Construção e validação de cenário para reconhecimento de sepse por estudantes de Enfermagem: estudo metodológico

RESUMO

Objetivo:

Construir e validar um cenário de simulação clínica para o ensino de estudantes de Enfermagem sobre reconhecimento precoce de sinais e sintomas de sepse no contexto da unidade de emergência.

Métodos:

Estudo metodológico desenvolvido em duas fases: construção de cenário simulado e validação do conteúdo por juízes especialistas. Para análise dos dados, foi calculado Índice de Validade de Conteúdo (IVC) considerando concordância igual ou superior a 80%. O valor mínimo aceitável de IVC para validação do cenário foi de 1,0.

Resultados:

O cenário de simulação mostrou se apropriado, com Índice de Validade de Conteúdo global igual a 1. Alguns ajustes relacionados à clareza da redação foram necessários, conforme sugestão dos juízes. Conclusões: Foi construído e validado com êxito um cenário de média complexidade e alta fidelidade para o ensino sobre o reconhecimento precoce de sinais e sintomas de sepse.

Descritores:
Estudo de Validação; Sepse; Treinamento por Simulação; Educação em Enfermagem; Estudantes de Enfermagem.

ABSTRACT

Objective:

To build and validate a clinical simulation scenario for teaching Nursing students about early recognition of signs and symptoms of sepsis in the context of the emergency unit.

Methods:

Methodological study developed in two phases: construction of a simulated scenario and content validation by expert judges. For data analysis, the Content Validity Index (CVI) was calculated considering agreement equal to or greater than 80%. The minimum acceptable CVI value for scenario validation was 1.0.

Results:

The simulation scenario proved to be appropriate, with a global Content Validity Index equal to 1. Some adjustments related to the clarity of the wording were necessary, as suggested by the judges. Conclusions: A medium-complexity, high-fidelity scenario was successfully constructed and validated for teaching early recognition of sepsis signs and symptoms.

Descriptors:
Validation Study; Sepsis; Simulation Training; Nursing Education; Nursing Students

RESUMEN

Objetivo:

Construir y validar un escenario de simulador clínico para la enseñanza de estudiantes de Enfermería sobre reconocimiento precoz de signos y síntomas de sepsis en el contexto de la unidad de urgencia.

Métodos:

Estudio metodológico desarrollado en dos fases: construcción de escenario simulado y validez de contenido por jueces especialistas. Para análisis de los datos, fue calculado Índice de Validez de Contenido (IVC) considerando concordancia igual o superior a 80%. El valor mínimo aceptable de IVC para validez del escenario fue de 1,0.

Resultados:

El escenario de simulado se mostró apropiado, con Índice de Validez de Contenido global igual a 1. Algunos ayustes relacionados a la claridad de la redacción fueron necesarios, conforme sugestión de los jueces.

Conclusiones:

Fue construido y validado con éxito un escenario de mediana complejidad y alta fidelidad para la enseñanza sobre el reconocimiento precoz de signos y síntomas de sepsis.

Descriptores:
Estudio de Validación; Sepsis; Entrenamiento Simulado; Educación en Enfermería; Estudiantes de Enfermería

INTRODUÇÃO

A sepse é considerada um problema de saúde pública no Brasil e no mundo, constituindo um desafio a ser enfrentado pelas políticas públicas. Atualmente, é definida como uma disfunção orgânica com risco de vida, causada por uma resposta desregulada do hospedeiro à infecção(¹).

O estudo multicêntrico Spread, conduzido pelo ILAS (Instituto Latino-Americano de Sepse), mostrou que um terço dos leitos das unidades de terapia intensiva são ocupados por pacientes com sepse e choque séptico, em que a letalidade global foi de 55%(²).

Entre 47 e 50 milhões de pessoas são atingidas anualmente por essa síndrome. Os custos estimados associados ao tratamento estão entre US$ 26 mil e US$ 32 mil nos Estados Unidos e US$ 9,6 mil por paciente no Brasil(³).

