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Avaliação pra valer

EDITORIAL

Avaliação pra valer

Maria Therezinha Nóbrega da Silva

Há anos ouve-se dizer que as Instituições de Ensino Superior - IES - precisam ser submetidas à avaliação. Enquanto este discurso não se organiza numa prática definitiva, de forma aleatória, sem qualquer relação com o mercado de trabalho e nenhum plano de desenvolvimento estratégico regional, os cursos superiores cresceram desordenadamente, especialmente junto à rede privada de ensino. Recentemente, na área de Saúde, o total de cursos era de 393 (1990), atingindo a marca de 430 cursos em 1994. De maneira análoga viu-se o mesmo fenômeno ocorrer no setor saúde.

Se no passado o setor público educacional e de saúde eram considerados privilegiados empregadores dos profissionais mais qualificados e prestadores dos melhores serviços, nos último anos, após intencional sucateamento dos dois setores, da desqualificação de seus trabalhadores e da desmoralização pública governamental sobre seus próprios serviços, pouco resta da antiga confiabilidade de tempos atrás.

A este atual quadro acrescenta-se a diminuição de verbas para as Universidades públicas, além do decréscimo de bolsas e verbas para pesquisas oferecidas pelos órgãos tradicionais de fomento. Hoje estas Universidades passam pela sua pior crise político-financeira, associada ao descrédito de sua razão de existir. Na gestão governamental passada, o Ministério da Educação, através da Secretaria de Educação Superior (SESu), em dezembro de 1993, lança o Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB). Este tinha como objetivo "desenvolver uma cultura de avaliação" no meio acadêmico. Até o ano de 1995, o desafio lançado pelo MEC teve adesão de 55 universidades, que tinham projetos de avaliação em andamento. Entretanto, no corrente ano, pouca notícia se teve do PAIUB, para não dizer nenhuma. Ao que parece, o silêncio do PAIUB no ano de 1996 foi substituído pelo barulho do "PROVÃO".

É pena que um programa consistente e conseqüente de avaliação fosse secundarizado ou colocado em banho-maria para dar lugar à proposta de avaliação de concluintes de cursos dissociada de processos de formação, assim como de seus insumos e regiões onde os cursos superiores acontecem.

O Exame Nacional de Cursos - conhecido pelos alunos como PROVÃO nasceu através da promulgação da Lei 9131, de 24.11.95 que altera o dispositivo da Lei 4024, de 20.02.61 e pela Portaria 249, de 18.03.96 que trata da sua operacionalização. Buscando conhecer os motivos dessa idéia, deparase com a arrogância vaidosa decorrente de poder autoritário, gestando um filho rejeitado, visto que imposto.

Se as Comissões de Especialistas da SESu estivessem em franco trabalho de avaliação dos cursos e instituições, poder-se-ía entender esta iniciativa como mais um elemento de um amplo processo avaliador do sistema universitário e, ainda assim, considerado na sua devida proporção.

Contudo, o indicador de menor credibilidade está recebendo peso e prestígio indevidos e, se visto isoladamente, insuficiente a qualquer análise mais consistente.

No momento, concluintes de três cursos são submetidos ao Provão: Direito, Administração e Engenharia. Todavia um relativo sucesso desta medida, será o argumento esperado para a sua extensão aos demais cursos superiores a curto prazo. Com esta perspectiva, o curso de Enfermagem estará envolvido em tempo menor do que se poderá pressupor. Assim sendo, uma reflexão por parte dos enfermeiros sobre esta medida é indispensável, além de ações coerentes e rápidas a partir do pensamento crítico desenvolvido e assumido. É tempo dos Diretores de Escolas e Entidades de Enfermagem do país se organizarem para tomarem uma posição se desejarem apoiar ou resistir à medida do governo.

Afinal, o que pretende esta avaliação tangencial ao problema? Fechar os cursos onde os concluintes não obtiverem uma média mínima estabelecida como ideal? Avaliar e eliminar os docentes cujas disciplinas não tiveram respostas corretas por parte dos alunos? Estabelecer um programa de melhoria para os cursos de concluintes de menor escore no exame?

Este exame certamente será utilizado pela imprensa de forma sensacionalista para, segundo os seus critérios, avaliar as IES.

O mercado de trabalho, por sua vez, utilizará o seu resultado como forma de selecionar seus candidatos.

O incauto concluinte, que no ingresso de seu curso superior não foi comunicado sobre cursos que preparam alunos para o Provão, com toda certeza será aquele que receberá a carga discriminatória de uma avaliação desta natureza.

É interessante assinalar que num mesmo momento em que se busca outras formas de selecionar alunos para os cursos superiores, institui-se a velha e desgastada fórmula para avaliar o momento em que os alunos deixam as instituições escolares.

De qualquer forma, a conjuntura exige que as IES apresentem com urgência um processo contínuo de avaliação de seu desempenho em todos os sentidos, onde os alunos não sejam o bode expiatório das irresponsabilidades cometidas em todos os níveis, mas que demonstrem o quanto os resultados são diretamente dependentes dos recursos habilmente empregados na formação de cidadãos.

Governo e IES precisam assumir os erros e acertos de sua competência, sem tentar transferir ou responsabilizar o usuário do sistema educacional por sua decisões passionais, conivências e omissões em relação aos rumos que a educação seguir neste país.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Dez 2014
  • Data do Fascículo
    Jun 1996
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