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Iniquidade em saúde, comportamentos não saudáveis e cobertura de mamografia no Brasil

RESUMO

Objetivo:

Investigar a prevalência da cobertura de mamografia e a relação entre fatores sociodemográficos e comportamentais associados à não realização de mamografia em mulheres de 50 a 69 anos de idade, usando dados do Vigitel 2016.

Método:

Estudo transversal, de base populacional, que utilizou dados do Vigitel e incluiu 12.740 mulheres na faixa etária de 50 a 69 anos. As variáveis foram analisadas por meio da regressão logística.

Resultados:

Entre as mulheres estudadas, 21,8% não haviam realizado a mamografia nos últimos 2 anos. As características associadas à não realização do exame foram mulheres com menos de 12 anos de estudo (p<0,001), que declararam não ter companheiro (p=0,001), com baixo peso (p=0,002), autoavaliação da sua saúde como negativa (p<0,001) e com pelo menos um comportamento negativo em saúde (p<0,001).

Conclusão:

Observa-se um subgrupo de mulheres com marcadores de maior vulnerabilidade, os quais refletem as iniquidades na cobertura da mamografia.

Descritores:
Mamografia; Iniquidade em Saúde; Cobertura de Serviços de Saúde; Acesso aos Serviços de Saúde; Programas de Rastreamento

ABSTRACT

Objective:

To investigate the prevalence of mammography screening and the association among socio-demographic, behavior factors and non-adherence to mammography screening among women between 50 and 69 years old, using data from Vigitel 2016.

Method:

Cross-sectional, population-based study with data from Vigitel including 12,740 women in the 50-69 age group. The variables were analyzed using logistic regression.

Results:

Among the women studied, 21.8% had not had a mammography in the past 2 years. The characteristics associated with non-adherence to the test were having less than 12 years of education (p<0.001), having no partner (p=0.001), being underweight (p=0.002), having a negative self-perceived health status (p<0.001) and having at least one negative health behavior (p<0.001).

Conclusion:

There is a subgroup of women with markers of social vulnerability, which reflect the inequality in mammography screening.

Descriptors:
Mammography; Health Status Disparities; Health Services Coverage; Health Services Accessibility; Mass Screening

RESUMEN

Objetivo:

Investigar la prevalencia de la cobertura de mamografías y su relación entre los factores sociodemográficos y comportamentales asociados a la no realización de mamografías en mujeres de 50 a 69 años de edad, según datos del Vigitel 2016.

Método:

Se trata de un estudio transversal, de base poblacional, realizado con los datos del Vigitel que incluye 12.740 mujeres entre 50 y 69 años. Las variables se analizaron con regresión logística.

Resultados:

Entre las mujeres estudiadas, el 21,8% no se había hecho una mamografía en los últimos 2 años. La no realización del examen estaba relacionada con determinadas características: menos de 12 años de estudio (p<0,001), no tener pareja (p=0,001), bajo peso (p=0,002), autoevaluación de su salud como negativa (p<0,001) y por lo menos un comportamiento de salud negativo (p<0,001).

Conclusión:

Se observa un subgrupo de mujeres con marcadores de vulnerabilidad más elevados, lo que refleja las desigualdades en la cobertura de las mamografías.

Descriptores:
Mamografía; Iniquidad en la Salud; Cobertura de los Servicios Sanitarios; Acceso a los Servicios Sanitarios; Programas de Rastreo