Diversos motivos podem estar associados à alta taxa de mortalidade por sepse no Brasil, destacando o possível despreparo dos profissionais de saúde para identificar de maneira rápida e correta casos de sepse ou choque séptico e a consequente demora para o início do tratamento(³-⁴).

Nessa perspectiva, estudos nacionais(⁵-⁶) e internacionais(⁷-⁸) têm evidenciado um déficit no conhecimento sobre o reconhecimento, desenvolvimento e manejo da sepse por parte dos estudantes de Enfermagem e enfermeiros.

No entanto, a adoção de estratégias educacionais ativas e imersivas de ensino para a aprendizagem sobre sepse pode favorecer a melhora do conhecimento sobre essa temática, propiciar a identificação precoce dos seus sinais e sintomas, bem como a diferenciação das fases evolutivas pela enfermagem, melhorando o prognóstico dos pacientes(⁹).

Nessa vertente, o ensino baseado em simulação clínica, mediante a prática repetitiva (repetição até a excelência) e a vivência de situações clínicas em ambiente controlado, mostra-se crucial para a capacitação e formação de profissionais mais seguros e capazes para, por exemplo, identificar os sinais e sintomas de sepse. A simulação como estratégia educacional estimula a reflexão, pensamento crítico e a capacidade de tomar decisões clínicas, assim como o desenvolvimento de habilidades psicomotoras em estudantes de Enfermagem(¹⁰).

A construção de cenários bem planejados e sistematizados representa uma alternativa que favorece a aproximação do estudante de Enfermagem à realidade da prática clínica. Ademais, o processo de validação por meio da consolidação da confiabilidade por juízes especialistas pode fortalecer as estratégias educativas e melhorar a relação entre teoria e prática, visando contribuir com a formação de enfermeiros mais reflexivos e críticos, com competências para o reconhecimento precoce de sepse.

OBJETIVO

Construir e validar um cenário de simulação clínica de média complexidade e alta fidelidade para o ensino de estudantes de Enfermagem sobre reconhecimento precoce de sinais e sintomas de sepse no contexto da unidade de emergência.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O estudo foi desenvolvido atendendo às normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa com seres humanos, de acordo com a Resolução 466/12, após autorização dos Comitês de Ética em Pesquisa da Faculdade Ciências da Saúde e da Faculdade de Ceilândia, ambos da Universidade de Brasília.

Desenho, período e local do estudo

Estudo metodológico, de delineamento transversal e abordagem quantitativa, seguindo as recomendações do Simulation - Based Research Extensions for the Strengthening the Reporting of Observational Studies Epidemiology (STROBE) e da International Nursing Association for Clinical Simulation and Learning (INACSL). O estudo foi desenvolvido de agosto a novembro de 2021 em uma universidade pública do Distrito Federal e seguiu as seguintes etapas: construção do cenário de simulação clínica; validação de conteúdo por juízes especialistas.

População, critérios de inclusão e exclusão

A seleção dos juízes especialistas ocorreu por amostragem não probabilística intencional. Os critérios de inclusão foram baseados na análise de currículo conforme referencial de Fehring(¹¹). Para seleção no currículo Lattes, adotou-se como critério de busca ser enfermeiro, nível de titulação (especialista, mestre ou doutor), prática clínica assistencial na área de cuidados de enfermagem em situações críticas e de risco, simulação clínica e docência em Enfermagem.

A pontuação mínima considerada como válida foi de 7 pontos(¹¹), de um total de 14 pontos distribuídos nos itens: título de doutorado em Enfermagem ou áreas afins = 4 pontos; título de mestre em Enfermagem ou áreas afins = 4 pontos; especialização em Enfermagem em unidade de terapia intensiva adulto geral e/ou cardiológica = 2 pontos; prática clínica assistencial ou docência na área de cuidados críticos = 2 pontos; experiência com simulação clínica = 1 ponto; conhecimento sobre sepse = 1 ponto.

