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PROCESSO DE ENFERMAGEM - AVALIAÇÃO FEITA PELOS ALUNOS DO DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM DA UCP * * Trabalho apresentado na II Jornada Paranaense de Enfermagem, realizada em Curitiba em maio de 1977.

INTRODUÇÃO

Em 1975, pela primeira vez em nossa escola, orientamos nossos alunos e aplicamos o Processo de Enfermagem, em duas disciplinas: Enfermagem Médica (alunos do 4.º período), e Enfermagem Ginecológica (alunos do 6.º período).

Anteriormente, algumas disciplinas aplicavam só o histórico de enfermagem e o plano de cuidados; outras, apenas o plano de cuidados.

Inicialmente ministramos aulas teóricas sobre a Teoria das Necessidades Humanas Básicas e o Processo de Enfermagem, salientando, especialmente, a importância de sua aplicabilidade para o desenvolvimento profissional da enfermagem.

Após entrosamento com o pessoal de enfermagem das clínicas, iniciamos a experiência, dando a cada aluno 1 ou 2 pacientes para serem cuidados e fornecemos um roteiro de Histórico de Enfermagem (ANEXO I ANEXO I UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM ). Diariamente o aluno deveria preencher a folha de evolução e, através do plano assistencial, traçar e executar o plano de cuidados.

Lendo o artigo de HORTA, resolvemos adaptar o questionário utilizado para avaliar o que nossos alunos perceberam e aproveitaram desta experiência com o Processo de Enfermagem.

DEFINIÇÃO DE TERMOS

Baseadas na Teoria das Necessidades Humanas Básicas, da Dra. Wanda de Aguiar Horta, temos:

• PROCESSO DE ENFERMAGEM: é a dinâmica das ações sistematizadas e inter-relacionadas, que visa a assistência ao ser humano. Compreende seis fases ou passos: histórico de enfermagem, diagnóstico de enfermagem, plano assistencial, plano de cuidados, evolução e prognóstico de enfermagem.

• HISTÓRICO DE ENFERMAGEM: é o roteiro sistematizado para o levantamento de dados (significativos para a enfermeira) do ser humano, que tornam possível a identificação de seus problemas.

• DIAGNÓSTICO DE ENFERMAGEM: é a identificação das necessidades do ser humano que precisam de atendimento, e a determinação, pela enfermeira, do grau de dependência deste atendimento, em natureza e extensão.

• PLANO ASSISTENCIAL: é a determinação global da assistência de enfermagem que o ser humano deve receber, face o diagnóstico estabelecido.

• PLANO DE CUIDADOS: é a implementação do plano assistencial, pelo roteiro diário que coordena a ação da equipe de enfermagem na execução de cuidados adequados ao atendimento das nccessidades básicas e específicas do ser humano.

• EVOLUÇÃO DE ENFERMAGEM: é o relato diário das mudanças sucessiva" que ocorrem no ser humano, enquanto estiver sob assistência profissional.

• PROGNÓSTICO DE ENFERMAGEM: estimativa da capacidade do ser humano em atender suas necessidades básicas, alteradas após a implementação do plano assistencial e à luz dos dados fornecidos pela evolução de enfermagem.

OBJETIVOS

  1. Indagar a opinião dos estudantes sobre o Processo de Enfermagem;

  2. Identificar fatores que interferem na aplicação do Processo de Enfermagem.

METODOLOGIA

1. População e amostra

A população constituiu-se de todos os alunos do 4.º e 6.º período do ano letivo de 1975, das disciplinas de Enfermagem Médica e Enfermagem Ginecológica, respectivamente.

Dos 72 alunos, 25 (34%) deixaram de preencher o questionário, constituindo-se a amostra de 47 alunos (66%).

2. Instrumento

Os dados foram colhidos através da aplicação de Questionário (ANEXO II).

3. Aplicação do instrumento

O questionário foi distribuido no início do semestre letivo subseqüente ao da aplicação do processo, e recolhido até 2 meses após.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Abaixo transcreveremos os itens constantes do questionário de "Avaliação do Processo de Enfermagem, os respectivos resultados e nossa opinião sobre os dados coletados:

1. O HISTÓRICO DE ENFERMAGEM PERMITIU:

Embora 26 alunos (44,6%) tenham afirmado que o histórico de enfermagem não serviu para "aprender enfermagem", vemos que a maioria positiva todos os outros itens, o que nos leva a refletir sobre qual o conceito que os alunos têm do que é enfermagem realmente.