INTRODUÇÃO

O câncer de mama é o tumor que mais acomete as mulheres no mundo. O rastreamento por meio da mamografia visa sua detecção precoce e diminuição da mortalidade(11 Martei YM, Pace LE, Brock JE, Shulman LN. Breast cancer in low- and middle-income countries: why we need pathology capability to solve this challenge. Clin Lab Med. 2018;38(1):161-73. doi: 10.1016/j.cll.2017.10.013
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2 Ministério da Saúde (BR), Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Diretrizes para a detecção precoce do câncer de mama no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2015.
-33 Ghoncheh M, Pournamdar Z, Salehiniya H. Incidence and Mortality and Epidemiology of Breast Cancer in the World. Asian Pac J Cancer Prev. [Internet]. 2016 [2019 Oct 17];17(S3):43-6. Available from: http://journal.waocp.org/?sid=Entrez:PubMed&id=pmid:27165206&key=2016.17.S3.43
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). As maiores taxas de incidência correspondem às dos países desenvolvidos, entretanto, a taxa de mortalidade é maior nos países em desenvolvimento, o que pode ser atribuído ao diagnóstico tardio(33 Ghoncheh M, Pournamdar Z, Salehiniya H. Incidence and Mortality and Epidemiology of Breast Cancer in the World. Asian Pac J Cancer Prev. [Internet]. 2016 [2019 Oct 17];17(S3):43-6. Available from: http://journal.waocp.org/?sid=Entrez:PubMed&id=pmid:27165206&key=2016.17.S3.43
http://journal.waocp.org/?sid=Entrez:Pub...
-44 Dianatinasab M, Fararouei M, Mohammadianpanah M, Zare-Bandamiri M. Impact of social and clinical factors on diagnostic delay of breast cancer. Medicine (Baltimore). [Internet]. 2016 [2018 Sep 22];95(38):1-6. Available from: https://journals.lww.com/md-journal/Fulltext/2016/09200/Impact_of_social_and_clinical_factors_on.8.aspx
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) e à falta de acesso ao tratamento oportuno(44 Dianatinasab M, Fararouei M, Mohammadianpanah M, Zare-Bandamiri M. Impact of social and clinical factors on diagnostic delay of breast cancer. Medicine (Baltimore). [Internet]. 2016 [2018 Sep 22];95(38):1-6. Available from: https://journals.lww.com/md-journal/Fulltext/2016/09200/Impact_of_social_and_clinical_factors_on.8.aspx
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).

A recomendação da realização de mamografia é a cada dois anos, na faixa de idade de 50 a 69 anos, para detecção precoce e redução da mortalidade(55 Migowski A, Azevedo Silva G, Dias MBK, Diz MDPE, Sant’Ana DR, Nadanovsky P. Guidelines for early detection of breast câncer in Brazil. II - New national recommendations, main evidence, and controversies. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2018 [2018 Oct 15];34(6):1-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n6/1678-4464-csp-34-06-e00074817.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n6/1678-...
). Essa recomendação é para a população de risco padrão(22 Ministério da Saúde (BR), Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Diretrizes para a detecção precoce do câncer de mama no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2015.), sendo decorrente da avaliação do custo-benefício associado ao sobrediagnóstico, sobretratamento, exposição à radiação e morte por cânceres radioinduzidos que a mamografia em excesso e fora da faixa de idade pode ocasionar(22 Ministério da Saúde (BR), Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Diretrizes para a detecção precoce do câncer de mama no Brasil. Rio de Janeiro: INCA, 2015.

3 Ghoncheh M, Pournamdar Z, Salehiniya H. Incidence and Mortality and Epidemiology of Breast Cancer in the World. Asian Pac J Cancer Prev. [Internet]. 2016 [2019 Oct 17];17(S3):43-6. Available from: http://journal.waocp.org/?sid=Entrez:PubMed&id=pmid:27165206&key=2016.17.S3.43
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4 Dianatinasab M, Fararouei M, Mohammadianpanah M, Zare-Bandamiri M. Impact of social and clinical factors on diagnostic delay of breast cancer. Medicine (Baltimore). [Internet]. 2016 [2018 Sep 22];95(38):1-6. Available from: https://journals.lww.com/md-journal/Fulltext/2016/09200/Impact_of_social_and_clinical_factors_on.8.aspx
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-55 Migowski A, Azevedo Silva G, Dias MBK, Diz MDPE, Sant’Ana DR, Nadanovsky P. Guidelines for early detection of breast câncer in Brazil. II - New national recommendations, main evidence, and controversies. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2018 [2018 Oct 15];34(6):1-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n6/1678-4464-csp-34-06-e00074817.pdf
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).

A cobertura de mamografia no país, de acordo com dados do Vigitel, no ano de 2012, foi de 77,4%, superando em sete pontos percentuais as metas propostas pelo Ministério da Saúde para 2022(66 Bernal RTI, Malta DC, Iser BPM, Monteiro RA. Método de projeção de indicadores das metas do Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis no Brasil segundo capitais dos estados e Distrito Federal. Epidemiol. Serv. Saude. 2016;25(3):455-66. doi: 10.5123/s1679-49742016000300002
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). Entretanto, resultados da Pesquisa Nacional de Saúde, realizada em 2013, mostram variações de acordo com a região (região Norte - 38,7%; e Sudeste - 67,9%), escolaridade, e se a mulher possuía plano de saúde ou era usuária do SUS (79,5% e 51,0%, respectivamente)(77 Azevedo e Silva G, Souza-Júnior PRB, Damacena GN, Szwarcwald CL. Early detection of breast cancer in Brazil: data from the National Health Survey, 2013. Rev Saude Publica. 2017;51(supl.1). doi: 10.1590/s1518-8787.2017051000191
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). Essas diferenças na cobertura entre as pesquisas poderiam ser atribuídas a desenhos metodológicos.