Após consulta no currículo Lattes, 13 juízes foram convidados por correio eletrônico, com aceitação de dez por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Segundo Pasquali(¹²), é necessário um número mínimo de seis especialistas. Após aceitação, foi enviado o questionário de caracterização do juiz (nome, sexo, idade, formação profissional, tempo de formação e exercício da profissão; área de atuação, titulação, experiência com simulação clínica e com o tema sepse), roteiro do cenário clínico simulado e formulário de validação de conteúdo para os especialistas. O prazo para a devolução dos instrumentos pelos especialistas foi de 15 dias.

Protocolo do estudo

O primeiro passo para construção textual do cenário foi a escolha do tema sepse, definido como presença de pelo menos dois sinais de síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SRIS) e/ou uma disfunção orgânica(¹).

Na sequência, o conteúdo textual foi elaborado de acordo com os seguintes aspectos: conhecimento prévio do aprendiz; objetivos de aprendizagem; fundamentação teórica da atividade; preparo e desenvolvimento do cenário; debriefing; e avaliação(¹³).

O conhecimento prévio do aprendiz para a vivência do cenário simulado foi definido pela estrutura cognitiva pré-existente com base em conteúdos curriculares(¹³) e pelo acesso ao material didático no formato de apostila sobre a temática sepse.

Os objetivos de aprendizagem foram baseados na necessidade de reconhecimento precoce de sinais e sintomas de sepse por meio dos critérios de SRIS e de disfunção orgânica. A fundamentação teórica do cenário clínico simulado foi norteada pelos melhores níveis de evidências propostos pelas diretrizes da Campanha de Sobrevivência à Sepse - SSC (Surviving Sepsis Campaign 2021)(¹).

A etapa de preparo do cenário de paciente com suspeita de sepse buscou enfatizar os principais sinais e sintomas, como dor abdominal, febre, taquipneia e fala de palavras desconexas.

O ambiente reproduzido foi um box de emergência com cama do tipo hospitalar, equipamentos/materiais médicos (carrinho para atendimento de parada cardiopulmonar, desfibrilador, monitor multiparamétrico, régua de gases, oxímetro de pulso, aparelho de pressão arterial não invasiva, estetoscópio, termômetro, dentre outros) para oferecer realismo à cena. O paciente foi mimetizado por um manequim de alta fidelidade (Sim Man^® tradicional) com capacidade de respostas fisiológicas. O tempo estimado para o debriefing foi de 30 minutos. Optou se pelo modelo estruturado (estágio emocional, descritivo, avaliativo, analítico, conclusivo)(¹⁴), por permitir reflexão sobre a vivência simulada.

A técnica Delphi tradicional foi utilizada na validação do conteúdo dos instrumentos de pesquisa pelos juízes especialistas(¹⁵). Foram necessárias duas rodadas, sendo a segunda para avaliação da versão reformulada após as contribuições realizadas pelos especialistas na primeira rodada.

Os juízes avaliaram cada item do instrumento (cenário simulado) conforme os critérios: a) clareza: questão que contém as informações importantes para o alcance dos objetivos do estudo, enunciada de maneira compreensível; b) abrangência: questão que incorpora ou inclui informações relevantes para o alcance do objetivo da pesquisa; c) organização: disposição das questões e alternativas, como também seu conteúdo; d) pertinência: questão relevante para alcançar o objetivo da pesquisa. Esses critérios foram analisados considerando uma escala do tipo Likert, com quatro níveis de resposta: Irrelevante = 1; Pouco relevante = 2; Bastante relevante = 3; Extremamente relevante = 4. Havia também um campo aberto para observações, caso o juiz o julgasse necessário.

