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AVALIAÇÃO DA DEGERMAÇÃO DAS MÃOS COM HEXACLOROFENO, COMPOSTO QUATERNÁRIO DE AMÔNIO E SABÃO COMUM* * Dissertação de Mestrado apresentada à Escola de Enfermagem Ana Neri da Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1975.

Vários aspectos de infecção hospitalar têm atraído a atenção de muitos pesquisadores em nossa época.

A infecção hospitalar atinge grandes proporções quando a causa determinante é encontrada entre os membros componentes de uma equipe cirúrgica.

As intervenções cirúrgicas, para maior segurança do paciente, devem ser realizadas dentro dos princípios e padrões que regem a assepsia |cirúrgica; esta atinge o seu expoente máximo na sala de operação, pelo rigor com que é executada.

Semmelweiss (1847), investigando a Cciusa do grande aumento do índice de mortalidade por febre puerperal, apontou as mãos dos médicos e estudantes de Medicina como possível agente produtor da infecção. Ressaltou a importância de "lavar as mãos".

Halsted (1889) instituiu o uso de luvas de borracha tentando solucionar o problema da veiculação de germes patogênicos pelas mãos.

Dineen (1971) afirmou que 50% das luvas, depois do ato cirúrgico, podem apresentar orifícios, e se considerarmos o crescimento rápido das bactérias, grande número pode ser inoculado na ferida cirúrgica.

Frice (1938) foi o primeiro investigador a realizar estudos quantitativos sobre o efeito da escovação na remoção dos microrganismos. Concluiu que seria necessário duas horas e meia de escovação contínua para remover toda a flora bacteriana da pele, o que seria impraticável.

O mesmo autor afirmou ainda em estudos posteriores que a flora bacteriana transitória das mãos é removida fácil e rapidamente com água e sabão, embora a escovação não seja um método eficiente na remoção da flora residente, sua ação sobre a flora transitória é evidente. Assim, a importância de uma boa escovação e de uma fricção enérgica das mãos é necessário para se obter bons resultados, no uso de antissépticos.

O valor germicida de diferentes substâncias químicas foi testado em diversos hospitais do mundo, com resultados dignos de crédito. Dentro desses compostos, têm importância os derivados quaternários de amônio; seu valor germicida foi reconhecido por Hartman e Kaegi em 1922, sendo que essa propriedade não foi tomada em conta; só em 1935, Domagk, grande estudioso das propriedades bactericidas de substâncias químicas, demonstrou interesse por eles.

Miller e col. (1943) demonstraram que mão escovadas ou submetidas a imersão em um composto quaternário de amônio a 1%, durante um a três minutos, davam culturas bacteriológicas negativas. No entanto, o uso subseqüente de sabão estéril, exposição à água corrente durante 15 a 30 segundos ou a soluções concentradas de álcool redundavam na recuperação de microrganismos viáveis a partir das mesmas áreas de pele tratadas. Sugeriram, os autores, que a presença do composto quaternário de amônio determinaria a formação de uma película invisível, na superfície cutânea, a qual reteria uma flora bacteriana viável. A película, resistente a traumas mecânicos e à exposição à matéria orgânica, seria desintegrável pelos agentes mencionados acima. Tais suposições foram posteriormente confirmadas pelos autores, no decurso de cirurgias experimentais.

Seastone [(1947), em observações do uso de hexaclorofeno na escovação cirúrgica, referiu que seis minutos de aplicação do antisséptico, uma vez por dia, durante cinco dias consecutivos e a obrigação de ter contato diário com o antisséptico, manteria seus efeitos. Quando houvesse troca de luvas entre cirurgias, uma breve lavagem com o antisséptico seria suficiente para manter o nível baixo de colônias, na pele.

Com base nestas informações e nas verificações de que os vários antissépticos usados têm uma ação boa para cada autor, procuramos estudar em nosso hospital os vários parâmetros que influem na antissepsia das mãos e unhas.

O objetivo principal do nosso trabalho foi a comparação de dois antissépticos e um sabão, entre si, associados ou não à escovação.

MATERIAL E MÉTODO

As técnicas de degermação das mãos foram realizadas com seis componentes, do pessoal de enfermagem, em atividade diária, no Centro Cirúrgico. Em séries sucessivas, com intervalos de tempo de sete a quatorze dias, as técnicas foram repetidas, pelas mesmas pessoas.