Estudos mostram desigualdades sociais no acesso ao rastreio de câncer de mama(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
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9 Gathirua-Mwangi W, Cohee A, Tarver WL, Marley A, Biederman E, Stump T, et al. Factors associated with adherence to mammography screening among insured women differ by income levels. Womens Health Issues. 2018;28(5):462-9. doi: 10.1016/j.whi.2018.06.001
https://doi.org/10.1016/j.whi.2018.06.00...

10 Chkotua S, Peleteiro B. Mammography Use in Portugal: National Health Survey 2014. Prev Chronic Dis. 2017;14(170054). doi: 10.5888/pcd14.170054
https://doi.org/10.5888/pcd14.170054...

11 Chongthawonsatid S. Inequity of healthcare utilization on mammography examination and Pap smear screening in Thailand: Analysis of a population-based household survey. PLoS ONE. [Internet]. 2017 [2018 out 15];12 (3). Available from: https://www.researchgate.net/publication/314648885
https://www.researchgate.net/publication...

12 Lopes TCR, Gravena AAF, Agnolo CMD, Rocha-Brischiliari SC, Demitto MO, Carvalho MDB, et al. Prevalência e fatores associados à realização de mamografia e exame citopatológico. Rev Bras Promoç Saúde. 2015;28(3):402-10. doi: 10.5020/18061230.2015.p402
https://doi.org/10.5020/18061230.2015.p4...

13 Mukem S, Meng Q, Sriplung H, Tangcharoensathienet V. Low coverage and disparities of breast and cervical cancer screening in Thai women: analysis of National Representative Household Surveys. Asian Pac J Cancer Prev. 2015;16(18):8541-51. doi: 10.7314/APJCP. 2015.16.18.8541
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-1414 Barbosa YC, Oliveira AGC, Rabelo PPC, Silva FS, Santos AM. Fatores associados à não realização de mamografia: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Rev Bras Epidemiol. 2019;22:E190069. doi: 10.1590/1980-549720190069
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). Mulheres pretas e pardas(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
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), com menor escolaridade(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
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,1010 Chkotua S, Peleteiro B. Mammography Use in Portugal: National Health Survey 2014. Prev Chronic Dis. 2017;14(170054). doi: 10.5888/pcd14.170054
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-1111 Chongthawonsatid S. Inequity of healthcare utilization on mammography examination and Pap smear screening in Thailand: Analysis of a population-based household survey. PLoS ONE. [Internet]. 2017 [2018 out 15];12 (3). Available from: https://www.researchgate.net/publication/314648885
https://www.researchgate.net/publication...
,1313 Mukem S, Meng Q, Sriplung H, Tangcharoensathienet V. Low coverage and disparities of breast and cervical cancer screening in Thai women: analysis of National Representative Household Surveys. Asian Pac J Cancer Prev. 2015;16(18):8541-51. doi: 10.7314/APJCP. 2015.16.18.8541
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), solteiras ou que vivem sem companheiro(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
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,1010 Chkotua S, Peleteiro B. Mammography Use in Portugal: National Health Survey 2014. Prev Chronic Dis. 2017;14(170054). doi: 10.5888/pcd14.170054
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,1515 Lam M, Kwok C, Lee M. Prevalence and sociodemographic correlates of routine breast cancer screening practices among migrant-Australian women. Aust NZ J Public Health. 2018;42(1):98-103. doi: 10.1111/1753-6405.12752
https://doi.org/10.1111/1753-6405.12752...
-1616 Al-Wassia RK, Farsi NJ, Merdad LA, Hagi SK. Patterns, knowledge, and barriers of mammography use among women in Saudi Arabia. Saudi Med J. [Internet]. 2017 [2019 May 03];38(9):913-21. Available from: https://smj.org.sa/index.php/smj/article/view/smj.2017.9.20842/10487
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), fumantes(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
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) e que não possuíam plano de saúde(1212 Lopes TCR, Gravena AAF, Agnolo CMD, Rocha-Brischiliari SC, Demitto MO, Carvalho MDB, et al. Prevalência e fatores associados à realização de mamografia e exame citopatológico. Rev Bras Promoç Saúde. 2015;28(3):402-10. doi: 10.5020/18061230.2015.p402
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13 Mukem S, Meng Q, Sriplung H, Tangcharoensathienet V. Low coverage and disparities of breast and cervical cancer screening in Thai women: analysis of National Representative Household Surveys. Asian Pac J Cancer Prev. 2015;16(18):8541-51. doi: 10.7314/APJCP. 2015.16.18.8541
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-1414 Barbosa YC, Oliveira AGC, Rabelo PPC, Silva FS, Santos AM. Fatores associados à não realização de mamografia: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Rev Bras Epidemiol. 2019;22:E190069. doi: 10.1590/1980-549720190069
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) realizaram mamografia com menor frequência. Adicionalmente, estudos restritos a pequenas amostras(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
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,1212 Lopes TCR, Gravena AAF, Agnolo CMD, Rocha-Brischiliari SC, Demitto MO, Carvalho MDB, et al. Prevalência e fatores associados à realização de mamografia e exame citopatológico. Rev Bras Promoç Saúde. 2015;28(3):402-10. doi: 10.5020/18061230.2015.p402
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) mostraram que fatores comportamentais não saudáveis, como prática insuficiente de atividade física e baixo consumo de frutas e hortaliças, podem estar associados à não realização de mamografia.