2. COMO VOCÊ SE SENTIU AO FAZER O HISTÓRICO DE ENFERMAGEM?

A maioria dos alunos se sentiu à vontade ou como uma pessoa que quer ajudar, o que é muito bom para o relacionamento enfermeiro-paciente.

Quanto aos 8,5% que se sentiram constrangidos. ou os 2,1 % que se sentiram como um especulador da vida alheia, vários fatores podem ter concorrido para isso; mas provavelmente o mais evidente é a dificuldade de comunicação. Por outro lado, não deixamos de considerar os problemas referentes ao pouco domínio, por parte, do aluno, do conhecimento específico do que é enfermagem, bem como do objetivo do histórico.

3. COMO OS PACIENTES PARECEM REAGIR DURANTE O HISTÓRICO DE ENFERMAGEM?

Na opinião dos alunos, os pacientes, de modo geral, (57,4%) ficam muito satisfeitos em ter com quem conversar e a quem contar os problemas, além da vontade de auxiliar o próprio entrevistador.

Quanto aos pacientes que demonstraram inibição para responder o histórico talvez seja em conseqüência do constrangimento do próprio aluno, que não tem a capacidade de comunicação suficientemente desenvolvida.

4. QUAL SUA OPINIÃO SOBRE O HISTÓRICO DE ENFERMAGEM?

Algumas opiniões favoráveis: 41 (87,2%)

  • - "É válido. Mas na prática é quase-impossível devido às condições dos nossos hospitais".

  • - "É importante porque no histórico levantamos dados básicos sobre o paciente e, com isso, identificamos os seus problemas".

  • - "É uma forma de explorarmos vários itens a respeito do indivíduo como pessoa e como paciente".

Opiniões desfavoráveis: 4 (8,6%)

  • - "É muito extenso e, por isso, pouco objetivo. Creio que não funciona. Alguns dados são muito pessoais e não-levam a nenhum auxílio".

  • - "Deveriam falar menos dele, simplificá-lo e aplicá-lo mais. Talvez, então, as coisas mudassem".

  • - "É muito cansativo para o paciente, que não não demonstra muita vontade de contar seus problemas".

Comentário:

As opiniões desfavoráveis ao processo referem-se mais à sua extensão do que à sua eficácia, o que pode ser facilmente corrigido com a aplicação metódica, avaliação, busca de um modelo mais prático, conciso e com o mesmo grau de eficiência.

Nota-se pessimismo por parte de alguns alunos como "creio que não funciona", "na prática é quase impossível nas condições de nossos hospitais". Já estariam os alunos "contaminados" pelo comodismo, pela estrutura obsoleta dos hospitais e em especial dos serviços de enfermagem? Ele, como estudante, realiza essa atividade. Mas nas clínicas onde estagia, é aplicado o processo?

5. O DIAGNÓSTICO DE ENFERMAGEM PERMITIU:

A totalidade das respostas, 100%, demonstrou ter considerado que o diagnóstico de enfermagem permitiu individualizar o cuidado, melhorar o plano assistencial e usar raciocínio lógico, embora 27,7% tenham achado que não serviu para estudar mais enfermagem. Se esse diagnóstico faz com que melhore o planejamento da assistência ao paciente, não serve, também, para aprender mais enfermagem?

Permanece ainda a dúvida do que o aluno considera ser enfermagem como ciência, bem como desconheça, em parte, o seu conceito e o seu conteúdo.

6. QUAL SUA OPINIÃO SOBRE O DIAGNÓSTICO DE ENFERMAGEM?

Houve um alto percentual de concordância 97,9 - 46 respostas.

Algumas opiniões:

  • - "O diagnóstico de enfermagem facilita muito para fazer um bom plano de cuidados e dar um atendimento melhor".

  • - "Muito importante, porque só assim o paciente é individualizado".

  • - "Permite conhecimento mais individualizado do paciente e uma avaliação de suas necessidades".

  • - "Necessário para partir para o plano assistencial".

7. A ELABORAÇÃO DO PLANO ASSISTENCIAL E DO PLANO DE CUIDADOS PERMITIU:

Os resultados evidenciam quase o mesmo grau de concordância no que se refere à melhoria da assistência de enfermagem,melhoria dos cuidados de enfermagem e aprendizagem dos aspectos clínicos da doença, revelando uma atitude positiva quanto ao papel da enfermagem.

