%) e sem cuidador (n = 133, 66,5%) (Tabela 1).

Tabela 1
Características sociodemográficas dos idosos internados no serviço de emergência de um hospital público de ensino, São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

Características	n	%
Sexo
Masculino	104	52,0
Feminino	96	48,0
Idade
Média (desvio-padrão)	71,86 (8,11)
Mediana	71
Mínimo-máximo	60-93
Estado civil
Casado	97	48,5
Solteiro	12	6,0
Viúvo	61	30,5
Divorciado/separado	30	15,0
Ocupação
Empregado	27	13,5
Desempregado	7	3,5
Dono de casa	8	4,0
Aposentado	158	79,0
Escolaridade
Analfabeto	11	5,5
Fundamental incompleto	105	52,5
Fundamental completo	50	25,0
Ensino médio completo	22	11,0
Superior completo	12	6,0
Renda familiar em salário mínimo (SM)
Menor que 1 SM	3	1,5
De 1 a 2 SM	71	35,5
De 3 a 4 SM	91	45,5
Mais que 5 SM	35	17,5
Renda individual em salário mínimo (SM)
Sem renda	14	7,0
Menor que 1 SM	6	3,0
De 1 a 2 SM	121	60,5
De 3 a 4 SM	48	24,0
Mais que 5 SM	11	5,5
Possui cuidador?
Não	133	66,5
Sim	67	33,5
Total	200	100

• Nota: SM = Salário mínimo.

Dos 200 participantes do estudo, 56 (28%) pacientes apresentaram delirium, segundo a aplicação do CAM nas primeiras 24 horas de internação. Ao relacionar a presença de delirium com as variáveis sociodemográficas, observou-se que a única característica que apresentou significância estatística foi a presença de um cuidador junto ao paciente, de modo que aqueles que não possuíam cuidador apresentaram maior percentual de ausência de delirium (p = 0,0002) (Tabela 2).

Tabela 2
Associação entre os dados obtidos pelo Confusion Assessment Method e as variáveis sociodemográficas, São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

Características	Delirium (CAM)*		Total	Valor de p
	Presente n (%)	Ausente n (%)	n (%)
Sexo
Masculino	27 (26)	77 (74)	104 (52)	0,5040
Feminino	29 (30,2)	67 (69,8)	96 (48)
Estado civil
Casado	23 (23,7)	74 (76,3)	97 (48,5)	0,5019
Solteiro	5 (41,7)	7 (58,3)	12 (6)
Viúvo	19 (31,1)	42 (68,9)	61 (30,5)
Divorciado/separado	9 (30)	21 (70)	30 (15)
Ocupação
Empregado	6 (22,2)	21 (77,8)	27 (13,5)	0,8813
Desempregado	2 (28,6)	5 (71,4)	7 (3,5)
Dono de casa	2 (25)	6 (75)	8 (4)
Aposentado	46 (29,1)	112 (70,9)	158 (79)
Escolaridade
Analfabeto	2 (18,2)	9 (81,8)	11 (5,5)	0,1004
Fundamental incompleto	33 (31,4)	72 (68,6)	105 (52,5)
Fundamental completo	15 (39,5)	23 (40,5)	50 (25)
Ensino médio completo	2 (10,5)	17 (89,5)	22 (11,0)
Superior completo	2 (16,7)	10 (83,3)	12 (6)
Renda familiar em salário mínimo (SM)
Sem renda/menor que 1SM	0 (0)	3 (100)	3 (100)	0,1120
De 1 a 2 SM	25 (35,2)	46 (64,8)	71 (100)
De 3 a 4 SM	25 (27,5)	66 (72,5)	91 (100)
Mais que 5 SM	6 (17,1)	29 (82,9)	35 (100)
Renda individual em salário mínimo (SM)
Sem renda	5 (35,7)	9 (64,3)	14 (7)	0,4277
Menor que 1 SM	1 (16,7)	5 (83,3)	6 (3)
De 1 a 2 SM	37 (30,6)	84 (69,4)	121 (60,5)
De 3 a 4 SM	12 (25)	36 (75)	48 (24)
Mais que 5 SM	1 (9,1)	10 (90.9)	11 (5,5)
Possui cuidador?
Sim	30 (44,8)	37 (55,2)	67 (33,5)	0,0002
Não	26 (19,5)	107 (80,5)	133 (66,5)
Total	56 (28,0)	144 (72,0)	200 (100)