As pessoas escolhidas para realizar as técnicas de degermação, tinham as mãos com a pele íntegra, as unhas estavam aparadas, com esmalte e este também estava íntegro formando uma superfície lisa, nas unhas.

Utilizamos os seguintes produtos:

1) P terciário octil-fenoxietoxietileter sulfonato sódico (Entsufon) - 50 g; Bis (2 - hidroxi- 3, 5, 6 -triclorofenil) metana (Hexaclorofeno) - 3 g; Emulsão neutra q.s. - cada 100 cm3.

2) Cloreto de benzildimetil 2 (2 p. 1.1. 3.3. tetrametil-butil-fenoxi) etoxi) etil) amônio: 0,2 g; Propilene glicol: 0,5 ml: aquilaril polietitene plicol éter: 3,0 ml: veículo aquoso indicador q.s.p. - cada 100 ml.

3) Sabão.

A água utilizada, na degermação, foi esterilizada, em galões de vidro de cor âmbar, entre doze a vinte e quatro horas, antes da realização das técnicas. Os galões com capacidade para quatro litros foram autoclavados, a 121 ºC, por trinta minutos, sem a tampa e imediatamente após a esterilização, tampados, observando-se a técnica asséptica.

Em cálices graduados e esterilizados medimos a quantidade dos produtos usados.

Utilizamos, nas técnicas de escovação das mãos e unhas, escovas com cerdas vegetais, nas quais de um lado as fibras eram curtas, empregadas para unhas, e do outro eram longas, para mãos. Foram acondicionadas, individualmente, em campos de algodão cru e autoclavadas. por quinze minutos, a 121 ºC.

Enxugamos as mãos em compressa cirúrgica, esterilizada, após a realização das técnicas.

Para cultura do material das mãos, colhido antes e depois da degermação, empregamos as Placas Rodac com meio de cultura agar-infusão-sangue (coelho).

Para recuperarmos as placas Rodac utilizamos: água, sabão e escova, esterilização a frio com Glutaraldeído 2%, água esterilizada para remoção dos resíduos da solução e álcool etílico 70%, por pew.

Um balão volumétrico com amostra de água foi transportado do hospital ao Laboratório, em um recipiente com gelo, para exame bacteriológico da água utilizada nas técnicas (prova de esterilidade).

TÉCNICAS DE DEGERMAÇÃO USADAS

As técnicas de degermação abaixo discriminadas são em número de seis, realizadas em séries sucessivas, com intervalo de tempo de sete a quatorze dias, para repetição das mesmas.

Técnica 1 - As mãos foram molhadas com água esterilizada dos galões de vidro.

  • - Aplicamos 5 ml de emulsão com hexaclorofeno.

  • - Friccionamos até a formação de espuma.

  • - Massageamos, durante dois minutos, a espuma na superfície das mãos.

  • - Enxaguamos com água esterilizada.

  • - Repetimos a técnica.

  • - Enxugamos com compressa esterilizada.

Técnica 2 - As mãos foram molhadas com água esterilizada dos galões de vidro

  • - Aplicamos 10 ml da emulsão com hexaclorofeno misturada com 5 m! de água esterilizada, aos poucos, sempre que a espuma diminuía.

  • - Pegamos uma escova, esterilizada, do lado das cerdas longas e molhamos com água esterilizada.

  • - Escovamos dez vezes a palma e dedos da mão, cada escovadela correspondia a um só movimento, iniciado na região da palma que está em contato com o punho, terminando na ponta dos dedos.

  • - Escovamos dez vezes o dorso e dedos da mão, cada escovadela era iniciada na região do dorso que está em contato com o punho e terminava na ponta dos dedos.

  • - O lado medial de cada dedo e o lado lateral receberam vinte escovadeias cada uma terminando na ponta do dedo.

  • - Novamente, a palma e dedos receberam dez escovadelas e também o dorso e dedos.

  • - Unimos os dedos mínimo, anular, médio e indicador de forma a expor a prega ungueal, pegamos a escova do lado das cerdas curtas, escovamos vinte vezes, iniciando cada escovadela na prega ungueal do dedo indicador, terminando no mínimo.

  • - Unimos os quatro dedos de forma a expor o leito ungueal e escovamos vinte vezes, iniciando no dedo indicador e terminando no mínimo.

  • - O dedo polegar foi escovado sozinho, seguindo o mesmo método.

  • - Enxaguamos com água esterilizada.

  • - Enxugamos com compressa esterilizada.

Técnica 3 - O antisséptico usado foi o amônio quaternário (30 ml) e os mesmos passos descritos, na técnica 1, foram seguidos nesta.