Faltou melhor entrosamento com a equipe médica e mesmo a participação do pessoal de enfermagem, que apenas deixaram os alunos executarem o processo, sem dele terem participado. Os alunos sentiram isso, pois quase a metade da turma (44,8%), achou que não melhorou o entrosamento com a equipe médica e de enfermagem. A situação não seria outra se a equipe de enfermagem hospitalar participasse da experiência? Os alunos teriam um modelo a ser seguido e conseqüentemente, sua atuação seria de maior entrosamento.

8. QUAL A SUA OPINIÃO SOBRE O PLANO ASSISTENCIAL E O PLANO DE CUIDADOS?

Nesta questão foi difícil avaliar quem realmente achou o plano assistencial e o plano de cuidados desfavorável.

Foram consideradas desfavoráveis 19 (40,4%) opiniões que acharam que o plano não é viável ou que não serviu para melhorar a assistência ao paciente. Salientamos que respostas desfavoráveis referiram-se mais a falha da nossa experiência pela dificuldade de execução da assistência planejada.

Acreditamos que, se o planejamento não estivesse sendo executado apenas pelos alunos, mas sim pela equipe hospitalar, a reação seria outra.

Algumas opiniões favoráveis:

  • - "É o ideal a ser seguido. Os dois, quando bem elaborados, melhoram sobremaneira o trabalho da enfermeira".

  • - "Auxilia em muitos pontos para o melhor atendimento do paciente e também ajuda todos a participarem"

  • - "Seria ótimo se fosse feito para todos os pacientes".

Algumas opiniões desfavoráveis:

  • - "A validade do plano asistencial está condicionada à possibilidade de se levar a efeito a assistência programada. Fazer um plano assistencial e deixar o paciente ter alta sem lhe prestar os cuidados é muito negativo".

  • - "Utopia, enquanto não existir número suficiente de enfermeiras para número de pacientes ou treinar o pessoal auxiliar para fazê-lo".

  • - "É muito complexo. Deveria ser bem mais simplificado para poder ser viável e adaptável à nossa situação".

9. O PREENCHIMENTO DIARIO DA FOLHA DE EVOLUÇÃO PERMITIU:

Como não tivemos muito entrosamento com a equipe médica, novamente os alunos sentiram que o preenchimento da folha de evolução não serviu para melhorar a comunicação com o médico (44,7%).

Foi alentador verificar que 95,8% dos alunos acharam que serviu para melhorar a observação, característica imprescindível do profissional de enfermagem.

10. QUAL SUA OPINIÃO SOBRE A FOLHA DE EVOLUÇÃO?

Aqui também as opiniões desfavoráveis 8 - 17,0% referiram-se mais às falhas na nossa experiência do que à validade da utilização da folha de evolução.

Algumas opiniões favoráveis:

  • - "É ótima, pois o paciente apresenta um quadro diferente diariamente e desse modo podemos acompanhar com mais interesse as mudanças do estado de saúde com involução da doença".

  • - "É importante porque força a gente a observar mais os pacientes".

  • - "Permite contato mais direto com o paciente e melhor atendimento".

Algumas opiniões desfavoráveis:

  • - "Na nossa experiência não teve muito valor. Serviu para maior comunicação minha com o paciente. Acho dispensável quando existir relatório de enfermagem na rotina hospitalar".

  • - "Ainda não atingiu o ponto ideal. A enfermagem precisa orientar o pessoal para observações e anotações mais objetivas".

  • - "É necessário entrosamento com a equipe de enfermagem e continuidade nas observações".

11. QUANTO AO PROGNÓSTICO DE ENFERMAGEM, O QUE VOCÊ ACHA?

HORTA diz que o "prognóstico de en-enfermagem é a estimativa da capacidade do ser humano em atender suas necessidades básicas após a implementação do plano assistencial e à luz dos dados fornecidos pela evolução de enfermagem". É pois importante para avaliar a assistência prestada; mas, considerando a estrutura dos nossos serviços, será que ele é essencial? Pelo menos na forma como está sendc preconizado 53,2% opinaram desfavoravelmente e nós pensamos em achar algum meio de verificar onde falhamos (acreditamos ser falta de orientação nossa) ou de testar sua validade real.