Análise dos resultados e estatística

Os resultados foram analisados pelo software R Core Team 2021 (Versão 4.1.0). Para análise em relação ao grau de concordância dos itens, calculou-se o Índice de Validade do Conteúdo e aplicou-se o teste Binomial Exato para cada item em cada critério (organização, clareza, abrangência e pertinência), verificando a proporção de concordância entre os juízes, adotada como igual ou superior a 80% (P ≥ 80%)(¹⁶) e significância (α) de 5%. Assim, valores de p maiores que 0,05 indicam que houve concordância entre os juízes acerca dos itens em cada critério. Além disso, foram calculados a Média do Índice de Validade de Conteúdo da Escala (S-IVC-AVE) e o Percentual de Item com Concordância por Unanimidade (S-IVC-UA). O valor mínimo aceitável de IVC para validação do cenário foi de 1,0, seguindo a recomendação da literatura para um corpo de seis juízes ou menos(¹⁶).

RESULTADOS

O processo de validação de conteúdo do cenário foi realizado no total por dez juízes especialistas enfermeiros com idade média de 36,2±8,3 anos. Destes, 80% eram mulheres, com em média 13,1±8,0 anos de formados e 12,5±8,4 anos de exercício profissional. Do total, 50% trabalhavam em unidade de terapia intensiva geral e 40% declararam-se docentes do ensino superior de Enfermagem. Todos (100%) informaram experiência clínica com o tema sepse. Em relação à simulação clínica, 90% dos participantes informaram experiência com o ensino simulado. A titulação acadêmica predominante foi de doutores (50%), enquanto 40% dos juízes declararam-se especialistas (10% em cardiologia e 30% em unidade de terapia intensiva geral), e 10% eram mestres.

Foram realizadas duas rodadas para avaliação dos juízes especialistas visando à obtenção de concordância de pelo menos 80%. Na primeira rodada, havia 14 itens no instrumento relacionado ao cenário clínico simulado. Em todos os critérios e em todos os itens, o IVC variou de 90% a 100%, com p > 0,05 indicando concordância superior ou igual a 80% para permanência do item. Quanto à validade da escala, o S-IVC médio variou de 97% a 98% entre os critérios, e o percentual de unanimidades variou entre 71% e 79% entre os critérios.

Na segunda rodada, permaneceram os 14 itens do instrumento relacionado ao cenário clínico simulado. Acerca dos critérios Organização, Clareza e Abrangência, o IVC foi de 100% com p > 0,05 em todos os itens, indicando concordância superior ou igual a 80% para permanência do item. No critério de Pertinência, o IVC variou de 89% a 100%, com p > 0,05 em todos os itens, indicando concordância superior ou igual a 80% para permanência do item. No tocante à validade da escala, tanto o S-IVC médio variou de 99% a 100% quanto o percentual de unanimidades variou de 93% a 100% entre os critérios (Tabela 1). Após avaliação dos juízes, todos os itens do cenário clínico simulado foram considerados validados.

Tabela 1
Avaliação dos juízes sobre a organização, clareza, aparência e pertinência do cenário de simulação, o IVC e o valor de p de cada item, Brasília, Distrito Federal, Brasil, 2021

Itens avaliados	Técnica Delphi Primeira Avaliação (primeira rodada)								Técnica Delphi Segunda Avaliação (segunda rodada)
	Organização		Clareza		Abrangência		Pertinência		Organização		Clareza		Abrangência		Pertinência
	IVC*	p	IVC*	p	IVC*	p	IVC*	p	IVC*	p	IVC*	p	IVC*	p	IVC*	p
1. Título do cenário	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
2. Público	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
3. Experiência prévia do aprendiz	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
4. Objetivos de aprendizagem	90	0,893	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	89	0,866
5. Tempo de simulação	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
6. Recursos humanos	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
7. Recursos materiais/equipamentos	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
8. Documentação	90	0,893	90	0,893	90	0,893	90	0,893	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
9. Preparo do cenário	90	0,893	90	0,893	90	0,893	90	0,893	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
10. Briefing	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
11. Desenvolvimento do cenário: descrição do caso clínico	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
12. Desenvolvimento do cenário: informações no prontuário médico	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
13. Programação da cena	90	0,893	90	0,893	90	0,893	90	0,893	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
14. Debriefing	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000	100	1,000
S-IVC-AVE**	97		98		98		98		100		100		100		99
S-IVC-UA***	71		79		79		79		100		100		100		93

• ^*
  IVC - Índice de Validade de Conteúdo, Teste Binomial Exato.
• ^**
  S-IVC-AVE - Média do Índice de Validade de Conteúdo da Escala.
• ^***
  S-IVC-UA - Percentual de Item com Concordância por Unanimidade.