Técnica 4 - O antisséptico usado foi o amônio quaternário (60 ml) associado à escovação e os mesmos passos descritos na técnica 2, foram seguidos nesta.

Técnica 5 - Usamos sabão, este foi passado vinte vezes, nas mãos molhadas, os mesmos passos descritos, na técnica 1, foram seguidos nesta.

Técnica 6 - Usamos sabão associado à escovação, este foi passado vinte vezes, na escova molhada, e os mesmos passos descritos, na técnica 2, foram seguidos nesta.

TÉCNICA PARA LEITURA DAS PLACAS "RODAC"

Após colher o material das mãos, incubamos as placas, em estufa a 35 ºC, por vinte e quatro horas. Decorrido este tempo realizamos a leitura contando o número de colônias existentes na superfície do agar-infusão-sangue.

COMENTÁRIOS

O estudo da degermação das mãos, com vários antissépticos, mostrou-nos que a capacidade de degermação depende de uma série de circunstâncias que procuraremos discutir a seguir.

O uso de hexaclorofeno, em emulsão, mostrou-se capaz de reduzir as colônias bacterianas, em meio de cultura, quando as amostras foram colhidas da pele das mãos, sendo necessário utilizar 5 ml, durante dois minutos, removê-lo e aplicá-lo novamente, durante mais dois minutos.

Quando associamos o hexaclorofeno à escovação, verificamos que ao contrário da nossa expectativa a quantidade de microrganismos aumentou. Isto parece corroborar os achados de Maurer, em 1968, de que há microrganismos capazes de resistir à ação de um antisséptico. Sugerimos que esta técnica não seja utilizada para degermação pré-cirúrgica das mãos pois, pelos nossos resultados, não consideramos que possa apresentar rápida degermação das mãos para o ato cirúrgico. Seastone, em 1947, já afirmava isto.

Observando a ação de outro antisséptico contendo compostos quaternários de amônio, verificamos que este foi tão eficiente quanto o hexaclorofeno na degermação das mãos.

A associação de um composto quaternário de amônio à escovação, mostrou nos uma melhora sensível dos resultados, exibindo ótima degermação da pele das mãos

Constatamos que os melhores resultados obtidos em nosso trabalho foram a degermação e a escovação das mitos com um antisséptico contendo compostos quaternários de amônio.

Finalmente, tentamos comparar os dois antissépticos estudados com sabão na degermação e na escovação das mãos, concluímos que o uso de sabão nos dois modos não oferece segura redução de microrganismos, contraindicando o seu uso, no hospital.

  • CUNHA, A,M.P. - Avaliação da degermação das mãos com hexaclorofeno, composto quaternário de amônio e sabão comum. Rev. Bras. Enf.; DF, 31 : 177-181, 1978.
  • *
    Dissertação de Mestrado apresentada à Escola de Enfermagem Ana Neri da Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1975.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

  • 1
    DINEEN, P. - Studying effectiveness of scrubbing preparation of patients skin. Hosp. Topics, 49 : 74-75, 1971.
  • 2
    DOMAGK, G. - Eine neuekeasse von desinfektionsmittchn. Deutsche Med Wochenschrift, 61 : 629-632, 1935.
  • 3
    HALSTED (1889) - Apud: DAVIS, L ed. - Christopher's textbook of surgery 6th ed. Philadelphia. 1956, p. .7
  • 4
    HARTMAN, M. & KAEGI, H. Z. -- Apud: Valko, E. P., 1946.
  • 5
    MAURER, I. M. - Disinfectants in hospital. Nursing Mirror, 126 : 25-26, 1968.
  • 6
    MILLER, B. F.; ABRAMS, R.; HUBER, D. A.; KLEIN, M. - Formation of invisible, non-perceptible films on hands by cationic soaps. Proc. Soc Exp. Biol. & Med, 54 : 174-176, 1943.
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    PRICE, P. B. - New studies in surgical bacteriology and surgical technic with special reference to disinfection of the skin. J.A.M.A., 111 : 1993-1996, 1938.
  • 8
    SEASTONE, C. V. - Observations on the use of G-ll in the surgical scrub. Surg, Gynec. Obstet, 84 : 355-360, 1947.
  • 9
    SEMMELWEISS (1847) - Apud: GOODMAN, L. S. & GILMAN, A. - As bases farmacológicas da terapêutica 4.ª ed. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 1973, pg. 4.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 1978
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