Algumas opiniões favoráveis:

  • - "Bom, se realmente conseguíssemos fazer aquilo que planejamos".

  • - "Permite um bom acompanhamento e avaliação do nosso trabalho".

  • - "Válido, desde que se tenha feito com bastante critério todo o processo de enfermagem".

Algumas opiniões desfavoráveis:

  • - "Muito complexo, vago e de pouca validade".

  • - "Difícil e de pouca validade".

12. QUAIS AS MAIORES DIFICULDADES QUE VOCÊ ENCONTROU AO APLICAR O PROCESSO DE ENFERMAGEM?

Se o processo de enfermagem fosse aplicado em todos os estágios, dentro de uma linha filosófica ou marco conceptual que reunisse os esforços de todos os docentes, e com melhor entrosamento hospital-escola, provavelmente a maioria das dificuldades seriam abolidas, pois estas resultaram de falta de continuidade e entrosamento com os demais elementos da equipe médica e de enfermagem.

13. DÊ SUA OPINIÃO SOBRE O PROCESSO DE ENFERMAGEM.

Esta questão, para facilitar a avaliação, foi dividida em tópicos.

Como era uma questão com respostas abertas, é difícil transcrever todas as idéias, mas de modo geral os alunos acharam que:

Para o paciente - o processo de enfermagem ajuda em todos os aspectos, individualizando-o, porque ele se sente mais seguro e tratado como pessoa.

A equipe de enfermagem - acharam que foi difícil a colaboração da equipe, embora se note um melhor entrosamento com aqueles que têm boa vontade.

A equipe médica - não participou muito, talvez mais por não terem conhecimento do assunto do que por resistência à modificação.

Quanto à própria atuação - muito teórico, mas deu para motivar à modificação.

Quanto à viabilidade na prática profissional - infelizmente a maioria não acreditou muito na sua viabilidade, devido principalmente à sua complexidade, exigindo muito tempo para sua execução.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muitos enfermeiros que trabalham em escola ou em hospital, relutam em iniciar a aplicação do processo de enfermagem por vários motivos, como: perda do tempo, falta de pessoal, pouco resultado positivo.

Acreditamos que devemos primeiro testá-lo, para depois falarmos sobre seus defeitos.

É necessário lembrar, ainda, que com a nova legislação sobre o exercício profisisonal, esta será a função específica do enfermeiro em futuro próximo.

Pelos resultados apontados em noss? experiência, concluímos que apesar das dificuldades: falta de entrosamento com a equipe médica ede enfermagem e pouca oportunidade para prestar a assistência planejada, nosso tempo foi muito bem aproveitado e os resultados, tanto para o ensino como para o paciente, foram satisfatórios.

Cremos que, como a aplicação de assistência sistematizada, pode ser diminuído o número de funcionários, e além disso, o enfermeiro aproximando-se mais do paciente, conhecendo-o e planejando seus cuidados, retoma seu lugar de líder da equipe de enfermagem. O tempo que se perde na elaboração do plano e coleta de dados é ganho na prestação de cuidados previamente estabelecidos e adequados.

É de máxima urgência o treinamento de todo o pessoal de enfermagem na área de ensino e de campo de atividades.

Sugerimos que cada profissional dentro de sua área faça uma experiência da aplicação do processo, avalie os resultados e divulgue-os, para que brevemente cheguemos à atuação ideal.

  • *
    Trabalho apresentado na II Jornada Paranaense de Enfermagem, realizada em Curitiba em maio de 1977.
  • KOCH, R.M. e OKA, L.N. - Processo de enfermagem - Avaliação feita pelos alunos do departamento de enfermagem da UCP. Rev. Bras. Enf.; DF, 30 : 274-285, 1977.

ANEXO I UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ DEPARTAMENTO DE ENFERMAGEM


REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

  • HORTA, Wanda de Aguiar - A metodologia do processo de enfermagem. AbreItalicoRevista Brasileira de enfermagemFechaItalico. 24 (6): 81-95, out./dez. 1971.
  • ______ - Enfermagem : teoria, conceitos, prlncipios e processo. Revista da Esc. Enf. USP, 8 (1): 7-17, mar. 1974.
  • ______ - Avalião do histórico de enfermagem pelos estudantes de enfermagem da EEUSP. AbreItalicoRevista enfermagem em novas DimensõesFechaItalico, 1 (4): 198-202, 1975.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 1977
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