Sobre a análise qualitativa dos juízes em relação ao cenário da sessão de simulação, dois (20%) sugeriram reorganização do texto no que se refere aos objetivos de aprendizagem, para oferecer maior clareza. Apenas um (10%) sugeriu, nos objetivos secundários, retirar o item relacionado aos princípios de biossegurança, aferição e avaliação dos sinais vitais, por estes serem considerados habilidade prévia do estudante.

Quantos aos materiais/equipamentos utilizados no cenário, foi sugerida a inclusão de alguns itens, como: a régua de gases (1; 10%); frasco de hemocultura para fungos e kit para cateterização vesical de demora (2; 20%); prancheta, biombo, lixo infectante, hamper e carrinho de emergência com lacre (1; 10%); soluções de ringer lactato e soro glicosado 5% (1; 10%); seringa heparinizada para gasometria arterial (1; 10%).

No item referente à documentação utilizada na cena simulada, houve a sugestão do acréscimo da folha de registro de enfermagem apenas por um (10%) dos juízes. Na descrição detalhada do cenário, um dentre os dez juízes sugeriu inclusão de falas dos participantes da atividade simulada. Nesse sentido, foi elaborado um roteiro (script) com diálogo dos atores/colaboradores participantes do cenário simulado. A seguir, o Quadro 1 representa um resumo da versão final do cenário simulado validado sobre sepse com as contribuições dos juízes especialistas.

Quadro 1
Descrição sucinta da versão final do cenário validado “Atuação do enfermeiro no reconhecimento precoce dos sinais e sintomas de sepse”, Brasília, Distrito Federal, Brasil, 2022