A não realização de mamografia constitui um sério risco à saúde, pois a detecção precoce aumenta a probabilidade de encontrar um tumor em estágio inicial, o que melhora o sucesso do tratamento dessa doença(1717 Ministério da Saúde (BR), Câncer de mama. [Internet] 2018 [2018 Sep 25]. Available from: www.saude.mg.gov.br/saudedamulher.
www.saude.mg.gov.br/saudedamulher...
). Assim, estudos de escores de comportamento negativo em saúde podem indicar acumulação de risco de câncer de mama, uma vez que são fatores de risco para esse tipo de câncer e podem estar associados à não realização de mamografia.

OBJETIVO

Investigar a prevalência da cobertura de mamografia e a relação entre fatores sociodemográficos e comportamentais associados à não realização de mamografia em mulheres de 50 a 69 anos de idade, usando dados do Vigitel 2016.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O Vigitel foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa para Seres Humanos (Conep nº 355.590/2013)(1818 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2013: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2014.) e o consentimento verbal foi obtido por ocasião dos contatos telefônicos com os participantes(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.).

Desenho, local do estudo e período

Trata-se de estudo transversal, de base populacional, que utilizou dados provenientes do Vigitel, do ano de 2016. O Vigitel realiza entrevistas telefônicas em adultos com idade de 18 anos ou mais, nas capitais dos 26 estados e no Distrito Federal(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.).

População, amostra; critérios de inclusão e exclusão

Amostras de 2.000 entrevistas são necessárias em cada capital, sendo a amostragem realizada em duas etapas, obtidas a partir do sorteio de 5.000 linhas telefônicas em cada cidade. Para isso, um sorteio sistemático e estratificado que utiliza o código de endereçamento postal (CEP) é realizado de acordo com o cadastro das linhas nas empresas de telefonia. Posteriormente, essas linhas residenciais fixas foram dividas em réplicas de 200 linhas(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.).

Após a identificação das linhas elegíveis, uma foi sorteada e, a partir desta, sorteou-se um dos adultos residentes no domicílio, correspondendo à segunda etapa(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.). Uma equipe treinada foi responsável por aplicar um questionário por entrevistas telefônicas guiadas por computador. No ano de 2016, das 77.671 linhas elegíveis, 53.210 completaram as entrevistas(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.).

Do total de 53.210 pessoas entrevistadas em 2016, 32.952 eram mulheres. Destas, 12.740 estavam na faixa etária alvo para o rastreamento do câncer de mama (50 a 69 anos), de acordo com as recomendações nacionais(55 Migowski A, Azevedo Silva G, Dias MBK, Diz MDPE, Sant’Ana DR, Nadanovsky P. Guidelines for early detection of breast câncer in Brazil. II - New national recommendations, main evidence, and controversies. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2018 [2018 Oct 15];34(6):1-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n6/1678-4464-csp-34-06-e00074817.pdf
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). Para o modelo multivariado, foram excluídas as mulheres que não tinham dados completos para todas as variáveis de interesse, totalizando 12.483 mulheres (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma da população estudada

Protocolo do estudo

O desfecho principal foi a não realização de mamografia nos últimos dois anos. Utilizaram-se as seguintes questões: “A sra. já fez, alguma vez, mamografia, Raio-x das mamas?” e “Quanto tempo faz que a sra. fez mamografia?”. Foram consideradas como “não realização de mamografia” as mulheres que nunca realizaram o exame e as que já haviam realizado em um tempo superior a dois anos.