• Nota:
• ^*
  CAM: Confusion Assessment Method; SM = Salário mínimo.

As comorbidades autorreferidas mais prevalentes foram hipertensão arterial sistêmica (n = 133, 66,5%), diabetes mellitus (n = 73, 36,5%) e dislipidemia (n = 70, 35%). Ao associar as comorbidades com delirium através do CAM, observou-se significância estatística com as variáveis hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia e doenças cerebrovasculares (Tabela 3).

Tabela 3
Associação entre os dados obtidos pelo Confusion Assessment Method e as comorbidades autorreferidas, São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

Comorbidades	Delirium (CAM)*		Total	Valor de p
	Presente n (%)	Ausente n (%)	n (%)
‡HAS
Não	28 (41,8)	39 (58,2)	67 (100)	0,0020
Sim	28 (21,1)	105 (78,9)	133 (100)
Total	56 (28)	144 (72)	200 (100)
Diabetes mellitus
Não	37 (29,1)	90 (70,9)	127 (100)	0,6376
Sim	19 (26)	54 (74)	73 (100)
Total	56 (28)	144 (72)	200 (100)
Dislipidemia
Não	45 (34,6)	85 (65,4)	130 (100)	0,0045
Sim	11 (15,7)	59 (84,3)	70 (100)
Total	56 (28)	144 (72)	200 (100)
Doenças cerebrovasculares
Não	47 (25,8)	135 (74,2)	182 (100)	0,0293
Sim	9 (50)	9 (50)	18 (100)
Total	56 (28)	144 (72)	200 (100)

• Nota:
• ^*
  CAM: Confusion Assessment Method;
• ^‡
  HAS: hipertensão arterial sistêmica.

Ao associarmos os dados do CAM aos hábitos de vida, como atividade física e etilismo, constatou-se que todos os idosos que apresentaram delirium, (n = 56, 28%) não praticavam atividade física, com significância estatística (p = 0,0055). Já em relação ao etilismo, não foi identificada correlação entre o consumo de álcool e a presença de delirium (Tabela 4).

Tabela 4
Associação entre os dados obtidos pelo Confusion Assessment Method e os hábitos de vida atividade física e etilismo, São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

	Delirium (CAM)*		Total	Valor de p
	Presente n (%)	Ausente n (%)
Faz atividade física
Sim	0 (0)	18 (100)	18 (100)	0,0055
Não	56 (30,8)	126 (69,2)	182 (100)
Total de pacientes	56 (28)	144 (72)	200 (100)
Frequência
1 vez/semana	0 (0)	1 (100)	1 (100)	-
2 vezes/semana	0 (0)	4 (100)	4 (100)
3 vezes/semana	0 (0)	4 (100)	4 (100)
4 vezes/semana	0 (0)	4 (100)	4 (100)
5 vezes/semana	0 (0)	3 (100)	3 (100)
mais que 5 vezes	0 (0)	2 (100)	2 (100)
Total de pacientes	0 (0)	18 (100)	18 (100)
Fez uso de álcool no último mês
Sim	4 (25)	12 (75)	16 (100)	1,0000*
Não	52 (28,3)	132 (71,7)	184 (100)
Total de pacientes	56 (28)	144 (72)	200 (100)

• Nota:
• ^*
  CAM: Confusion Assessment Method.