Título do cenário	Atuação do enfermeiro no reconhecimento precoce dos sinais e sintomas de sepse
Público	Estudantes de Enfermagem
Conhecimento prévio do aprendiz	Habilidades no cuidado ao paciente com suspeita de sepse
Objetivos de aprendizagem	Primário: reconhecer o risco de sepse e tomar decisões. Secundário: coletar dados a fim de identificar o paciente com suspeita de sepse; comunicar-se efetivamente com o paciente e seus familiares em busca de sinais e sintomas sugestivos de sepse; ao suspeitar de sepse, abrir protocolo e acionar equipe médica; realizar e priorizar atendimento de enfermagem.
Tempo de simulação	Briefing: 5 minutos; Cenário: 15 minutos; Debriefing: 30 minutos
Recursos humanos:	Três monitores para assumir os seguintes papéis: paciente simulado (sala de comando do simulador de alta fidelidade); médico que aparecerá ao ser solicitado pelo enfermeiro; filho do paciente; dois docentes facilitadores com experiência ou capacitação em simulação.
Recursos materiais/ equipamentos	Cama hospitalar com grades laterais, roupa de cama, travesseiro, régua de gases, mesa auxiliar, escada de dois degraus, camisola hospitalar, papagaio, suporte para soro, lixo infectante, carrinho de emergência lacrado, luvas de procedimento e estéreis, antissépticos, equipamentos de proteção individual, gazes, bandeja de inox, soluções fisiológica, glicosada e ringer lactato, agulhas (40×12; 30×7; 13×45 mm), seringa heparinizada, seringas (3, 5, 10, 20 mL), equipo de soro e conector de duas vias, rótulo para identificação do soro, fita microporosa hipoalergênica, torniquete, cateter flexível para punção venosa (no 20, 22), filme transparente, sachê de álcool a 70%, antibiótico e analgésicos, frascos para hemocultura, tubos para coleta de sangue, kit para sondagem vesical de demora, eletrodos, monitor multiparamétrico, estetoscópio, esfigmomanômetro, oxímetro de pulso, cateter nasal de oxigênio tipo óculos, umidificador de oxigênio, água destilada, manequim simulador de paciente de alta fidelidade.
Documentação	Prescrição médica, registro de enfermagem, folha com resultados laboratoriais: glicemia: 90 mg/dL (VR: 65 a 99 mg/dL); leucócitos: 25.100/cél.mm3 (VR: 5.000-10.000 mm3); lactato: 2,5 mmol/L (VR: 0,3-2,4 mmol/L); exame de imagem com laudo (tomografia de abdômen): ascite de moderado volume e densificação dos planos adiposos peritoneais (processo inflamatório); esplenomegalia.
Preparo do cenário
Tema: Sepse com foco abdominal. Fidelidade do cenário: alta fidelidade. Caracterização dos atores/colaboradores: simulador de paciente de alta fidelidade Laerdal SimMan® Traditional, caracterizado com vestimenta adequada ao ambiente hospitalar (camisola com abertura para as costas); filho do paciente (monitor com calça jeans e camisa de manga curta); médico (monitor com calça jeans, camisa de manga curta e jaleco branco). Espaço físico: a cena ocorre em ambiente caracterizado como leito do box da unidade de emergência. Complexidade do cenário: média complexidade. Ações esperadas: confirmação do caso clínico para sepse, abertura do protocolo e início do pacote da primeira hora. Habilidades prévias: princípios de biossegurança, aferição e análise dos sinais vitais, exame físico, comunicação e interação com o paciente, análise dos dados fornecidos pelo paciente, família, exames, prontuário.
Desenvolvimento do cenário:
Descrição do caso clínico	JRS, masculino, 65 anos, casado com história de diabetes mellitus tipo 2 controlada com alimentação e atividade física regular. Deu entrada no pronto‑socorro acompanhado pelo filho e história prévia de internação por colecistectomia laparoscópica com alta hospitalar há dois dias. Há um dia, oligúria e dor abdominal com uso de analgésico (paracetamol) em domicílio. Segundo o filho, hoje o paciente acordou com febre de 38 oC e piora da dor abdominal, taquipneia e fala de coisas estranhas.
Informações do prontuário médico	História Clínica: Diabetes melittus tipo 2, colecistectomia laparoscópica. Nega alergias. Medicamentos em uso: Paracetamol de 6/6h nas últimas 24 horas. Dados antropométricos Altura: 1,70 m; Peso: 85 kg
Dispositivos acoplados ao simulador	Camisola hospitalar, pulseira de identificação, pulseira de classificação de risco de cor laranja
Debriefing	Estruturado
Avaliação	Desempenho prático dos estudantes

DISCUSSÃO

A validação de materiais educacionais tem ganhado relevância e atraído maior interesse para a construção do processo de ensino-aprendizagem e formação qualificada para o mercado de trabalho, com potencial redução da evasão acadêmica(¹⁷-¹⁸).

Abordagens baseadas em simulação estimulam o envolvimento ativo dos estudantes na construção do conhecimento e no desenvolvimento de suas competências em vários contextos(¹⁹). Nessa perspectiva, foi construído e validado um cenário sobre admissão de paciente com sinais e sintomas de sepse no contexto de uma unidade de emergência, embasado por roteiro norteador(¹³) e fundamentado nas diretrizes do International Nursing Association for Clinical Simulation and Learning(²⁰).

A validação de conteúdo foi realizada por um conjunto de especialistas com capacitação/formação nas áreas de simulação clínica e sepse, com uso da técnica Delphi(¹⁵), que viabilizou o consenso de especialistas, além da análise de concordância dos itens que reproduzem com confiança o reconhecimento dos sinais e sintomas de sepse pelo enfermeiro.