As variáveis sociodemográficas foram cor da pele/raça (branca, parda e preta, amarela e indígena), faixa etária em anos (50 a 59, 60 a 69), escolaridade em anos (12 ou mais, 9 a 11, 0 a 8) e estado civil (com e sem companheiro). As comportamentais e de saúde foram as seguintes: diabetes, hipertensão arterial, índice de massa corporal - IMC (peso adequado, baixo peso, sobrepeso, obesidade), atividade física no lazer, consumo recomendado de frutas e hortaliças, tabagismo, consumo de álcool, autoavaliação do estado de saúde (positiva, negativa), posse de plano de saúde e comportamento negativo em saúde (nenhum a quatro). Esse último foi construído a partir da apresentação de um comportamento negativo em saúde: não realizar atividade física no lazer, não consumir o recomendado de frutas e hortaliças, ser fumante/ex-fumante, consumir álcool.

O IMC foi classificado de acordo com a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS): peso adequado ≥ 18,5 e < 25; baixo peso < 18,5; sobrepeso ≥ 25 e < 30, obesidade ≥ 30 kg/m2 (2020 Ministério da Saúde (BR), Índice de Massa Corpórea[Internet]. 2018 [2018 Sep 22]. Available from: http://portalms.saude.gov.br/component/content/article/804-imc/40509-imc-em-adultos
http://portalms.saude.gov.br/component/c...
).

Para a prática de atividade física no lazer, foi considerado realizar 150 minutos semanais de atividade de intensidade leve ou moderada ou pelo menos 75 minutos semanais de atividade física de intensidade vigorosa(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.). O consumo recomendado de frutas e hortaliças foi determinado conforme Vigitel, de cinco ou mais porções diárias de frutas e hortaliças, em pelo menos cinco dias da semana(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.). A autoavaliação do estado de saúde foi positiva se a mulher respondeu como muito bom ou bom, e negativa quando a resposta foi regular, ruim ou muito ruim(1919 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigitel Brasil 2016: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília: MS; 2017.).

Análise dos resultados e estatística

A análise dos dados incluiu estimativas da cobertura da mamografia, da prevalência de sua não realização e erro padrão (±EP). Conduziram-se análises não ajustadas e ajustadas das potenciais características sociodemográficas, comportamentais e de saúde associadas à não realização do exame nos últimos dois anos por meio da regressão logística. Estimou-se o Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos de 95% de confiança (IC95%), sendo utilizado o pacote estatístico Stata, versão 14.0, módulo Survey.

RESULTADOS

A cobertura da mamografia entre as mulheres que se encontravam na faixa etária alvo para esse exame (50 a 69 anos) foi de 78,2% para os últimos dois anos. A prevalência de não realização do exame foi de 21,8%, variando conforme as características sociodemográficas, comportamentais e de saúde das mulheres. Essa prevalência de não realização foi maior em alguns grupos, como entre as mulheres com baixa escolaridade (28,8%), sem companheiro (26,3%), sem plano de saúde (30,8%), e com três (25,4%) e quatro (35,6%) comportamentos não saudáveis, com baixo peso (42,6%) e fumante (33,8%), dentre outras (Tabelas 1 e 2).

Em relação às características das mulheres, a maioria relatou ser branca, com idade entre 50 e 59 anos, que apresentava entre 0 a 8 anos de estudo, vivia com o companheiro e era da região Sudeste. Na análise não ajustada, as mulheres que declararam ser de outras cores que não a branca, que possuíam menor grau de escolaridade (0 a 8 e 9 a 11 anos de estudo) e viviam sem companheiro apresentaram maior chance de não realização do exame, assim como as que moravam nas regiões Nordeste e Centro-Oeste (Tabela 1).