Com relação ao uso de medicamentos, foi observado que, dentre todas as medicações utilizadas, aqueles pacientes que não faziam uso de anti-hipertensivos e antiulcerosos em suas residências, assim como aqueles que, durante a internação, recebiam analgésicos, apresentaram maior percentual de presença de delirium, com significância estatística (Tabela 5).

Tabela 5
Associação entre os dados obtidos pelo Confusion Assessment Method e as medicações em uso, São Paulo, São Paulo, Brasil, 2018

Medicamentos	Delirium (CAM)*		Total	Valor de p
	Presente n (%)	Ausente n (%)	n (%)
Utilizados na residência
Anti-hipertensivos
Não	29 (41,4)	41 (58,6)	70 (100)	0,0019
Sim	27 (20,8)	103 (79,2)	130 (100)
Total	56 (28)	144 (72)	200 (100)
Antiulcerosos
Não	42 (34,4)	80 (65,6)	122 (100)	0,0114
Sim	14 (17,9)	64 (82,1)	78 (100)
Total	56 (28)	144 (72)	200 (100)
Utilizados no hospital
Analgésicos
Não	10 (17,9)	46 (82,1)	56 (100)	0,0463
Sim	46 (31,9)	98 (68,1)	144 (100)
Total	56 (28)	144 (72)	200 (100)

• Nota:
• ^*
  CAM: Confusion Assessment Method.

DISCUSSÃO

O delirium é uma alteração cognitiva que, apesar de citada há mais de 2.500 anos, mantém-se mal compreendida. Sabe-se que de 30% a 40% dos casos podem ser evitados e, apesar de apresentar baixa prevalência na comunidade, sua presença geralmente leva à procura de um serviço de saúde e a onerosos gastos ⁽¹³⁾.

O perfil econômico e sociodemográfico dos participantes, principalmente no que diz respeito ao sexo e à idade, coincide com os resultados encontrados na literatura ^{(3,5-8,10,13)} e, particularmente, em outra recente pesquisa realizada com idosos atendidos em uma unidade de emergência de um hospital universitário do estado de Goiás ⁽¹⁷⁾.

O predomínio de pacientes do sexo masculino pode estar associado a maior morbimortalidade dessa população e ao fato dos homens serem considerados menos cuidadosos em relação à saúde ^(17-18).

O baixo nível de escolaridade apresentado pelos idosos nesta pesquisa sugere uma maior tendência a apresentarem problemas de saúde. Pesquisa realizada no Rio Grande do Sul observou que quanto menor o tempo de escolaridade, maior a correlação com incapacidade funcional, tanto para atividades básicas da vida diária, como para atividades instrumentais. Essas correlações podem também estar relacionadas às condições socioeconômicas desses idosos, uma vez que, em nosso país, a cor da pele e a escolaridade estão diretamente relacionadas ao nível socioeconômico da população e, como consequência relaciona-se também às condições de saúde, e estilo de vida ⁽¹⁹⁾.

A identificação da hipertensão arterial sistêmica (HAS) como a comorbidade mais prevalente entre os idosos desta pesquisa também é evidenciada em pesquisas que indicam ser a doença, juntamente com o diabetes mellitus e as demais doenças cardiocirculatórias, uma das condições crônico-degenerativas mais frequentes entre os idosos no nosso país. A HAS está entre as principais doenças que atingem os idosos, sendo uma das maiores responsáveis pela redução da qualidade e expectativa de vida nessa população ^(20-21).

Entre os participantes desta pesquisa, 56 (28%) pacientes apresentaram delirium nas primeiras 24 horas de internação no serviço de emergência. Pesquisadores da Harvard Medicine School, EUA, verificaram que de 8% a 17% dos idosos que dão entrada em serviços de emergência apresentam delirium e que, quanto maior o tempo de internação, maior a incidência da doença, podendo atingir até 50% dos idosos internados ⁽¹³⁾.