A técnica Delphi tem como vantagens a possibilidade de acesso a pessoas geograficamente distantes, o baixo custo para operacionalização, a possibilidade de interação entre pesquisador e participantes, o compartilhamento de opiniões e ideias e a produção de um instrumento com alta qualidade e especificidade. Por outro lado, está suscetível a algumas desvantagens como a demora na devolução dos questionários, dificuldades na composição dos especialistas e necessidade de diversas rodadas para o estabelecimento do consenso final(¹⁵).

Os resultados da validação foram positivos, e as sugestões dos especialistas agregaram maior qualidade ao cenário, o que fortaleceu o realismo e ampliou as informações específicas relacionadas à temática. Evidências sobre triagem e cuidados de sepse em países em desenvolvimento são insuficientes para informar sobre as práticas de implementação em ambientes de saúde(²¹). Então, ampliar conhecimentos e qualificação profissional por meio de metodologias ativas e imersivas, como a simulação, representa uma alternativa para a sistematização de práticas clínicas, principalmente em unidades de emergência e terapia intensiva.

O quantitativo de juízes incluídos no estudo favoreceu o alcance do Índice de Validade de Conteúdo (IVC) no valor de 1, conforme recomendação da literatura(¹⁶), o que representa nível de concordância entre especialistas juízes superior a 80% dos itens avaliados no questionário referente ao cenário simulado.

A clareza dos objetivos de aprendizagem do cenário evidenciou melhora, dada a progressão obtida na média do IVC da primeira rodada (98%) para a segunda rodada (100%), o que revela concordância consensual entre especialistas e disponibilidade para utilização. Seguramente, os objetivos devem ser específicos, mensuráveis, alcançáveis, realísticos e realizáveis no tempo adequado(²²), como mostrado nos resultados. Nesse contexto, torna-se possível melhorar as chances de disseminar informações e incentivar a reflexão(²³) a respeito da sistematização do cuidado sobre sepse com uso de estratégias ativas, integradas e imersivas, como a simulação.

Além disso, na validação de cenários, os objetivos na primeira etapa devem nortear as ações desenvolvidas nas etapas subsequentes, o que reforça a importância do alcance do maior nível de concordância possível. O método de validação visa avaliar se o cenário simulado cumpre o seu objetivo e se é reproduzível enquanto ferramenta inovadora de ensino(²⁴).

Na sessão de simulação, o briefing representa a primeira etapa pré-simulação e tem como objetivo fornecer informações que orientam e direcionam os participantes. É reconhecido que a apresentação do cenário e de suas possibilidades pode facilitar a compreensão dos objetivos de aprendizagem na execução e segurança(²⁰,²²).

Os recursos humanos devem ser previstos para que o cenário seja desenvolvido conforme os objetivos de aprendizagem. Seguramente, facilitadores de simulação e a simulação podem contribuir para a otimização de estruturas e processos de trabalho(²⁵). Em alguns laboratórios e/ou centros de simulações, principalmente no contexto brasileiro, ainda é comum deparar-se com docentes que não possuem capacitação em simulação clínica; porém a participação e apoio técnico especializado são indispensáveis para controlar e programar os simuladores e/ou apoiar o educador em questões metodológicas de estruturação, montagem e execução de cenários simulados(²⁶).

Sobre os recursos materiais/equipamentos, adequações foram necessárias para atender às sugestões dos juízes especialistas, como a inclusão de materiais e dispositivos. Sabe-se da importância de tecnologias educativas e inovadoras para aprimoramento da força de trabalho, logo a disponibilidade de equipamentos pode otimizar sistemas de trabalho(²⁵). Além disso, foi introduzido um roteiro com diálogo dos atores/colaboradores para nortear e garantir a qualidade do diálogo entre os participantes e o simulador de paciente durante o desenvolvimento da cena simulada.