Tabela 1
Prevalência e Odds Ratio não ajustado da não realização de mamografia pelas mulheres brasileiras, na faixa etária de 50 a 69 anos, segundo características sociodemográficas, Brasil, 2016

Quanto às características comportamentais e de saúde, a maioria das mulheres não tinha diagnóstico de diabetes e hipertensão, estava com o peso adequado, era inativa, não consumia o recomendado de frutas e legumes, não fumava, não consumia álcool, autoavaliava seu estado de saúde positivamente, possuía plano de saúde e pelo menos um comportamento negativo em saúde (Tabela 2). Na análise não ajustada, as mulheres com diabetes, hipertensas, com baixo peso, inativas, que não consumiam frutas e hortaliças conforme recomendação, fumantes, que avaliaram negativamente seu estado de saúde, sem plano de saúde e que possuíam um ou mais comportamento negativo em saúde apresentaram maior chance de não realização do exame (Tabela 2).

Tabela 2
Prevalência e Odds Ratio não ajustado da não realização de mamografia segundo características comportamentais e de saúde, Brasil, 2016

No modelo ajustado, observou-se que as mulheres com menor escolaridade, sem companheiro, com baixo peso, que autoavaliaram negativamente seu estado de saúde e apresentaram um ou mais comportamento negativo em saúde tiveram maior chance de não realização da mamografia (Tabela 3).

Tabela 3
Odds Ratio ajustado (OR) e IC95% da não realização de mamografia segundo características sociodemográficas, comportamentais e de saúde, Brasil, 2016

A variável posse de plano de saúde não foi inserida no modelo final ajustado, pois estava correlacionada com a escolaridade (correlação=0,3382). Cabe ressaltar que tanto a escolaridade quanto o comportamento negativo em saúde apresentaram relação dose-resposta (p<0,001 para as duas associações).

DISCUSSÃO

A cobertura de mamografia neste estudo foi de 78,2% para os últimos dois anos, ultrapassando a meta recomendada(66 Bernal RTI, Malta DC, Iser BPM, Monteiro RA. Método de projeção de indicadores das metas do Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis no Brasil segundo capitais dos estados e Distrito Federal. Epidemiol. Serv. Saude. 2016;25(3):455-66. doi: 10.5123/s1679-49742016000300002
https://doi.org/10.5123/s1679-4974201600...
). Diferenças significativas foram observadas entre os grupos estudados, sendo a cobertura proporcionalmente menor nos grupos socialmente mais vulneráveis. No presente estudo, a chance de não realizar mamografia foi maior em mulheres de baixa escolaridade, naquelas que vivem sem companheiro, com baixo peso e que avaliam sua saúde negativamente, similarmente ao que ocorre com a realização de exame preventivo de câncer do colo uterino(2121 Tiensoli SDT, Felisbino-Mendes MS, Velasquez-Melendez G. Avaliação da não realização do exame Papanicolaou por meio do Sistema de Vigilância por inquérito telefônico. Rev Esc Enferm USP. 2018;52: 1-7. doi: 10.1590/s1980-220x2017029503390.
https://doi.org/10.1590/s1980-220x201702...
).

Pelo fato de ser um marcador de nível socioeconômico(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-...
,1111 Chongthawonsatid S. Inequity of healthcare utilization on mammography examination and Pap smear screening in Thailand: Analysis of a population-based household survey. PLoS ONE. [Internet]. 2017 [2018 out 15];12 (3). Available from: https://www.researchgate.net/publication/314648885
https://www.researchgate.net/publication...
), a baixa escolaridade explicaria em grande parte que mulheres nessas condições têm menor acesso às informações relacionadas à mamografia, não compreendendo sua relevância e diminuindo, assim, a chance de realização do exame(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-...
,1414 Barbosa YC, Oliveira AGC, Rabelo PPC, Silva FS, Santos AM. Fatores associados à não realização de mamografia: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Rev Bras Epidemiol. 2019;22:E190069. doi: 10.1590/1980-549720190069
https://doi.org/10.1590/1980-54972019006...
,2222 Gonçalves CV, Camargo VP, Cagol JM, Miranda B, Mendoza-Sassi RA. O conhecimento de mulheres sobre os métodos para prevenção secundária do câncer de mama. Ciên Saúde Coletiva. [Internet]. 2017 [2019 May 03];22(12):4073-81. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v22n12/1413-8123-csc-22-12-4073.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v22n12/1413...
).