O delirium foi mais prevalente em idosos que relataram não praticar atividade física, coincidindo com pesquisas que relataram a associação da realização de atividade física com menores taxas de declínio cognitivo e demência. Segundo esses estudos, vários mecanismos neurais, que são estimulados pela atividade física, como angiogênese, neurogênese, liberação de fatores neurotróficos (IGF-I), fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) e neuroplasticidade, atuam como fatores de neuroproteção ^(22-23).

Verificou-se que os idosos que não possuíam necessidade de cuidador, ou seja, cuja capacidade funcional estava preservada, apresentaram menor percentual de delirium. Estudos realizados com idosos institucionalizados e/ou não, demonstrou que aqueles pacientes mais idosos, com maior déficit funcional, dependiam mais da presença de um cuidador e apresentavam maior declínio cognitivo ^(24-25).

Os dados encontrados nesta pesquisa convergem com obtidos em estudos que indicaram que as principais comorbidades associadas à presença de delirium são a hipertensão arterial sistêmica (HAS), dislipidemia e doenças cerebrovasculares ^(13,26).

Apesar do delirium ser muito comum em pacientes idosos, a sua fisiopatologia ainda é pouco conhecida ^{(10,13-14,27)}. A literatura evidencia que as doenças cardiovasculares, em especial a HAS, têm sido associadas ao déficit de memória, atenção e raciocínio abstrato ^(5,7,9,23). Já, em relação às dislipidemias, foi identificada uma pesquisa que evidenciou associação com o comprometimento cognitivo ⁽²⁸⁾.

Embora tenha sido evidenciada nesta pesquisa a associação do uso de analgésico com presença de delirium, não foram encontrados indícios que pudessem reafirmar esse dado, tornando-se necessárias outras investigações para que se possa evidenciar esta relação. Estudos que indicam o uso de sedativos e analgésicos como fatores de risco para o desenvolvimento de delirium foram realizados em ambiente de unidades de terapia intensiva, onde há grande associação de fármacos e a dinâmica de atendimento é intensa, porém diferente das condições ambientais em que foi realizada esta pesquisa ^{(23,26,29-30)}.

Limitações do estudo

As limitações deste estudo são inerentes ao desenho transversal e ao fato de ter retratado a realidade de um único serviço de emergência, não permitindo generalização dos resultados obtidos e nem o estabelecimento de uma relação de causa e efeito entre as variáveis investigadas.

Contribuições para a área da enfermagem, saúde ou política pública

Os resultados obtidos nesta pesquisa devem contribuir para o aumento das evidências científicas relacionadas ao delirium e, assim, esperamos que possam minimizar os riscos aos quais os idosos institucionalizados estão propensos quando admitidos nos serviços de emergência.

CONCLUSÃO

Como perfil dos idosos atendidos no serviço de emergência encontrado neste estudo, prevaleceu o gênero masculino, média de idade de 71,8 anos, casados, aposentados, que cursaram o ensino fundamental incompleto e possuíam renda individual entre um e dois salários mínimos. Foi identificada prevalência significativa de ocorrência de delirium entre esses idosos durante as primeiras 24 horas de atendimento no serviço de emergência.

A ocorrência de delirium foi associada ao sedentarismo, à necessidade de um cuidador, à presença de hipertensão arterial sistêmica, dislipidemia e doenças cerebrovasculares. Dentre os medicamentos, os analgésicos foram associados à presença de delirium.

Esses idosos necessitam receber um melhor atendimento em seus domicílios e, para tanto, devem ser elaborados planos de cuidados individualizados, em que estratégias sejam implantadas para reduzir os custos associados a essa doença e a deterioração da qualidade dessa população.

Os resultados desta pesquisa apontaram para a necessidade de que sejam realizadas outras investigações que visem à detecção precoce e à identificação dos fatores de risco para desenvolvimento do delirium nesses serviços, em razão da prevalência significativa encontrada.

REFERENCES

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  05 Dez 2019
• Data do Fascículo
  Nov 2019

Histórico

• Recebido
  12 Jun 2018
• Aceito
  26 Fev 2019