A complexidade do cenário, ainda que moderada, foi executada com realismo, atendendo à configuração de alta fidelidade para motivar melhor desenvolvimento do raciocínio clínico e tomadas de decisão perante cada sinal e sintoma apresentado pelo paciente. Para maior aproveitamento da estratégia, é preciso considerar o nível de conhecimento prévio dos participantes, que deve ser compatível com a complexidade do cenário. A simulação clínica é vista como uma técnica de apoio didático-pedagógica que proporciona integração curricular e associa conhecimentos prévios à experiência prática(²⁷).

Ainda em relação ao desenvolvimento do cenário, importa que o facilitador planeje as competências e habilidades que devem ser aperfeiçoadas ou desenvolvidas pelo participante da atividade simulada, considerando o conhecimento e experiência pregressas.

O emprego do debriefing estruturado e com “bom julgamento” contribuiu para oportunizar ao estudante a possibilidade de se expressar de forma ativa, com consequente valorização do seu ponto de vista. Nessa etapa da sessão de simulação, é possível tratar os erros cometidos como oportunidade de aprendizagem, o que possibilita aprimorar o julgamento crítico e construtivo e favorecer o pensamento reflexivo(²⁸).

A pedagogia moderna tem revelado a importância da aprendizagem mediante inovações pedagógicas, considerando inclusive o engajamento tecnológico dos estudantes no século XXI. Então, explorar ferramentas e desenvolver potenciais em contextos de aprendizagem para aprimorar o conhecimento tem se mostrado crescente na área de ciências da saúde(¹⁹).

Portanto, a construção e a validação de um cenário que envolva o tema sepse podem constituir uma ferramenta de apoio e um suporte adicional para resultados positivos de aprendizagem por meio de situações/casos que proporcionem maior desenvolvimento do estudante e da estruturação de conhecimentos e habilidades que suscitem reflexão aos futuros enfermeiros. Isso porque tais técnicas de aprendizagem visam ensinar esses profissionais a identificar os pacientes com risco de sepse, contribuir significativamente para minimizar o risco de atraso no diagnóstico e iniciar as condutas de forma direcionada.

Limitações do estudo

As limitações foram relacionadas às restrições de acesso aos espaços para validação e testagem do cenário, impostas pela pandemia de covid-19; e à dificuldade do cumprimento do tempo de resposta pelos juízes.

Contribuições para a área da enfermagem, Saúde ou Política Pública

O cenário construído e validado neste estudo poderá ser utilizado como ferramenta educacional facilitadora por docentes de instituições de ensino superior em Enfermagem ou em programas de capacitação para enfermeiros que trabalham em unidades de emergência ou terapia intensiva. O desenvolvimento de habilidades cognitivas, afetivas e psicomotoras em situações de emergência como a sepse é fundamental, considerando que a ausência de pensamento crítico, resolução de problemas e capacidade de tomada de decisão podem prejudicar gravemente os pacientes. Então, qualificar futuros enfermeiros para identificação precoce da sepse ganha protagonismo para um cuidado individualizado, qualificado e seguro.

CONCLUSÃO

O cenário de simulação clínica de média complexidade e alta fidelidade para o ensino de estudantes de Enfermagem sobre a atuação do enfermeiro no reconhecimento precoce dos sinais e sintomas de sepse foi construído e validado com êxito. Foi elaborado com base em protocolos pautados nos melhores níveis de evidência, sendo validado por juízes especialistas com prática clínica assistencial na área de cuidados de enfermagem em situações críticas e de risco, simulação clínica e docência em Enfermagem. O quantitativo de juízes incluídos no estudo favoreceu o alcance do Índice de Validade de Conteúdo no valor de 1, o que representa nível de concordância entre os juízes superior a 80% dos itens avaliados no instrumento referente ao cenário simulado.

• FOMENTO
  A pesquisa foi realizada com apoio do programa Demanda Social, da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Carina Dessotte

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  09 Out 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  23 Set 2022
• Aceito
  10 Mar 2023