A relação entre status marital e rastreio para o câncer de mama é controversa na literatura. Um estudo realizado em país mais desenvolvido, como a Austrália, demonstrou que o parceiro pode ser um incentivador a rastrear e que a contribuição do companheiro pode estar relacionada ao suporte social e seu papel vital no incentivo da mulher a buscar cuidado(1515 Lam M, Kwok C, Lee M. Prevalence and sociodemographic correlates of routine breast cancer screening practices among migrant-Australian women. Aust NZ J Public Health. 2018;42(1):98-103. doi: 10.1111/1753-6405.12752
https://doi.org/10.1111/1753-6405.12752...
). Em contrapartida, outro estudo mostrou que em país mais conservador, como no México, mulheres casadas podem não rastrear pelo machismo do parceiro (pela exposição do corpo feminino)(2323 Tejeda S, Thompson B, Coronado GD, Martin DP. Barriers and facilitators related to mammography use among lower educated Mexican women in the USA. Soc Sci Med. 2009;68(5):832-9. doi: 10.1016/j.socscimed.2008.12.023
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2008...
). Apesar de encontrar associação entre o estado conjugal com companheiro e maior realização de mamografia, os autores apontam que perguntar sobre o estado conjugal não necessariamente define viver com ou sem o companheiro, ficando difícil inferir sobre a participação do parceiro no rastreio da mulher(1010 Chkotua S, Peleteiro B. Mammography Use in Portugal: National Health Survey 2014. Prev Chronic Dis. 2017;14(170054). doi: 10.5888/pcd14.170054
https://doi.org/10.5888/pcd14.170054...
,1616 Al-Wassia RK, Farsi NJ, Merdad LA, Hagi SK. Patterns, knowledge, and barriers of mammography use among women in Saudi Arabia. Saudi Med J. [Internet]. 2017 [2019 May 03];38(9):913-21. Available from: https://smj.org.sa/index.php/smj/article/view/smj.2017.9.20842/10487
https://smj.org.sa/index.php/smj/article...
).

Neste estudo, mulheres que autoavaliaram sua saúde como regular, ruim ou muito ruim apresentaram maior chance de não realizar mamografia. A percepção que o indivíduo tem da sua saúde como ruim está relacionada com os comportamentos negativos em saúde que possui, como tabagismo, alcoolismo e inatividade física(2424 Pavão ALB, Werneck GL, Campos MR. Autoavaliação do estado de saúde e a associação com fatores sociodemográficos, hábitos de vida e morbidade na população: um inquérito nacional. Cad Saúde Pública. 2013;29(4):723-34. doi: 10.1590/S0102-311X2013000400010
https://doi.org/10.1590/S0102-311X201300...
). Desse modo, pode-se inferir que, além desses comportamentos, existe a menor procura por serviços de promoção da saúde e prevenção de doenças, incluindo a não realização de exames de rastreamento.

Comportamentos não saudáveis, como atividade física insuficiente, consumo do álcool, tabaco e dieta não saudável, são considerados como fatores de risco para o câncer de mama(55 Migowski A, Azevedo Silva G, Dias MBK, Diz MDPE, Sant’Ana DR, Nadanovsky P. Guidelines for early detection of breast câncer in Brazil. II - New national recommendations, main evidence, and controversies. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2018 [2018 Oct 15];34(6):1-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n6/1678-4464-csp-34-06-e00074817.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n6/1678-...
). Neste estudo, tais condições foram associadas à menor chance de realizar a mamografia, podendo ser encaradas como acumulação de risco, por serem fatores associados ao câncer de mama e à não realização do diagnóstico precoce(1717 Ministério da Saúde (BR), Câncer de mama. [Internet] 2018 [2018 Sep 25]. Available from: www.saude.mg.gov.br/saudedamulher.
www.saude.mg.gov.br/saudedamulher...
). A utilização de um escore de comportamento não saudável acumulado neste estudo permitiu tal avaliação. Ressalta-se, ainda, que alguns estudos mostram que as mulheres não realizam a mamografia por não se considerarem em risco para o câncer de mama, pois não sentem dor ou não palparam alguma alteração(2323 Tejeda S, Thompson B, Coronado GD, Martin DP. Barriers and facilitators related to mammography use among lower educated Mexican women in the USA. Soc Sci Med. 2009;68(5):832-9. doi: 10.1016/j.socscimed.2008.12.023
https://doi.org/10.1016/j.socscimed.2008...
), ou por não apresentarem alto risco familiar(2525 Schneider IJC, Corseuil MW, Boing AF, d’Orsi E. Knowledge about mammography and associated factors: population surveys with female adults and elderly. Rev Bras Epidemiol. 2013;16(4):930-42. doi: 10.1590/S1415-790X2013000400013
https://doi.org/10.1590/S1415-790X201300...
). Esse comportamento demonstra um claro desconhecimento acerca da doença, seus fatores de risco e talvez uma deficiência do serviço em relação à educação em saúde voltada para a prevenção de agravos e promoção da saúde. Os nossos achados relacionados à escolaridade podem reforçar isso.

Observa-se que, mesmo com o cumprimento das metas quantitativas de cobertura de realização da mamografia, parece não haver impacto esperado na diminuição das taxas de incidência e mortalidade do câncer de mama no país(55 Migowski A, Azevedo Silva G, Dias MBK, Diz MDPE, Sant’Ana DR, Nadanovsky P. Guidelines for early detection of breast câncer in Brazil. II - New national recommendations, main evidence, and controversies. Cad Saúde Pública. [Internet]. 2018 [2018 Oct 15];34(6):1-16. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csp/v34n6/1678-4464-csp-34-06-e00074817.pdf
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). Ações de prevenção complementadas por meio de acesso ao tratamento em tempo oportuno, prioridades no rastreamento nos grupos com chances diminuídas de realização e em grupos de alto risco da doença podem impactar na redução da mortalidade pelo câncer de mama, por meio da detecção precoce(88 Buranello MC, Meirelles MCCC, Walsh IAP, Pereira GA, Castro SS. Prática de exames de rastreio para câncer de mama e fatores associados - Inquérito de Saúde da Mulher em Uberaba MG, Brasil, 2014. Ciên Saúde Coletiva [Internet] 2018 [2019 Feb 04];23(8):2661-70. Available from: http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-8123-csc-23-08-2661.pdf
http://www.scielo.br/pdf/csc/v23n8/1413-...
).

Portanto, nossos achados apontam que, apesar do aumento da cobertura da mamografia no país e do cumprimento da meta do plano nacional, diferenças persistem, apontando desigualdades do rastreio. A realização do exame foi menor em grupos com diferenças sociodemográficas e comportamentais, com destaque para as mulheres com baixa escolaridade e baixo peso, além daquelas com comportamentos negativos em saúde, sendo estes também fatores de risco para ocorrência do câncer de mama. Assim, demonstra as desigualdades como barreiras ao exame. Essas evidências são úteis e devem ser consideradas ao definir alocação de recursos para melhoria do rastreio da doença no país.

Limitações do Estudo

As limitações do presente estudo devem ser explicitadas. Inquéritos transversais indicam apenas relações associativas entre as variáveis de exposição e desfecho. Porém, pode-se considerar plausível que mulheres com baixos níveis socioeconômicos e com comportamentos não saudáveis participem em menor proporção das atividades de rastreamento das políticas públicas. Viés de memória pode também estar presente na caracterização do período em que foi realizado o exame, entretanto, resulta em dificuldade para estimar sua direção e magnitude.

Contribuições para a Enfermagem

O enfermeiro desempenha papel fundamental no âmbito da atenção primária à saúde, na qual ocorrem as estratégias de rastreio em nosso país, podendo contribuir para a melhoria das desigualdades encontradas. Priorizar as mulheres mais vulneráveis, que não realizam ou realizam menos o exame, poderia ser o primeiro passo para a construção de um rastreio mais estratégico e menos oportunista. Além disso, permitiria um cuidado acessível e qualificado a esse grupo de mulheres.

CONCLUSÃO

A prevalência de realização da mamografia entre as mulheres que se encontravam na faixa etária alvo para esse exame (50 a 69 anos) foi de 78,2% para os últimos dois anos. A prevalência de não realização (21,8%) variou conforme as características sociodemográficas, comportamentais e de saúde, sendo maior nas condições que podem indicar maiores iniquidades sociais e comportamentais, como baixa escolaridade, baixo peso, avaliar negativamente sua saúde e ter escore alto de comportamentos não saudáveis e nas mulheres que não têm companheiro.

Portanto, a presença de iniquidades sociais e comportamentais potencialmente determina diferenças nas coberturas do exame de mamografia no Brasil. Esse resultado aponta possibilidades de identificar grupos mais distantes das metas de cobertura recomendadas.

  • FOMENTO
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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa
EDITOR ASSOCIADO: Ana Fátima Fernandes

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    06 Jan 2020
  • Aceito
    26 Jul 2020
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